Em busca de algo pra fazer

A explicação de Gabriel foi suficiente para Rodrigo. Ele ainda queria tirar notas antes de atender o próximo paciente, então apressou um pouco mais a dupla, dando tapinhas no ombro de Gabriel:
- Obrigada por ter vindo, Gabriel - Disse, chamando-o para um aperto de mão e depois abaixando ate Luthien - E obrigada por conversar comigo! - O psicólogo tentou se aproximar e dar certo toque em Kirlia, mas ao reparar o receio da psíquica, desistiu. Abriu um sorriso e ao menos fora recíproco e levantou - Foi um bom bate papo. Não da pra fazer um tratamento ou acompanhamento assim, mas sempre que tiver por Vermilion e tiver um tempinho livre, passe por aqui. Só me ligar, eu tenho uma Gardevoir também, talvez as duas podem se dar bem juntas.

Na verdade a Gardevoir dele era bem velha, bem lenta e bem cansada... ok, mais um motivo para que ela seja "experiente" e "amiga" de Luthien, mas isso fica para outro dia. Agora Gabriel ia para o centro Pokémon. Numa dessas já era hora do almoço; talvez de estabelecer no restaurante, tirar um cochilo e se preparar pro mísero momento da peça que apareceria seria bom.

Ou não... mais uma vez, deixarei o Time Skip ao seu critério.

Não fora difícil imaginar como esse tempo passou. Algumas notícias sobre a área de saúde e educação tomaram a time line de Gabriel. Ora ou outra ele deve ter cogitado jogar algo, no fim ele apenas passou seu tempo com seu notebook. Ótimo! Ao menos ia para a peça informado! Nesse final de semana rolaria a segunda fase do Enem. Daqui a 3 meses teriam o resultado. Estudantes publicavam memes de questões e opiniões. A saúde ia bem, Sinnoh parecia ter algum conflito político um pouco mais sério, enquanto Alola seguia sendo o maior IDH do mundo.

É, tudo normal.

As notícias de Vermilion eram só sobre o clima: deve chover de madrugada, antes disso não. O trânsito também estava ok, salvo a região portuária. Se Gabriel prestasse atenção na geografia do lugar, veria que era melhor sair mais cedo. Um alarme soou em seu celular, indicando que já eram 16:00 e talvez fosse hora de ir. Nesse meio tempo Kirlia ficou ao seu lado, reflexiva. Ela tinha um misto de sentimentos; ora ria sozinha e se encantava com o som de sua risada, outra ora ficava tímida. Se perguntava se falara "errado demais" e percebia o limite de seus ouvidos quando se tratava de sua própria voz.

Num certo ponto lembrou de uma música que ouviu e até cogitou representá-la, mas desistiu. Vergonha.

Bem, era melhor que fossem logo; a igreja já estaria começando a receber as primeiras plateias. A participação de Gabriel era curtíssima, mas ele nem sequer ensaiou. Isso era um dos motivos de ser bom ele ir logo... sentir o peso da cruz (literalmente), se acostumar com as vestes e processar a vergonha que iria passar.

Dessa vez fora tão rápido quanto a primeira vez. Tomar a ducha, se trocar e se preparar levara quinze minutos. O trajeto apenas 20, por fim a entrada na igreja e o encontro de Luzia. Oh, Luzia! A velhinha já vinha receber Gabriel as pressas, dessa vez ela viu ele logo que possível! Correu para a entrada e o chamou pelo braço, tocando-o sem pudor. Levou-o para dentro do vestuário e apresentou o garoto para a trupe:
- Gente, esse aqui é o Gabriel. Ele vai ser o dublê do Jânio! - Falara isso com uma facilidade... todos os 10 atores no cômodo suspiraram e falaram em coro - Oi Gabriel!

Parecia apresentação de alcóolatras anônimos.

Bem, a sala logo se esvaziou e Luzia não tinha pressa em preparar Gabriel... até porque, rolaria a paixão de cristo INTEIRA até que o garoto de fato precisasse entrar. Quando a sala realmente ficou VAZIA e os atores se posicionavam, o nosso protagonista poderia olhar no relógio... ainda faltavam 20 minutos para a peça começar. O palco estava montado, os personagens posicionados e o silêncio reinava. A igreja toda esperava a chegada do restante da plateia e quando desse 17h, o sino tocaria e a peça começaria.

Enquanto isso?! Luzia mexia no guarda-roupa e pegava a túnica meio rasgada, junto dela uma coroa de de espinhos bem realista, mas que era feita nada-mais-nada-menos que de jornal e cola branca... e tinta, é claro! Ela se apressava para dar os apetrechos para o dublê de corpo, já chamando uma tal de Micaela para preparar a maquiagem.

