Ato 04 — Enlaçados.

Um itinerário até de fato tomarem o rumo até Johto, no National Park: volta à Rustboro, Mauville onde puderam ensinar algumas técnicas novas aos monstrinhos para que, enfim, pudessem ir ao destino outrora planejado. Mesmo que por tão pouco tempo, os acontecimentos na rota cento e quinze marcaram a dupla cada qual ao seu modo: a garota ainda se sentia um pouco melancólica com a despedida da criança que lhe fora terna, enquanto o companheiro ressurgia mais determinado, como a fênix mitológica; em seu peito, um colar, agora um farol para tentar iluminá-lo quando as águas sombrias da vingança lhe afligirem.

Contudo, aquilo seria o suficiente para pará-lo? Era uma indagação retórica, que nem ao menos se chegaria a uma ínfima iluminação à resposta da questão. Uma eterna dicotomia entre o bem e o mal, ying e yang, luz e trevas: esse era Nicholas. Ao seu lado, bem como em seu peito, dois grandes faróis tentavam extinguir por completo aquilo aprisionado em seu intrínseco. Como colocado inúmeras vezes, o louro era vítima dos próprios sentimentos que tanto suprimiu.

Se em algum momento anterior de sua vida se entregou aos sentimentos, sentira-se traído pelos mesmos, que o fizeram ser ainda mais cauteloso quando se trata de assuntos emocionais. Rompeu com estas, e buscando força na razão, seguiu para Hoenn; apenas para se entregar às emoções novamente, como uma mosca se gruda a uma teia de aranha em seus voos rasantes tão lépidos. Ao menos durante aquela viagem, pôde olvidar de tudo aquilo que o lancinou outrora.

— Você acha que vai ficar tudo bem? — indagou Emma, branda, apertando ainda mais ao braço do companheiro que se enlaçava; achegou-se ainda mais do braço de Nicholas para que o mesmo o envolvesse com o membro destro em um abraço, repousando suas mãos sobre a cintura da enamorada. — Quer dizer... Ela ter ido embora, eu mesma nem sei se foi real.

— Já passou. Para de ficar remoendo — soprou o garoto, com os olhares fixos na paisagem na janela do transporte. Aproveitou a pausa ínfima para aproximar Emma de seu corpo ainda mais. — Fique feliz porque aconteceu, e porque cumprimos a promessa. É o suficiente.

— Mas, sabe de uma coisa? Se tivermos uma filha, podemos chamá-la de Sofya, que tal?

— Filha?! Como é que é?! Se tem uma coisa que eu não quero ser é pai. Quem sabe daqui há muito tempo.

— Para de ser chato, Nico! Em todos os livros é assim: quando o mocinho e a mocinha encontram alguém muito querido e essa pessoa se vai, eles sempre homenageiam seus filhos com o nome dessa pessoa que se foi. E com a gente não vai ser diferente.

— É claro que vai. A gente tá no mundo real, e não em uma fantasia. Se algum livro representasse o mundo real como ele é, com certeza o autor seria o Stephen King.

Em baixo tom, Emma ensaiou uma breve gargalhada. Subiu os olhos na direção do semblante do companheiro, que mantinha os orbes ziguezagueando pela paisagem em sua janela.

— Como sempre... Você é tão pessimista.

— Não se é pessimista quando é a verdade. E isso que eu tô me poupando daqueles sensacionalismos ridículos daqueles jornais de tarde.

— Não tem nada a ver com o assunto, mas você não é daqui, não é?

— Não. Sou de Pallet.

— E como você ficou depois de tudo aquilo acontecer? Deve ter sido horrível a sensação, né? Se você conseguiu aguentar tudo isso e ainda se manter desse jeito, você é um cara muito forte.

— Sendo sincero: foi uma merda. Eu tinha uma reserva de dinheiro, e ao invés de vir pra cá, mandei o meu pai e minha mãe pra uma embarcação que nem ao menos sei pra onde foi. Era pra eu ter morrido em Pallet, mas dei sorte de pegar um barco pra Littleroot, e o que aconteceu depois você já deve saber.

— Já percebeu que você tem essa fixação de sempre se entregar pra outra pessoa continuar bem? Você sempre tentar negar, mas é igualzinho aqueles heróis medievais, sabe?

— Mas é claro que não. Por que eu me basearia em personagens fictícios. Prefiro pensar que eu sou só... humano.

