Ato 06 — Flashes.

O combate parecia que não se desenrolar mais por tanto tempo. Bastou direcionarem o ataque para um único alvo, potencialmente perigoso portando consigo um golpe de efeito crescente conforme usado em sequência. Ademais, a vitalidade de Loudred é maior do que a da ave com a sua planta em uma de suas asas, podendo ser mais difícil de exauri-lo — mesmo que suas defesas tivessem desvantagem demasiada em relação a Farfetch’d.

Dinâmico, rápido, assim era o combate. Percebendo os ventos soprando ao seu favor, tanto Nicholas quanto Emma não tardaram em seguir na estratégia de ofensiva desmedida. Ora, em time que está ganhando, não se mexe, não é?

— Sequência de Flamethrower — pediu Nicholas, relaxando um pouco mais à postura, percebendo que, se tudo desse certo, o combate não tardaria em acabar.

— Tente acertá-lo com dois do seu Draining Kiss, Kirlia! — era a vez de Emma comandar.

Em combinação explosiva, a ofensiva desmedida da dupla arrancou a última porção de energia que a ave tinha consigo: com a mescla do ataque de Kirlia e Charmeleon, Farfetch’d deixou o já dormente corpo estatelar contra o tapete gramado com as pálpebras cerradas; não tinha mais energia para continuar seguir, decretando a vitória de Nicholas e Emma em mais um combate.

Ao fim, o homem recolhera para a cápsula seus dois monstrinhos, achegando-se, amical, da dupla tida como a vencedora do combate. Conforme anunciado pelo manto celeste, não mais pincelado com o harmônico anil como de costume, algumas gotículas iniciavam seu trajeto até o chão, vez ou outra esbarrando nos obstáculos humanos que se interpunham entre a via mais curta entre terra e céu. Em gesto amistoso, o treinador entregara aos dois algumas pequenas pedrinhas que, em determinados estabelecimentos, poderiam fazer uma troca entre os minérios e alguns discos que ensinavam as mais distintas técnicas para um monstrinho.

Aceitaram aquele gesto singelo partindo do homem, agradecendo-o com discrição, ademais exaltando Loudred e Farfetch’d que continuaram em pé durante um bom tempo em contraste com as suas defesas tão baixas.

Entretanto, não tinham a oportunidade de falar acerca do Meteor Falls com aquele homem, afinal, um outro fenômeno arrancava-lhes a atenção por completo. Um distinto brilho começava a envolver todo o corpo do psíquico da loura que, confuso, deixava os olhos carmins bailarem por todas as suas estruturas; deixou-se levar por aquele calor e lampejo intrínseco, aceitando as bênçãos etéreas ao cerrar suas pálpebras e mirar o melancólico firmamento, sendo abraçado pelo advento da evolução. Gradualmente, suas dimensões dobravam em tamanho conforme cintilava cada vez mais ofuscante, seus dois pequenos chifres se esvaíam para, novamente, remodelar a feição: era semelhante a ganhar um penteado curto, e tal uma linha crescente, estendia-se e aumentava gradualmente a cada centímetro que percorria. Se outrora o visual de Kirlia remetia à uma bailarina, agora, não mais; parecia trajar um alvo e longo vestido branco.

Repentinamente, o lampejo se esvaiu, irrompendo uma nova forma daquele foco de luz na pradaria da rota cento e catorze. Kirlia despertava agora como Gardevoir, um dos mais conhecidos e desejados híbridos entre os psíquicos e as fadas.

O agora Gardevoir fitava sua mestra com um ligeiro e faceiro sorriso no canto de seus lábios. Cerrou as suas pálpebras em júbilo. Com as írises cerúleas quase saltando da prisão de carne e boca entreaberta, Emma disparava na direção de seu monstrinho. A uma meia distância, os pés deixaram o chão para galgar na direção da fada, envolvendo-o em terno abraço, além de apertado, é claro. As exíguas mãos pressionavam na altura da cintura o psíquico, completamente tomada pela euforia de ver um de seus pequenos despertar com força ímpar. Jocosa, gargalhava, quase inaudível; estava deveras satisfeita em ver o seu primeiro pokémon capturado estar em seu estado definitivo.