Micaela chegou e junto dela um sorriso de Luzia que indicava um "claro, claro, vou mandar trazerem". Saiu de cena e deixou Gabriel com uma mulher incrível. Incrível mesmo! Cabelo médio, castanho claro, natural. Ondas leves até o topo das costas, nariz arrebitado e boca volumosa. Testa média, com sobrancelhas bem delineadas, apesar de claras e sutis. Enormes olhos caramelo-claro, sem olheiras e com sardas-de-sol na bochecha. Seu queixo tinha uma bolinha ao centro que dava certo charme no rosto fino da garota.

Vestia um body rosa-salmão e uma saia média, que acabava nos seus joelhos, em tom magenta. A roupa era completada com uma pulseira de lã bege e duas grandes argolas douradas em sua orelha. Seu andar firme (de salto-alto) fazia com que seus brincos balançassem, a fazendo cintilar. Certamente o som lhe faria lembrar o barulho que Jirachi fazia ao se mover... a diferença primoridal é que esta era uma mulher de 1,68 e que não brilhava cegamente.

Apesar de brilhar do seu jeito.

Ah é, quase ia me esquecendo... ela veio te maquiar. Pegou a maleta, colocou em cima da mesa e abriu uma variante de cores. Botou um de seus pinceis mais finos na boca e disse, mordendo a ponta do objeto:
- Oie - Estendera o 'e' num som musicalizado - Eu sou Micaela. Eu preciso fazer alguns machucados em você para parecer mais real... se importa?! Pra isso eu precisaria que você trocasse de roupa...

Esse quote pode vir a ser importante escreveu:

Descanso de Kirlia 8/15

NÃO SÃO MACHUCADOS DE VERDADE, GABRIEL, SÃO OS DE MAQUIAGEM MESMO!!!!!!!!!!! Você corou e Micaela não entendeu nada, na verdade ela até preferiu ficar sem entender. O garoto foi para a portinha do banheiro, se trocou e quando se olhou no espelho.... entendeu um pouco o quão vergonhoso era aquela tortura.

Ele não estava desnudo, mas a túnica se contrastava com sua pele alva. A roupa meio rasgada as vezes deixava passar um ar e se inflava todo... o corpo do garoto não era visível, mas ao estar num 'saco-de-batatas-branco', a sensação que se passava ao vislumbrá-lo era quase uma deformidade. Era difícil saber se Gabriel era gordo ou magro dentro daquela vestimenta, e seus braços fracos não pareciam acompanhar o desenho da túnica.

O problema não era o tamanho... era o vestuário mesmo. Ele era feito para ser assim. Quando Micaela lhe viu, procurou ver se ainda existia algum sinal de rubror em sua pele. Quando não encontrou (ou fingiu-se de cega) se aproximou:
- Posso?! - Perguntou, apontando para a roupa.

Com ou sem aval, ela chegou bem próxima de Gabriel, pegou um pó marrom-avermelhado dentro de sua maleta, espalhou nas mãos e agarrou o tecido branco, sujando-o por completo e amassando-o com um apertar forte. Depois do ato, pegou uma corda no guarda-roupa do lado, amarrou abaixo do peito de Gabriel e forçou a lateral do pano para baixo. Com as unhas, deu uma rasgada na lateral.

Agora a costela de Gabriel estava amostra, mas nada além disso.

Pegou mais um pouco de pó e fizera de novo; amassou o pé do vestido e rasgara um pouco mais a túnica na altura do pé. Dessa vez pegara uma tessoura:
- Você precisa estar mais surrado que isso - Dera uma breve piscada. Em certo ponto ela puxou um banquinho e sentou-se ao redor do garoto. Movia-se constantemente, então vez ou outra acabava chutando-o e derrubando-o sem querer.

Bem, a produção até ia bem... mas um sino altíssimo a interrompeu. O susto fora tanto que ficou claro que Micaela não era acostumada com aquele tipo de ritual... provavelmente estava no mesmo barco que Gabriel, não sendo nada religiosa e sendo apenas uma contratada para uma missão. O som reverberara por todo o cômodo por vários instantes e o coração da garota demoraria voltar ao normal.

A peça, lá fora, começava. As cortinas eram puxadas e um homem bem vestido, ao centro de uma mesa (esse era Jesus Cristo oficial) cantava em tonalidade de ópera:
- ♫ EIS O MISTÉRIO DA FÉ ♫

Esse quote pode vir a ser importante escreveu:

Descanso de Kirlia 10/15