Uma rocket na minha fazenda milionária

Há quem diga que o campo é um lugar onde se vai para relaxar. Particularmente, era difícil para a ruiva ponderar a respeito - quer dizer, já havia passado por sabe-se lá quantos lugares diferentes, e em nenhum havia conquistado verdadeiramente uma sensação de paz interior. Mesmo assim, após tanto tempo enfiada até o pescoço em missões de certa organização criminosa, trabalhos voluntários e um ou outro desafio de ginásio, lá estava ela, dando mais uma oportunidade ao acaso e se dirigindo aos inúmeros (e invejáveis!) lotes de fazenda ao longo da UCE, os passos incertos se arrastando pelos caminhos de terra enquanto tentava localizar a foto da porteira enviada pelo parceiro de empanadas junto às indicações de como chegar até o terreno.

— ...mano do céu, — Reclamou ao eletrodoméstico que levitava ao seu lado. — se eu soubesse que esse lugar era enorme, juro que tinha vindo voando. — Balançou a cabeça, um suspiro inquieto enquanto os orbes acinzentados passeavam despretensiosamente pelas cercas, plantas, frutos e animais que por ali se espalhavam; Claro, demorou algum tempo antes que eles finalmente percebessem o enorme cerceado pintado cuidadosamente de branco, tão parecido com as madeixas daquele responsável por sua manutenção. — ...Sinceramente, eu tô surpresa que ele não escolheu alguma coisa colorida e com glitter. — Comentou com o fantasma, um riso relaxado escapando da garganta - e os pés se arrastando, devagar, na direção da porteira.

”Eu vou deixar destrancado pra você.”, disse Shion.
”É só entrar, sem problema nenhum.”, Shion disse.

Spoiler: Shion não o fez.

— Ah, cê tá de brincadeira comigo, né? — Ranzinzou assim que, ao empurrar o portão, percebeu que o cadeado bem trancado não o deixou ceder. — Eu vou te esganar, Taito. — Murmurou, balançando a cabeça e deixando um suspiro pesado escapar. Pensou em ligar para a criatura; Entretanto, porém, contudo e todavia, também tinha a consciência de que, dentro de uma fazenda, os diabos dos criadores não eram lá conhecidos por, uh, resposta rápida, sabe como é. Vai saber lá quanto tempo ia ficar em pé de trouxa ali, se dependesse disso?

— ...Quer saber, que se dane. — Decidiu, afastando-se alguns passos e espiando a altura da porteira. Era… Irritantemente alta - mas não demais, não exageradamente. Também era perfeita para escalar considerando os vãos entre as tábuas e, se tivesse que ser sincera, aquele ali não era um obstáculo muito impressionante se comparado com os inúmeros que já tivera de encarar ao longo de toda uma jornada.

...Claro que, durante nenhum deles, estava toda arrebentada como naquele exato momento.

— ...puta m- — Guinchou, abafado, assim que uma fisgada em um dos músculos resolveu surgir quando jogou o peso pra cima do portão. As pálpebras apertaram instantaneamente, a mandíbula trincou - a respiração veio e foi, pesada, mas o coração se acalmou um pouco quando Balthazar intercedeu, oferecendo apoio e suporte naquela breve escalada. Um sorriso grato, pequeno, foi o que ofereceu ao pokémon; E, agradecendo que não tinha nenhuma ronda de Rangers pelo lugar para precisar explicar o motivo de estar meio que invadindo uma propriedade, após alguns segundos se jogou pra dentro da propriedade, ajeitando os cabelos e batendo as roupas com suavidade, a palma se apoiando na superfície da lataria possuída pelo elétrico. — ...Valeu, Balt. — Enfim, vocalizou. — ...será que eu devia ter cobrido isso aqui com maquiagem ou algo assim? — Murmurou, roçando as pontas dos dedos livres pelas manchas roxas espalhadas no rosto e no pescoço. O moletom dava conta das espalhadas pelo corpo, claro, mas o maior problema ali eram as possíveis questões que poderiam ser erguidas pelo criador.