— Olha... Esses heróis medievais são sempre pessoas de coração puro e do mais nobre sentimento. São justos, pessoas iluminadas e é impossível não amar. Se você não se parecesse com um, eu já tinha te dado uma bota faz tempo, bobinho. E também se sinta feliz: você é o meu primeiro namorado.

— Primeiro...?

— Por que que é tão difícil de acreditar? Tá insinuando alguma coisa, mocinho?!

— É claro que não. Olha só pra você: é linda, inteligente, um amor de pessoa. E como assim um nerdão do interior de Kanto é o seu primeiro namorado? A pergunta é: quem que não desconfiaria?

— Ai, Nico, você e esse seu pessimismo... Mas, bom, eu te conto. Todos os meninos em Lumiose eram um saco, sabe? Todos iguais: mesquinhos, convencidos e sempre tinham um papo estranho; só porque viviam por lá e tinham uma boa condição de vida se achavam os donos da porra toda. Só que na verdade, eram uns bostas, né. Aliás, eles sempre eram piada na minha roda de amigas.

— E...?

— O nerdão é diferente. É lindo, cheiroso, tem um coração nobre, imponente, inteligente. Você sabia que sempre que você faz aquela cara séria enquanto tá lutando eu acho muito sexy?

Nicholas engoliu em seco. Volveu ainda mais o seu pescoço na direção da janela para esconder a fronte ruborizada. Quiçá, o louro não era tão acostumado a receber elogios ou cantadas daquela maneira. Do outro lado, uma risada silenciosa se manifestava no cenho da treinadora, sempre atenta às reações de Nico.

— Qual o problema, tigrão? Tá com vergonhinha, tá?

— Para de ficar falando essas besteiras. Eu, hein!

— Bom, eu tô com um pouquinho de sono, então você vai ser meu travesseiro, entendeu? Nada de movimentos bruscos. Quando já estivermos em Johto, é pra me acordar, tá? Te amo.

Emma ergueu sua mão direita até o queixo do louro, volvendo sua fronte para a sua direção. Morosa, avançou na direção de Nicholas, selando os lábios com terno beijo antes de se enlaçar novamente aos braços do companheiro. Depois de um longo suspiro acompanhado de um faceiro riso, cerrou as pálpebras. Sua respiração padronizara, e agora em silêncio, a figura angelical dormia depois de poucos minutos junto ao corpo de seu herói medieval.

— Herói medieval, tigrão... — recostou Nicholas a cabeça sobre a poltrona, encarando o teto, murmurando para si próprio. — Quanta besteira...

A viagem seguiu, e agora, sozinho com os seus pensamentos, o louro pudera cerrar suas pálpebras sem que adormecesse. Tomado por lembranças: das mais ternas às horripilantes. Sempre que voltava para próximo de sua terra natal, era tomado por incessante nostalgia. Fora em Pallet que viveu seus tempos áureos antes que toda a água ruísse não só com aquele garoto sonhador do interior de Kanto, como suas construções físicas e todos os laços que construíra com os residentes. Planejara, com certeza, em algum momento retornar àquele ambiente que enchia seu âmago de esperanças e sentimentos aprazíveis; a brisa marítima da rota cento e quinze fê-lo ter um vislumbre de como fora sua infância.

Retornaria, mas em outra oportunidade. Ainda tinha muitas missões a cumprir: rever seus pais, encontrar um certo alguém e proteger ao farol que repousava ao seu lado. Foi desse modo até chegarem a Johto, no National Park.

Não houve tantas surpresas quando o casal desceu. Emma esfregou os seus olhos para vislumbrar a grande roda gigante que tinha ao fundo, ficando boquiaberta com aquilo. Súbita, suas mãos se encontraram em aplauso agudo; fechara os membros superiores, voluteando em seu próprio eixo com a paisagem ao redor. Nostálgica, abriu um jubiloso sorriso. Um parque, muitas pessoas de lá para cá, e as inúmeras atrações fizeram-na recordar de Lumiose, a cidade das luzes de Kalos. Ao seu lado, Nicholas descia dos degraus do transporte, sisudo, com os orbes anis ziguezagueando por toda a paisagem. O emaranhado de vozes irreconhecíveis e bramidos a plenos pulmões das pessoas desconhecidas acalentava o âmago de ambos, afinal, quem não estaria abalado depois de um evento sobrenatural como aquele da rota cento e quinze, não é mesmo? E o melhor remédio para essa patologia era um momento de distração.

