_ Sem pânico, senhor Pete. Passemos calmamente e esperamos sua reação. Se tivermos sorte ele nos deixará passar reto, mas se tentar algo eu lhe protejo, certo? Tentei acalmar o mercador com palavras e continuei a caminhar como se não fosse nada. A essa altura do campeonato já passei por tantos baixos e altos que um cara só como aquele "punk" não me causava nenhum espanto. Na real eu ainda esperava que ele nos parasse, já que estou ansioso por batalhas desde que pensei em vir por esse caminho.
O treinador não parecia intimidado com aquele rapaz, mesmo que Pete pensasse o contrário. Depois de muitas aventuras, um delinquente era uma ameaça quase invisível. O rapaz se aproximava cada vez mais da dupla. O mercador não parecia estar confortável com aquela situação, parecia inclusive mais nervoso do que o normal, como se temesse por algo.
A tensão aumenta ainda mais quando ambos se cruzam. Silêncio. Aquele punk não parecia nem ter reconhecido Pete, olhando para baixo como se nem tivesse o visto. O homem olha para trás e parecia aliviado com aquela situação, mesmo se saísse dela como mentiroso. Mas, assim que ele expressa isso, o delinquente que passara por eles deu meia volta e, com malicia no olhar, diz:
- Olha só, se não é o velho Pete! Achei que iria me ignorar seu maldito! - ao abrir a boca, observava-se que lhe faltava um dente.
O senhor toma um susto, ficando estático aonde estava e virando inconfortavelmente. Com o sorriso mais forçado que podia, ele responde:
- Nossa! Haha! Não acredito que passei por você e nem percebi! Que "mancada" não é mesmo? Mas e aí, vem passando por aqui por algum motivo?
O rapaz de moicano olha para o garoto que acompanhava o comerciante dos pés à cabeça, para logo depois se aproximar do careca, passando o braço por cima de seus ombros. Num tom meio que de gozação, ele fala:
- Que pergunta mais besta! Você já sabe muito bem porque estou aqui! - era possível notar que os músculos de seu braços se contraíam, fazendo força contra Pete, que tentava levar aquilo na esportiva. O homem então percebe o pokémon que os acompanhava, que naquele momento o ameaçava rosnando. Em um tom mais sério agora, ele continua - Bem, foi bom vê-lo! Só vim avisar que o chefe já está perdendo a paciência com você. - ele se vira agora para Mahiro - Bela espécie a que você tem. Eu até pensei em te convidar para um esquema, mas bem... - ele novamente olha para o corpo inteiro do rapaz - Você não cumpre os requisitos básicos para entrar na empresa, se é que você me entende.
Então, sem nem se despedir, o homem vai embora, voltando a caminhar na direção que passava originalmente, rindo um pouco das coisas que ele mesmo falou, deixando um senhor horrorizado, com as mãos na cabeça, cochichando algo bem baixo consigo mesmo, e um treinador, que ainda tentava ligar todos os pontos daquela conversa. Afinal qual seria a reação de Mahiro para aquele encontro tão breve que ele nem teve tempo de dizer alguma coisa? Em que furada estava aquele comerciante?
Minhas preces de passar reto ou ser chamado para uma batalha não foram atendidas. Aquele cara do moicano parecia conhecer Pete muito bem, e seu modo de agir e falar me dava nos nervos. Fiquei atento a seu rosto a qualquer movimento que fazia junto de Growlithe. Com as mãos no bolso tentava intimidar ele tanto quanto a habilidade correspondente de meu Pokémon. Parei e escutei tudo, sem falar uma palavra, e o deixei ir embora sem ao menos dizer um "piu". Assim que este se foi, voltei meu rosto para encarar o mercador. Não precisava dizer nada, ele sabia que gostaria de explicações pelo acontecido. _ Minha maior virtude é a paciência... Talvez por isso não parti para cima jogando meu Venusaur em cima daquele cara pois sei que posso me encrencar caso não me controle, mas a vontade era enorme. Agora os mistérios pra cima do senhor só aumentam. Como posso acompanhá-lo sabendo que tem ligações com pessoas como esta? E como vou protegê-lo sabendo que minha vida pode estar em risco? Pensei que teria que defendê-lo apenas dos Pokémons selvagens, não de uma gangue, ou talvez uma máfia.
Tudo daquele homem, desde sua maneira de andar até o seu falar eram de certa forma irritante para Mahiro, mas, para a sorte daquele rapaz, sua paciência o permitiu ignorar as provocações daquele punk. Assim que aquele homem foi-se embora, o treinador encara o mercador, e começa a exigir explicações, afinal, quando aceitou o serviço, não havia nada dizendo sobre protege-lo de gangues ou mafiosos.
