Jack of Spades!

Primeiro ato!

A tensão era tão grande que poderia ser cortada com uma faca: Katana, irritada e atormentada, focava nas próximas ações de Muk, enquanto Hawlucha e Persian sequer piscavam observando qualquer movimentação na água do pântano. A população assistia a batalha com certa preocupação, mas nada que os impedisse de exercer seu trabalho de vigiar o perímetro; no fim, Capitão Jack era uma figura extremamente respeitada por todos.

— Vamos com tudo... Duplo Mud Bomb! — Rato gargalhava, entrando dentro da água do pântano aos poucos — Estamos só começando.

O que parecia ser um último round dessa batalha se iniciava. Estressada, a lutadora demorava para conseguir focar na aura do adversário, mas nada que a impossibilitasse de agir antes do mesmo. Mais uma esfera da alma era enviada na direção de Muk, que mesmo minúsculo era arremessado para trás, quicando no chão algumas vezes antes de cair no chão fora de combate e retornar ao seu tamanho original.

— Por que ele está entrando ali? — Chesire engoliu seco — Tem alguma coisa que não estamos ve-

A fala do felino era interrompida por um grito vindo do outro lado do vilarejo. Chesire desaparecia em meio ao ar, talvez para investigar o que estava acontecendo. Ao lado da casa era possível ver Dodo correndo na direção de Will, com uma expressão não muito feliz em seu rosto:

— E-e-ela está aqui, Ca-capitão. — respirava ofegante — Estamos te-te-tentando segurá-la, mas no-nossos Pokémon estão exaustos.

Antes mesmo que Will pudesse perguntar algo ao cowboy, com o mesmo pé que vinha, Dodo voltava correndo para sua posição. Uma música diferente da que tocava acima de si começava a tocar a alguns metros de onde estavam, o que significava que também havia uma batalha por ali.

O tempo estava encurtando e Rato agora somente deixava sua cabeça para fora do pântano, com um sorriso estampado em seu rosto desfigurado. Com toda a comoção, Malamar aproveitava para lançar um de seus tentáculos na direção de Katana, mas que rapidamente era interceptado por Hawk e seu Flying Press. A noturna conseguia desvencilhar seu tentáculo dos braços do lutador, mas desistia de atacar a metálica, retornando mais uma vez para baixo d'água.

— Parece que temos visitas, Jack. — Rato debochava — Se eu cair, que você caia junto comigo! Malamar, proteja o lago com Reflect e Light Screen!

Primeiro ato!

O silêncio pairava sobre o pequeno vilarejo, sendo somente possível escutar a música a poucos metros de distância que regia uma outra batalha. O comportamento da população dizia muito sobre como estava o andamento do outro embate: algumas já corriam para dentro de suas casas, se escondendo do que poderia vir a seguir, abandonando até mesmo seus postos de vigilância. Não parecia que estavam conseguindo segurar "ela".

Chesire não retornava e era possível ver Dodo a distância correndo com seu Smeargle para o centro do local. Infelizmente, a casa do Chapeleiro ficava na frente da visão de Will, então não era possível que o carateca acompanhasse tudo que acontecia ou sequer ver de quem se tratava essa tal de "ela". Estar no escuro sobre uma situação difícil era complicado para nosso treinador, mas ele tinha outros problemas em mãos.

Mais uma batalha contra Rato se iniciava e dessa vez contra a temível Malamar. Katana, novamente graças sua velocidade, atacava primeiro com seu potente terremoto. A água do pântano ficava completamente turva mas não era possível ver se a adversária havia se machucado; mesmo o grande poderio do ataque terrestre não a fazia sair de lá de dentro. Uma proteção branca se formou sobre a linha d'água, reluzindo um pouco o brilho esverdeado que pairava devido a possível quantidade de plantas — Reflect.

Katana seguia, concentrando seus pensamentos na aura da psíquica e enviando a esfera orinigária de sua espécie. O ataque mergulhava, fazendo uma certa comoção dentro d'água mas que graças a um leve sorriso da lutadora mostrava que havia acertado a adversária. Por fim, mais uma camada protetora era formada, dessa vez contra ataques especiais.