— Ei, e se nós fazermos de conta de que é o nosso primeiro date? — empolgada, Emma volvia, repentina, na direção de Nicholas; o louro até mesmo se assustou de início. — Eu tenho uma roupa aqui de reserva que é a coisa mais linda e maquiagem, então, eu quero ficar maravilinda pra gente poder dar uma volta no parque. Vou trocar essas roupas e você também troca a sua, eu sei que você tem uma outra reserva.

— Dois pontos: — Nicholas ergueu seu dedo indicador e médio de sua mão direita, como se tivesse numerando o que ponderaria a seguir. — você já é linda por natureza e a roupa que eu tenho reserva aqui não é nada demais. Uma jeans, uma camiseta branca sem estampa e um sapato preto.

— É melhor usar isso do que sua roupa escolar que você usa em jornada. E eu também vou me arrumar, então é justo, vai!

Empolgada, a loura dera dois pulinhos acompanhado de algumas palmas empolgada. Nicholas suspirou fundo, volvendo os olhos na direção da companheira em riso conformado.

— Tudo bem então.

— Ai, eu te amo, Nico! Você é o máximo! Você vai ver sair a miss universo do banheiro feminino, eu prometo!

Célere, a loura açodou na direção do banheiro feminino que não era muito longe dali. Ainda parado, Nicholas dava risada da situação até volver-se na direção do toillet masculino. A maneira como a garota era espontânea conseguira fazer crescer um pé de cerejeiras em um terreno tão pedregoso e ácido era simplesmente impressionante. Ao contrário de Emma, o treinador avançava em passos morosos até o próximo destino. Sem muitas delongas, adentrou até uma cabine, arqueando suas singelas roupas da mochila.

Nico não é um cara muito vaidoso, e fazia apenas o básico. Trocava suas casuais roupas de aventura por sua camiseta branca sem estampas, uma jeans azul clara e alguns rasgos justa e um tênis preto casual. Não olvidou de passar um desodorante aerossol em suas axilas e um doce perfume em seu pescoço. Saindo da cabine, encarou por ínfimos segundos sua imagem no espelho do higiênico banheiro do parque. Passou a mão sobre suas madeixas áureas, jogando-as para trás; seu cabelo liso volvia a escorrer sobre sua testa. Comparado com o estado anterior, estava melhor.

No sanitário feminino, a garota fazia um ritual completamente diferente. Primeiro, apenas trocava as suas roupas: colocou uma cropped branca, uma calça pantalona de coloração alaranjada e uma sandália de plataforma da mesma cor das vestes da parte inferior do corpo. Gentil, retirou sua característica faixa vermelha, rumando ao espelho. No espelho, para deixá-la ainda mais venusta, maquiava o seu rosto com a ajuda de Jigglypuff — a fada não apenas auxiliava-a, como também dava alguns pitacos. Ao fim, passava um batom carmim forte em seus finos lábios, para valorizá-los ainda mais. Por fim, reposicionou seu adorno carmesim em sua cabeça. Arqueou o seu smartphone, acionando a câmera. Em frente ao espelho, fazia inúmeras poses com sua rechonchuda, sempre alternando cada uma delas: ora mais curvada, ora mais reta. A loura esforçava-se para conseguir uma boa foto — apesar de todas mostrarem o quanto sua beleza era ofuscante, raras vezes dizia que os registros eram bons. Quando, enfim, julgou uma como a ideal, postou em seu pokégram, recolhendo seu monstrinho depois de tanto agradecê-la.

Do lado de fora, um pouco impaciente, aguardava Nicholas. Quando vislumbrou a loura, até ensaiou algumas palavras repreensivas por conta da demora. Todavia, no momento em que a imagem de Emma se tornava nítida, ficou boquiaberto conforme a treinadora se aproximava.

— Caralho... — exprimiu, hipnotizado com a beleza da áurea. — Você tá perfeita.

— Eu disse, não disse? — convencida, retrucou, achegando-se do enamorado e roubando mais um sucinto beijo; seu batom não se borrou, importante salientar. — Você também tá bem melhor. Agora, tá até parecendo um homem.

— Obrigado pela parte que me toca.

Deu uma gargalhada abafada, tomando as mãos de Nicholas, entrelaçando as duas mãos e iniciando a caminhada para o interior do parque.

