I'M NOT A SUCCESOR, I'M THE DETHRONER!

O fim da passagem para o próximo ato era seguido por muita movimentação dos bastidores. Aquilo era interessante. Quando assistia qualquer espetáculo, nunca reparei no trabalho que dava para manter a sincronia de todos, além de preparar tudo para a passagem. Eu respirei fundo e logo peguei o texto escondido nas roupas. A ideia era dar mais uma lida, mas parecia que a emoção do palco estava tão grande que resolvi dispensar.

Logo seguia andando para a minha posição. Todos estavam prontos. O Cenário, sem dúvidas, era divino. O país das maravilhas estava ali e eu ficava até contente de estar participando daquele momento. O caminho se seguia para a parte dos improvisos. Claro que eu tinha preparado algo mais cedo, por isso, não foi 100% improviso.

- Tem horas que é caco de vidro
Meses que é feito um grito
Tem horas que eu nem duvido
Para passar aqui, eu acredito.

As cenas se seguiam rapidamente depois da rápida interação com a Rainha Branca e breves momentos nos bastidores até que tudo estivesse pronto. Em poucos minutos estava novamente em palco e acompanhado dos parceiros anteriores e mais uns quantos coadjuvantes que foram enviados connosco na missão de salvar Alice e conseguir o artefato.

Porém... Havia um obstáculo no caminho... Eles tinham de atravessar um espelho, não é que não fizesse nenhum sentido, afinal estavam no mundo dos espelhos, porém ainda um pouco estranho, mas era real, o Chapeleiro fez um pequeno poema rimando as suas frases e conseguiu através o espelho, os guerreiros pareceram ter medo daquilo e recuaram, mas eu me mantive firme e ao ver os exemplos anteriores logo enunciei:

O surgimento da Rainha de Copas levava toda a plateia a se ajeitar em suas poltronas, na tentativa de focar em cada detalhe do palco. O olhar de todos casava-se perfeitamente com a música de tensão que rolava e isso fora crucial para trazer o efeito desejado. O sumiço do chapeleiro, a rainha que se pintava de bondosa, a face de surpresa de Shion, contrastando-se com a minha de seriedade (a máscara ajudava, afinal). Toda tensão estava no palco e mesmo que fosse notório que a Rainha de Copas não se arrependeria tão fácil, parecia haver uma esperança no olhar de todos.

Eu prontamente dei um passo a frente, colocando o braço na frente da filha da rainha, como quem dissesse que não seria tão fácil assim. O balançar negativo da cabeça, levando as longas orelhas a fazer um sinal que apoiava a minha decisão, acenava para Shion que algo de errado não estava certo..

Sabrinna aparecia em cena após o trio atravessar o espelho e o que deixava a cena ainda mais estranha era o facto de Brycen desapareceu do palco quando chegamos ao novo lugar. Eu reagia com um semblante de choque e surpresa, emoções que eram mais facilmente transmitidas através da música ambiente e alguns movimentos exagerados com o meu corpo, inicialmente eu não tive qualquer reação enquanto escutava o que a Rainha dizia... Um discurso bem incoerente com a figura de antes, um discurso que pretendia mostrar que estava se redimindo e procurava a paz, dizendo que aprenderia com os seus erros e queria governar sem tirania.

Ayzen se adiantara a mim e colocou seu braço na minha frente, numa forma de me avisar sobre o perigo de aquilo não ser verdade e que era provável que fosse uma mentira, para além disso o gesto dele me impedia de fazer algo irracional. Na verdade, aquilo realmente não fazia qualquer sentido... Alguns pontos se foram ligando, enquanto exprimia uma semblante pensativo e encarava a personagem, passando a analisar não só as falas dela e comportamentos, como também o local onde estavam.

O mundo dos espelhos... Um reflexo, um outro de nós, um mundo contrário ao nosso... Isso poderia explicar a mudança súbita na personalidade da Rainha... Ela não deveria ser a verdadeira Rainha de Copas, mas sim uma imagem contrária dela criada naquele mundo para além do espelho! Teria de encontrar uma forma de comprovar a minha teoria agora...

- Hum... É sério, minha mãe? Mas sabe uma coisa... Você sempre me ensinou a nunca confiar nos outros, pois nunca se sabe quando irão aproveitar-se da nossa distração para aplicar o golpe fatal, não é? Lembra disso, certo? Não tente me enganar... Me diga, o que você pretende e o que é você de verdade? Para além disso, onde está o Chapeleiro? - confrontei aquela figura, que podia não estar mentindo relativamente à sua aparência mas com certeza estava escondendo algo.

