got me thinkin' nonsense ~

Acima de tudo, o silêncio.

Apesar dos chamados e sugestões suaves, em momento algum as palavras do casal foram suficientes para alcançar ou arrancar quaisquer reações da criatur(inha) semi-oculta nas sombras da cela. Mesmo a gigante quadrúpede tentou chamar a atenção da criatura que 100% viraria um MeiKai, batendo os pés e emitindo uns Saur, saaaaur! no processo, tendo tanta efetividade quanto a de seu(s) treinador(es) - absolutamente nenhuma.

Ao contrário deles, porém, a gramínea tinha uma vantagem: Alcance.

Ela analisou cuidadosamente os arredores, pouco antes que os olhões pousassem na lamparina abandonada em cima da mesa. Num açoite rápido, uma das vinhas se desenlaçou para agarrar na argola do objeto, movimentando-o pelo ar e pelo meio das grades para que pudesse trazer luz ao interior da prisão e, acima de tudo, tentar oferecer uma compreensão melhor do que é que estava acontecendo por ali - ou, pelo menos, uma mínima prévia da situação.

Foi aí, e só aí, que a cabeça do rapaz se movimentou.

Não se engane: Não foi nenhum movimento gritante. Ela somente pendeu minimamente para o lado, afastando uma das madeixas da frente do rosto, o que expôs imediatamente a presença de uma gag ball (NÃO sexual, pelo amor de Suicune!) que tratava de fazer o favor de entalar-se dentro da boca, o que provavelmente era uma ótima explicação para a ininteligibilidade dos sons que escoavam da garganta.

Momentaneamente, um brilho dourado pulsou no único olho descoberto - rápido o suficiente para que pudesse ser descartado como um reflexo da lamparina ou até mesmo uma ilusão de ótica, eu admito -, a pálpebra semi-caída em expressão distante, atordoada... sonolenta, de certa forma.

Entretanto, tão rápido quanto cintilou, o dourado se foi.

E deu lugar à uma tonalidade diferente, brilhante, mesmo que a cor estivesse um tanto quanto nebulosa, naquele momento - uma de várias lembranças, de familiaridade e, ouso dizer, até mesmo de conforto.

Lilás.

À esta altura, acho que tudo que tenho para dizer é: Pobre Karinna.
Quer dizer, ela até tentou ajudar, entende? Mas é difícil de competir quando sequer era capaz de encaixar a presilhinha no lugar e uma esfera de energia potentíssima dava conta de simplesmente explodir um pedaço das grades - um para cá, outro para lá, mais um aculá, os pedaços de ferro voaram e se estabacaram com força contra paredes, chão, tudo.

Felizmente, ninguém se feriu.

Mas ei, não precisa ter pressa! Ele não tá indo pra lugar nenhum, olha só!!!
..haha..

Enfim; Tal como não havia reagido para quase nenhuma das tentativas anteriores de comunicação, o albino também não o fez quando sua prisão foi despedaçada no clima anticlimático de Venusaur. Não posso dizer o mesmo, entretanto, de quando a gag ball foi finalmente retirada da boca, um fio de saliva ligando o objeto à boca por alguns instantes antes que se quebrasse no ar. O maxilar se moveu de maneira extremamente vagarosa, os músculos se acostumando com a ideia de que não existia mais o obstáculo que criara morada no interior da cavidade oral.

...A cabeça se moveu, também, mais uma vez. As madeixas se dividiram, revelando os traços e trejeitos tão, tão familiares ao ruivo, ainda que há muito tempo não houvessem sido encontrados - uma confirmação muda de identidade foi tudo aquilo presenteado ao policial, e sequer havia sido propriamente feita pelo pobre grandalhão.

— ...Devolva. — Foi a única resposta rosnada. A voz era rouca, extremamente rouca - o tipo de rouquidão consequencial de alguém que gastou muito a garganta, sabe-se lá por qual motivo. — Me devolva. — Arranhou mais uma vez, os ombros pendendo para frente e o rosto quase se batendo - de maneira bem patética, aliás - contra o do mais baixo. A corrente que servia de coleira, porém, tensionou ao impedir o processo.

...O olhar nublado, porém, não parecia encontrá-lo de maneira apropriada.
A voz torpe, atrapalhada, também não.

Era como se estivesse sobre efeito de algo, é o que eu quero dizer.
Dopado?
...Mas por quê?

E que culpa uma pobre alma pode ter de não encontrar uma singela existência no meio de um mundo dominado pelo nomadismo?

Quando Zhár se aproximou, dando sua eficiente narigadinha contra o homem, o corpo se movimentou brevemente num vai-e-vem curtíssimo, tal qual um João Bobo, mas em momento algum reconheceu verdadeiramente sua presença. A única reação mais própria que teve foi quando a água chegou aos lábios e, ao contrário do que talvez deveria fazer, as pálpebras simplesmente se apertaram, virando a cabeça e escapando do líquido vital, trazendo a consequência do filete escorrer pelo rosto e derramar sobre a camisa de força, o chão, espalhando uma poça e também umidade pelo lugar.

— ...Devolva. — Ele insistiu, simplesmente, os olhos se abrindo mais uma vez para se encontrarem com os do ruivo - entretanto, a impressão estampada gritava que, o que quer que estivesse "vendo" (se é que estava), provavelmente ia muito além do rapaz. — Devolva eles! — ...agitou-se, o parco avanço novamente contido por um clang das correntes quando elas repuxaram a roupa pela parte da nuca. Não muito, considerando que não era como se pudesse fazê-los, mas certamente não estava em uma boa posição para se lidar naquele exato momento - quem sabe daqui a algum tempinho?

Há outra coisa importante que preciso citar; Algumas, na verdade.

A primeira é que, apesar da condição, Elfman não estava lá em um de seus piores estados. Apesar dos pesares, a pele não fornecia indícios de desidratação ou desnutrição - sequer de sujeira, aliás, mesmo que os cabelos estivessem incrivelmente desalinhados.

Outro detalhe é a diferença entre as celas vazias, a própria na qual haviam acordado e a de Elfman que, apesar de discreta, era visível: Aquela em que o albino estava evidenciava uma limpeza bem mais cuidadosa. Claro, ele não estava em nenhum ambiente estéril e completamente livre de micróbios, mas não estava aprisionado na própria sujeira, o que por si só já era uma vantagem incrível. Além disso, em um dos cantos da cela, uma mesa se destacava na prisão do albino; Não havia nada sobre ela no momento, mas era um móvel que só existia ali, então acredito que valha a pena ser destacado.

...mas era só isso.
Nada mais que pudesse ser encontrado, ou pelo menos não que fosse relevante o suficiente para ser perceptível sem contexto algum.