— CAPITÃO! — Chesire surgia ao lado de Will novamente, ofegante como nunca e até dando um susto no carateca — Acabe logo com isso, só nos restaram dois Pokémon que não aguentarão por muito tempo. — olhou para a água — Tire ela dali! Com todo respeito, o senhor não será páreo para o poder de fogo que Tomoe traz consigo. — deu um tapa na própria testa — Esqueci que não se lembra de nada. Vocês dois tem história, o que não te faz nenhum favor... Principalmente com as habilidades que ela tem. — respirou fundo, tentando conter seu nervosismo — Se não der tempo, tente se lembrar que já foram apaixonados. Até hoje acho que ela te ama, então, se conseguir fazer com que ela baixe a guarda, eu dou meu jeito para acabar com ela. — começou a andar em círculos — O problema é que ela está com você-sabe-quem do lado dela... — deu outro tapa na cabeça — Que merda! Por que você não lembra de nada? Não dá tempo de explicar!

Com isso, Chesire sumia mais uma vez no ar, talvez para tentar atrasar Tomoe de chegar até Will.

Primeiro ato!

Completamente perdido e sem recordar de memórias que talvez nunca tenham sido suas, Will se encontrava em uma situação delicada. A janela para escapar da temida Tomoe cada vez mais se fechava e era possível ver o vilarejo já deserto: os que não foram derrotados pela mulher, se escondiam e fechavam suas janelas por medo de retalhação. Dito isso, a batalha com Malamar também não era fácil, o que forçaria uma futura substituição da parte do carateca.

— Parece que é o fim, Jack! — Rato colocava mantinha somente a cabeça fora d'água e gargalhava entre as sentenças — Farei meu máximo para você cair junto comigo! — sorria e seu semblante já horrível ficava macabro também — Malamar, Rest e Sleep Talk!

Com isso, o que já era difícil, ficava ainda pior para o Capitão. A psíquica, que se escondia no pântano, dormindo tornaria os ataques de seus lutadores ainda mais complicados. Sem visão e com a vida completamente recuperada, o que fazer?

Não só com esse problema em mãos, dois disparos de escopeta poderiam ser escutados do outro lado da casa. Um grito estérico ecoava do vilarejo para floresta, mas que era logo abafado por um terceiro tiro, provavelmente contra a pessoa que gritara.

Um silêncio tomava conta do País das Maravilhas, onde até mesmo uma agulha caindo chamaria atenção. Katana, mesmo um tanto quanto assustada pelos disparos, usava sua barreira de proteção perfeitamente, mas que não ajudaria em muito. Malamar, seguindo as ordens de seu treinador, deitava no leito do pântano e tirava uma soneca para recuperar suas energias. A substituição de Will veio a seguir, retornando sua metálica e colocando Hawlucha já preparado e disposto para batalha à sua frente.

Mesmo atento em todas as direções, algo surpreendeu o voador: seu corpo começara a ficar envolto em uma aura cor-de-rosa — Psychic — que o arremessava contra uma árvore na beira do pântano e fazia com que caísse na água. Por sorte, a adversária estava dormindo. O que fazer agora?

Primeiro ato!

O barulho de armas de fogo, por mais que de certa distância, escalava o nervosismo de Will, se vendo imediatamente em uma situação cada vez mais complicada: Malamar se recusava a cair com Rest e Rato não colaborava nem mesmo com tudo que o carateca dizia tentando convencê-lo a terminar a luta. A janela de fuga ficava cada vez menor, o que era péssimo já que "Capitão Jack" não se lembrava de quem Tomoe era ou o perigo que poderia trazer a ele e seus Pokémon.

— Malamar, utilize seu Sleep Talk novamente e, se acordar, Psychic! — Rato exclamava, saindo do pântano e dando alguns pulos de alegria, principalmente ao perceber a tensão de Will — Acabou, ela você não derrota!

O turno começava como de praxe, com Hawk agindo primeiro devido sua grande velocidade: dando enormes saltos em volta do pântano, o lutador criava cópias ilusórias durante todo o percurso, dificultando o acerto de ataques adversários. Malamar seguia, mas seu Sleep Talk somente tentava criar mais uma camada de proteção na água, falhando. O lutador agora partia para o ofensivo, criando inúmeras rochas no próprio ar e arremessando-as na direção da água, atingindo em cheio a psíquica que dormia no fundo.

— Se você ach-

Rato interrompia a própria frase enquanto fitava o teto da casa do Chapeleiro Maluco, seus olhos arregalaram imediatamente e sua linguagem corporal mudava da água pro vinho; antes agressivo, agora o adversário engolia seco e tentava correr para dentro da floresta. Em cima da residência destruída, uma figura feminina em pé chamava atenção: alta, com cabelos loiros e cachos que chegavam até a cintura e reluziam com o sol que batia em suas costas. Um vento quase que cinematográfico surgia e com ele a garota saltava na diagonal em direção ao chão.

