Surfando no recomeço

Depois de ficar vermelho como um Octillery, o menino sussurrou que tinha medo do mar. 64 achou irônico, aquele garoto realmente lembrava ele. Seria mais complicado do que o monotreinador imaginava mas ele tinha decidido que ajudaria Elias.

- Elias, vou te contar uma história. Vem comigo. - Disse o loiro levando o menino até a areia molhada onde vez ou outra batiam umas mini-ondas nos pés.

- Quando eu entrei no mar pela primeira vez foi um dos dias mais carteados da minha vida. Eu perdi dois amigos num ataque de Sharpedos, eu nunca mais vi a mulher que me resgatou, e eu estaria morto se não fosse por Brood. - Meia-Quatro agachou e fez um carinho na cabeça de Surskit. - Depois desse dia eu sentei nessa mesma praia e fiquei olhando o mar sem conseguir entrar por causa do trauma. Foi quando eu conheci um surfista monstro que me ajudou a entender o mar e me ensinou a surfar.

64 olhou para o menino para ver se ele estava acompanhando. Parecia tão concentrado que o loiro continuou.

- Ele me disse que nós homens temos a tendência de querer controlar tudo para que saia sempre do jeito que planejamos. E esse sentimento defensivo que faz com que algumas pessoas arreguem ao confrontar o incontrolável mar. O medo é uma coisa boa Elias, é ele que impede que um Goldeen fraco enfrente um Gyarados selvagem, e que um jovem iniciante invada uma base da Equipe Rocket sem preparo. O que você tem que fazer é transformar o medo em seu aliado, e aprender a respeitá-lo. Quando você entra no mar respeitando seu poder, ele te recebe e divide seus dons, o surfe é somente um deles.

- Então agora eu quero que ao invés de tentar enfrentar o mar, você vá comigo até ele e pergunte se pode entrar, ele vai te responder no seu coração. - Finalizou 64 dando passos lentos em direção ao mar.

Meia-Quatro não era muito de falar, muito menos de contar sobre sua história. Mas algo naquele garoto lhe fazia querer ajudar, talvez as semelhanças do menino tivessem liberando um pouco de seu lado bom oprimido por anos de sofrimento.

Off: Sem problemas, e boa sorte na matéria.

Elias seguiu Meia-Quatro lentamente até conseguir entrar por inteiro na água. O loiro conseguia ver o olhar de satisfação do garoto ao perder o medo do mar.

- Você conseguiu, mas lembre-se sempre que o mar deve ser respeitado. Seu medo agora virou seu parceiro, quando a maré estiver muito violenta seu medo lhe dirá o que fazer.

64 se virou para o horizonte, fechou as duas mãos e as juntou perto do peito. Deu para ouvir um suave obrigado saindo da boca do loiro.

- Agora volta. - Disse o monotreinador enquanto caminhava de volta a areia junto a Elias. - Surfar não é tão mamata quanto dar um tibum. Você, sua prancha e o mar devem estar em perfeita sincronia. Mas por enquanto eu vou te ensinar os bizus para você conseguir pegar uma onda e depois eu te conto qual o ingrediente secreto para pegar a onda perfeita.

Meia quatro se sentou na areia do lado da prancha já deitada. - A primeira etapa é se posicionar no lugar certo para que você consiga levantar no momento exato. Se você levantar um segundo antes ou depois de onde deveria o caldo é certo. Para se posicionar na parte certa da onda você deve usar seus braços. Então agora deite na prancha e faça braçadas na areia. Eu quero com intensidades diferentes, primeiro você começa com braçadas lentas depois quero que aumente a velocidade dos seus braços. Faça.

A aula fluiu melhor do que Meia-Quatro imaginou, o menino que a pouco tempo  não conseguia entrar na água agora já conseguiria surfar sozinho. Quando Elias pegou sua quinta onda sem precisar de ajuda, o loiro sabia que ele estava pronto. Entretanto antes que 64 pudesse falar algo, o jovem agradeceu por tudo e disse que precisava ir para casa, depois deu um abraço repentino no monotreinador e se despediu.

- Minha mãe deve estar preocupada... Deve ser um sentimento bom. - Meia-Quatro falava com o mar depois de agradecê-lo mais uma vez enquanto saia da água.

A aventura planejada tinha saído um pouco do controle do jovem, mas ele estava feliz de ter ajudado a criança com seu problema com a água. Agora seus pensamentos tinham se voltado para o suposto mercado negro novamente. O céu já estava escurecendo e o movimento dos meliantes deviam aumentar a essa hora. - Está na hora de descobrir mais sobre aquele lugar Brood. Vamos lá pra casa para eu me trocar e vamos ficar de sentinela para ver se descobrimos algo.

Assim 64 recuou sua aranha para a pokebola, tomou uma ducha no chuveiro da praia e começou a caminhar para a casa abandonada onde guardava suas coisas. Lá ele poderia se secar e colocar uma roupa propícia para que ninguém suspeito pudesse identificá-lo.

Já era finalzinho de tarde quando Meia-Quatro chegou a sua casa e apoiou a prancha numa parede repleta de plantas trepadeiras. Começou a se arrumar quando se deparou com um bilhete escrito "Tenha cuidado". O loiro se assustou e se virou imediatamente, olhou para todos os lugares que podia. Alguém tinha descoberto onde ele estava escondido, e além disso sabia dos planos do treinador.

Mas como? Eu não contei pra ninguém que eu iria investigar o suposto mercado negro... Como... Só se alguém me viu no dia em que eu passei lá, e me seguiu até aqui... Mas não é possível... Será que...

64 Não fazia ideia de quem pudesse ter colocado o bilhete ali, mas quem que tivesse sido não queria arranjar problema. Afinal suas coisas ainda estavam ali, mas parecia que ele não queria que o monotreinador investigasse o local. Certamente ele sabia de mais coisa do que o loiro. Porém isso tudo só deixou Meia-Quatro com mais vontade de investigar, agora ele tinha certeza que alguma coisa acontecia por trás daquela porta e o jovem ia descobrir o que era.

Lógico que ele sabia que não tinha pokemons fortes e não faria nada muito imprudente. Até porque ele sabia muito bem o que acontecia com os invasores. Já ouviu os gritos de muitos deles na caverna da Equipe Rocket. Agora era hora de investigar somente. Então o loiro se vestiu todo de preto, arrumou suas coisas e colocou a máscara de mergulhar na mochila. Sua intenção era ficar ir até o local e achar algum lugar que ele pudesse ficar de sentinela e analisar tudo o que acontecia ali. Assim foi 64 andando em direção ao local ainda preocupado com o bilhete, sempre olhava para os lados para ver se estava sendo seguido.

Meia-Quatro andava até o local enquanto o tempo passava e a noite caia. As vezes ele olhava para trás repentinamente, mas não conseguia achar ninguém. Se alguém o seguia estava fazendo muito bem, pois não deixava rastros. Ao passar novamente pela orla da praia ele percebeu um pokemon parado no chão, olhou de relance para os lados mas não viu ninguém perto.

O loiro então decidiu chegar perto e ver o que era aquele pokemon. - E ai fera, tá perdido? Cadê seu Mestre? - Disse 64 retribuindo o olhar do monstro enquanto caminhava em sua direção.

Uma pequena pausa no caminho não iria atrapalhar os planos do monotreinador, mas o bilhete ainda intrigava os pensamentos dele. Ele realmente não fazia ideia de como acharam sua casa.