Big TV _White Lies

Trotes velozes, maestrados pelo líder-morcego e - é claro - o tatear das minhas mãos. Mais alguns metros e Gliscor parecia esquecer minha limitação; voava mais alto, mais rápido e, o pior, mais à frente. Eu?! Bem, eu só o segui. O barulho de água-correndo preenchia meu ouvido esquerdo e desaguava pelo direito, mas nada disso parece "perto demais", se é que me entende.

Em certo momento, desacelerei. Até queria acompanhar Jormungand, mas me era tão possível quanto ganhar asas e voar. Minha respiração ofegava! Parte por semi-sedentarismo, outra parte por exercitar-me dentro de um traje de mergulho e uma máscara pouco agradável. Arfei, diminuindo o passo para um caminhar bem - mas bem - lento. Gliscor já nem mais iluminava minhas vistas escuras. Já sem saber se era teto-preto ou breu, desisti. Joguei-me contra a parede, desci lentamente as costas e sentei no chão.

Estiquei as pernas; debrucei-me sobre as coxas e tentei me alongar. Rememorei o momento em que caí no chão lameado do esgoto e, por consequência, tive uma feliz memória; o saudosismo do chão. Ele era menos-quente, menos-fedido, menos-morto... eu ouvia melhor ali, sentia-me menos cansada, respirava melhor e até... bem, até conseguia respirar fundo de quando em quando! Fora ali que me recuperei e... bem, ali que perdi Gliscor.

É uma linha reta, né?! Não tem muito para onde ir... ele não tem como ter "desaparecido"...

... mas é melhor eu persegui-lo logo, antes que escureça de fato e fique tudo muito pior.

E fui! (re)Alonguei os membros e prossegui. Levantei, tentei gritar a plenos pulmões e falhei, mas ao menos um mísero anúncio eu fiz:
- Jô, cadê você?!
Minha surpresa?! O eco sumiu. Na verdade, o barulho de faísca também parecia parar de ecoar, e se tornar de fato um barulho "presente". Decidi seguir em frente, sem pensar no pior. Tateei a parede até... bem, até ela não existir mais.

Não sei ao certo o que veio primeiro: a enxurradas e sons d'água vindo à esquerda, ou o fim da parede de segurança. Certamente fora os dois que me alertaram: já não estava mais num tubo reto. Oh Winnie, mas também! Que ideia estúpida; achar que uma REDE de esgoto será majoritariamente retilínea. Pois bem, perdi Gliscor e estou - literalmente - numa encruzilhada.

Arranhei a garganta, tirei a máscara por um breve instante e griter:
- GLISCOR, VEM ME AJUDAR! - E não é que resolveu?!
Era óbvio que ele também me procurava; voltando o trajeto todo para me encontrar. A felicidade que tive quando ouvi um múrmuro típico do morcego, que logo aparecia do outro lado do cruzamento, tendo voado por aquilo tudo sem nem se dar conta de minhas limitações:
- Venha aqui, me carrega, vamos continuar seguindo, mas pare de ir muito na frente, ok?! - Retomei a máscara para o lugar que deveria estar, estendi os braços e esperei.

O pokémon?! Bem, apenas obedecera, vindo em minha direção, me arrebatando com o rabo, enrolando-me e trazendo rente ao corpo. Prendera minha cintura em suas pernas e voara até a outra "margem". Dali eu continuaria, agora com passadas mais conscientes... prometo a você.

Eu já vi esse filme. Eu não só já vi esse filme como sei exatamente como ele vai acabar. Pousei em terra-quase-firme, tateei a parede e a acompanhei até mais a frente, onde as faíscas ganharam forma.

Veja bem, não é que não vi os Magnemites, mas Gliscor fora muito mais rápido que eu! Logo mais o grandalhão ia a frente e, dessa vez, não se mostrava bem apessoado pelo cenário. Contra pokémons-poison ele podia até ser benevolente, contra elétricos?! Não mesmo. Avançou o sinal vermelho e enfrentou o territorialismo dos dois inocentes Magnemites, como quem dizia "vocês não tão dignos desse território".

Pois é, a receita da merda! Estufou o peito, mostrou um dos caninos brilhosos e apontou para um dos metálicos com sua cauda de pinça. Já antevendo a batalha, peguei o Lucky Egg e assobiei, chamando sua atenção. O morcego logo arranhara a garganta e pestanejara em minha direção, mostrando certo desagrado com o chamado, porém o respeitando.

Quando próximo, peguei de si o Toxic Orb e dei-lhe o Lucky Egg:
- Se for se meter em encrenca, ao menos se certifique de que será produtivo - Aconselhei. Era um conselho idiota; eu sei. Provável que os selvagens que esbravejaram contra Gliscor estão certamente "irritados" e iriam o atacar enquanto eu fazia isso - Bem, não se preocupe comigo, vá e use Earthquakes.

- Oh, é óbvio que você flutuaria - Falei ao Magneton ao centro, levando uma das mãos à cabeça - Bem Gliscor, vamos ter que usar duplo Brick Break, pode ser?!