— Você ficou tão lindo, meu amor... Você é o meu orgulho — soprava para Gardevoir, lentamente soltando da prisão afetiva que envolvera seu psíquico. O monstrinho encarava a sua treinadora, lançando um breve riso ao vê-la tão contente. Emma afagava o rosto do monstrinho completamente boba com a sua evolução, os orbes cintilavam ao ver àquela forma. — Vamos nos apresentar a todo mundo, que tal? Acho que temos um novo amiguinho.

Tomou o psíquico pelas suas mãos, quase arrastando-o enquanto açodava de volta na direção onde jaziam Nicholas e os demais. Silencioso, Gardevoir saudava o já conhecido Charmeleon que o fitava, completamente boquiaberto com a metamorfose que sofrera. O louro lançava um olhar satisfeito, por mais que não dissesse uma única palavra, e isso era o suficiente para a fada entendê-lo. Próximo a eles, estava Xatu e o filhote de Swablu.

Sem perder muito tempo, a loura achegou-se morosa na direção da ave de alvas penugens; em uma mão, um pequeno doce que carregava em sua mochila e na outra uma das cápsulas bicolores vagas, com ainda nenhum monstrinho aprisionado. Agachou-se para que os olhos anis ficassem no mesmo nível da ave. Aproximou primeiro o doce do bicho de Swablu, e os lábios abriam-se em um sorriso ingênuo e cálido; era como se toda aquela ternura tão intrínseca à Emma buscasse preencher todo o âmago do guloso monstrinho.

— Esse docinho aqui é porque você foi um bom bebê durante todo esse tempo — soprava Emma, em tom quase inaudível, não desviando os olhares na direção da ave. Aos poucos, aproximou também a esfera bicolor do filhote. — E por que você não vem com a gente também? Você vai ter uma companhia muito legal, e vai poder ser tão forte quanto o Xatu, Charmeleon ou mesmo o Gardevoir. Eu vou dar pra você todos os mimos do mundo, e isso inclui alguns docinhos! Parece legal, não é? — os lábios descerravam em sorriso de orelha a orelha, dando uma piscadela para Swablu, e as sobrancelhas indicavam o botão no centro da cápsula. — Se você quiser vir com a gente, aperta o seu bico nesse botãozinho e espera. E então, pequenino?

Uma última gargalhada bem sucinta antes de estender aquele olhar terno na direção do pequeno. Se outrora ele parecia ter gostado daquele embate, a oferta de Emma parecia ser convincente o suficiente, não é?

Quem diria que o selvagem se renderia ao oceano de afeto que transbordava das írises oceânicas únicas da kalosiana com tanta facilidade, huh? Com um discreto sorriso faceiro, aproximava a cápsula bicolor de seus lábios, encostando-os, suave, sobre o aparelho. Não o fez baseado em batalhas, conforme os andarilhos costumeiros; a loura valorizava uma relação baseada em ternura, sempre tão afável e transparecendo uma bonança infinita. Ao terminá-lo, levou a cápsula até um bolso vago em sua mochila — que não estivesse abarrotado de comida ou onde jazia seu guarda-chuvas —, repousando-a lá. Mais uma vez, estendeu os amenos olhares para Gardevoir, volvendo a recolhê-lo; Nicholas repetiu o processo com Charmeleon e também Xatu.

Agora em um movimento mais lépido para — possivelmente — proteger o seu cabelo da chuva que estava a cair, Emma arqueara um singelo guarda-chuvas, puxando, ríspida, o louro para perto de si e rapidamente envolvendo-o em terno abraço. Uma gargalhada mansa deixou suas cordas vocais, dirigindo os olhares na direção do kantoniano. Repousava a sua cabeça suavemente sobre o peito do rapaz, entregando-lhe o utensílio para que erguesse e se protegesse melhor dos pingos que seguiam a cair naquele trecho da pradaria — era mais alto, afinal.

— A gente agora pode finalmente ir, né? — era uma pergunta retórica, dirigindo passos mais apressados na direção da estrada que levava até a cachoeira; não seria uma chuva que iria abalá-los, apesar de que foi uma que anunciou as ruínas de sua primeira cruzada na rota cento e um. — Sabe, eu jamais pensei que ia estar andando pelo mundo afora, ainda mais depois de fugir do meu próprio pai. Ver meus pequenos evoluindo é uma sensação tão... gostosa.

— Duvido que essa vai ser a última. Você não vai querer voltar pra Kalos pra aquela mesmice de sempre, não é? — inquiriu o louro, desviando os olhares na direção da garota.

