Unprepared

A esfera bicolor de cores vermelha e branca abriu-se em sua divisão, sugando o cavalo-marinho venenoso para dentro de si num feixe de luz escarlate, logo se fechando com ele dentro. Após algum tempo, um barulho de clique fora ouvido, sinalizando o sucesso da captura e gerando uma alegria temporária em Aron e em mim.

Infelizmente, a felicidade logo se dissipara, dando espaço para que uma intensa dor se alastrasse em meu corpo. Senti fraqueza em meus músculos, e logo despenquei sobre a rocha, jazendo paralisado nela. Não conseguia mover corretamente os meus membros, o que me deixava numa situação deplorável.

Logo, uma gargalhada de zombaria surgira como se estivesse rindo de mim. A princípio, pensei que fosse algo da minha mente, mas de certa forma parecia bem real.

Quando olhei ao redor, percebi algo estranho: como se tivéssemos sido teleportados, agora o panorama do horizonte se apresentava como o exterior do planeta, uma vasta escuridão estrelada.

Estava surpreso, mas não tanto como fiquei quando fui sugado para dentro de um portal. A dor ainda estava presente em todas as minhas juntas, mas eu não conseguia pensar em mais nada a não ser me aproximar da mochila, guardar as Pokébolas (inclusive a de Skrelp) e pegar a cápsula de Aron para deixa-lo em segurança.

A gargalhada irônica e perturbadora penetrava nas entranhas da minha mente e se impregnava em cada parte do meu crânio. O ambiente escuro e tenebroso em que estava preso junto a meus pertences tornava a situação em algo fantasmagórico, quimérico. Aquilo parecia aos poucos me deixar cada vez mais assustado, e era bem capaz que eu perdesse a minha sanidade por alguns momentos se eu continuasse naquele local subversor e amedrontador, longe da minha família e de quaisquer outros indivíduos. Seria todo este evento fruto da minha imaginação?

Assim que recolhi os meus itens e os aproximei do meu corpo, não fui capaz de pensar em outra coisa a não ser em segurança própria e de meus acompanhantes, embora não pudesse fazer algo útil para tal causa. Se fosse um sonho, eu preferia que tivessem me beliscado para o meu despertar antes do local me proporcionar visão esta que logo tive de outra argola dourada, que parecia mais ávida por objetos e sujeitos do que a anterior, que nos puxou para dentro de si e ocasionou toda esta trama.

O círculo obscuro havia engolido com sucesso cerca de metade da massa da rocha que nos servia de navio a navegar pelo espaço negro. Aron, intimidado com o poder do tão bizarro portal, chegara para perto de mim, procurando pela garantia de sua sobrevivência. Assim que foi possível, retornei meu tão adorado companheiro para dentro de sua cápsula, mas não podia fazer o mesmo comigo, logo me apresentando para o autor de toda aquela baderna como alguém exposto; um potencial alvo para suas malevolências.

-T-Tem alguém aí? – Disse, com a voz falhando no meio da frase. Possuía suspeitas de que o possível responsável estivesse por aquelas bandas. -Se for fazer algo comigo, por que não... Por que não faz logo?! - Ergui minha face.

Cessaram... Os acontecimentos e esquisitices bizarras que ocorriam à minha volta pareciam ter cessado; o portal cujos limites eram delimitados por uma argola dourada desaparecera assim como as gargalhadas que perturbariam e colocariam a sanidade de qualquer pessoa apresentada a uma situação daquelas em risco. Mas ainda estava no suposto e anormal espaço sideral.

O aparentemente interminável silêncio pairava sobre o ambiente, sendo levemente distorcido apenas pelos sons da minha respiração acelerada. Estava sendo exposto a tantos mistérios, tantas preocupações... O que era aquilo tudo afinal? Uma ilusão que a minha mente me propôs? As artimanhas de um Pokémon brincalhão e inconsequente? O veneno que antes me atingiu mostrando efeitos secundários? Os meus pensamentos enchiam a minha cabeça em um turbilhão de perguntas que simplesmente não eram respondidas de uma vez.

