#Extra [Teatro] - A Guerra de Naipes

  A peça ia seguindo seu rumo, com erros mínimos e quase que imperceptíveis. Essa primeira parte era mais simples e tranquila, e logo Ren se viu, como Wallace, a curvar-se em resposta à sua rainha. Com a troca de cenários e a brevíssima pausa que tiveram, ele, juntamente de Ryousuke, em sua armadura, ouviram a atriz elogiá-los e desejá-los uma boa sorte.
 Realmente, para dois novatos cuja inscrição era recente, o papel que receberam era muito importante. Desenrolariam o final do espetáculo, onde haveriam lutas e um mundo completamente diferente. O diretor definitivamente era um daqueles loucos. Quando as cortinas se abriram novamente, lá foram Suitless e Wallace, viver seu épico, com o cenário mudando constantemente.
 Quando seus personagens terminaram a cena com a despedida dos demais viventes do palácio, logo estavam “à deriva”, navegando até o longínquo lugar por onde vinham os problemas. A próxima troca de cenário fez com que Ren nem ao menos precisasse atuar, ficara espantado espontaneamente com a cena aterrorizante e profunda. Os elaboradores haviam se superado, tudo estava muito parecido com a realidade, mesmo que esta, distante e mórbida.
 Se bem se lembrava dos papéis que brevemente havia lido, Ren imaginava que, pouco depois de pisarem aquela terra assolada pelo miséria e desgraça, iteragiriam com uma outra atriz, arquitetando a trama na mente do público, que certamente ficaria confuso. Viria, junto dela, a parte difícil, já que, junto de Ryousuke, teria que derrotar a tal garota em uma batalha pokémon. Olhava para seu companheiro de palco, ainda no personagem, esperando que o mesmo continuasse com o que fora planejado. Obviamente, improvisar seria inevitável, então lhes restava aguardar, mais uma vez.

   Conforme saíam do “navio” e pisavam naquela terra não tão firme, eles podiam avaliar melhor o estrago ali feito. Definitivamente, algo de errado acontecia ali, e assim Ren, out melhor, Wallace, expressou, por meio de gestos e palavras elegantes. Os atores interagiram brevemente, lembrando-se de algumas falas e improvisando outras. Eis que a parte estranha começou.
  Um robô se aproximava dos garotos, um grande e repleto do que pareciam ser armas. Era um dos chamados *mechas*, populares na cultura jovem. Esse, em questão, era de papelão, apenas representando a chegada do ser tecnológico, seguido daquilo que lembrava uma entidade demoníaca, que voava acima do tal mecha, como que em uma perseguição. Realmente, o diretor da peça não batia muito bem da cabeça, por querer misturar tais mundos em um *crossover* tão excêntrico.
 Voltando à apresentação, o boneco robótico parecia reconhecer Wallace e Suitless, ou ao menos, a embarcação pela qual chegaram. Dava a entender, pela estilização do mecha e por suas falas, que aquele era um soldado da Rainha Branca, há muito enviado, junto do Chapeleiro, que não parecia mais tão maluco, quando comparado com aquele que comandava o espetáculo.
  Tomado pelo roteiro, ou talvez por uma atracão natural, Ryousuke se aproximou daquilo que o peão branco havia deixado, após do que parecia ser sua encenada morte. Uma pedra, negra e brilhante, como se um pedaço do universo, tão vasto e complexo, estivesse concentrado ali, na rocha de escuríssima coloração, que parecia conter estrelas.
  Após discutirem rapidamente sobre o que poderia ser aquele item, assim como lamentarem a aparente morte do soldado, Suitless se aproximou de Wallace, que, curioso, foi tocar a pedra. Nisso, um clarão cegou a todos, e ouviu-se um forte estrondo, como se algo pesado caísse. Nervoso, Ren abriu os olhos, e expressou uma surpresa genuína. Dessa vez, o mecha não era de papelão, e sim, real, na medida do possível. Ele havia caído do céu, como o garoto se lembrara, agora que via o robô. A atriz voadora que antes ria, satisfeita com a desgraça alheia de sua antiga presa pareceu grunhir em desprazer, ao ver o mecha.
  A máquina havia sido “despertada” algum tipo de vínculo que se fizera quando a mão dos atores de tocara, segurando a rocha, que, agora que percebiam, havia sumido. Ren estava impressionado, parecia que realmente vivia aquela situação, no corpo do jovem aristocrata e seu companheiro “mercenário”. De acordo com a leitura que fizera, apressado, dos papéis, aquela seria a arma para derrotar tudo aquilo que trazia terror ao País das Maravilhas, embora o garoto não se lembrasse exatamente de todos os detalhes.
  Havia também uma variável: as batalhas pokémon seriam reais, como aquela que Wallace estava prestes a ter contra a garota demoníaca, que já estava pronta para a luta. Assim sendo, antes de sequer entrar na esplendorosa máquina, Ren sacou a Pokéball de Hokori, que estava todo majestoso em seu traje de guerreiro, e o jogou em campo, à espera das ações de Ryousuke para, enfim, dar continuidade ao espetáculo.

  Ren estava nervoso. Havia se esquecido de falar com a outra atriz! Mas logo encontrara uma solução, pensando rapidamente.

  — À você, não tenho nada a dizer, de qualquer maneira. — disse ele, empinando seu nobre nariz, após olhar a garota de baixo a cima. — Além disso, acho que já sei o por quê de toda essa raiva e irritação. Os chifres não devem ajudar muito, não é?! — continuou, com um sorriso debochado, trazendo certa comicidade à peça.

 Com isso, sendo o último a ordenar, e tendo ouvido àquilo que fora dito pelos outros, Ren também orientou seu pokémon.

 — Mr. Mime — resolveu chamá-lo dessa maneira para colaborar com a interpretação de seu personagem — Não te importes com esses fúteis e ignorantes pokémon. Sei que não gostas quando sou arrogante, mas são os inimigos da Rainha! Use dois Barrier, tentando realizar a esquiva dos tapas deste... Felino! És mais veloz, estou certo de que podes superá-lo! Senão, haverei de contentar-me com apenas um de seus movimentos. — Hokori era esperto e dava muita importância para a peça, ouvindo atentamente e idealizando a impecabilidade de seus movimentos. Também tentava atuar e dar mais vida ao seu próprio personagem, baseando-se em suas vestimentas, inclusive pretendendo utilizar o escudo que segurava para ajudar a barreira psíquica a se erguer, e quem sabe assim, fortalecê-la.