Surpreso com a reação do garoto, o mercador logo o corrige, como se tudo aquilo fosse um mal entendido:
- Não! Espere! Não é bem assim! Esses delinquentes podem ser... é... um pé no saco, na falta de uma espressão melhor... Mas ao menos eles são clientes fiéis. O problema é que, com a proximidade do inverno, os frutos são cada vez mais escassos, e eles começam a ficar impacientes... Mas acho pouco provável que eles nos ataquem, afinal, eles precisam de mim... Quero dizer, eles não precisam necessariamente de mim, mas eu fui o único que encontraram para procurar o que eles querem...
Será que a resposta do calvo satisfaria o menino, ao menos por enquanto? Pete aparentava ser um comerciante de longa data. Talvez ele soubesse o que estava fazendo, ou ao menos estava contente com sua situação atual. Mas, mesmo que ele aparentava ser o mais honesto que conseguia, Mahiro tinha a constante impressão que ele sabia algo, algum segredo, mas que não queria ou não podia contar. Talvez isto fosse apenas paranoia, mas já fazia muito tempo que o rapaz tinha aquela impressão.
Mesmo que fosse perguntado sobre algum segredo, ele provavelmente iria desviar o assunto, então sobrava ao garoto apenas especulações baseadas no que ele viu e ouviu até aquele momento. Fazia então, tanto sentido se preocupar com isso? Afinal, Pete era apenas um comerciante, principalmente de plantas, que mal fariam algum produto natural? Ou melhor, qual o objetivo que uma gangue tinha com um comerciante natural? Eram essas questões que ficavam no ar, questões que talvez nem mesmo o vendedor saberia explicar.
A desculpa de Pete me deixou mais desconfortável, aliás, porque pessoas como aquele cara de moicano se interessariam por bagas? De certo modo algumas tem efeitos bem particulares, o que me leva a pensar as intenções de pessoas assim. Mas enfim, meus olhos terão que ficar mais abertos quanto ao senhor, e me atentar para estar ajudando a fazer nada ilegalmente. _ Se for assim tudo bem. Continuemos então, preciso me aquecer para minha batalha de ginásio e até agora só tive a chance de lutar contra Electrikes. _ Disse após respirar fundo e dar passagem para o mercante prosseguir. _ Então, que tipo de plantas esses caras procuram? São elas que estamos indo atrás no deserto?
Mesmo com a explicação dada pelo mercador, Mahiro continuava desconfiado do seu real objetivo. Mesmo que ele não soubesse o que estava fazendo, aquilo tudo parecia ter uma ponta ilegal. Aquilo não cheirava bem. Devido a isso, o rapaz faz mais uma pergunta, na tentativa de se aprofundar mais nesse pedido inusitado que aqueles punks haviam feito ao homem. Ele, em resposta, abaixa a cabeça e a mexe para cima e para baixo, simbolizando um "Sim" à afirmação do rapaz sobre este ser o fruto que buscava no deserto.
- Achei estranho no início quando me fizerem esse pedido. Eles me pediram uma Cucumis spicius. Não sei exatamente o nome popular dela, porque para o público leigo, essa planta é inútil! É um fruto que não causa efeito nenhum num pokémon, e por outro lado possui um gosto horrível. Ao juntar isso tudo ao juntar com seu preço e raridade, a torna uma berry quase sem uso. Há quem diga que esse fruto é tão apimentado que até mesmo um cão de fogo como o seu estaria soltando chamas pela boca. Seu formato... - ele dizia, com a mão no queixo, tentando lembrar sobre a fruta em questão - Parece com um graveto cheio de espinhos. São encontrados em regiões desérticas, em algumas vegetações rasteiras, por essas circunstâncias, são difíceis de encontrar, pois tempestade de areia são comum por lá e acabam escondendo o fruto embaixo dos grãos. Bom, ao menos é o que alguns me disseram...
Enquanto o mercador falava sobre o fruto que estariam procurando, o treinador olhava para o seu redor, e percebe algo inusitado: as bordas daquela estrada de terra que seguiam começava a ter uma fina camada de areia. Mas como aquela areia havia chegado ali? Seria isso um sinal de que estariam próximos do Shimmer Desert? Talvez aquele ambiente hostil fosse o local que aquele rapaz encontraria mais criaturas para batalhar, mas seria ele o ambiente ideial?
Pete explicou melhor a situação e cheguei a entender ser um mal entendido da minha parte. Apesar de ser estranho, começava a suspeitar menos daquele homem a partir da história contada. No começo cogitei ser uma Tamato Berry, porém elas costumam ser redondas e essas tem efeitos sobre os Pokémons. Agora um fruto desértico fortemente apimentado, alongado e cheio de espinhos me era novidade. Me virei para a frente para pensar, e percebi a presença de areia. Pouca, mas já indicava estar perto do deserto. Me animava com a situação, talvez encontre excelentes criaturas para batalhar ou até mesmo capturar. _ Peço desculpas por duvidar do senhor, compreendo melhor a situação agora. Não sei o que esse povo quer com tal fruto apimentado, mas já fico aliviado em saber que não é nada "ilegal", digamos assim. Olhe! Estamos próximo ao Shimmer. Está preparado pelo o que há de vir?
