#Extra [Teatro] - A Guerra de Naipes

  A batalha estava próxima do fim. Ela não fora muito longa ou demorada, mas, sem dúvidas, fora a mais agressiva e emocionante até o momento. Ren ainda estava afetado pelo desmaio de seus pokémon, mas continuou, ainda que com o nariz a escorrer fluidos e o olhar embaçado.

— Ísis, uma última vez, Fairy Wind! Confio em ti, e sei que podes! Se acabar por ser atacada ainda assim, aguente firme. Ele não é páreo para nós!!! — disse ele, apoiando sua monstrinha. Wallace também estava preparado para ajudar Suitless naquilo que parecia ser o golpe final.

     É, a vitória talvez não estivesse tão certa assim. Mesmo em um fragilíssimo estado, Bouffalant conseguira derrotar ambos Duskull e Flabébé, morrendo logo após, em função dos insetos. Mais um pokémon caído, mais lágrimas. Entretanto, essas não foram tão exasperadas e descontroladas, mas ainda assim estavam lá. Ren lembrava a si mesmo que era comum os nocautes no mundo dos monstrinhos, que fazia parte da natureza das batalhas. E também decidia que preferia muito mais os contests, com toda aquela beleza e vigor.
    Eles saíram do mecha, para checar todas as coisas, e assim que o fizeram, Ren caiu em um abraço forte e triste, sob os braços de Ryousuke. Lágrimas silenciosas escorriam, enquanto ele tentava encontrar uma explicação lógica para o personagem Wallace comportar-se daquela forma. Acabou por dizer que, sendo um nobre, nunca tivera problemas com o estado de seus pokémon. Ele sacou cada um dos três Full Restore que lhes foram entregues no início do teatro, liberou os demais pokémon desmaiados  e espirrou a solução em todos eles, até então ignorando o gato, mas esperava que o mercenário Suitless distraísse o felino enquanto isso. Ao ver que todas as suas fadas pareciam bem, ele sorriu e voltou-se para aquele que outrora fora seu adversário.

    — Gato de Chesire. Não sei se lembrarás de mim, mas sou membro da corte da Rainha Branca, enviado em uma pequena e sigilosa missão para resgatá-los. Parecia-me que estavas a ser controlado por esse estranho fio em teu pescoço, não tendo mais controle sobre suas funções corporais. Mas não temas, agora estás bem. Por favor, siga o caminho até a praia, onde encontrarás o navio que nos trouxe. Ainda temos assuntos a resolver aqui.

   O garoto dizia, abraçando firmemente Dandara, grato pela consciência da tal e de todos os outros. Explicara tudo ao gato, demostrando certa empatia, mesmo sendo ele aquele que derrotara todos seus monstrinhos. Faltava a Ren esperar mais algumas poucas interações, e enfim aquela breve pausa mais uma vez, onde novamente descansaram, conversaram e prepararam-se para a próxima cena, o inimigo final.

    Batalha terminada, os atores agora ouviam aquilo que o felino tinha a dizer, uma vez que esse parecia ter recuperado parte de sua memória, e dava seu depoimento aos rapazes. Com as interações feitas, Wallace e Suitless tendo tido seu contato, o gato feito sua súplica e ido até o navio, e o público a ansiar por um desfecho, que não parecia estar tão distante, eles recolheram o item deixado pelo agora aliado, um que lembrava e muito os que já haviam recebido, e viram as cortinas de fecharem, rapidamente, para a troca de cenário.
   Dessa vez não tiveram muito tempo para fazer algo, já que em poucos instantes, o palco já havia sido modificado. O pessoal que trabalhava com o cenário realmente era muito habilidoso. O fundo preparado era muito bem detalhado, e tudo fora feito com notável capricho, até mesmo a "remenda" realizada no chão de madeira do palco, que fora quebrado na última batalha. Ren colocou-se em posição e chamou Ryousuke, já tirando do bolso os naipes que havia ganhado nas batalhas. As cortinas abriram-se com as falas do rapaz, que especulava sobre os fins daqueles objetos. Haviam quatro naipes, e ele só tinha posse de três. Para que eles serviriam, e onde estaria o outro? A sala do trono, embora esplendorosa, não dava resposta alguma, como verificada pelo nobre Wallace, que inspecionara rapidamente o lugar, antes de notar a porta atrás do enorme trono, oculta por toda a exuberância do restante da sala.
   Acompanhado pelo mercenário, ele resolveu descer as escadas, não tão ricas e belas quanto o salão anterior. Na verdade, havia uma certa beleza, mas diferente daquela já encontrada. Era uma beleza mais sombria e mística, não muito amigável, mas ainda bela. As pedras negras eram esculpidas cuidadosamente, chegando a dar um certo efeito ilusório de que foram colocadas ali desleixadamente, mas um bom olho poderia dizer que era intencional, o que certamente fora o requisitado pelo diretor da peça. Entretanto, a visibilidade ia diminuindo a cada passo, com a luz tornando-se cada vez mais distante, até que uma iluminação, claramente artificial, pôde ser vista ao fim das escadas, no que parecia ser uma pequena sala. Lâmpadas, com uma luz mais amarelada, que iluminavam como velas, dando uma certa ênfase no ambiente sombrio e medieval. E claro, no centro de tudo, o centro das atenções.
   Um escândalo. Brycen e Sabrinna, no mesmo compartimento, com importantíssimos papéis. Mesmo o garoto, tão privado de informações mundanas e diversão como fora, conhecia ambos, por conta dos shows que a mãe costumava assistir. Era uma honra para ele contracenar com os famosos. Dando sequência à peça, Brycen, representando o Chapeleiro Maluco a quem deveriam resgatar estava debatendo-se, acorrentado, envolto por um símbolo de magia negra, enquanto Sabrinna, a Rainha Vermelha, tinha em mãos um livro grosso, e recitava estranhos encantamentos, que na verdade eram uma receita de bolo de banana sem glúten escrito em latim antigo.
    Ren começou a agir, silenciosamente, tendo seu personagem a andar nas pontas do pé, uma vez que a Rainha não havia notado a presença dos invasores, e se o Chapeleiro o havia feito, não demonstrava. Quem sabe Wallace não conseguiria bater com força a cabeça da Rainha, fazer com que a tal desmaiasse, tirar o louco companheiro e sair dali, sem maiores conflitos? O fato é que a ideia até poderia ter dado certo, se o nobre não tivesse tropeçado em uma dos rústicos tijolos negros, que estava desencaixado, caído de cara no chão, gemendo e tirando o tecido do vestido da Rainha de sua boca, agora dolorida. Ele levantou-se rapidamente, queixando-se da dor, e olhou para frente. O que acabaria por acontecer agora?