Malfeito feito

O Chefe seguia defendendo sua perspectiva, e confesso que olhando daquele ângulo ele não me parecia errado. E isso só me fazia lembrar como é complicado lidar com seres humanos. Acho que por isso preferimos jornadas solitárias cercadas de bichos e alguns encontros com a humanidade de vez em quando.

Em todo caso, logo estávamos com um endereço em mãos para buscar, e uma nova versão dos fatos para colher. Algumas ideias até se desenhavam na minha cabeça, como o tal Carnivine realmente existir e, na verdade, pertencer à alguém. Pode ser uma pessoa misteriosa, ou alguém do próprio povo influenciando as coisas por trás dos panos, enfim.

Quando nos permitiram sair daquela sala, agradeci os monges com um aceno e um sorriso, concordando com as falas de Ayzen, que eu segui quando pudemos voltar a caminhar pelos corredores. Em dado ponto eu seguraria em seu braço para lhe chamar a atenção - de preferência longe de olhares e ouvidos de outros monges. Tinha uma nova suspeita que me inquietava e eu precisava dizer:

– Zen, antes de irmos até o endereço, não é melhor tentarmos falar com quem tá lá fora, na entrada? – dei de ombros nos segundos em que formulava a ideia em outras palavras – Tem possibilidade de o responsável até estar ali com os manifestantes, mas mesmo que não esteja, talvez falar com eles nos dê uma luz de como esse "telefone sem fio" tá acontecendo... E, com sorte, podemos até começar a amenizar os ânimos. O que você acha?

Admito que nem sei se minha ideia é das melhores, mas fico curiosa pra saber como essa história de Carnivine Shiny tá sendo recebida por quem a apoia. Além disso, seria no mínimo agradável para todos se conseguíssemos já dispersar um pouco dessa revolta. Quanto antes, melhor...

Shellder: 40/40 | Fletchling: 07/40~~~~~~~~ Kiki & Ayzen - Malfeito feito - Violet

Ayzen seguiu caminho quieto, compenetrado em seu PokéNav. Se o conheço um pouco, suspeito que esteja procurando as referências do endereço, no mínimo, ou buscando o que pudesse de informação sobre o gramíneo de Sinnoh. Eu não iria atrapalhá-lo nisso, sabendo que ele tinha uma mente que trabalhava com a racionalidade e a lógica muito melhor do que a minha, mais intuitiva e emocional. Reconheço que é de informações mais verídicas e concretas que precisamos, nesse momento.

Minha deixa veio depois, quando descemos e encontramos os manifestantes já em maior número. "Ué. O que aconteceu?", ambos estranhamos a situação, eu com uma leve desconfiança sobre o que quer que tenha feito os outros recuarem. Quando fomos notados pelos manifestantes precisei deixar os devaneios de lado para me focar no que era minha alçada, e aparentemente Ayzen também reconhecia.

– Oi pessoal. – dei alguns passos na direção deles, vestindo minha melhor persona simpática e solidária – Pois é, nós viemos tentar entender o que está acontecendo e o por quê desse conflito. Sabem, eu cresci aqui e acho que nunca tinha visto acontecer antes. – tentei me colocar como uma semelhante, acreditando que isso amenizaria um pouco a seriedade das coisas; é sempre bom ter jogo de cintura e lábia – Pra sermos honestos, gostaríamos de ouvir vocês também, é claro, principalmente pra saber como isso começou. É uma pena que alguns tenham ido embora, pelo que percebi... – joguei verde na esperança de colher um spoiler – Mas, então, por que não querem homenagear o Bellsprout da Torre? Ouvimos dizer que estão querendo usar uma lenda no lugar. – espero não inflamar ninguém com esta parte e... Droga, maldita memória, acabei de lembrar de algumas "cortesias" só no final – A propósito, eu me chamo Nakeisha. Algum de vocês é o líder das manifestações?

Espichei o pescoço para olhar cada um dos rostos. Todos jovens, o que me levava a crer que dificilmente o representante estaria ali, de fato. Mas, pelo menos, talvez pudéssemos colher uma das versões do extremo oposto do conflito. Quem melhor para entregar os fatos de forma objetiva se não a linha de frente? Acho que, neste aspecto, eu e Ayzen formávamos uma boa dupla no quesito complementaridade, e eu espero que agora meus pontos em Carisma e Perícias Sociais me ajudem.

