SHIMMER RUINS DUNGEON #1 - KB & SHIANNY

— Parece que... — a iminente tremida no chão fazia o corpo balançar um pouco; assustada, tudo que consegui fazer foi segurar no ombro de Natalie, tentando manter o equilíbrio — É... Estamos sendo requisitadas no templo. — um sorriso de nervoso despontou do rosto, aproveitei para secar o suor na testa com o ante-braço — Wooper... Um Pokémon sendo capaz de tanto poder? — voltei os olhos para o alto, observando a luz rosácea que transcendia além dos limites da construção do santuário — Será que é ele de novo? — balancei a cabeça negativamente algumas vezes com a lembrança do mausoléu mais uma vez me assombrando; quer dizer, se esse maldito ser etéreo quiser, dizem que é capaz de destruir tudo isso com um simples piscar de olhos... por que brincar com nosso psicológico assim? — Não vou surtar de novo. Precisamos pensar.

Com o fim da batalha, liberei Laksa de sua Pokéball, sinalizando para que Sushi uma vez mais prendesse a arqueóloga com seu poder psíquico, mas que se colocasse ao lado de suas irmãs enquanto o fazia. Busquei na bolsa mais dois Potion e uma Oran Berry, os medicamentos para a recém-evoluída e a frutinha para o veterano, recuperando o pouco que fora tirado de sua vitalidade. Aproveitando a deixa, liberei cada um dos meus pequenos, equipando os itens que acharia necessário que segurassem dali em diante.

— O negócio agora é sério. O que quer que exista ali está pronto para nos matar. — acariciei a cabeça de um por um, afagando-os também no pescoço, com exceção de Yasai, que o corpo todo é o pescoço — Preciso que deem seu máximo quando liberá-los da Pokéball, tá bom? Sushi, é pior do que aconteceu na praia. — a preguiça não parecia muito surpresa, mas consentiu; dizem que sua linha evolutiva possui muita percepção sobre as coisas, era capaz de Alakazam saber do que se tratava desde que colocamos os pés aqui — Vai dar tudo certo. No ruim, eu mesma dou umas porradas em quem estiver lá em cima.

A brincadeira não serviu de muita coisa para aliviar a tensão que eu mesma criei há poucos segundos. Manju, Laksa, Onigiri e Yasai, menos experientes, me observavam um pouco aflitos, intercalando seus olhares entre fitarem o templo e à mim. Retornei cinco dos Pokémon, deixando somente Alakazam do lado de fora; com as mãos livres após guardar as esferas, prendi os cabelos ainda mais fortes em um coque torto, balançando a cabeça até estalar e espreguiçando todo o corpo logo em seguida.

— Se morrermos lá em cima, que seja lutando. — quem diria que a garota que alguns minutos atrás queria ceifar a própria vida diria algo dessa maneira, não é? a bipolaridade me era cada vez mais terna — Woop- — os olhos voltaram-se para Laura uma vez mais, bufando logo em seguida — Natalie, o que vamos fazer com essa garota? — cerrei os olhos, abrindo um sorriso travesso logo em seguida para a ruiva; me conhecendo, sabia que não vinha coisa boa por aí — A gente podia... Usar ela de isca. — tornei a fitar a arqueóloga, levando o indicador direito ao queixo — Não é como se ela fosse saber... Quer dizer, considerando as possibilidades, ela já está meio que morta, né? — dei de ombros, já começando a caminhar na direção do templo — Fica à sua escolha. Você que quis trazer ela até aqui.

Era finalmente hora de descobrir o maior segredo que Shimmer Ruins guarda dentro de si...

Já não era sem tempo.

as ruínas.

— Hm... Peraí. — tornei a liberar meus pequenos, trocando uma vez mais os itens que cada um seguraria, aproveitando para pegar um que Natalie me emprestara, colocando-o para Mochi segurar; após as modificações, retornei todos exceto Sushi para suas respectivas esferas metálicas — Agora sim... Vamos.

Sinalizei para que Chase me acompanhasse. Subir os degraus era o menor dos problemas, mas só por sua construção, era possível saber que estávamos seguindo para um local principal das ruínas. Um portão nos impedia de passar, mas com leves empurrões, conseguimos seguir.

...

Existem certas coisas que nossos olhos demoram para acreditar que estão vendo. Digo isso porque foi assim quando assassinei aquele capanga do Maxima na cento e vinte um, foi assim quando quase me afoguei no acidente que matou minha família, foi assim quando olhei dentro dos olhos de Arceus e descobri que o ódio era recíproco... Situações tão, mas tão absurdas, que o cérebro demora a processar que, bom, aquilo é a realidade e não somente um pesadelo do qual você pode acordar.

