#003 — Uma turminha do barulho

Uma turminha do barulho.

— Então, se não fosse pela sua irmã, provavelmente todos nós estaríamos mortos? — Hailee arregalou os olhos — E ele matou alguém? — apontou para Ryousuke, agora conversando com seus Pokémon — Nossa. Parece que esse rostinho inocente engana um pouco, né? — deu uma risada e voltou seu olhar para Joe — Agradeça sua irmã futuramente por mim. Aliás, deixa que eu mesma irei agradecer.

Apesar da insuportável tempestade e dos incessantes trovões, algo sobre a costa do Monte Pyre trazia calmaria. O vento dava uma leve diminuída por alguns minutos e o deserto da praia abraçava a névoa que começava a ficar cada vez mais espessa em alto mar. Hailee sentava sobre uma das pedras distribuídas e fechava os olhos, aproveitando a brisa que desfazia seu penteado e levava seus longos e molhados cabelos cor-de-rosa para trás. Wailmer pensava em voltar até o barco, olhando algumas vezes para onde ouvira a explosão, mas rapidamente repreendia a si mesma, dando um mergulho por alguns segundos para refrescar a cabeça. Minccino observava o ruivo um tanto quanto aflita, talvez por medo do treinador e abaixava a cabeça, deixando que seu treinador aplicasse as poções, choramingando um pouco. A surpresa vinha na mordida que a roedora dava na mão do rapaz após fingir que estava com medo — mostrando aí sua natureza calculista.

— Medo do meu Staraptor? — abria os olhos e ria de Dominic — Parece que ele já mostrou seu poder, então. — passava a mão sobre a esfera do voador, ainda desmaiado — Acho que agora deveríamos aproveitar esse clima, acabamos de sair de uma enrascada e vocês só querem saber de batalhar. Tsc, tsc. — balançou a cabeça negativamente algumas vezes e parou abruptamente— Hm? — cerrou os olhos e focou em uma parte específica do lado esquerdo da praia — O que está acontecendo ali?

Hailee se levantava e apontava para uma parte da costa que não possuía areia e sim uma piscina natural formada pelas ondas do oceano. De longe, parecia uma briga entre selvagens que não ia nada bem. A jovem puxava Joe pela mão e Dominic pelo braço, sinalizando para Ryousuke também ir. Assim que o quarteto se aproximava, dava de cara com uma cena um tanto quanto atípica: dois Qwilfish brigavam com um enorme Blitzle, que estava imóvel por estar com suas patas presas embaixo da areia. O elétrico tentava se defender como podia, mas por algum motivo parecia escolher não utilizar seus típicos ataques elétricos que lhe dariam vantagem, havendo um motivo bem importante que fora revelado assim que abaixou sua cabeça para espantar os peixes: agarrado em seu pescoço estavam dois pequeninos Vulpix e Meditite, que choravam e choravam o mais alto que podiam — ao julgar por seus tamanhos, pareciam ser um pouco maiores que bebês. Ao ver nossos heróis, o equino pedia socorro e a raposa tentava pular, caindo diretamente na água, onde um dos venenosos já corria para atingi-lo.

— Alguém faz alguma coisa! — Hailee se desesperava e empurrava Ryousuke e Dominic na direção da poça — Não posso chegar perto de veneno! Joe, me ajude com esses dois peixes! — sacou a esfera de Mimikyu e lançou-a rapidamente no chão para revelar o fantasma — Mimikyu, use seu Shadow Sneak para parar o Qwilfish que vai atacar o Vulpix! — apontou na direção do peixe — Em seguida acerte seu Scratch no outro!

Uma turminha do barulho.

Depois de terríveis horas nas mãos de malfeitores, talvez fosse hora de Arceus dar um momento de paz para nossos três mosqueteiros, certo?

Errado.

Diante de uma confusão que escalou exponencialmente assim que os selvagens viram Dominic, Joe, Ryousuke e Hailee, nossos heróis rapidamente metiam a mão na massa para ajudar os que precisavam de ajuda. Com água até as coxas, o garoto-zumbi e o ruivo seguiam para ajudar Blitzle, Meditite e Vulpix, enquanto o rastafari e a garota de cabelos cor-de-rosa lidavam com os Qwilfishs. Sendo mais rápido em campo graças sua habilidade Swift Swim, um dos venenosos atingia Mimikyu com Poison Sting, que rapidamente retalhava com uma poderosa onda psíquica que o derrubava em um único golpe. O segundo peixe também focou seus ataques no fantasma, mas pareceu não dar muito dano apesar do disfarce da fada cair: dessa vez, combinando seus ataques, Shroomish e Mimikyu terminavam de derrubar o segundo selvagem irritadiço.

