#001 On the Run

Emily se mostrava uma pessoa agradável para conversas. Por todo o momento que trabalhamos juntos, não houve sequer um em que o silêncio se instalara entre nós. Ela parecia estar disposta a sanar minhas dúvidas e eu as dela. Eu, como iniciante, aprendia algumas coisas básicas com ela.

“Nunca pensei que começaria a refletir sobre meu futuro como treinador Pokémon tão cedo”, pensava comigo ao ouvir a pergunta dirigida a mim. Olhei para Spheal, naquele momento não conseguia pensar naquela pequena Pokémon evoluindo para algo maior e de aparência diferente.

- Eu e Spheal também nunca batalhamos. – disse em complemento com as ultimas palavras ditas pela treinadora – Quanto a evolução, não consigo imaginar minha Spheal de uma outra maneira se não esta. Acredito que o que ela deseja também é importante, mesmo que o dia de sua evolução demore a chegar.

Enquanto respondia Emily não pude deixar de observar Spheal, mais uma vez. Ela parecia tão despreocupada com tudo, apenas focada em se divertir e curtir ao máximo o tempo fora do apartamento. Possuía uma ideia inicial, mas isso não significava que ela fosse imutável. Tudo era uma questão de tempo.

Já estávamos quase terminando os preparativos finais quando um pequeno problema apareceu. Parecia que a temperatura elevada havia derretido o gelo das bebidas, logo, deixando o líquido nas garrafas em uma temperatura ambiente – algo nem um pouco refrescante. Carl nos incumbiu de resolver aquilo, pois precisava passar no restaurante.

- Bem, segundo minha Pokédex, Spheal possui movimentos do tipo gelo. Talvez se pegássemos um balde com água, poderíamos transformá-la em gelo. Depois só precisaríamos de algo forte o bastante para quebrar o gelo em pedaços menores. – sugeri para Emily.

Chamei Spheal para perto de mim, apenas esperando o aval de minha colega de trabalho. Não optara por utilizar o movimento diretamente nas garrafas, pois não sabia se Spheal era capaz de dosar a força, logo, correndo o risco de congelar demais as garrafas e torná-las inconsumíveis.

Congelar a água no balde mostrou-se ser bem efetivo. Spheal parecia feliz com resultado, batendo suas duas nadadeiras como sinal de felicidade. Por dentro eu estava feliz com o resultado, mesmo que não expressasse nada externamente.

O único problema seria como iríamos quebrar o gelo. Spheal não possuía nenhum movimento que realizaria tal proeza. Ainda que não tivesse ideia do faria, pedi para que Emily providenciasse um pouco mais de água, pois parecia que o gelo de todos os isopores estava derretido já.

Enquanto pensava, de repente, notei um pedaço de madeira passar em meu campo de visão, era Timburr, parecia que o pequeno Pokémon lutador havia ficado no estabelecimento. Foi então que minha mente clareou e a solução para o problema de quebrar o gelo me vinha.

- Timburr, você não teria algum movimento bem legal para quebrar todo esse gelo, teria? – disse me colocando agachado, para ficar em uma altura próxima ao do Pokémon. Precisaríamos realizar um pequeno trabalho em equipe ali. Depois de conversar com o lutador, direcionei meu olhar para Emily - Vamos tentar terminar isso o mais cedo possível. Conto com você - fiz um sinal de positivo com meu polegar, levantei, tirei a poeira da roupa e voltamos ao trabalho.

Parecia que todo o nosso trabalho em equipe estava funcionando ali. Spheal se mostrava orgulhosa consigo mesma por estar conseguindo lidar com toda aquela situação, certamente ficaria devendo um almoço para a pequena.

Timburr mostrou ser detentor de uma força voraz. Seus punhos brilharam, envoltos em uma luz incandescente e atingiram o bloco de gelo que Spheal havia criado. O impacto fez com o bloco se despedaçasse.

“Uma força dessas seria útil em nossa equipe, Spheal, você não acha?”, falava para mim mesmo, enquanto observava Timburr em ação. Essa fora a primeira vez que pensei em uma equipe Pokémon. Esse pensamento súbito chegou a me assustar, um calafrio percorreu toda minha região dorsal. Este tipo de ideia era algo muito típico de treinadores.

No entanto a grande revelação do momento era Cleffa, a pequena Pokémon levitou os cubos de gelos com maestria e sua dona, Emily, chegava com uma mangueira de bombeiros e uma quantidade considerável de baldes. Quando olhei para ela, não pude evitar de sorrir internamente.

A mangueira de bombeiros era um pouco exagerada, talvez, devido a sua alta pressão. No entanto, se conseguíssemos ajustá-la, certamente seria útil, pois agilizaria o trabalho. Os baldes eram grandes, teríamos gelo até o final do evento.