Permaneci estática pelo que pareceu muitos segundos ao descer o escorrega de areia e adentrar todo aquele infinito dourado. Deslumbrada talvez fosse a palavra correta, mas, para ser bem sincera, não foi isso que chamou minha atenção por mais tempo: gigantesco, belíssimo e imponente, um voador jazia acima de um trono belíssimo, tão ameaçador que aos poucos tirou-me do transe que o próprio consciente estabeleceu na mente... Será que um dia eu teria um desses? Os lábios separavam-se e as cordas vocais até tentavam emitir algum som, mas não sei qual já que não tive chance de deixar as palavras saírem. Abobalhada, os dígitos apertaram-se contra a barra das vestes inferiores, talvez de nervoso, talvez por acreditarem que fazendo aquilo estivesse mantendo o corpo em equilíbrio para não cair em desmaio, talvez por algum motivo que jamais saiba. Naquele momento, sequer sabia corretamente como minha cabeça estava funcionando.

A surpresa — oras, Oirar't claramente guardou sua Caixa de Pandora para o ato final — veio poucos segundos depois: encantando a arqueóloga, o que parecia ser não somente voador como também psíquico, tornou Luana semelhante aos zumbis que encontramos fora dos portões de Shimmer. Aquilo, talvez, tenha sido o estopim para que o consciente despertasse de vez, tendo em vista que completamente hipnotizada, a amada de Oliver conseguira se desvencilhar do tremendo poder psíquico de Alakazam, partindo para cima de Natalie. Em súbito reflexo, tudo que consegui fazer foi esticar a mão esquerda, empurrando a ruiva para trás com o corpo e tendo o dorso da mão cortado profundamente pelos dentes da mulher que fincaram como presas de um felino sobre minha carne. Em um grito de dor, empurrei-a para trás, mas sem sucesso: tudo que minhas consecutivas falhas tentativas de me desvencilhar da mulher fez foi escavar ainda mais o ferimento, rasgando ainda mais profundamente o dorso e a palma da mão. Em certo ponto, lutando agora também contra os braços descontrolados de Luana que tentavam me derrubar, sentia os dentes da mulher acertarem as falanges, trazendo consigo uma dor física que jamais havia sentido antes na vida, tão aguda que por muito pouco não fez com que desmaiasse. O coque, mal feito, se desfazia dentre os bruscos movimentos, derrubando as madeixas loiras sobre o rosto, impedindo-me de ver propriamente o que acontecia; por uma das poucas aberturas dentre os fios de cabelo conseguia assistir Sushi, estático, amedrontado com o que estava acontecendo. O corpo, completamente pintado de rubro que jorrava da mão esquerda, fazia-me sentir em um trincheira de guerra, bem semelhante aquelas que sempre via em filmes de Galar que passavam na televisão quando pequena. Onomatopeias involuntárias saíam junto com os gritos de dor: até tentava dizer algo para a preguiça psíquica ou para Chase, mas não conseguia. Tentei e tentei muito, mas o cérebro não conseguia processar o que era necessário ser dito. Imaginei que, bom, pedi tanto pelo fim, que talvez aquela fosse a forma que o Maldito-Etéreo-Ser-Que-Me-Odeia havia decidido atender meus desejos...

... Aí, simplesmente, o pesadelo teve fim.

Caindo como um pedaço de carne imóvel, assisti os olhos de Luana perderem o pouco de vida que lhe restava, desfazendo-se em um corpo completamente oco por dentro, que agora jazia no chão, encerrando sua passagem por esse domínio espiritual. Com uma expressão assustada, permaneci inerte por segundos que pareceram horas, fitando todo aquele sangue que banhava parte do salão de ouro, mesclando-se junto à sílica que descansava no solo e formando uma gigantesca poça. As mãos, as duas, mas principalmente a esquerda assustadoramente ferida, tremiam rente ao corpo; quando dei por mim, caí de joelhos sobre o depósito carmim, trazendo-as próximas ao peito e forçando o maxilar para não gritar toda a dor que sentia dentro de mim. Com a adrenalina sendo expelida da corrente sanguínea como um corpo estranho, pude finalmente voltar o olhar para frente, observando dentre os caminhos de queratina dourados o gigantesco Pokémon de pedra que tomara lugar do psíquico voador. Engoli seco, cerrando os olhos em dor, começando a respirar rapidamente para não deixar a aflição tomar conta do meu psicológico: agora era a hora da verdade, precisava me manter sã. Evitei olhar para o dorso do membro que jorrava sangue, simplesmente enrolando-a dentre as vestes e jogando a bolsa no chão para que a mão direita pudesse buscar as esferas necessárias. Retornei Sushi sem dizer uma palavra, buscando a de Meowstic e a de Gallade para lança-los em campo.