Mas... Bolar teorias e buscar por respostas não adiantaria perante a ocasião da qual eu me encontrava, visto que tentar explica-la parecia impossível. Apenas precisava esperar passar. Mesmo que tivesse que aguardar uma enorme passagem de tempo, apenas precisava esperar passar. Mesmo que não tivesse fim.

Acontece que eu não era muito de esperar.

-Ei... Está me ouvindo? - Perguntei para a escuridão celeste. -Sabe, isso está ficando um pouco entediante... Pode me fazer voltar para onde eu estava antes?

Enfim o autor daquela obra se apresentara visualmente diante de nossos olhos. Ao menos uma de minhas teorias estava correta: era um Pokémon. Mesmo que seu corpo fosse miúdo, uma aura obscura e amedrontadora ainda o envolvia, tornando toda a situação mais tenebrosa. O perigo era iminente, mas não havia muitas coisas a fazer se não tentar convencê-lo a nos tirar daquela área tão bizarra.

-Ei, você... – Antes que pudesse recitar o meu discurso, um frio percorrera toda a minha espinha, travando os meus movimentos. Possuía um mau pressentimento, assim como Aron, que encarava a estranha criatura rosada com medo e raiva.

Acreditava que meus companheiros ainda estivessem feridos por causa da batalha anterior, então não ousei usá-los para me ajudar, apenas deixando Skrelp preso em sua Pokébola e afastando Aron do Pokémon.

Enquanto fitava os anéis dourados que rodeavam os membros do monstro, vagarosamente ia buscando dentro da minha mochila pela minha Pokédex para identificar a criatura. Afinal, quem sabe não adquiria boas informações sobre ela?

Todo cuidado era pouco. Erguendo ambos os meus braços que seguravam o dispositivo de detecção, arrisquei-me a apontar a câmera da Pokédex para o Pokémon. Então, caso conseguisse descobrir algumas características dele, liberaria toda uma ala do vocabulário para conversar com ele.

Não importasse que ação eu tentasse fazer uso, a criatura que levitava perante meus olhos tendia a me parar, evitando qualquer movimento. No panorama do vácuo estrelado, a figura demoníaca estendia-se com um sorriso largo e olhos que emanavam sua diversão e aura maléfica.

Já possuía uma noção básica de suas capacidades elementares: podia gerar portais negros delimitados por anéis dourados e enviar os objetos e seres que eles engoliam para outros locais, além de também dominar algumas habilidades de pulsos de força já apresentadas anteriormente.

Era evidente a nossa desvantagem. Não apenas estávamos em seu próprio território, mas como também tínhamos uma imensa desigualdade de poder. -Não podemos lutar contra ele... Seus ataques são muito fortes. – Sussurrei, dirigindo-me a Aron para que ele não fizesse nada sem pensar nas consequências.

O choque do golpe tornara todo o meu corpo em uma simples sacola de pele e carne vulnerável. Jazia sobre uma pequena parte da rocha, sendo que alguns pedaços dos meus membros sustentavam-se com o pequeno apoio da pedra enquanto pairavam na escuridão. Ao tentar me levantar mesmo com as dolorosas feridas físicas, percebi que não conseguia mover as minhas pernas corretamente. Talvez o abalo do ataque tenha percorrido por todos os meus ossos e incapacitado os músculos da parte inferior do meu corpo.

Abaixei a minha cabeça e olhei para a coloração preta que nos cercava. O desespero tomou conta dos meus pensamentos, apesar de que o pânico não demorou tanto para sair, visto que a busca por recursos estratégicos havia concedido frutos. Então, passando a encarar o estranho Pokémon olho-no-olho, disse:

-Qual o seu nome afinal? E qual é o seu propósito?