— Bobão. Agora, a gente pode ter um primeiro encontro decente, né? E não pense que eu me esqueci daquela história do fliperama, senhor moço. Eu vou cobrar beijo que você me deve, ouviu?

— E eu pago com todo prazer. Vam’bora.

Devidamente trajado e de humor renovados, a dupla se dirigiu à entrada do National Park para aproveitar o aprazível sol que banhava as atrações com o seu esplendor. De uma experiência de quase morte a um encontro no parque pouco tempo depois. A vida e suas inconstâncias; apaixonante e tão enigmática.

— Ah, é tão bonito, não é? — os orbes cerúleos da garota cintilavam, tal o astro que residia a anos luz da terra e mesmo assim, banhava a todos com seu esplendor. — Eu li alguns comunicados pelo pokénav, e parece que tem muita coisa legal — de repente, parou, olhando para o flyer principal com as atrações, bem como suas localizações. Apertou ainda mais os dedos entrelaçados com de seu companheiro, açodando até onde estava fixado. — Vamos ver de mais perto.

Arrastando Nicholas, açodou. Junto ao comunicado, rapidamente se localizaram e tomaram consciência de cada uma das atrações que o festival oferecia. Percorriam seus olhos anis, ambos, por cada letra e figura que jazia naquele cartaz comunicativo rapidamente; a garota esticava seu dedo indicador e passava por cada sílaba próxima ao papel, enquanto o enamorado apenas olhava um pouco mais ao longe. Súbita, em um salto, voltou para próximo de Nico.

— Tem tanta coisa pra fazer, né? Eu tô até perdida.

— A gente podia dar uma olhada nessa tal tenda de captura. Sei lá, me parece bem interessante.

Emma ergueu sua sobrancelha de imediato ao ouvir as palavras do louro, lançando um olhar de juíza sobre o mesmo. Gentilmente, descolou as mãos de ambos apenas para cruzar os braços; curvou levemente o pescoço para a direita, mantendo aquele mesmo semblante de ínfimos segundos atrás.

— Senhor Nicholas Halstenberg, da cidade de Pallet no interior de Kanto — sisuda, fitou-o; o louro, por sua vez, lançava um olhar desconfiado para a enamorada. —, nós dois combinamos que isso aqui seria como um encontro, não é?

— É. Mas por que todo esse drama...? — inquiriu o treinador, com um emaranhado de inocência e desconfiança.

— Então primeiro vamos fazer tudo o que um casal faz! A gente vai comer alguma coisa, aí eu tiro aquela foto de casal com legenda “date com o meu favorito”, depois a gente vai brincar com os brinquedos e aí sim a gente pensa em ir nessas atrações de treinadores. Entendeu bem?

— Só que qual a diferença entre ir agora e depois? É a mesma distância entre um e outro e a gente ainda chegou de manhã, tem o dia inteiro.

— Então você vai ignorar o meu pedido?

Emma começou a fitar o chão, quebrando sua voz gradualmente. Ensaiou até mesmo uma lágrima escorrer depois de angelical rosto; no fim das contas, era só drama.

— Que draminha mais mequetrefe, hein. Eu esperava mais.

— Eu sempre achei que finalmente tivesse encontrado um príncipe encantado, e ele acha que eu sou dramática. Eu nem sou, tá? Só queria comer alguma coisa e brincar com meu namorado e ele só quer saber de capturar pokémon, ficar mais forte. Ele não gosta de mim.

— Pelo amor de Arceus. Isso é sério?

— Então me leva pra comer alguma coisa e depois pra roda gigante? Por favor, amorzinho, nunca te pedi nada.

— Tá, tá bom, vamos indo então.

— Pra quem achou que meu drama era ruim, você fez exatamente o que eu queria.

— Só fiz porque eu fiquei com muita dó. Dó não da sua carinha de Lillipup triste, mas porque tava bem ruinzinho mesmo.

— Como é?!

— Nada, Emma. Não foi nada. Quer comer alguma coisa em específico?

— Vamos até lá primeiro, e aí a gente vê.

Nicholas buscou a cálida mão da loura, entrelaçando-as sem pestanejar. Tentou um avanço súbito para roubar um sucinto beijo de Emma, que jogou o seu corpo para trás, emburrada, quiçá pela reação do louro ao ver seu protótipo de drama. Pararam e se encararam um ínfimo lapso de tempo, apenas para se perderem em cândidas gargalhadas, encontrando os lábios um do outro mais uma vez, seguindo, juntos, para as atrações mais casuais.