— Laksa, Fake Out e Covet. Argh... Mochi, Skill Swap e Leaf Blade. — disse, com tanta imponência que parecia fazer força para as palavras deixarem os meus lábios; os monstrinhos, assustados, olhavam para trás em preocupação — Estou bem. Prestem atenção no oponente, se quisermos sair daqui com vida precisamos derrotá-lo. — cerrei os olhos, respirando uma vez mais para não deixar o corpo desligar pela dor — Wooper... Não deixa eu desmaiar. Custe o que custar, não deixa. Não deixa. — pela primeira vez pude parar e observar a treinadora, que me fitava de volta como uma expressão que sequer consegui prestar muita atenção — Uma pela outra, né? — o rosto franzia em dor e apertava ainda mais a mão contra o corpo, escondida dentro da roupa, agora completamente vermelha; um sorriso brincalhão surgiu no rosto, mas tão breve que fora quase imperceptível, sendo logo tomado pela expressão de dor uma vez mais — ... Mulher filha da puta.

Perdido em meio a dor e ao medo, o consciente sequer parava para pensar que, caso o estrago na mão esquerda fosse significativo, os dedos teriam muito trabalho para voltar a tocar violino. Quiçá jamais poderiam voltar a tocá-lo novamente, não como antes. Minha única saída, mesmo que temporária, do terror que era ser lúcida diante da vida que o destino me presenteou ainda aos oito anos de idade.

Não há castigo maior para uma artista do que tirar, em sua forma mais bruta e cruel, a habilidade de expressar sua arte.

Parabéns, Arceus.

Três a zero.

as ruínas.

— Será... Que vamos ser amassadas? Virar dois purêzinhos de carne? — respirei fundo, balançando a cabeça negativamente diversas vezes em seguida para tentar me manter acordada — Será que ele vai comer a gente depois? Aliás, por onde será que esse bicho come? — poderia dizer que eu já estava ficando delirante, mas acredito que a quantidade corrente de dor só tirou um dos filtros que usava para me comunicar que nem gente — Que merda...

Era difícil prestar atenção na batalha contra o gigantesco monstro de pedra sem sentir como se o corpo fosse desfalecer a qualquer momento. A mente, já perdida em meio à dor aguda, lutava para manter-se acordada, dando leves cambaleios quando sentia a cabeça pesada e o corpo prestes a apagar por completo. Tentei, às vezes, buscar coragem para espiar a lacerada mão dentre os panos da camisa, mas simplesmente tirá-la de perto do corpo já fazia a ferida arder absurdos, o que contribuía para piorar a terrível situação.

— Uffff... Uffff. — em certo ponto, por algum motivo, achei que ficar inspirando e expirando igual uma maratonista fosse ajudar minha situação de alguma maneira — Vamos bater... Se a gente ficar muito tempo aqui vou acabar perdendo a minha mão. — em ato súbito de lucidez, voltei a atenção para Natalie, estendendo levemente o "berço" feito para a mão esquerda por dentro da camisa, um tanto melada pela mistura da areia com o sangue — Precisamos de mais força. — o inimigo não parecia sentir qualquer indisposição, mesmo após uma das potentes Leaf Blade de Gallade que já foram capazes de cortar o estômago de um Mr. Mime. — Laksa, retorne! — busquei a esfera da recém-evoluída, sacando outra em seu lugar — Sushi, Psychic! — liberei a preguiça, que imediatamente caía ao lado de Mochi — Mochi, Swords Dance, siga com mais um Leaf Blade!

as ruínas.

— ... — me mantive em silêncio observando Natalie irritada com o clima e também com o poderio gigantesco do golem à nossa frente — Ha. HahaHAHAHA! — aos poucos, uma gargalhada foi se intensificando; algo que tinha certeza que incomodaria a ruiva, mas não era como se minha cabeça estivesse no lugar, né? — É sempre... Engraçado. — apertei mais a mão sobre a parte de baixo dos seios, soltando uma onomatopeia de dor no processo — Ver você xingando. — Chase parecia focada no embate, precisava me comunicar se quisesse permanecer acordada; soltando as costas, esperava ser segurada pela ruiva, caso contrário cairia no chão como a maldita Luana, Laura, nunca sei — Sei que é uma mulher adulta, mas... Xingar sempre foi a minha coisa. Eu sou a irmã malvada aqui, Wooper. — bufei, sentindo a palidez de minha pele ficar cada vez mais próxima à ausência completa de cor — Sushi, duplo Psychic. Gallade, duplo Leaf Blade.

as ruínas.