- Spheal, vamos lá, só mais alguns movimentos de gelo e finalizamos. Não quero te levar a exaustão por causa disso, então apenas alguns desses grandes baldes devem bastar – me direcionei para Emily – Isso é perfeito! Apenas precisamos ter cuidado com a pressão, quantos aos baldes, acho que da e sobra. Vamos lá, time! – digo com o máximo de empolgação que me é possível, embora para eles deve ter soado como palavras normais.

Enquanto Emily enchia os baldes de água, eu começava a organizar os isopores que ainda precisavam de gelo, afim de organizar a linha de produção.

Tudo cooperava para a realização da tarefa imposta a nós. Emily e sua Cleffa pareciam líderes de torcida, animando e encorajando Timburr com sua empolgação, mandando ao pequeno Pokémon lutador boas vibrações.

Graças ao trabalho colaborativo havíamos terminado antes das outras equipes, tínhamos ali meia hora de descanso, antes do evento começar e nos tirar dessa calmaria. Pegava uma garrafa de água e me hidratava. Sentia o topo de minha cabeça abafada, devido ao gorro que usava, por isso, o removi por alguns segundos e então, com o restante do líquido, molhei um pouco minhas madeixas, a fim de sentir mais frescor.

Enquanto segurava meu gorro com uma das mãos, Spheal não perdera tempo e logo o abocanhou e rolou para longe com meu acessório. Sequer tive tempo de recuperar meu item perdido, quando pensava em correr atrás da Pokémon dois Pokémon desconhecidos para mim entravam. Apontei minha Pokédex em direção a eles e o aparelho eletrônico os categorizou como sendo Combuskens – que faziam parte da linha evolutiva de Torchic.

Quando Carl revelou o que tinha nas sacolas, um delicioso aroma invadiu minhas narinas. Só precisávamos organizar as ultimas coisas. Colocamos sobre uma das bancadas os itens e então voltamos ao descanso. Carl, representando Sr. Jyn, nos entregou uma espécie de fruta azulada. Aceitei de prontidão e alguns segundos depois, cochichando para Emily, perguntei do que se tratava aquilo. Meu conhecimento sobre o mundo Pokémon era bastante limitado.

A explicação de Emily sobre a Oran Berry me fez refletir sobre o gosto daquele estranho fruto azul. As papilas gustativas dos Pokémon pareciam funcionar de um modo diferente dos humanos, talvez sua percepção de sabores fosse mais abrangente que a dos humanos. Uma curiosidade em saber o gosto do fruto me sobreveio, quase como uma tentação. No entanto resisti e o guardei dentro de minha mochila.

Carl se mostrou uma pessoa expressiva nas palavras, quando nos delegou o que cada um faria durante o evento. As palavras do garoto eram duras, porém... sinceras? Talvez, mas ouvir a verdade sobre você, vindo de uma outra pessoa, causava certo desconforto. Sem contestar, iniciei minhas atividades no caixa.

Quando os portões se abriram a quantidade de pessoas que entraram me assustou. Parecia que o evento fora bem divulgado. Dentre a multidão cheguei até mesmo a pensar que, talvez, algum conhecido pudesse estar ali. Todavia não tive sequer muito tempo para isso, o cheiro da comida atraiu alguns clientes e logo o trabalho de atendimento começou. Era hora de mostrar meu carisma.

Do lado de fora de nossa tenda, onde Spheal estava entretida com meu gorro. A minha pequena Pokémon estava tão entretida com o acessório que não sentiu o perigo eminente que estava a sua espreita, seu amigo, o Spheal macho, havia localizado novamente ela.

Parecia que o Spheal macho havia descoberto uma maneira de conquistar a fêmea de sua espécie: com comida. Spheal sabia que o individuo por trás daquele picolé não era nem um pouco agradável, mas a sobremesa era tentadora. Acompanhei a cena de longe, esperando por uma pausa no número de clientes para agir.

Quando tive tempo para respirar um pouco,me aproximei dos Pokémon. A língua de Spheal  estava prestes a tocar o sorvete quando eu chegara para interromper. Me coloquei no meio dos dois Pokémon e olhando para Spheal faço um sinal de desaprovação.

- Nem pensar, mocinha. Nada de sobremesa antes do almoço. Primeiro vamos comer a sua comida e depois pensamos nisso. Nós dois sabemos que isso tira todo o seu apetite, vamos para dentro da tenda, vamos. – assim que indiquei para onde minha Pokémon devia ir, olhei para o Spheal macho e disse – Desculpa amigão, mas hoje não.

Tive que ser rápido em resolver o problema com Spheal, afinal estava no horário de experiente e clientes chegavam a toda hora. Apenas precisava atender por menos de duas horas e trabalho se daria como feito.