(006) — Holy Ground

Karinna não era exatamente mestre em esconder suas expressões, então, logo que arregalou os olhos, o jovem levou a mão direita até o rosto, enquanto segurava seu Pokémon com o braço esquerdo. Ele aparentava ter ficado envergonhado com Karinna arregalando os olhos, mas não podia culpá-la.

- Eu tenho que aprender a fechar minha boca. - Comentou o jovem, que começou a reparar melhor nas expressões de Bley e pode deduzir o interesse da jovem no que ele havia dito. Um suspiro foi dado pelo homem de cabelos alvos. - Olha, seja franca comigo e eu vou ser franco com você. Qual seu interesse em me ajudar? O que quer em troca? - Ele falava sério. - Não gosto de joguinhos, seja direta. Lido com gente do pior fetio o tempo todo, então, se quiser algo, fale, aventureira. - O jovem de alta estatura, por mais que parecesse, não esboçava tom de deboche. Seus olhos fundos eram fixos no rosto da loira e ele tinha uma expressão intimidadora no olhar, e, apesar disso, nenhum dos Pokémon de Karinna entrava em alarde. Ele não tinha quaisquer intenções ruins com ela.

Após o ultimato direto e grosseiro do jovem recém chegado, Bley fazia um sinal para ele aguardar. No final das contas, ela não podia simplesmente interromper seu treinamento, certo? Dessa forma, separou as duplas novamente. A pequena Wynaut ficaria junto de Gallade, a Eevee com o Probopass e sua Druddigon com o parceiro de longa-data, o Kadabra.

O treinamento agora consistia na colisão das duplas. O treinamento começou esquisito para Mochi e Yasai. Como ambos não tinham recebido muitas intruções direcionadas, eles começavam distantes e começavam a correr um em direção ao outro, até se chocarem e recuarem. Talvez não fosse uma ideia muito inteligente, mas, por sorte do destino, enquanto Mochi corria na direção da Pokémon recém-nascida, ele encontrou uma pedra em seu caminho e tropeçou bem no momento da colisão com Yasai, que agora tinha forças suficientes para competir com o tipo lutador, que havia perdido completamente a velocidade. Mas, por sorte, eles conseguiam colidir e receber o impacto tranquilamente. E dessa forma, o treino fluiu, contudo, agora Mochi passava a tropeçar na pedra de propósito.

Para Probopass e Manju, as coisas foram um pouco mais fáceis. O grande pedregulho do time começava a girar suas partes em torno de si, até que as lançava em direção a Manju. Sem muitos problemas, a pequena Eevee recebia os golpes com maestria e senti muito pouco dos impactos, já que, mesmo sem qualquer ordem, o Pokémon metálico tomava cuidado com as pontas para que elas não atingissem sua parceira de treino. E, dessa forma, o treino para a Druddigon e Sushi fluiu de forma muito semelhante, com o dragão correndo longas distâncias até colidir com tudo contra o Pokémon amarelado, e, este, aguentava a força do impacto, sem quase se importar.

Finalizadas as etapas, os Pokémon da loira aparentavam estar mais rápidos e mais resistentes. O treinamento havia sido um sucesso.

Dessa forma, a atenção era voltada novamente para o jovem de cabelos brancos, e suspirou.

- Certo, eu não fui muito cortez. Falarei apenas que meu nome é Elfman, e, para alimentar esse seu súbito interesse em mim, sou um necromante. - Falava de forma ranzinza e impaciente, mas ainda assim, mantinha uma naturalidade tamanha em sua fala que qualquer um poderia se surpreender, principalmente pelo peso da última frase.

Elfman percebia as intenções de Karinna com ele. O jovem sorriu, convencido, diante das palavras desafiadores que chegavam até si. O tom ignorante não mudava, tão pouco oscilava, mas ficava feliz em ver que a jovem loira, ao menos parecia, tão sincera quanto ele.

- Você gosta de se fazer de entendida, né? - Falava o jovem quando sorriu convencido, em seguida, seu semblante e tom de voz novamente se fechavam. As palavras ignorantes e insensíveis voltavam a jorrar de sua boca. - Eu tenho cara de quem foi criado numa seita maluca? Não, porra. Eu estudei necromancia por conta própria. Aprendi a ler sumério antigo e alguns outros idiomas lapidados naquele lugar medíocre alí. - Dizia ao apontar para o Monte Pyre. - Infelizmente, sou limitado. Tudo que posso fazer é prender as almas das pessoas em corpos de Pokémon, dando Pokémon fantasma como sacríficio. - Falava ainda mantendo a expressão fechada em seu rosto.

O jovem de cabelos alvos olhava Bley de cima a baixo. O que ele poderia oferecer para ela?

- Bem, o que tenho para te oferecer, é fazer o mesmo que fiz com meu irmãozinho aqui. - Dizia ao balançar o Pokémon em seus braços. - Ele já nasceu morto e levou minha mãe junto. É um filhote de Kangaskhan, minha mãe também esta presa a forma da Pokémon. - Falava ao sacar uma Luxury Ball do bolso. - No entanto, se ainda não for do seu agrado... - Ele baixou a cabeça e parou por um instante, como se ponderasse uma proposta mais ousada. - Já ouviu falar sobre os Dusknoir abrirem passagens para o outro lado? Tem uma lenda antiga que diz que no meio do Monte Pyre, existe um artefato enorme, que abre a passagem para o outro mundo e lhe permite conversar com os mortos, em troca da vida de três desses Pokémon.

