Pamelor

Fora um voo bem… molhado? É, acho que seria este o termo. Ainda que completamente chuvoso, não estava nas minhas piores condições: até durante a viagem a capa de chuva fora bem útil. Guardei-a com carinho e aceitei que, dali para frente, não há mais como não se molhar;  talvez a usaria para algo mais inteligente (e útil) mais tarde. Adiantei o passo e corri até a entrada da rota. Meus seis pokemons estavam guardados na esfera e eu, aos poucos, sentia necessidade de companhia. Ainda que a falta me tomasse, resisti. Não os traria para aquele ambiente hostil se não fosse de fato necessário.

Bati o pé no meio fio divisor da região e, ao fazê-lo, eu estava oficialmente na rota 121. Fora mais um passo e senti que o impossível aconteceu: a chuva que já era torrencial piorara. Como um só passo fizera tanta diferença?! Não sei; aquilo realmente não era um ato natural.

Prossegui com o segundo passo e aceitei que dali para frente aquela enxurrada só pioraria. Larguei mão da maioria das roupas e torci para completar o circuito sem morrer de hipotermia. Para evitar o inevitável corri, afugentando o frio desalmado daquela situação. Procurei alguma proteção que não fosse arbórea, tentando evitar áreas de risco para relâmpagos sem alvo. Consegui? Ainda não. Continuei em frente, avançando com o passo corrido sobre a lama, espalhando água para os lados e sujando minha calça preta de marrom.

Oito da noite… você não poderia esperar até amanhã, Winnie?! Minha ansiedade me fizera enfrentar o perigo ao máximo mas, ao menos, duas coisas me felicitavam: minha confiança em meu time e o alívio de enfim estar fazendo o que me foi pedido.

Dei mais alguns passos corridos, ainda tentando evitar a companhia de meus pokemons. Enfrentei a solidão em um afundar profundo e meu medo de que Nicholas estivesse correndo perigo era minha única companhia. Ao menos aquele estado me acalmou; não é que ele não queira mas acredito que, com essa tempestade, será impossível para o garoto conseguir algum sinal para me mandar uma mensagem de tudo bem.

Preocupação as vezes soa como egoísmo; pedimos mensagens quando não podem dar. “Leve consigo o celular”, dizem as mães, quando sentem que o caminho é perigoso. As vezes elas mesmas esquecem que o objeto de valor à mão é o que torna aquele processo complicado. Meu sentimento para com Nicholas não era diferente; ao menos eu sabia disso. Sabia que digitar uma mensagem ou fazer uma ligação poderia atrair descargas ou quebrar o PokeNav… ainda assim eu queria um acalento ou uma afirmação de que está tudo ocorrendo como planejara.

No fim meu dever era um: investigar o sumiço dos Rangers. Ainda que fosse essa minha missão pisava no terreno com a cabeça completamente cheia de outra coisa.

Salvo o número relativamente grande de movimento ao pé da rota nada de novo chamara minha atenção. Isso iria diminuir, certo?! Imagino que a maioria desistirá ao decorrer do caminho ou ainda seria impedida de continuar. Espero que sim; quanto menos gente à frente melhor. Mantive-me em frente, num pisar pouco rápido. Eu sabia que a distância ao monte Pyre não era lá tão grande mas com aquela chuva? Tornou-se um mundo! Não via para onde ia, nem para onde pisava e muito menos quem aparecia. Mal sei como vi o tal garoto com guarda chuva estragado! Bem, de qualquer forma, tratarei de me manter distante.

Em mais alguns passos eu já estava em algum lugar novo... eu acho. Não tenho muito como ter certeza. A questão é que meu PokeDex aptou e eu, claro, peguei apressada. Podia ser Nicholas, né? Não, não podia. Era Netero que descobriu, sabe-se lá como, que eu seguia em missão, ao monte. Recebi a mensagem com um pouco de frustração e descaso, revirei os olhos e reclamei alto:
- Você não sabe de tudo? Deveria saber disso também - Eu estava certa de que ninguém ali ouvira isto e Netero muito menos.

Tentando respondê-lo da forma mais simples, direta e rápida o possível, botei o aparelho em mãos e comecei a digitar. A intenção da mensagem era avisá-lo que não o mandaria informações a menos que fosse de fato imprescindível. Além disso precisava confirmar minha intenção de cumprimento:

To entrando no Mt Pyre agr, ainda n tenho nenhuma informação.
Qndo conseguir algo sobre a missão te repasso.
Sobre Nico também.
To atrás dele.

Minhas abreviações podiam ser feias mas eu estava completamente sem tempo, irmão. Sem paciência também; minhas gafes e informalidades poderiam ser entendidas, respeitadas e aceitas pelo velhaco, ele não era tão chato assim.

OFF: Oi me chamo Vitória, prazer em conhecê-lo. Espero que se divirta tanto quanto eu!!!

Não dera nem um passo e minha PokeDex apitara de novo. Eu não cairia desta vez; não era Nicholas, era Netero, eu estava certa disso! Ignorei por um breve tempo, tentando dar mais três ou quatro passos à frente sem interrupções até que minha ansiedade tomou conta, por completo, da situação. Não resisti a negação; peguei o aparelho.

