Um homem sem sorte não quer guerra com ninguém

Segui Gaby em direção ao que poderia se dizer o Centro da cidade. É difícil traçar um mapa de Arborville mesmo depois de ter sobrevoado a cidade. Pois… É cheia de árvores para todos os lados. Eu confesso que fico bem confuso e teria me perdido sem uma guia.

Paramos em frente ao que seria o futuro ginásio da cidade. Aparentemente, essa é uma parte importante e não foi concluída porque os trabalhadores se feriram com as batalhas. - Eu entendi tudo que tem feito. Irei usar Drilbur para nivelar o fosso, acho que para esse trabalho ele é melhor do que Steelix. - Drilbur concordou mostrando suas enormes garras. Afinal, ele é uma topeira e cavar é literalmente sua vida. - Pode começar, você tem que deixar tudo nivelado como naquele lado, ok?

- Olhando toda essa tubulação, eu acho que é melhor não usar o Infernape para deslocar ela. Eu vou até o Centro Pokémon e irei trazer Pokémon mais adequados para o trabalho. Você pode ficar aqui com o Drilbur? - Com uma resposta eu voei até o Centro Pokémon e fui diretamente ao PC. A troca seria rápida, eu tirei Prinplup, Pineco e Steelix e no lugar deles trouxe Alakazam, Bronzong e Lucario.

Então novamente montei em Skarmory e voltei para o local da obra. - Agora sim tenho a mão de obra perfeita. - Dito isso liberei o novo trio. - Alakazam e Brozong, comecem retirando a terra cavado pelo Drilbur com o Psychic. Depois iremos mover os tubos com a ajuda de Lucario e Infernape.



Off: Não precisa mudar o time na box.

As coisas se desenrolaram bem com a divisão de tarefas que Nico executou para seu time. Cada um em seu posto e usando suas melhores habilidades conseguiram ter, juntos, o resultado de horas de esforço equivalente ao que quatro homens teriam em cada uma das mesmas tarefas.

Definitivamente, aquilo punha um ponto conclusivo de que o que faltava para o povo de Arboville era uma maior experiência e, digamos, esperteza para lidar com seus próprios Pokémon. Para que os mesmos fossem mais que simples pets, pois eram poucos na cidade que reamente extrapolavam esta realidade. Quem sabe este também não era o motivo de ainda terem um Ginásio fechado e sem Líder? A falta de representatividade dos treinadores era evidente. Ah, e não podemos nos esquecer dos traumas das grandes catástrofes (e pequenos chifres) que ainda deviam ecoar em alguns nativos de Kanto e Johto.

Enfim, o céu escurecendo pelas nuvens carregadas e o próprio ritmo da chuva aumentando progressivamente lembravam à todos que o tempo e o clima também eram seus inimigos. Por sorte, minutos antes de começarem a última parte - soterrar a tubulação -, trabalhadores vieram ao encontro de Gaby para lhe comunicar do andamento das coisas em seus setores.

– Égua, nem acredito! Espia maninho, parece que deu tudo certo pras outras bandas! – agora sim a mulher parecia verdadeiramente alegre e satisfeita – Um bora logo terminar de enterrar isso e xispar daqui. Depois, se quiseres pode ir na frente, lá pra Associação. Dona Onete deve tá te esperando pra acertar as coisas.

Dentro daquelas poucas horas o espaço da Associação de Moradores teria se transformado. Deixaria de lado o caráter de depósito para ocupar o salão de recepção com mesas compridas, constantemente preenchidas com aperitivos e bebidas, além de cadeiras e bancos organizados próximos às paredes. O que tinha para comer? Eu te conto em breve...

Com o uso de meus Pokémon terminar o trabalho foi fácil. Felizmente eu já tinha um pouco de experiência com esse trabalho ao ajudar na reconstrução de Johto, mesmo que eu tenha mais destruído do que construído. Depois que Drilbur terminou de nivelar o fosso, Alakazam e Bronzong tiraram toda areia excedente. Por fim os dois levantaram os tubos com Psychic, enquanto Infernape e Lucario davam apoio. Rapidamente conseguimos colocar os tubos no lugar e Gaby cuidou de fazer o resto.

- Agora usem Psychic para tapar tudo! - Ordenei para meus Pokémon, o trabalho poderia ser feito por todos. Robb e Lucario usavam pás e Drilbur usava suas próprias garras.

- Acho que agora acabamos. - Falei para Gaby tirando o suor da testa. - Foi trabalhoso, contudo fico feliz que tenhamos resolvido tudo em apenas um dia. Eu imaginei que essa missão poderia demorar mais.

Retornei meus Pokémon e montei novamente em Skarmory e voltei para a associação. Lá uma verdadeira festa estava acontecendo, com aperitivos e bebidas. Decidi procurar dona Onete para relatar o fim da missão. - Tudo pronto! Acho que agora vocês terão paz.