— Ja-Jack? — a bela voz adocicada da jovem dizia em meio ao ar, olhando o carateca e respirando fundo em seguida — Me sal- — sua fala era interrompida: a feição pura da garota que dissera aquilo rapidamente se transformava em algo sádico, seus olhos dourados como ouro se tornavam vazios e pálidos, sem contar o sorriso maléfico que surgia em sua face, voltando sua atenção para Rato, que tentava fugir — VOCÊ NÃO VAI FUGIR DE NOVO, RATO DO CARALHO!

Magicamente, como a maioria das coisas no País das Maravilhas, diversas flintlocks de média distância surgiam em meio ao ar e ali mesmo a bela garota começava a disparar na direção do fugitivo. O primeiro tiro pegou nas costas de Rato, que caía no chão gritando de dor e pedindo a ajuda de Jack. Isso não a impediu de continuar: Tomoe continuava disparando suas armas de fogo, assistindo aos poucos o torso do homem se desfazer em meio ao solo terroso da floresta. O sangue respingava mais a cada disparo, pintando parte das árvores e até mesmo da água do lago de vermelho. Malamar finalmente acordava e saía da água em desespero, tentando salvar seu treinador que já jazia morto no chão. A garota finalmente caía sobre o solo e com uma última arma acertava em cheio o corpo da psíquica, que estava distraída tentando reanimar o que restava de seu treinador.



— Vamos, Capitão! É nossa deixa para fugir! — Chesire surgia, puxando o carateca pela capa preta em direção ao outro lado da floresta — Não temos o que fazer aqui, ela está irracional! — sinalizou para Dodo, que à direita segurava uma Ultra Ball em sua mão e liberava um majestoso Rhyperior — Dodo vai nos ganhar algum tempo, mas precisamos ser rápidos.

Segundo ato!

O trio continuava correndo floresta a dentro na esperança de fugir da temível Tomoe, o que foi possível graças a grande ajuda de Dodo, que aparentemente havia conseguido segurá-la por algum tempo. Chesire acelerava o passo ao lado direito de Will, enquanto Hawk de vez em quando dava alguns saltos bem altos e pairava sobre o ar para visualizar melhor o ambiente; como não conhecia nada, todo cuidado com tudo era muito pouco, ainda mais depois de perceber o quão estranho era esse "País das Maravilhas" que se meteram.

— Calma aí. — Persian desaparecia no ar, surgindo rapidamente um segundo depois — Eles ainda estão batalhando, talvez nos dê tempo de pensarmos em alguma coisa. — revirou os olhos — E me dá tempo de te explicar as coisas já que você não lembra. — Chesire enfiava suas garras no calcanhar de Will — E agora? Lembra de alguma coisa? Que merda! — deu uma risada — Desculpa, não resisti. — continuou caminhando — Bom, Tomoe era seu romance, vocês eram grudados um no outro! — gargalhou — Romance MESMO, uma vez já peguei vocês, hm... Você sabe...... — fez sinal com as mãos, esfregando uma na outra — Vocês ficaram dias sem falar comigo com vergonha — fechou os olhos, lembrando da cena e abrindo um terno sorriso — Bons tempos.

Mais um tiro chamava atenção, fazendo até mesmo a maioria dos pássaros que voavam sobre as altas copas das árvores saírem voando em desespero pelos céus de Wonderland. Os olhos de Chesire se arregalaram por um momento e então começara a correr novamente. Apontou na direção norte, até passarem por algumas construções destruídas, claramente pertencentes ao finado Reino de Espadas: os belíssimos muros de concreto negro possuíam o símbolo do império destacado em branco. Sua maioria, todavia, possuía um X em vermelho marcado em cima, provavelmente pintado pelo Reino de Copas. Majestoso, o finado império possuía milhares e milhares de hectares que se estendiam até o encontro com as águas em seu norte, atrás do castelo. Algumas de suas partes ainda estavam intactas, enquanto suas muralhas e partes terrestres estavam dizimadas e reduzidas a ruínas.

— Acho que se entrarmos no Reino teremos alguns minutos de paz, mas nada a impedirá de nos seguir. — o felino bufou — Aos menos terei tempo de te contar tudo certinho. — colocou a patinha sobre o queixo novamente — Pode visitar o que restou de seu quarto também, acredito que pode te ajudar a lembrar de alguma coisa...

Após adentrarem as muralhas do Reino, Chesire sinalizava que haviam duas entradas disponíveis: a comum, pelo hall do castelo e uma segunda mais privada, conhecida somente por quem já trabalhou para a alta realeza. O felino deixou a critério do Capitão para escolher.