Tão depressa apareceu como desapareceu... Após ver que sua estratégia de nos enganar não teve qualquer resultado, a Rainha de Copas mostra mais uma vez a sua indignação para com a atitude da sua filha, admitindo ainda o facto de nunca ter confiado na sua própria descendente e sucessora por direito - Essa sua afirmação só prova o quão correta eu estou ao me aliar à Rainha Branca. Trair a minha mãe? Você se afirma como tal após dizer que nunca confiou em mim? As coisas podiam resolver-se de outra forma, mas você nunca esteve disponível para me ouvir, na verdade, numa esteve disposta a ouvir ninguém que contrariasse a sua vontade. Não se preocupe em atormentar meus sonhos... Eles já são atormentados quando sonho com a forma como está a destruir o País das Maravilhas a cada minuto que passa... - me contive por ali ao vê-la ir-se embora e respirei fundo para me estabilizar emocionalmente de novo, visto que, o discurso me fazia despertar alguns sentimentos que se transcreviam para minha vida pessoal fora do palco.

Porém, não foi preciso muito tempo para que sua atenção fosse novamente despertada, agora pelo Chapeleiro que vinha bem feliz e afirmando que tinha achado Alice. Isso era ótimo! Mas... Seria mais uma armadilha dos mundos dos espelhos? Não havia tempo para ficar pensando e pensando sobre estas coisas... Eu fui na direção de Brycen, esperando que o mesmo me levasse aonde Alice estaria.

O show naquele momento pertencia ao típico drama de mãe e filha. Shion se aprofundava cada vez mais na peça e era impossível separar agora a personagem de sua real personalidade. Eram uma só. Eu fiquei assustado. Não tinha entendido o porquê de uma personagem do sexo oposto, mas realmente ficou espetáculo. Era engraçado que até a voz do rapaz mudará e nem eu saberia dizer ao certo se eu conheceria o verdadeiro rapaz mais novo, porém, eu seguia o meu papel.

Após alguns efeitos, Sabrina deixava o palco. Tive pouco contato com a líder de Gym de Kanto e queria saber se tinha notícias. Tinha conversado pouco com meus país de Celadon, mas eu confiava que nas poucas vezes eles tivessem seguros. Mesmo assim, eu deixei qualquer ansiedade e continuei as minhas “férias” naquele palco.

Finalmente Alice era revelada. Pelo menos fora o que o “Chapeleiro maluco” bradava para todos. As pessoas ainda estavam transitando de cenas, da mãe desnaturada com sua filha revoltada para o Chapeleiro que queria salvar todo País das Maravilhas. Eu segui com uma leve olhada para o relógio.

- Não há mais tempo. Vamos, vamos! Alice precisa de mais tempo!

A peça rapidamente voltou a algo já visto pela plateia: o trio junto andando pela caverna, procurando por Alice. Podia ser repetido, porém, a música e o cenário em constante mudança aumentava a sensação de imersão por parte da plateia, deixando a cena menos chata. Apesar de saber que aquilo era apenas encenação e de se ter preparado com antecedência para a apresentação, quer dizer... Um dia de preparação... A cena era de certa forma intimidadora pois as ações que estavam descritas no texto ainda eram um surpresa devido às diversas formas como podia ser executadas com todos os recursos dos teatro.

O chapeleiro parecia bastante animado, apesar de todo o suspense criado por todo o resto, mas talvez isso fosse devido à personalidade distorcida do personagem. Enfim, chegamos ao local onde, supostamente, o trio poderia ver Alice. A cena era chocante... Alice estava presa em um espelho dentro do mundo dos espelhos! Na minha cabeça começavam a passar possibilidades para salvar a garota e exprimia isso através de um semblante de choque e movimentos rápidos dos olhos para todos os lados. Porém... Houve algo que chamou à minha atenção quando Brycen nos mandou passar pelo espelho... O chapéu! Onde que ele pegou aquele chapéu? Ele tinha dado ele para a Rainha como prova de que voltaria! Era impossível ele estar usando ele agora... Dei alguns passos para trás, ganhando alguns metros de distância e pegando o meu parceiro pelo braço, fazendo alguma força e puxando-o para mim.

- Chapeleiro... Onde pegou esse chapéu? Você tinha deixado ele com a Rainha Branca! - então eu puxava de minha espada temendo que se tratasse de um verdadeiro inimigo - Você é uma das armadilhas do reinos dos espelhos, não é? Confesse! Não deixarei que leve a melhor! Não posso deixar que leve a melhor! - o meu tom de voz ficava mais agressivo enquanto contemplava o grave erro que quase cometeu ao confiar naquela pessoa sem analisar bem a situação antes - Seja rápido.