Aquele evento único no National Park reunia pessoas de todas as regiões possíveis. Com a reconstrução de Tohjo, as lamúrias pelo despertar da lendária baleia podiam ser deixadas de lado por um ínfimo tempo, o suficiente para que se perdessem nas atrações próximas à metrópole de Goldenrod. Por mais que o treinador gostaria de ver as atrações voltadas ao seu ramo, um obstáculo angelical o barrava, suplicando por um pouco mais de doçura, digamos.

E não tem o que fazer, não é mesmo? Novamente com as mãos entrelaçadas e devaneando sobre como as forças do universo cooperaram para unir aqueles dois destinos, duas almas tão diferentes, e ao mesmo tempo eram perfeitos. Ela era a luz, ele as trevas; ela era o grito, ele o silêncio; ela sempre tão quente, e ele frio, gélido; uma união de opostos ímpar, tal as cargas de convencionadas por sinais opostos ou mesmo o mitológico yin-yang. Emma arrancava gargalhadas de seu enamorado, como poucas vezes o fizera desde que, sorumbático, viu sua terra ser assolada pela incessante tempestade evocada por Kyogre.

Dizem que Arceus tece o destino de cada um com infinita sabedoria. O Alpha conseguiu dar alguma razão aqueles dois, mesmo que momentânea, e não só pelo que viviam nesse presente em Johto, mas em toda a sua viagem: Emma, a renegada de uma família rica e rejeitada por seus pais por não ser considerada talentosa; Nicholas, tido por seus próximos como um gênio, um herói silencioso que prezava pela vida de seus queridos, colocando a sua própria em cheque. Prudência, coincidência ou seja lá o que for, aqueles dois se completavam.

Não delongou para que chegassem ao maior brinquedo de todo o parque. Pegaram a fila, não tardando para que tomassem uma cabine para si. O funcionário do parque a fechava logo depois. Dois pequenos bancos, cada um em uma extremidade do cubículo; o casal ignorou-os, ficando de pé. Emma rapidamente tomou as mãos do louro para si, colocando-as em volta de seu abdômen enquanto recostava-se sobre o tronco do mesmo. Em suspiro jubiloso de olhos cerrados, pousou sua nuca sobre o peito de Nicholas, com os orbes cerúleos de ambos voltados ao céu que adornava todo o ambiente.

A roda, então, deu início ao seu tradicional trajeto. Conforme subiam junto da cabine, um pequeno frio na barriga de ambos os deixou mais leve com mais algumas gargalhadas cândidas, apenas se unindo ainda mais no mesmo abraço do início. A loura ergueu seu braço direito até a nuca do treinador, abaixando-a gentilmente até o seu pescoço. Em frenesi, cerrou os olhos, com os lábios trêmulos e todo o seu corpo reagindo com a aproximação de seu enamorado; afagava as madeixas douradas de Nicholas, divagando.

— É estranho, né? — pensou alto a loura. — Tudo o que aconteceu foi tão... intenso e repentino. Eu nunca pensei que minha vida fosse virar de cabeça pra baixo como aconteceu. Em uma hora como essas, era pra eu estar ou em casa lendo ou tentando dar um jeito de escapar dos meus pais pra ir pro shopping com minhas amigas; se desse errado, eles provavelmente me levariam até uma festa das outras famílias em Lumiose — riu. — E pra terminar, eles iam me empurrar pra algum daqueles ricaços insuportáveis e eu seria infeliz. Mas tudo aconteceu de um jeito esquisito, e eu encontrei você.

— Era melhor ter achado algum ricaço? — provocou o louro, encostando seus lábios mais uma vez sobre o pescoço de Emma.

— Arceus me livre, seu bobão. Eu duvido que qualquer um daqueles bundões faria o que você fez. E foi nesse desencontro que a gente se achou, tão de repente e... mágico, talvez.

— Você começou a gostar de mim por que eu não fiz mais do que a minha obrigação. É isso?

— Na verdade, não. Não se você se lembra de quando a gente tava na cabana, lá na rota cento e um. Eu me apaixonei quando eu vi que você era... humano. É. Essa é a palavra. Por mais que você estivesse se culpando por tudo, eu vi um coração tão nobre, tanto que até o Mightyena gostou de você. Então eu peguei na sua mão, e me arrepiei toda. Foram aquelas borboletas no estômago que me deram a certeza de que tinha que ser você. Tem outros detalhes também: eu te achei um gatinho, mas te chamei pra gente explorar a rota só porque precisava de companhia, então não se ache tanto.

