[Recrutamento de aprendiz] Gray Fox

Oie!:

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Era uma tarde que tendia ao frio em Ecruteak quando Gray chegou até o Gym local. Soma-se a isso o fato de o próprio prédio ser localizado numa área mais alta da cidade, construído sobretudo em madeira e pedra, com fortes traços da arquitetura oriental; coisas que só colaboravam com a queda da sensação térmica.

Lá dentro tudo era à meia-luz, com archotes e candelabros iluminando a recepção e trazendo uma rusticidade elegante. Não havia som senão o do vento farfalhando as árvores dos arredores. Os aromas eram, com certeza, aqueles todos provenientes do fogo que consumia o que lhe servia de substrato: madeira, cera, linha. Mas nenhum deles se sobrepunha ao inegável odor de canela e alfazema, provenientes do incenso aceso à mesa do recepcionista.

O homem sentado atrás da recepção meditava quando Gray chegou com sua guitarra e seus acompanhantes. Tranquilamente ergueu a cabeça careca para olhar o rapaz, pousando nele um par de olhos analíticos, profundos, sábios. Afinal, era isso que o homem era, praticamente, um sábio, talvez até mesmo mesmo um sacerdote a julgar pelo kimono negro que vestia.

– Boa tarde, senhoras e senhor. – como quem tem todo o tempo do mundo o homem de meia idade voltou os olhos para um grosso e judiado livro que tinha sobre a mesa – Já estiveram aqui antes? Como se chamam? – já ia folheando algumas páginas, provavelmente pra passar as mais antigas e encontrar as mais recentes.

O monge erguia os olhos para contemplar a insígnia que Gray lhe apresentava como prova de sua passagem e vitória naquele Gym. Depois daquilo, definitivamente não tinha mais nada a ser comprovado. Afinal, era o símbolo de que, sobretudo, o rapaz já conhecia o líder pessoalmente, então podia até dispensar maiores formalidades das apresentações.

– Uhm, então já veio antes mesmo. – colocava-se de pé e tirava de trás do balcão uma lamparina, que acendia com uma das velas – Morty não está no campo de batalha, agora. Siga pelo caminho principal e dobre à direita na terceira esquina, encontrará uma sala de portas fechadas, mas o líder estará lá realizando uma sessão. Por isso, seja prudente ao se anunciar, por favor. – explicava com aquele tom monocórdico, sereno e paciente; estendia a lamparina acesa para Gray e enviesava um sorriso – Sugiro que não desvie o caminho. – finalizava com um quê de suspense.

Como Gray já estivera ali antes, conhecia um pouco do interior incomum do ginásio, cujo piso era todo pedregoso e inundado, sendo o caminho traçado por pontes de madeira erguidas a certa altura acima do solo. Não só isso, tudo ali se mantinha na escuridão profunda, por isso a lamparina em sua mão, ela seria sua única fonte de luz constante, pois os demais archotes espalhados pelo caminho só se acenderiam quando ele se aproximasse, porém se apagariam imediatamente assim que ele se afastasse.

Gray nem tinha chegado à primeira das "esquinas" quando foi engolido pela escuridão, sem nem conseguir ver o homem na recepção lá atrás. Fora, é claro, os sons agourentos que inundavam aquele silêncio inquietante. Vozes, vindas de todas as direções, sussurravam coisas ainda impossíveis de compreender; umas soavam como ameaça, outras como provocação, e os deboches vinham acompanhados de risadinhas... Doll não parecia confortável com nenhum deles, por isso tentava com insistência localizá-los em meio ao escuro.

Gray – Tarde | 23°C – Ecruteak Gym

Diferente das suas acompanhantes, Gray estava longe de se incomodar com as presenças misteriosas que habitavam o escuro e provocavam os visitantes. Ora, não podemos esperar menos de um especialista em Fantasmas que já tinha visto e vivido bastante do que podia ser considerado sobrenatural.

Doll fez um esforço para executar aquela tentativa de gerar uma luz para si, mas mesmo conseguindo fazê-la, não surtiu tanto efeito para afastar as vozes que os acompanhavam. Pelo menos foi o suficiente pra deixar a Pokémon se sentir mais segura. Assim conseguiam passar pelo primeiro caminho cruzado sem maiores problemas além desses.