Bem, minha orientação era apenas "um pouco" útil. Eu já não tinha lá tantos golpes para usar! Poison Jab não funcionaria, Rock Slide?! Pouco efetivo. Resta-me golpes defensivos e, é claro, o inutilizado Earthquake. Bem, ele saberia lidar melhor com aquela batalha sem minha orientação; provável que se fosse um selvagem, teria antecipado (ou percebido) o Magnet Rise, e teria agido de forma mais... coerente?! Não sei né... ele está confuso.

Bem, eu não me preocupava; contornava a curva do "cruzamento" e ganhava uma visão melhor do palco. Resta um. Como no jogo dos sapinhos; a diferença é que eu ainda não ganhei:
- Ei Jô... - num exato momento, a sonoridade me fizera ri. Quase completei a frase com um clichê "where you going with that gun of yours?", imitando o tal do Jimi Hendrix, mas contive-me. Não era hora para brincar, né?! Muito menos levar pouco a sério a situação... eu acho - Acho que a gente ta perto...

Porque eu disse isso?! Apenas para me conter. Se eu ficasse calada ou não me esforçasse para falar algo nulo, eu certamente cairia numa risada patética. Cheguei a um ponto que minha sorte (ou azar) passa a ser cômico. Os pokémons "hostis" andam em bandos, o esgoto em si é bastante quente, o odor já não me incomoda mais, ainda assim a caminhada era extensa e Gliscor... ah, Gliscor parecia se deleitar tanto com a situação, que vê-lo confuso em uma batalha simples me causava risadas involuntárias.

Ah, meu querido. Logo você?! O morcego encrenqueiro? Que resolve tudo no braço?! Vai ficar ai parado por causa de um Supersonic?! Sei não em, você não é muito de aceitar essas humilhações, certamente vai cobrar com o dobro de força...

Puta merda... isso doeu. Eu quebraria a quarta parede para me perguntar que diabos de confusão é essa, que dura mais turnos que o máximo, mas como eu não sei de nada, não quebrarei para perguntar isso. No mais, aceitarei os riscos; era perigoso deixar Gliscor ali, ainda assim ele me botara numa situação inevitável. Se ele caísse... faz parte, né?! Ai menos lutou bravamente. Eu me preocupo em reanimá-lo depois. Dei de ombros e ordenei:
- Você não vai sair dessa luta nem desmaiado, né?! - A retórica era horrível; não é como se tivéssemos como sair. Há como ir para trás sem Gliscor? E para frente? Eu estava quase que encurralada; em um lado Magneton, em outro o esgoto frígido e mau cheiroso - Vamos tentar a sorte. Brick Break e Earthquake!

Eu juro que aqui até cogitaria algum tipo de "role-play", algo como; entre na água lamacenta para tirar vantagem do Poison Heal, ou ainda "joguei esgoto nele".... mas há de se admitir que poucas dessas ideias são úteis. O máximo que podia fazer? Contar com meu apoio moral; contornei o "campo", tentei passar de fininho por Magneton e, na pior das hipóteses, retornaria Gliscor nocauteado e sairia correndo à frente.

Na pior das hipóteses mesmo! Não queria fazê-lo, mas também não queria continuar ali. Também não queria dar para trás! São tantos "não-quereres" que até acabo me perdendo no meu objetivo. No fim, não sei ao certo para onde quero ir, mas tenho certeza que dar para trás não é uma opção. Tudo aquilo era culpa minha, por (1) não prever o Magnet Rise e, (2) demorar dar as ordens para dar um mísero Lucky Egg, deixando Gliscor para trás na sequência de golpes.

Oxe, não me xinga não, ta?! BRAVINHO. O cu é meu eu dou quando eu quiser... claro, sem pandemia e quando meu exame tiver dado negativo. Enfim, enfim, me desculpa então, moço. É que pra mim é de um à quatro turnos, num sabia que tinha informação diferenciada não, ta?! Num precisa me odiar tanto, eu sou apenas uma simples camponesa que está no fundo do esgoto atrás de uma solução para um problema de escala municipal.

Isso mesmo, mu-ni-ci-pal! Não podemos esquecer do quão urgente e necessária se diz a solução. Vamos parar de brigar e correr?! Tem uns cidadãos precisando muito da nossa ajuda e é bom que eu vá logo. Vem, Jormungand! Não demoraremos mais! Vou te deixar fora da esfera, mesmo cansado. Sei que não parece uma boa ideia, mas você ainda é meus olhos.
- Jô, eu ainda preciso da sua ajuda - Bem, finalmente verbalizei. Era melhor eu passar ao meu pokémon minhas ideias birutinhas - Sei que ta cansado, mas esse pico de energia parece ta durando mais que o de mais cedo... me ajuda a encontrar o meliante?! Vamo, vamo, fica perto de mim. Qualquer coisa eu te curo.

E curo mesmo; eu já estava com um item de cura preparado em algum canto daquela roupa esquisita. Inclusive, falando em roupa, eu já estava toda suada por dentro daquela bu****, sinceramente ta tudo um c*. Até correr era nojento... viver era nojento. Eu já sentia que estava transpirando aquela umidade nojenta...

ARGH, vamos correr, existe um limite para se aguentar esse lugar e eu... eu... eu estou chegando nele! Mas vamos correr em passos lentos, ok?! A gente já viu que corrida-rápida não da muito certo. Tem que ser corrida-lenta.