Elfman não parecia brincar, sua expressão era cada vez mais séria e sua voz não tremulava. Os olhos olhavam fixamente as pupilas da loira, que mesmo sentada, não escapava do olhar penetrante do homem. Ele se aproximou um pouco, e, ainda com o seu "Otouto" em seus braços, ele se agachou e encarou os olhos de Bley novamente. Por algum motivo, ele nunca desviava os olhos e estava sempre os buscando enquanto conversava.

- E então? Quer passar a perna na morte? - Perguntava, em tom desafiador.

Elfman havia percebido que tinha conseguido a atenção de Karinna. Ela começava a desejar aquilo quase tanto quanto ele desejava ter sua avó de novo. No entanto, infelizmente, ela parecia sensata e muito cautelosa, o que acabou por tirar dele um suspiro. Diante da desconfiança de Bley, o jovem de cabelos alvos tirou do seu bolso um punhal, o segurou pela lâmina e direcionou o cabo para Karinna.

O punhal tinha um desing antigo, feito em madeira. Da ponta de seu cabo tinha um desenho de labaredas até chegarem numa caveira, que não tinha a parte de baixo da mandíbula e era justamente de onde a pequena lâmina afiada se projetava.

- Eu não estou mentindo. Seu Pokémon aí é praticamente um polígrafo, se eu estivesse, ele te avisaria. E, se você quiser mais certeza, pode pegar esse punhal. Se cansar dessa história, sinta-se livre pra me matar. - Falava ele em tom sério, tão sério, que o Pokémon em seu colo acordou no mesmo momento para arranhá-lo no rosto e gritar com ele. - O que foi? Ela quer uma prova não é? Já te disse que não me importo com o que acontece comigo, para com essa palhaçada. Só me importam vocês. - Ele ainda mantinha uma expressão séria em seu rosto e deixava seu Pokémon recém-desperto furioso.

Por mais que as palavras de Elfman fossem fortes, Sushi sequer expressava reação diante daquilo, na verdade, ele aparentava... Estar comovido?

Sem perceber, Bley acabou por interromper a comoção súbita de seu parceiro e o presenteou com um doce. Kadabra, que não era nada bobo, aceitou de bom grado e o comeu com a maior felicidade do mundo, deixando até mesmo suas bochechas rosadas diante do sabor adocicado, quando, subitamente, um misto de sensações o invadiu e pareceu o deixar em choque.

Nesse momento, o Pokémon amarelado começou a brilhar, uma coloração azul tomou conta de seu corpo, mudando seu formato. Seu rabo encolhia e ele ganhava outra colher, e aumentando, também, sua estatura. Quando o brilho sessou, revelou uma nova forma para Sushi. Ele havia evoluído. Kadabra agora era um poderoso Alakazam.

Karinna parecia desconfiada, mas estava disposta a ser mais agradável com seu "parceiro de viagem", chegando a contar um pouco de sua história e fazendo com que o jovem de cabelos alvos lacrimejasse um pouco. Ele era estúpido, grosseiro, mas era sensível com relação a esse tema.

- Não posso dizer que entendo... Mas compadeço da sua dor. - O garoto suspirou enquanto tomava rumo e sinalizava com a mão um "por aqui". - Meu irmão e mãe morreram no nascimento dele, pra minha sorte, ele era gêmeo. Minha irmã mais nova não sabe o que aconteceu e sofreu muito na mão do babaca do meu pai.

Enquanto Elfman falava, Otouto se revirava muito em seu colo. Ele aparentava estar incomodado com a chuva, então o jovem de cabelos alvos o retornou para uma Luxury Ball.

- Sabe, é esquisito. Geralmente filhotes de Kangaskhan ficam na mesma Pokéball que sua mãe, mas o Otouto não consegue. É quase como se fosse outro Pokémon. - Ele suspirou enquanto caminhavam rumo ao litoral da Rota 121. Tentava buscar o caminho mais curto, enquanto, distraídos pela conversa, não escutavam que a vegetação a sua volta se mechia.

- Eu posso te contar a história toda, mas ela é meio long- - Elfman não conseguiu terminar a frase. Fora subitamente interrompido por um uivo.

O que Karinna faria? Pediria para que o jovem terminasse a história e prosseguissem mais rápido ou iria atrás do responsável pelo uivo?

Enquanto a chuva fazia seu papel de molhar a dupla de treinadores, eles mal se importavam com a água e seguiam seu caminho firmes e imponentes. Não fosse o tema emotivo da conversa, a chuva seria desagradável, mas para algo tão melancólico, é possível que ambos achassem aquilo, no mínimo, condizente com a situação. O ritmo de caminhada tentava ser lento, já que Elfman liderava a frente enquanto Karinna tinha de se empenhar para alcança-lo e não ficar para trás, devido a sua baixa estatura.

Enquanto caminhavam, a conversa entre os dois se desenrolava, e, em certo momento, a jovem loira conseguia até mesmo arrancar um sorriso tímido do jovem alto. No entanto, a leveza era momentânea, e, ao perceber que a movimentação era incomum na vegetação, Sushi alertou o grupo e eles pararam de andar.

Seria uma intenção assassina? Bem, logo eles foram respondidos pois um Mightyena tentou dar o bote em Bley, do qual não pode ser salva pelo Psychic de Sushi mas pôde ser puxada pelo braço no último instante por Elfman, escapando de uma bela mordida no pescoço.

Agora o dono do uivo se revelava. Ele não estava feliz e tinha uma companhia: Uma Minccino com uma cara séria e raivosa bem nas costas da hiena.

Com dois problemas a sua frente, como Karinna agiria?