Entretanto, os habitantes daquele Gym não estavam assim tão dispostos a tornarem o restante do caminho agradável. Antes da segunda esquina os archotes do caminho já não se acendiam mais, então toda iluminação de Gray e sua turma vinham da lamparina e da esfera de luz feérica de Doll. Alguns dos sussurros também se tornaram mais evidentes, se assemelhando a vozes humanas.

Quando a ponte se desviava para uma curva à esquerda, na segunda esquina, em algum lugar lá adiante ouviriam o som de passos e um trio de luzes azuladas e bruxuleantes. Priscilla riria suavemente ao reconhecer a gargalhada de uma criança, cuja silhueta se desenharia entre as sombras projetadas pelas fracas luzes dos visitantes... Seria aquilo suficiente para Gray desviar o seu caminho e explorar?

Gray – Tarde | 23°C – Ecruteak Gym

Música! Essa foi a saída encontrada por Gray pra distrair suas acompanhantes e impedir que fossem atraídas pelas provocações dos arteiros habitantes das sombras. Sem dúvida, para o trio aquilo funcionou já que o som as faria não só pensar e focar em outras coisas, como também abafava os sons misteriosos vindos do escuro. Contudo, nem tudo são flores...

Precisamos lembrar que o trio é que é estranho nesse lugar, são a visita, ou os invasores dependendo de um ponto de vista mais drástico. O Gym de Morty não era toda aquela escuridão e quietude à toa, uma vez que ele abrigava criaturas, Pokémon e até pessoas que compartilhavam o gosto por estas qualidade. Assim, até poderiam passar se só estivessem cantarolando baixinho aquela canção, mas uma guitarra... Ah! Aí o negócio é diferente, porque a linha entre o silêncio e o barulho é muito tênue.

– SSSHHH! – o igualmente indiscreto pedido de silêncio vinha de uma figura baixa no meio daquele caminho que evitaram desviar.

Uma mulher de kimono cinza estivera meditando ali no escuro todo aquele tempo, mas obviamente só foi notada ao se levantar e caminhar a passos apressados na direção do trio. Sem hesitar ou pensar duas vezes, ela pousava uma mão firme no braço que Gray usava para dedilhar as cordas do instrumento.

– Onde acham que estão? – resmungou baixo com uma rispidez e seriedade de avó, combinando com a experiência expressa em seus cabelos brancos e rugas – Querem cantar aos mortos, vão ao cemitério. Aqui não é lugar. – depois desse breve instante, ela retirou a mão que tocava no rapaz, respirou fundo e assumiu um pouco mais de seriedade, aguardando uma manifestação por parte do especialista.

Gray – Tarde | 23°C – Ecruteak Gym

A velha senhora manteve-se séria enquanto o visitante se desculpava e justificava o porquê da música repentina. Ela deu uma leve bufadinha, amenizando seu próprio ânimo antes de seguir o diálogo com uma breve reverência à Gray e seus acompanhantes.

– Obrigada. – disse, antes de liberar o caminho do rapaz e voltar pelo caminho que veio – Os espíritos daqui não são do tipo festivos, é melhor não os contrariar.

A mulher então sumiu pelo caminho lá atrás, engolida pelo escuro. Aquela mesma risada infantil e o som de pés correndo - aquela que atraiu a atenção de Priscilla - se manifestou mais uma vez naquela mesma direção... Seria a mulher real? Um fantasma brincalhão? Um espírito ranzinza? Tudo? Nada? Restará a dúvida.

Agora sem música, Gray e seu grupo encontrariam o silêncio. Decerto que a música de antes ajudou a afastar os fantasmas que incomodavam. Isso e o fato de que, agora perto do seu destino, a presença humana era ainda maior por ali. O especialista descobriria assim que se aproximasse da terceira esquina.

Havia um grupo razoável de sacerdotes ali, quatro ao todo, um de frente para o outro, margeando o corredor à direita que dava para um par de portas de correr, feitas de madeira e papel, e que agora estavam fechadas. Dentro de toda a escuridão, seria uma surpresa ver que havia iluminação vinda de dentro daquele cômodo, pois uma luz avermelhada "vazava" pelo papel levemente translúcido das portas.

Todos os que estavam no corredor se encontravam sentados em posição de lótus com seus kimonos em tons de cinza. Tinham as cabeças baixas, concentrados, e não a ergueram nem mesmo com a aproximação do quarteto. Será que era ali dentro que Morty estaria afinal?

Gray – Tarde | 23°C – Ecruteak Gym