Quer dizer… Até então, não tinha realmente dado de cara com alguém conhecido para precisar explicar o motivo de estar toda roxa - então, pra falar a verdade, sequer tinha ponderado em alguma desculpa válida o suficiente que encobrisse um “então, eu invadi uma propriedade privada, quase fui presa e tive que fingir ser vítima de algum tipo de sequestro e pedir pro meu Nidoking me quebrar no pau pra não me foder”.

...hmm, tá, talvez devesse ter pensado nisso antes de chegar ali.

— Ah, quer saber, ele vai ter que me engolir assim mesmo. — Decidiu - até porque, sinceramente, estava sem saco de ficar tentando disfarçar TUDO O QUE FAZIA, O TEMPO TODO. — ...qualquer coisa, será que ameaçar bater nele funciona? Com a Karinna, normalmente dá jeito. — Franziu a ponte do nariz, um suspiro manso escapando de novo enquanto arrastava pés propriedade a dentro. — Qualquer coisa, se ele perturbar muito, você joga água nele, Balt. — Brincou com o elétrico, dando uma piscadela e fazendo um carinho gentil com o polegar, os orbes acinzentados se agraciando com a visão dos inúmeros açudes espalhados por todo o terreno.

É. Era impossível de não reconhecer a fazenda de Taito, pra falar a verdade.

— Será que tem campainha ou eu vou ter que espancar a porta? — Murmurou ao identificar a casinha da fazenda ao longe (bom, não tanto assim), balançando os ombros e permitindo que a caminhada se desviasse em sua direção, paciente e no aguardo de que ele não tivesse se mandado pra, sei lá, comprar pão ou algo do tipo. ESPERAVA que não, porque não queria ter que ficar largada na soleira da porta, sozinha, por sabe-se lá quanto tempo.

VIU, SHION???

Olha só, e não é que no fim das contas nem chegou a precisar descobrir se tinha campainha ou não?

Admito que não foi exatamente a imagem do rapaz de cabelos longos que realmente a atentou para sua presença - afinal, no fim das contas, o olhar constantemente se mantinha no chão para evitar pisar em qualquer coisa esquisita que estivesse pelo meio do caminho; Em realidade, apenas o grito (exasperado, se me permite identificar) do treinador foi o que arrancou as pupilas do chão de terra batida, a sobrancelha se erguendo com discrição ao se dar conta do aparente desespero da criatura. Quer dizer, sabe como é, tinha lá suas dúvidas de que aquela atitude seria uma reação às suas marcas, levando em consideração que não acreditava que o albino tinha algum poder de supervisão ou algo do tipo, mas...

"Como conseguiu entrar?"

...Ah, tava explicado.

Apesar do berro do criador, seu único cumprimento à distância se resumiu em um aceno de dedos descontraído, a mão livre se enfiando pacientemente no bolso do moletom. Levando em consideração que ele estava saindo da casa, tinha quase certeza que podia apostar que o bonito tinha lembrado que simplesmente a deixou TRANCADA do lado de fora e estava prontíssimo para ir atrás de consertar o erro, só que acabou se deparando com sua maravilhosa figura relaxada, tranquila e do lado de dentro do terreno.

...ou seja, ele tava achando que tinha dado uma de touro e acabado com tudo lá do outro lado, né?
... ...bem, até poderia ser uma possibilidade se estivesse em uma missão ou algo do tipo. Para sua sorte, Taito, essa mocinha que aqui vós fala tem um pouco mais de consideração pelas coisas dos amigos.

— Bom dia pra você também, fazendeiro. — Cumprimentou, um pouquinho cínica, balançando a cabeça com suavidade e ajeitando uma das madeixas pro detrás da orelha. — Ah, então... Eu tentei te ligar, você não atendeu, o portão tava trancado... Aí, arrebentei a fechadura porque fiquei com preguiça de esperar. Tem problema não, né? — Disse, passando reto pelo albino - e o olhar escapando para espiá-lo de esguelha, mantendo a maior seriedade possível e esperando a reação da criatura...