Shellder: 40/40 | Fletchling: 08/40~~~~~~~~ Kiki & Ayzen - Malfeito feito - Violet

Quando o discurso do manifestante começou com um "a gente observou vocês..." eu achei que vinha bomba à caminho. Já estava esperando uma sequência de acusações infundadas sobre estarmos tomando partido antecipadamente ou coisa assim. Mas, no fim, para meu alívio tudo correu bem.

As respostas foram menos esclarecedoras do que eu esperava. Nos mostraram uma foto sem resolução alguma, além de alguns fatos soltos que só me fizeram ainda mais intrigada. Só não deixei que isso transparecesse, por enquanto. Longe de mim arrumar encrenca com as Winx!

– Obrigada gente. Até breve! – repliquei o agradecimento, suspeitando que a última parte fosse se cumprir cedo ou tarde, principalmente se eles não saíssem de lá.

Peguei Ayzen pelo braço, entrelaçando o meu ao dele, e comecei a me afastar dali, de volta pelo corredor de turistas que nos separava da rua. Não tínhamos outra escolha a não ser seguir para o endereço dado. Porém, minha "pressa" em me afastar da multidão era mais para desabafar minhas impressões com um pouco mais de segurança.

– O que você tá achando dessa história? – comecei, num tom de conversa enquanto caminhávamos – Esse Carnivine tá muito estranho. É uma "lenda" com fome, que poucos viram e as fotos dele não são tão boas? Tenho um Pidove que, com fome, vai buscar comida até dentro da boca de um Kyogre... E, comendo, deixa o mundo cair sem fazer nada... – claro que minha ave não era um parâmetro, mas um exemplo grosseiro – E mais: acho que os outros manifestantes voltaram pra essa associação quando chegamos. Significa que eles tiveram esse tempo de vantagem pra preparar qualquer tentativa de nos convencer. Isso pode ser muito bom, ou muito ruim... – suspirei, franzindo o cenho e mordendo o lábio inferior com os questionamentos.

Depois de sairmos daquelas redondezas me deixaria ser guiada por Ayzen, que tinha o endereço em mãos e, acredito eu, a melhor rota para chegarmos lá. Do jeito que a cidade mudou e minha cabeça tá viajando em possibilidades, é melhor eu não arriscar me oferecer a tentar descobrir se conheço o endereço em questão.

Shellder: 40/40 | Fletchling: 09/40~~~~~~~~ Kiki & Ayzen - Malfeito feito - Violet

É sempre bom ter uma segunda opinião, um outro ponto de vista, outra perspectiva das coisas. Quando penso nisso, nem é só sobre essa missão, entre monges e habitantes. É, também, um pouco sobre a minha perspectiva e a de Ayzen, que claramente era diferente, mas não necessariamente conflitante.

De alguma forma suas palavras foram tirando um pouco das minhas inquietações, trazendo uma reflexão diferente sobre o pouco que tínhamos para suspeitar até ali. Enquanto eu via cada coisa como peça de um quebra-cabeça que eu tentava montar na mente, ele as via num olhar mais frio, indo além para avaliar até a própria natureza humana dos que protagonizavam aquele conflito, quase independente dos fatos que tentaram nos apresentar como provas até agora.

– Não tinha pensado por esse lado... – confessei, libertando o cenho das linhas de expressão, e meus lábios para um meio riso que começava a se desenhar, enquanto cruzava o olhar com os de Ayzen... – É um bom ponto. – ... só para me balançar naqueles pigmentos da perdição; verdes, azuis, dourados. Bom vê-los de novo, e no lugar onde os deixei.

Agora me sentia um pouco mais aliviada, mesmo vendo meu quebra-cabeça em pausa e com interrogações menos intensas, apesar das novas peças para processar. Aproveitei o relaxamento momentâneo para juntar meu corpo ao braço dele, fingindo me esticar para olhar o PokéNav que ele trazia com o GPS para nos localizar. Mas, sem eu me dar conta, minha mão livre instintivamente foi até seu bíceps, no braço mais próximo de mim, e ali ficou pousada, reproduzindo um carinho leve, quase automático, como um cafuné.

Shellder: 40/40 | Fletchling: 10/40~~~~~~~~ Kiki & Ayzen - Malfeito feito - Violet