Do outro lado da piscina natural, as coisas pareciam ir bem somente para um dos treinadores: Meditite flutuou rapidamente até o colo de Ryousuke, abraçando-o com ternura — de fato, o psíquico não só parecia assustado como também muito jovem. Blitzle por outro lado, não parecia muito feliz com a ideia: talvez super-protetor, assim que o pequeno lutador saiu de seu pescoço, começou a balançar a cabeça rapidamente e jogar água nos treinadores, provavelmente com medo que fizessem algum mal para aqueles que protegia. Vulpix, salvo pela ideia da garota e acariciado por Dominic, nadava cachorrinho até chegar na borda, onde todo molhado, deitava no chão e colocava sua cabeça dentre as patinhas, como se não quisesse ver o que estava acontecendo.

— Não, já derrotamos eles. Obrigada por perguntar, Dominic. — Hailee levantava a mão sinalizando um "high five" para Joe — Muito bem, Mimikyu! — a jovem retornava seu pequeno — E agora, o que faremos com eles? — apontou para os peixes boiando na água de barriga pra cima — Será que a porrada foi tão grande que eles morreram? — arregalou os olhos — Depois do que já passamos hoje não duvido de mais nada. — deu uma risada sem graça — Alguém quer? Por mim deixo Lugia levar de volta.

Blitzle continuava um tanto preocupado, mas com as patas ainda presas na areia, o elétrico começava a ficar extremamente agoniado. Desistindo de molhar e afastar Dominic, o equino acabava abaixando a cabeça, começando a emitir alguns cry bem baixinhos, olhando para o garoto-zumbi como quem talvez pedisse piedade e não o machucasse. Apesar daquele tamanho todo, o selvagem parecia bem triste e havia um motivo bem aparente para isso: conforme Don ajudava-o a desatolar, era possível ver uma espécie de coleira presa em sua pata direita traseira. Caso o treinador resolvesse olhar, veria que parecia estar já um tanto quanto enferrujada, possuindo os seguintes dizeres: "Propriedade de Hatsu Ginji". Assim que tocava no item, o choro do Pokémon se tornava ainda mais agudo e, mesmo com a forte chuva, era possível ver diversas lágrimas escorrendo por seus olhos azulados. Blitzle tentava disfarçar mergulhando a cabeça algumas vezes na água, mas eventualmente desistia e deixava o choro, um dos mais inocentes e puros já vistos por olhos humanos, acontecer naturalmente.

— Tadinho.... — Hailee se aproximava para dar uma olhada na coleira, se assustando um pouco com um raio que caía bem próximo de onde estavam — Esse tipo de identificação era bem famosa uns três anos atrás, lembro que eu e minha irmã éramos doidas para ter e colocar no Sorvete, mas custava muito caro. — olhou para Joe, sabendo que reconheceria o nome do canídeo e tornava a olhar para Blitzle— Você está esse tempo todo largado aqui, mocinho? — a garota abaixava e começava a ajudar Dominic a tirar as patas de Blitzle da areia — Que maldade... — olhou para o garoto-zumbi e depois de relance para Joe e Ryousuke com uma expressão séria — Se alguém resolver ficar com ele, caso encontre esse treinador por aí, faça-me o favor de dar uma surra nesse arrombado. — ambos conseguiam finalmente livrar o Pokémon, que quase sem forças somente caminhava até ao lado de Vulpix e deitava na areia — Sabe-se lá o que poderia ter acontecido caso não estivéssemos aqui para ajudar.

Uma turminha do barulho.

Depois de poucos minutos da mais pura dor emotiva, com direito a Blitzle ser consolado por Vulpix, Meditite e até mesmo Bunnelby, a zebra se colocava de pé. Pareciam que as palavras de Dominic demoraram um tempo para convencê-la, mas finalmente haviam conseguido: a elétrica, bem maior que o tamanho normal de sua espécie, parava de chorar e se posicionava na frente do garoto-zumbi abaixando sua cabeça e fechando os olhos já vermelhos de tanto chorar. Dando a entender que queria seguir viagem com nosso herói, a raposa flamejante também não ficava para trás e se enroscava na perna de Don, como quem dissesse que também queria ir junto com sua protetora. Já o pequenino lutador voltava para o colo de Ryousuke e deitava no ombro do rapaz, buscando sozinho uma Pokéball vazia da mochila do rapaz com seus poderes psíquicos e lançando-a sobre si mesmo; apesar de jovem, Medidite parecia ter bastante personalidade e cara de quem vai dar trabalho.

Do lado direto, ambas esferas metálicas lançadas por Joe e Dominic nos peixes terminavam de balançar e ficavam flutuando sobre a piscina natural. Outra captura!

— Hm... gente. Olha pra trás. — Hailee já estava de costas — Aquela é sua irmã, Joe?