Mas, tá, não era tão má assim. Não esperou taaaaanto tempo, não:

— ...Tô zoando, Shi. — Confortou o albino, revirando os olhos e deixando uma risada suave, meio debochada, escapar da garganta. — Eu só pulei o portão. Afinal, ainda bem que você lembrou de deixar aberto, né? — Reclamou, estendendo a mão para dar um empurrãozinho leve na cabeça do treinador. — Sabia que é pecado enganar visita, ô? — ...tá. Normalmente, não teria tanta intimidade assim com alguém, mas... Sabe como é, né? Levando em consideração todas as trapalhadas que já tinham se metido em uma cozinha, já tinha passado um pouco da linha de só "conhecidos" com aquele albino maluco.

Pois sim.

— Olhaqui, cê não reclama não, que quem ficou zanzando por aí atrás dessa fazenda fui eu, viu? E só pra chegar com os portões fechados, tsc... — Cortou, assim que ouviu o tom levemente irritadinho do rapaz. — 'Cê tava cozinhando? — Quis saber, espiando o fazendeiro de canto e desviando o olhar na direção da casinha, os pés pacientemente se arrastando para acompanhar o trajeto guiado por Taito. — Mais ou menos... Sinceramente, esse lugar parece um labirinto! Acho que eu devia ter te dito pra acender algum holofote gigante ou pendurar uma bandeira enorme em cima da fazenda, porque eu já tava começando a achar que vim pra cidade errada. — Comentou, franzindo com discrição a ponte do nariz.

— 'Cê bem que podia ter me dito pra vir voando, né? Teria facilitado um bocado minha vida... — Suspirou. — Quer dizer, acho que eu tinha que ter esperado, mas não achei que fosse tão cheio de terreno por aqui... — Comentou, espiando por sobre os ombros em direção à porteira, balançando a cabeça com discrição. — Isso aqui não é um investimento muito pesado, não?

— Ok, então aí vai a pergunta importante... — Começou, assim que o treinador confirmou sobre estar com o bucho no fogão. — É algo normal ou eu vou ser a cobaia? — Brincou, dando uma piscadela e um riso discreto. Não é que não confiasse nos dotes da criatura; Mas, sabe como é, durante a criação da receita secreta secretíssima das empanadas, vamos dizer que tinha ouvido umas ideias bem, hmm, interessantes, por assim dizer.

— Ah, é, né? Muito bom que você se baseia por minha fama colossal, viu! — Gargalhou, batendo com discrição o ombro contra o braço do rapaz em um gesto amigável. — Eu quero saber é por que o senhor não fez isso hoje, isso sim! E eu pensando que minha presença era importante, absurdo desses... — Reclamou - claro que não era sério, mas enfim... — Meu deus, e ainda teve aumento depois de tudo que você comprou? — Perguntou, as sobrancelhas se erguendo com discrição; Não a julguem, mas não era como se acompanhasse o valor de imobiliárias rurais e algo do tipo...

— Ai, sinceramente, Shi... Eu não sei como 'cê tem saco de cuidar de uma fazenda assim. — Comentou, balançando a cabeça com discrição. — Acho que eu preferia morrer de vez que ficar lidando com um monte de cálculo de empreendimento e tudo o mais... Não te cansa, não? — Bem, digo, claro que cansava, mas... Como ele não cansava a ponto de só... sei lá, parar?

Era uma dúvida eterna.

— Café não, pelo amor! Se eu colocar qualquer outra coisa amarga na boca, eu vou me matar. — Ameaçou, torcendo a ponte do nariz. Tudo que precisava era um pouquinho de doçura na vida; E, qual é, até que merecia, né?