— Arceus me livre daquele inferno. Só pelo fato de eu estar viajando, eu já consegui ter algumas experiências incríveis que eu sempre vou agradecer muito. Encontrei alguns amigos novos, você, e vi que o mundo era muito, muito mais do que a casa dos meus pais ou mesmo Lumiose. Eu nunca teria essas oportunidades se ainda estivesse presa naquele curso de administração que meu pai me colocou só pra ser a futura administradora da empresa junto com a Felicity. Ah, me empolguei demais, foi mal.

— Acredito que você é a única pessoa que tem a audácia de falar que fica feliz em me conhecer.

A loura deixou uma aprazível gargalhada abandonar as cordas vocais com o gracejo — com porções de autodepreciação — do garoto. A mão destra viajou até o seu ombro, dando-lhe um tapinha, espalhafatoso.

— Ai, para de ser chato, garoto, até parece. Eu, hein!

O que era uma simples garoa, gradualmente, estava em largos passos a se tornar uma torrente. Aquelas gotículas aumentavam suas dimensões e assim o impacto tornava-se mais violento ao chocar-se contra o guarda-chuvas segurado pelo kantoniano. O vento bramia, arrastando as vestes infimamente da dupla que, ousada, seguiam intrépidos para a sua expedição nas vísceras da rota cento e catorze, mais especificamente nas cataratas que estariam em um destino não muito longe do que foram outrora.

Em alguns momentos que arrancavam breves gargalhadas de ambos, o utensílio parecia ser levado com a correnteza de ar e se não fosse pelos reflexos do louro, seria apenas mais um guarda-chuva vagando pelos ares misteriosos que o destino o levaria.

Tão agitado quanto o próprio clima, avistaram as corredeiras tão inquietas quanto o próprio vento que brandia não apenas suas vestes, como conforme relatado outrora, buscava furtar o objeto que os protegia da torrente para si. As corredeiras seguiam o seu trajeto como de costume, no entanto, estavam bem mais violentas e a água já se espalhava tal um delta pelos arredores do rio. Notaram que um dos arbustos que o agora pássaro de Emma estivera já estava coberto pelas águas turbulentas da cachoeira.

O que deveria ser um cenário harmônico, projetado pelo próprio ser etéreo para transmitir paz a todos que os observassem aparentava caos e desordem, motivados pela mudança brusca de tempo; se outrora queriam um piquenique, mesmo que não fosse tão aprazível quanto, uma exploração — apesar das condições adversas — não era uma má pedida, huh?

O cenário pareceu ainda mais melindroso quando uma silhueta irreconhecível para ambos se debatia na margem, passando uma impressão de que estava se afogando; enfrentava as águas vis e turbulentas da corredeira caótica, quiçá querendo apenas não ter o seu sopro de vida ceifado por um fenômeno que não pudera escapar.

Perceberam então a dupla. Entreolharam-se, aflitos e surpresos por algo tão repentino assaltarem o seu consciente justo naquela hora; Nicholas não delongou em tornar para a sua calma e frieza corriqueira e Emma, sempre tão enérgica e movida por suas emoções, segurou nos braços do kantoniano, pressionando-os com certa força, transparecendo preocupação ímpar.

— A gente precisa ajudar ele, e rápido! — franzira o cenho e as sobrancelhas, em frenesi quase palpável. Os olhos cerúleos recolheram à figura ao seu lado que, ao contrário, parecia mais calma e analisava a ocasião com mais calma.

— E se você se enfiar lá no meio e for arrastada pela correnteza? Fica calma, deixa que eu resolvo isso — dissera Nicholas, arqueando a esfera bicolor que aprisionava a sua ave psíquica. Sem cerimônias, materializou Xatu para o mundo exterior; o monstrinho estava surpreso com aquele volume de chuva, afinal, fora recolhido quando era apenas uma chuva insignificante. — Xatu, tenta usar o seu Psychic naquela coisa ali pra levitar ele até perto da gente. Se precisar de ajuda, avisa pra mim, beleza? E vai com calma pra não machucar caso seja um pokémon, por favor.

O pedido era singelo, e com inteligência ímpar, o pássaro o faria de modo exímio. Claro que se necessitasse de uma ajuda braçal, seu mestre seria o primeiro a auxiliá-lo em uma melindrosa situação como tal.

Que não fosse nada demais...