Eu estava certa, não era Nicholas e sim Netero. Ainda que eu estivesse imaginado tal resultado, a frustração fora inevitável. Ao menos com ela veio o fim da ansiedade, que já estava tomando conta dos meus atos a tempos. Li o texto e fechei a tampa do aparelho, coloquei-o no bolso e voltei a dar mais três ou quatro passos. Era o suficiente para refletir a resposta àquilo ou não. Voar novamente no Altaria de Netero? Em hipótese alguma; não com essa chuva. O velho podia até ser um bom motorista mas não queria morrer para um relâmpago. Se ele é doido o suficiente para ir, azar dele, não me submeteria a isso.

Meus pensamentos foram se tornando em ódio; ódio por ter que respondê-lo mais uma vez. Fora assim pelos próximos cinco passos até que dei por mim; o que é isso que você está sentindo Winnie? O que te deu esse direito? Absolutamente nada. Netero não havia feito nada para me irritar, ainda assim eu ali estava, revoltada. Respirei fundo e decidi retomar a alguma forma menos surtada que lembrasse de mim; meu rememorar não fora muito útil mas ao menos pude me acalmar e decidir finalizar aquilo logo.

Pode ser que Nico esteja na Rota 121. Vou passar por aqui mas agradeço mesmo assim.

Desta vez fui curta porém mais formal; reflexo de um possível respirar fundo. Ou não né?! Talvez eu só queria acabar com aquele papo logo e mostrar desagrado fosse uma péssima forma.

Karma. Tem nome melhor? Se momentos atrás eu brigara com Nicholas por um pisão em Loki, agora caia ao chão após deslizar em alguma coisa que estava... se mexendo? Pois é, seria cômico se não fosse trágico. Num desses pisões fortes e certeiros acertei algo que, provavelmente de propósito, deslizara para fora. Meu pé afundou ao meio da lama e corri com as mãos na frente do rosto, tentando reduzir o impacto. Ao menos um ato meu bem sucedido; parara com as palmas das mãos e os joelhos na lama, mas meu tórax e minha cabeça se mantinham livres da lama. Evitando me sujar mais, levantei. Com as mãos tive apoio o suficiente para retornar os pés à posição que deviam e logo me ergui. Olhei para minhas palmas e reparei no grudento e gosmento monte de terra que passava por mim.

É, isso não é lá muito legal. Tentei batê-las mas apenas espalhei a gosma para o alto, alcançando um pouco meu rosto num misto de falha e burrice; felizmente ninguém viu isso. Decidi então deixá-la quase que toda lá; a chuva faria seu trabalho de tirar o grosso mais cedo ou mais tarde. Aceitei o destino e decidi limpar uma das mãos no tecido da calça; era com essa mão que me aproximaria do estranho objeto e o avaliaria. Desta vez não usaria a PokeDex, não seria lá muito inteligente trazer o eletrônico para aquela situação lamacenta e molhada.

Feito isso fui ao seu encontro. Minha intuição lembrava da reação de Loki ao ser pisado, que me fizera tomar um pouco mais de cuidado; catei um graveto em algum canto do chão, ou ao menos um item que pudesse fazer intermédio, fui até a rocha vermelha-e-amarela e lhe cutuquei. Sua reação eu não sabia qual seria mas a minha? Bem, a minha era um pulo para trás; o pokemon podia não ter feito nada mas, só pelo medo de sua reação, recuei e espremi um curto grunhido.

Eu não estava bem; aquela não seria minha reação comum. Admiti meu medo e liberei neste estado Loki. Acho que meu recém-evoluído Ursaring gostaria de me fazer companhia nessas horas.

Meu recuo injustificável se justificou. O pokemon embravecido me atacou e, neste instante, achei justo que houvesse trago Loki a campo. O urso bradou, irritado, investindo grunhidos contra o pokemon. Eu sabia que aquilo não fazia sentido algum; aquele pokemon não só era incomum naquele local como estava exageradamente tranquilo com a chuvarada toda. Viera ele com a tempestade? Certamente sim. Esse seria o único motivo para ter um sono confortável neste momento.

Meu pensamento era simples; Shuckle poderia deslizar a minha procura. Além disso correr daquele bixo não era uma hipótese que passaria pela minha cabeça. Se pensar bem, correr não me deram lá uma boa consequência. Encari Loki com um sorriso meio bobo, tirei da bolsa a cápsula que outrora pensei em dar a Teddi mas não o fiz. Agora como Ursaring o pedi para toma-la e, ao senti a força subir, liberei Baltoy para faze-lo companhia.

- Fafnir, use Toxic em Ursaring e depois Ancient Power - Ordenei a princípio - Loki, duplo Facade.
Minha intenção era ser rápida e precisa. Não faria aquele Shuckle sofrer demais; um nocaute simples seria o suficiente. Além disso conheço bem esse tipo de Swarm, o governo sempre nos pede para retirar os desequilíbrios desse Bioma, até porque, eles causam ainda mais desequilíbrio. Provavelmente o faria; num futuro largaria Shuckle em alguma floresta ou instalação rural em Johto.

OFF: usando Ability Capsule no Ursaring