O treinador não sabia ao certo qual seria aquela fruta que estariam atrás, mas pelo visto poderia ser semelhante à outra espécie conhecida pela sua picância. Porém, pelo visto, aquilo poderia ser apenas um pedido absurdo de uns rapazes que apenas queriam pregar uma peça em um comerciante inocente. Ou poderia haver algo mais profundo escondido nisso, mas o treinador considerou que não havia nada aparentemente "ilegal" ocorrendo. Pete sentia-se feliz com a conclusão daquele assunto, ao menos por enquanto, tanto que resolve demonstrar sua gratidão por palavras:
- Bom, obrigado por me entender... Mas bem, que bom que estamos mais próximos do Shimmer. Já faz algum tempo que não passo por essa região, mas me lembro de uma coisa ou outra. Se não me engano, ele é todo delimitado por montanhas. Há uma meia duzia de pontos de acesso, alguns mais demarcados do que outros. Mas vai ficar cada vez mais evidente, pois a vegetação está ficando mais escassa.
A observação do mercador se mostrava verdadeira, pois à esquerda do treinador, ao longo da floresta, havia uma grande cadeira de montanhas, como se fosse um "paredão". Conforme caminhavam por mais uma distância, as árvores e arbustos ficavam cada vez mais distantes um do outro e além da grama, havia agora também areia.
Foi então que, ao longe, Mahiro percebe algo diferente da paisagem natural. Era algo com ângulos retos e precisos, feito com materiais não-naturais. Parecia ser uma estrutura de algum tipo. Ao olhar para Pete, procurando resposta, o homem demonstrou uma expressão de tanta incerteza quanto ao do treinador. Afinal, quem teria uma casa assim tão próxima ao deserto?
Seguimos adiante, evidentemente, nos aproximando cada vez mais do local objetivo. As observações feitas pelo mercante eram evidentes, e um paredão podia ser avistado no horizonte. Porém o que chamou mais atenção era uma certa estrutura à frente. Seria estranho alguém morar por perto. Bom, poderia ser um ponto ignorado, mas já caminhamos por pelo menos uma hora e seria bom alguns minutos de descanso e nos hidratar adequadamente. _ Sabe se alguém mora por ali? _ Perguntei ao senhor à minha frente, porém percebia que ele esta tão em dúvida quanto a mim. _ Bem, há doido para tudo hoje em dia, mas não vejo mal e passar por perto e averiguar. Sada, consegue sentir a presença de algo ou alguém ao redor? Growlithe seguia a frente nossa sempre com o nariz encostado ao chão, e poucas vezes erguia a cabeça para ver o caminho a frente. Seu olfato poderia nos tirar essa dúvida conforme continuamos andando, e tinha certeza que em algum momento ele responderia com seu latido.
Com certeza, aquele local em especial parecia estranho para ser um local de moradia. Num mundo cheio de animais selvagens perigosos, era de se acreditar que as cidades, mais bem protegidas e com acesso à diversos outros serviços, viesse a ser algo essencial, como um porto no meio de um grande mar. Mas se alguém morava por ali, certamente contrariava o senso comum. Talvez isso fosse bom, ou ruim.
Ouvindo ao pedido de seu treinador, o cão de fogo começa a utilizar de seu olfato para vasculhar algum cheiro diferente do usual. Ele segue na frente, indo diretamente até aquela estrutura. Enquanto isso, Pete e o treinador seguiam ao guia deles. Chegando mais perto daquela fundação, nota-se que possuía a forma os materiais de uma casa ou cabana comum, feita de madeira. Seguindo a estrada de terra, esta recebe outra estrada paralela, diretamente para a esquerda. Convenientemente, a frente da casa se encontrava com a estrada.
Não parecia nada diferente do normal para uma cabana, havia algumas janelas, mas não parecia haver ninguém em casa. A porta era de madeira e possuía encravado a imagem de uma baleia de algum tipo. Assim que olhavam mais para baixo, eles notavam algo interessante: Um jardim. Ele continha em si algumas flores, mudas de algum tipo de hortaliça e talvez até mudas de alguma espécie de berry. Havia porém, entre os dois cantos, dois "arbustos", recheados de flores multicoloridas, parecendo um arbusto com diversas "bolas" de flores. Uma visão de encher os olhos, mas, entretanto, havia consigo uma placa, escrita em letras garrafais:
"Cuidado com as Hortências Prêmiadas"
Talvez fosse a placa ou apenas intuição, mas o rapaz chegou a conclusão que seria melhor não tocar naqueles arbustos.
Enquanto isso, o Growlithe continuava a vascular o local, até que ele para de repente, olhando para uma pequena muda, com apenas três folhas. Ele a cheira, e logo em seguida começa a latir contra ela. O que será que havia com ela? De quem seria aquela casa? Seja lá que for, com todo aquele latido, já deveria ter saído para reclamar. O que fazer nessa situação?