O fogo tomava cada rua, era inevitável ouvir gritos de agonia daqueles que queimavam, a pior das mortes para muitos. Não vi seus rostos e nem recordo de seus últimos suspiros, e mesmo que tal fardo devesse me doer no peito, nada acontece. Ninguém desperdiça lágrimas com desconhecidos.
- Ei você esse caminho irá lhe levar ao inferno.
A frase veio de uma figura atrás de mim, ela se ocultava na escuridão da fumaça, sua fala era mansa e alegre, por que motivo alguém sorria ao se deparar com aquela cena? Deverias ter fugido, tentado lhe abrigar longe dali, entretanto ela continuava parada esperando uma resposta.
- Sabe, sempre vivi minha vida tentando encontrar um significado. No fundo nem essa imagem me faz enxergar um. – Suspirei em desabafo.
A figura então sumiu, me deixou só no contemplar daquela visão importuna, e contrariando meu próprio pensar, caminhei ao seu encontro em tons de vermelho e cinza ela me acolheu. Não doía e não sufocava, era como um fantasma que dava seu adeus, ele deixaria de atormentar.
- Lynn o que você viu nunca lhe afetou. – E então ela retornou e começou a falar.
A figura era eu, um tanto mais velha, entretanto a mesma voz, o jeitinho único de morder os lábios. O tempo e a morte ali presentes, eram os fantasmas que me protegeram durante minha jornada. Quietos ficavam ao meu lado, observando-me e dando suporte quando necessário, eles não permitiram que uma garotinha conhecesse a dor de uma tragédia.
- Aquela que está hoje aqui é uma guria que descobriu sonhos e que pretende os concretizar, entretanto esse caminho a levará de volta até essa cena. Pretende prosseguir, ainda que saiba que apenas a tristeza lhe aguarda?
Ela tinha razão, tudo que fiz me levou a angústia e maus pensamentos, então por que nunca parei de trilhá-lo? Ah claro, foi por causa dele, de suas malditas palavras, “Heroes Never Dies”, heróis nunca morrem.
Continuei infinita vezes a chamar os outros de hipócritas, os odiava e no fundo agi igual a eles, nada nos diferenciava, esse é o resultado de uma vida levada na hipocrisia. Por qual motivo que ao pensar nisso, é impossível não deixar um sorriso passar despercebido?
- Você esqueceu-se de algo, não é que nunca me afetasse, é só que não preciso ser a heroína de todos, mas não é como pudesse os deixar morrer.
Os corpos se tornaram poeiras, e então tudo se tornou, o sonho tinha acabado. Acordei olhando uma pintinha apavorada em meio a uma floresta sombria, juntas ao monótono preto e branco novamente e feliz.
- Vamos Blair, pegue o pequeno vamos dar o fora daqui. – Acariciei sua cabeça como se fosse a de um bebê, devagar e carinhosamente.
Ela pulou nos meus braços, estava feliz pelo tudo que ouviu, meras palavras que afastaram o medo de seu coração. Blair era tão fofinha até quando agia impulsivamente, tinha nela algo admirável, que não sabia o que era.
Peguei os dois e os pus no ombro, e procurei a saída dali, tinha uma presa que eu queria, todavia não podia colocar o estado daqueles dois em segundo lugar. Tive de decidir minhas prioridades.
- Eu tive um belo sonho, nele o tempo e a morte brincavam de mãos dadas.