No horizonte da praia, Mariana vinha caminhando ao lado de seu Gengar com partes de sua roupa queimada e um olhar não muito feliz estampado em seu rosto: além disso, parecia estar machucada no braço esquerdo já que era possível ver, mesmo de longe, sua pele alva coberta de vermelho. Passaram-se alguns segundos e a Ranger se aproximou:

— Oi, Jou. Rapazes. E você é a Hailee, né? Parece estar bem melhor. — a rastafari tapava o arranhão no braço com a mão direita e agachava na piscina natural, lavando o machucado com a água cheia de sal — Três deles fugiram, dá para saber pela minha cara que não estou muito feliz, né? — direcionou a pergunta para seu irmão, que conhecia o comprometimento que a jovem tinha com sua função — Mas tudo bem. Meus aliados já foram descansar em Lilycove e acho que farei o mesmo. — estendeu a mão para Joe — Como Wailmer se comportou? Às vezes ela é muito apegada a mim, mas estou no caminho de ensiná-la a seguir ordens.

Ouvindo o que a garota tinha a dizer, Hailee retornou seu Mimikyu e se aproximou um pouco sem graça.

— Er... Mariana, né? Obrigada pela ajuda, você salvou minha vida. — abaixou a cabeça e juntou as mãos como em prece — Você vai voltar para Lilycove? Será que pode me dar uma carona? Afinal, acho que devo passar em um hospital.

Parecia que o agradecimento da garota de cabelos cor-de-rosa mudou o humor da Ranger, talvez por ter se lembrado o porquê de fazer o que faz: salvar vidas, tanto de pessoas quanto de Pokémon. Levantou-se, ajeitando seus dreadlocks e prendendo-os em um enorme coque.

— Não precisa me agradecer. Só te peço um favor. — fitou seu irmão e abriu um sorriso, sabendo que o garoto ficaria sem graça com o que diria a seguir — Só vá devagar com Joe, ele tem essa idade toda e acho que nunca nem beijou na boca. É todo abobalhado. — deu uma gargalhada e cutucou Dominic com o cotovelo, talvez para o garoto-zumbi entrar na onda de gastar os dois pombinhos — Um mulherão desses, ele não vai saber nem por onde começar. — disse entre gargalhadas, que durou alguns bons segundos — Ai ai... Mas sem problemas, Hailee. Bom que conheço bem minha cunhadinha durante o percurso.

Bom, não é necessário dizer que a jovem de Littleroot Town ficou tão vermelha quanto um tomate, escondendo o rosto dentre seus longos cabelos lisos e sem coragem de sequer olhar para Joe ou qualquer outra pessoa. Mariana terminava de rir e aproveitava para acariciar seu Gengar, que por sua vez também gargalhava da situação.

— Então, vamos nessa. — pegou a esfera de Yokosuka e lançou Wailmer no mar — Bom vê-lo de novo, irmãozinho. E conhecer vocês também. — deu um longo abraço em Joe e um tchauzinho para os outros dois mosqueteiros — Dominic, né? — montou na aquática e sinalizou para a outra garota subir também — Quando quiser ser um Ranger, só me procurar.

Agora fora de toda a vergonha que Mariana a fez passar, Hailee começava a se despedir: deu um abraço em Ryousuke e um leve tapinha no braço de Dominic.

— Então, foi legal quase morrer uma duzentas vezes com vocês essa tarde. Na próxima vez que nos esbarrarmos, que tal em um piquenique ou algo que não coloque nossas vidas em risco? — deu uma risada sem graça, voltando sua atenção para o Joe, abraçando-o e deitando a cabeça em seu ombro direito — Obrigada por salvar minha vida e não me deixar pra trás mesmo te xingando e gritando que você o fizesse. Conhecendo sua irmã agora vejo o porquê de você ser uma pessoa de bom coração. Deve estar no sangue. — soltou do abraço e não deu sequer um passo para trás; ao contrário, começou a fitar os olhos acastanhados do rapaz e tirar alguns dreadlocks de seu rosto — Você é um anjo na minha vida e da minha irmã, mesmo né, acontecendo o que aconteceu quando nos conhecemos, — deu uma risada, ajeitando seus cabelos molhados com a mão e jogando-os para trás — Antes que sua irmã ou Dominic comecem a fazer piadas, acho melhor ir logo. — foi aproximando seu rosto do rosto do rapaz, o qual ele escolheria se o beijo seria na bochecha ou na boca (aqui só trabalhamos com consentimento!!!) — Nos esbarramos por aí! — abriu um sorriso de orelha a orelha e correu até Wailmer, montando na baleia e sentando ao lado de Ana — Ah, dê tchau pro Haunter por mim pra ele não ficar chateado comigo!

E assim, a aquática começava a nadar. Com ajuda da névoa, poucos segundos depois ambas figuras femininas desapareciam em meio a imensidão do mar.

Novamente sozinhos, o que nossos três mosqueteiros fariam a seguir?