— Por mais que você não tenha perguntado, acredito que vi que comecei a gostar de você quando eu deixei de ser eu. Naquele tempo que você tinha sido levada até eu te encontrar, era como se eu fosse outra pessoa.

— Como se eu fosse seu oráculo, é isso?

— Er... digamos que sim.

— Você sempre diz que existem coisas que são só contos de fadas, mas olha só pra gente. Eu duvido você encontrar qualquer tipo de argumento racional que refute tudo isso.

Nicholas encostou sua testa sobre a cabeça da loura. Cerrou os olhos por ínfimos segundos, buscando palavras em seu cérebro; em vão, e o silêncio reinou naquele cubículo por todo aquele tempo curto que mais parecia uma eternidade.

— Viu só? Não tem. Aconteceu porque tinha que acontecer, e vai continuar sendo assim até o fim. Eu não quero me separar de você, Nicholas, nunca. Você é o meu herói medieval, é o meu porto seguro no meio de todo esse turbilhão, a minha fortaleza. E independente do que acontecer, eu vou estar sempre do seu lado. Sempre, sempre, sempre.

As vistas do casal então repousaram sobre a magnânima metrópole de Johto. Nenhum dos dois ainda havia visitado a cidade global símbolo do continente, restringiram-se apenas às fotos e reportagens acerca de Goldenrod. Agora, toda aquela paisagem gravada virtualmente em suas mentes era materializada no mais belo plano de fundo para aquela química intrínseca entre os treinadores.

Claro, romântica, tendo como mestre todos os seus livros lido ao longo de sua juventude e adolescência, Emma não poderia deixar passar em branco. Em filmes como aquele, sempre havia o momento único em que os protagonistas selavam todo aquele sentimento guardado ao longo da trama em uma paisagem paradisíaca; neste caso, próximo ao firmamento, tendo, ao fundo, o emaranhado de prédios e a cidade tremeluzindo como um adorno para o momento. A loura voluteou na direção do treinador. Seus olhos azuis fitavam seus olhos e, logo em seguida, os lábios rosáceos que despertavam seus desejos mais profundos. Envolveu seu pescoço com seus alvos braços, enquanto Nicholas enlaçava-a pela cintura.

E, morosos, os dois lábios abriam-se em terno beijo e longo, saciando a carne e a alma com cada toque cálido e aprazível. Como o final de uma comédia romântica, faltando apenas alguma trilha sonora romântica ao fundo.

Seguiram daquele modo até o fim daquela atração. Sem delongar muito, descerem de sua cabine, novamente entrelaçando os dígitos, entreolhando-se, como dois bobocas. Agora, por um tempo mínimo, novamente, os lábios encontravam-se em selinho cálido, e os orbes volviam a olhar para frente até a barraca com alguns sorvetes. Fizeram seus pedidos, e a loura insistiu para que seu par parasse um pouco para posar para uma selfie com a mesma — sempre conectada às redes sociais, especialmente seu pokégram. Nicholas encostou seu queixo sobre o ombro de Emma, envolvendo-a com seus braços por sua cintura, e os dois sorriram para a câmera frontal do dispositivo.

Click.

Feito o registro, volviam a andar a esmo pelo parque, até que chegaram a uma das principais atrações: as tendas de captura. Alguns rumores apontavam que pseudos podiam ser capturados ali, quiçá lendários — Nico não dera ouvidos a isso. Estavam numeradas de um a seis, cada qual das caixas residiam tipos específico de monstrinhos, restando aos participantes explorá-las. E justamente por isso, a fila era imensa.

Emma não gostava de nada disso.

— O sorvete e a roda gigante não tinham essa fila gigante — resmungou a garota, cruzando os braços, fitando Nicholas emburrada.

— Fica calma. A paciência é uma virtude — respondeu prontamente o louro, trazendo a treinadora para os seus braços, beijando-a na bochecha.

Passou alguns segundos até que Nicholas tirasse algum sorriso de Emma, e mais descontraídos, o tempo passou, chegando a vez do casal de escolher alguma das tendas. Duas organizadoras da atração explicaram aos dois como funcionava a atração, e não havia nada de tão difícil. O louro olhou de relance para cada uma das seis tendas, e não tardou em escolher qual seria a sua tenda.