O fim do trabalho marcou o início do descanso de Nico, ou pelo menos para aquele dia cheio de surpresas. A Associação estava finalmente movimentada e cheia, e nela ele reencontraria todas as pessoas com quem teve contato, exceto Gaby que chegaria mais tarde e, é claro, Joelma que deveria estar curtindo na lama - literal e figurativamente.

As mesas estavam repletas de comidas quase tão excêntricas quanto o próprio povo daquele lugar. Ouso dizer que o ruivo reconheceria, no máximo, o arroz e os frutos do mar, pois o resto era realmente bem exótico. Eram caldos e cremes de um amarelo chamativo, repletos de uma folha verde e estreita; além de um caldeirão cheio de uma "coisa" escura e folhosa com um aroma sutil de defumado. Também havia jarros de um líquido pastoso, denso e roxo, ao lado de potes contendo mais de um tipo de farinha. [fotos aqui] [e aqui]

Para arrematar a excentricidade ele notaria que a maioria das pessoas preferia comer em tigelas e cuias, ao invés de pratos. Chegava a ter uma beleza única a relação deles com aquele tanto de recurso que teriam aprendido a extrair da natureza, que até então tinha se revelado um pouco hostil para eles ali em Arboville. Era quase como se aquele estilo de vida fosse também uma forma de resistência às modernidades e globalização, enfim.

– Ah tu estás aí! – quando Onete o viu atravessou o salão para encontrá-lo e colocá-lo numa posição mais central, à vista de todos – Olha gente, aqui o menino da Réqui. Se não fosse ele só Arceus sabe quando a gente ia conseguir terminar nossas coisas. A gente ia viver com a cidade toda esbandalhada, minha casa alagando lá embaixo e tudo... E esse tempo todo a gente pondo a culpa só nos bichos. Ninguém adivinhava que era gaiatisse da Joelma né?! Só ele teve a coragem de ir lá pro mangal ver! Ela toma um chifre, pragueja a cidade toda e com aquelas rasga-mortalha ainda enfeitiça todos os bichos contra a gente... – suspirava, apesar de seguir contanto com empolgação – É isso meu filho, a gente te agradece muito, né gente?!

Nico recebeu aplausos animados e ligeiros de todos, até que Onete o tirasse da vista novamente, para não o deixar muito envergonhado e, claro, levá-lo até seu escritório improvisado no fim do salão.

– Acordo feito e cumprido, meu filho. Melhor coisa que fizemos foi chamar a Réqui e terem mandado tu! Toma. – entregou nas mãos do rapaz um envelope azul, contendo a remuneração prevista no contrato, e um pote de plástico vazio – Agora fica à vontade, come o que quiseres e leva o que quiseres também. Te diverte! – deu-lhe uma bitoca molhada na bochecha (respeitando as diferenças de altura) e um empurrãozinho para que voltasse ao salão.

Não demorei a perceber que a forma de falar e se comportar não é o único diferencial da cultura dos moradores de Arborville. Até mesmo suas comidas e bebidas são coisas que eu nunca tinha visto antes na vida. De onde eles tiram isso tudo? Não faço ideia. Eu resolvi que não irei provar nada agora e nem mesmo teria chance, pois dona Onete começou a me apresentar para o público.

Eu senti meu rosto arder, ele provavelmente agora está mais vermelho que meu cabelo. E ter consciência disso só me fez ficar com mais vergonha. Mesmo assim acho que tenho que falar algo em agradecimento. - Foi um prazer ajudar vocês. Podem contar com a Requiem sempre que precisarem. - Desde que paguem né. - Espero que agora vocês não tenham mais problemas com alagamentos ou selvagens.

Em meio a aplausos dona Onete me levou até seu “escritório”. Com um sorriso eu recebi a recompensa que iria direto para o potinho da Sociedade. Não acho muito seguro guardar tanto dinheiro em um pote no meio do nada, mas… É o que tem pra hoje. - Obrigado, Dona Onete. Foi um prazer conhecê-la. Eu irei comer um pouco e depois partirei para base da sociedade antes que comece a chover.

Com o seu empurrão eu voltei ao salão onde os moradores me puxaram para mesa de comida. Ao fundo uma música animada e diferente tocava. Não perdi a chance de provar cada um dos pratos e bebidas, principalmente o grosso líquido roxo que parecia ser muito bom. Depois de satisfeito eu apenas me despediria de todos e voaria para Cerulean.

Mesmo a excentricidade do povo e da comida de Arboville não foram capazes de impedir Nico de revelar empatia com aquela cultura tão diferente de tudo que ele já conheceu (ou nem tanto). O ruivo até se permitiu experimentar pratos exóticos, assumindo o risco de uma reviravolta neste plot caso fosse envenenado por uma certa comida escura e folhosa. Mas, não, não há mais tempo para uma última roda de carimbó. Vai cair um toró e, depois de despedir-se dos ilustres arbovillenses, era hora de Nico montar em seu Skarmory e pegar o beco. Volte sempre, menino da Réqui!