Sempre fui uma pessoa muito crente no místico e no etéreo, mas, honestamente, não tinha como não ser. O problema estava em encontrar algo para acreditar. Desde que perdi minha família, tudo que consegui fazer foi maldizer Arceus, até encontrá-lo próximo a Shimmer Ruins e perceber que todo aquele ódio acumulado por ele, no final das contas, havia feito com que ele também me odiasse. Estava perdida, espiritualmente falando, mas isso não me incomodava muito desde que fiz as pazes com meu consciente; havia, claro, aquela porção de âmago que queria acreditar no Pokémon que se tornou a estrela da minha sociedade, mas e se ele fosse que nem Arceus? E se Jirachi também fizesse parte do grupo que tirou tudo de mim? Não tinha como ter certeza de nada a não ser que o visse com meus próprios olhos.
Para meu azar, aquela luz que se aproximava e que me lembrou do lendário psíquico, simplesmente não parava de ficar cada vez mais perto. Engoli seco, com medo de que fosse algo que ceifaria minha vida ali mesmo. Pela velocidade que vinha, não adiantaria liberar algum Pokémon para tentar segurar aquilo e não adiantaria correr ou fugir. Suspirei, aceitando meu destino. Cerrei os olhos e os punhos, aguardando o impacto...
Mas ele nunca veio.
— Huh? — foi tudo que consegui dizer, abrindo os olhos um por um em câmera lenta
— ... — procurei pela luz que, de repente, havia desaparecido; confusa, olhei para um lado, olhei para o outro e, em fim, para cima
— ... — flutuando sobre minha cabeça estava o lendário Pokémon, me observando
— ... O-oi?Minhas espantadas janelas cerúleas brilhavam, meu coração batia em ritmo acelerado e até mesmo minhas pernas bambearam por alguns segundos, fazendo com que caísse no chão de joelhos. Os lábios abriam-se em admiração e tudo que conseguia fazer era encarar e sentir a energia que emanava daquele ser. Estiquei a mão direita, inocente, tentando descobrir se aquilo era de fato real ou fruto da minha imaginação. Se eu tivesse sorte, Jirachi tocaria de volta para me despertar do que acreditei veemente ser um delírio.
Demorou um tempo para que meu consciente tornasse a tomar controle do meu íntimo, o que talvez — e somente talvez — significava uma única coisa: estava ali uma oportunidade excepcional na vida. A perversidade tornou a correr dentre minhas veias, queimando meus braços com a adrenalina que fora injetada de repente no meu corpo; os lábios abertos e a expressão embasbacada deram lugar a um leve sorriso sádico e um semblante irritadiço. Mesmo atrapalhados, os pés deram impulso para o corpo caído, que saltou na esperança de reter e agarrar o lendário. Não que eu fosse conseguir, jamais, mas minha avareza já tomava decisões por si própria, controlando o impulsivo corpo obcecado por poder e dinheiro.
Quando despertei do segundo transe, este focando unicamente em tomar controle de uma divindade, joguei o corpo para trás, caindo de costas na relva. Um grito estridente emanou das cordas vocais, tão alto que tinha certeza que poderia ser escutado por todo Forina Valley; se meus conterrâneos Rockets não sabiam que eu estava por perto, agora descobririam. Cerrei os punhos, socando algumas vezes a grama com as laterais das mãos... Por incrível que pareça, minha fúria não era por saber que deixei a crueldade tomar conta de mim, e sim por não ter sido bem sucedida no que queria. Se antes havia dúvida se eu conseguiria me encaixar na organização, ali, naquele momento, percebi que não restava nenhuma sobre quem eu era: uma bela de uma filha da puta, sádica e egoísta que sempre fará de tudo por benefício próprio.
Ali, naquele momento, descobri que estava exatamente onde eu deveria estar: no berço da organização que me acolheu e que futuramente traria tudo aquilo que eu sempre quis.
Egg escreveu:
Spiritomb — 37/40