#004 - O desbravar de um novo mundo

No calor da batalha e em meio à tensão provocada pelo perigo iminente, às imagens de todo o cenário tendiam a atingir o jovem Raiko de forma vagarosa, como num filme em câmera lenta. Mas se por um lado esses milésimos a mais o ajudam a ter um discernimento para compreender melhor os acontecimentos, por outro se tornava angustiante acompanhar a forma como os dois caninos atacavam sem hesitar diante dos desejos banais de seu mestre. E ver queda do gramíneo pelas presas de fogo só piorava as coisas.

Alarmado, seus olhos se fixaram sobre o pequeno Kiko que jazia no chão, aparentemente inconsciente, torcendo para que a qualquer momento ele se erguesse e ouvisse os comandos que o garoto tinha dar. Dali, seu olhar voou rapidamente para cada uma das pessoas presentes, o homem mau, a senhora machucada e a amiga assustada, finalizando no gramíneo novamente.

- Vamos lá, vamos lá, vamos lá... Reaja, Kiko... Estamos quase lá... KIKO! – Começou sussurrando, seguido de último grito pelo apelido do parceiro, mas nada parecia diferente, o que o deixava mais do que desapontado. Não tinham mais tempo a perder. – Nina... É com você, tente finaliza-los com os Double Kick’s.

Então, sem mais nem menos e para a surpresa de todos, o caído tornou a abrir os olhos vagarosamente enquanto emitia, quase gritava, os seus característicos grunhidos. E tudo ocorria exatamente como seria digno de ocorrer em um daqueles filmes de ação onde o mocinho sempre recupera as forças no último instante.

- Isso, garoto. Sabia que não ia desistir assim tão fácil! Agora, vamos lá acabar com eles com mais um de seus Tackle’s! – Anunciava o garoto feliz enquanto Kiko preparava-se para a última investida.

Porém, outro acontecimento inusitado parecia estar prestes a acontecer. Enquanto corria, o pequeno Kiko sentiu-se invadir por uma nova e estranha energia, essa que, em instantes, começara a explodir dentro de seu interior, brigando para escapar de lá. Então, uma fina camada de luz branca percorreu todo seu corpo, algo que à medida que avançava expandia sua massa, aumentando o tamanho do pequeno. Já em suas costas, o bulbo rapidamente libertava suas folhas e deixava a mostra um lindo botão cor de rosa. Por fim, seu corpo, antes de tons verdes, adquiriu cores azuladas, finalizando o processo fantástico da evolução.

O fato era que o garoto, no seu interior, mantinha-se maravilhado pelos últimos acontecimentos, a surpresa evolutiva do seu parceiro gramíneo e a custosa vitória sobre os ferozes caninos do mal encarado, afinal essas eram noticias realmente boas. Entretanto aquele não parecia ser um momento para comemorações, já que a sensação de perigo ainda poluía o ambiente devido à presença do causador de todos os males naquela floresta, o que deixava o garoto bastante inseguro.

Mesmo assim, o espanto do jovem treinador foi repleto de tensão ao ter a visão de sua amiga tornando-se refém daquele homem vil e escutar suas exigências.

- ARIANE! – Gritou demonstrando parte do seu desespero. – Te-tenha calma. Não faça isso nem nenhuma besteira! Você poderá ir embora... Mas somente se libertar Ariane e esses pokémon.

A seu ver era mais do que sensato também pedir pela liberdade dos caninos, eles não tinham culpa pelas atrocidades que seu mestre os fazia cometer, assim como era impossível deduzir o que mais causariam se ele fugisse dali com eles. Só tinha medo que o homem não fosse tão adepto a sua negociação.

Apesar das suas boas intenções ao dizer aquelas exigências, o garoto não se deu conta que talvez estivesse expondo suas fraquezas para com tal situação ao homem vil, afinal em seu interior tinha total confiança de que ele fosse aceita-lás. Achou que o homem já estivesse derrotado, e por esse erro o cenário só tendeu a piorar.

“O que eu faço?” Pensava com temor e hesitação. “ Se for atrás dele, ele pode mata-la, mas se não for algo de ruim também pode acontecer a Ariane... E tampouco posso pedir a ajuda dos Pokémon já que eles podem acabar machucando ela no processo... Não posso tomar nenhuma atitude impensada. Mas no mínimo tenho de ganhar tempo.”

- Espere! – Gritou alarmado para o homem enquanto o seguia com cautela e reunia toda a sua coragem. – Que tal fazermos uma troca de reféns então? Eu vou no lugar dela.

Dito aquilo, seus olhos em busca de apelo se desviaram rapidamente para seus parceiros, notando o espanto deles para com sua sugestão e alguns grunhidos de protesto. Contudo, nenhum saiu do seu devido lugar, permaneceram inquietos e conscientes da situação, a não ser pela Sudowoodo que se agarrara ainda mais a jaqueta do jovem.

- Só eu e você. – Anunciou retornando o olhar espantado ao homem.

Na inocência criada a partir do desesperado momento, o garoto sequer havia cogitado a ideia de atacar o homem vil quando a improvável troca ocorresse. Em seu âmago realmente acreditara que se tornaria refém e a garota poderia seguir seguramente para o lado de avó. Contudo, as coisas não seriam tão fáceis. Logo o inimigo recusou a proposta e se pôs a partir enquanto os gritos de Ariane invadiam o local juntamente a súplica da senhora.

A situação se mostrava deveras complicada. Se por um lado, fazer algo significaria a morte de sua amiga, por outro, fazer nada daria na mesma possível conclusão, então só lhe restava uma única alternativa, avançar e arranjar alguma maneira miraculosa de salvar ela. Porém, tudo permanecia complicado. Ainda havia hesitação e medo dentro de si, temia que o pior destino se revelasse. Por fim, a situação se tornava um impasse.

“Você sabe o que deve fazer, seu idiota. Na melhor das hipóteses seria menos doloroso saber que você tentou, que não a deixou desaparecer sem ter feito nada, então faça isso de uma vez, cabeça de limão.” Tentava se encorajar. “Pense nisso como se fosse uma batalha qualquer apesar dos riscos.”

Pelo vão da porta, o jovem treinador observava o distanciar do homem e sua refém enquanto ainda reunia coragem para fazer o que tinha de ser feito, pensava em partir. Contudo, sabia que se continuasse apenas a pensar, nada faria. Fechou os olhos, expulsou o ar dos pulmões e se pôs a dizer o que não o faria voltar atrás.

- Nina e Bells, cuidem da senhora... – Anunciou enquanto se desvencilhava das mãos da rochosa. – Kiko, nós vamos salvar Ariane. Quero que use suas vinhas para segurar os braços do homem e restringir seus movimentos. Tome cuidado.

Terminado seu curto e frio discurso, Raiko se pôs a correr atrás do vil acompanhado de seu parceiro enquanto torcia que para que no final desse tudo certo. Só faltava uma garantia, no entanto.

- Cameron. – Sussurrava para a esfera bicolor na esperança de que pudesse ser escutado. – Quando sair daí faça de tudo para acertar seus tiros de seda sobre os olhos do homem que carrega uma garota.

Dito aquilo, lançou a esfera que carregava sua pequena parceira na intenção de que ela caísse e se abrisse metros a frente do homem talvez como uma distração ou cartada final.