— Entendi — balançou a cabeça positivamente. — Vou ir para a tenda de número três.

Escolhida a tenda, o louro adentrou, junto da companheira e das duas guias para a terceira tenda, combinando tipagens que, segundo Nicholas, poderia melhorar sua coleção. O recinto era caracterizado de acordo com os monstrinhos residentes. Não tardou para que uma elefanta, ao centro da tenda, acenasse para o treinador ao longe, com as luzes refletindo sobre seu corpo metálica; Nicholas devolvia as saudações.

Sendo assim, se aproximaria da pequena elefanta da Galar. Cufant, do tipo aço puro, é um monstrinho dotado de capacidades ofensivas veementes e com algumas deficiências defensivas — quiçá paradoxal quando vemos o geral da tipagem. Bonançoso, um sorriso tingiu o canto dos finos lábios róseos do treinador. Frente a frente com a criatura, afagou-a, manso.

— Vem cá — introduziu-se. —, tem algumas coisinhas que eu quero testar. Você se importaria se nos enfrentássemos? Posso te curar depois se for o caso.

Feito o pedido, deu alguns passos para trás. Lépido, a mão destra do louro desceu ao bolso de sua calça, arqueando uma esfera bicolor diminuta. Pressionou seu botão ao centro, aumentando as suas dimensões. Fez um movimento brusco de alavanca, como se fosse partir o apetrecho ao meio; isso acionou o mecanismo da pokébola, evocando um brilho alvo a frente de Nicholas. O lampejo se dissipou, revelando a lesma marinha recém capturada na rota cento e quinze, ainda em Hoenn.

Nicholas cruzou os braços.

— Shellos, Cufant. Cufant, Shellos — exprimiu, olhando de relance para as duas criaturas. — Se você não se importa, vou fazer os movimentos iniciais: Yawn e Water Pulse.

Ainda de braços cruzados, com o corpo teso, os orbes cerúleos ziguezagueavam pelos monstrinhos, sempre atentos com o desenrolar da batalha. Nela, jaziam dois propósitos ao treinador: ver a força de Shellos e de Cufant; ora, se ele iria enfrentar Roxanne daqui há não muito tempo, deveria ver o que cada um de sua equipe é capaz de fazer, e então, traçar estratégias a partir dos pontos observados.

Os braços eram cruzados e os orbes cerúleos, sempre inquietos, percorriam cada centímetro que as duas criaturas se movimentavam enquanto trocavam golpes. Sisudo, levou a mão destra até o seu queixo enquanto analisava os ataques de Cufant e Shellos; era como disse, não estava apenas a observar o metálico, como também a lesma marinha. Ainda não havia comandado o aquático de fato, tendo apenas vislumbres de seu potencial durante o embate contra a Morte na rota cento e quinze, e Nicholas tinha o monstrinho como o seu trunfo para futuros desafios de ginásios.

Apesar de serem análises não tão magníficas — quiçá, treinadores ainda novatos poderiam fazê-lo —, o louro valorizava aqueles lampejos de sua mente. Não pôde deixar de notar o potencial ofensivo do metálico que, com apenas dois ataques, fizera danos o suficiente que poderiam preocupar no futuro; a lesma não tinha seus maiores atributos ali também, contudo, era dotada de grande vitalidade, tal Cufant. O monstrinho de aço sofria alguns machucados pouco mais severos com um único ataque de Shellos, possivelmente por terem uma diferença de nivelamento acentuada.

Ao fim, pôde traçar algumas estratégias futuras em que se utilizaria de Shellos seja em sua forma base, seja evoluída. Mesmo não sendo um monstrinho que teve algum contato durante sua juventude, Nicholas pareceu satisfeito com alguns dos movimentos de Cufant — e, não obstante, a elefanta ainda ser mais lépida que o seu aquático, importante salientar.

Abaixou os dois braços, colocando suas duas mãos no bolso; deixou um sorriso satisfeito perfilar os finos lábios rosáceos com o fim do primeiro turno favorável ao mesmo devido ao estado de dormência do metálico. Restava seguir o combate.

— Continue com Water Pulse em sequência — exprimiu, manso, ainda atento a cada movimento dos monstrinhos.

Como o embate se desenrolaria a partir dos comandos pertencia apenas ao futuro. Mesmo com uma vantagem não apenas de níveis, como também da condição de Cufant, seria interessante observar aquela luta.