003 - Companhia Inesperada: Um Novo Norte!

Respirei fundo antes de iniciar minhas tentativas de captura e senti o ar quente queimando minhas narinas, apesar de naquela caverna a temperatura ser bem mais amena que no exterior. Isso fazia com que o ato de respirar se tornasse uma tarefa árdua e o corpo pedisse a todo instante que deixássemos aquele ambiente. Lancei então a primeira Pokébola e para a minha surpresa, a captura não havia sido bem sucedida, inclusive tendo a cápsula sido destruída por um golpe Ember daquela dromedária tão poderosa. Apesar dessa reação destrutiva, parecia que esta havia sido a última tentativa de Numel reagir, pois finalmente havia se espatifado no chão e não parecia levantar dali tão cedo. Aproveitei então para lançar uma segunda esfera alvirrubra e para minha felicidade, desta vez a captura foi perfeita, tendo a cápsula sido teletransportada em uma luz prateada para meu Storage. Ou ao menos era o que eu esperava...

E por falar em luzes, ainda havia uma luz estranhamente convidativa no final daquele "corredor" rochoso. Não parecia ser uma luz vinda de uma lanterna, mas uma luz natural, do Sol, que conseguia atravessar alguma saída entre as rochas e me alcançava. Considerando a distância que percorri para chegar até aqui e a posição por onde eu vim, aquela saída "nova" me levaria para algum lugar bem diferente. Poderia ser uma saída fácil ou pelo contrário, poderia ser um terreno difícil e que me deixaria mais perdido que antes. Tentei fazer mentalmente o mapa daquele lugar para ver se fazia sentido seguir por ali, mas havia dado tantas voltas para escalar a montanha que certamente estaria enganado, independente de qual fosse minha decisão.

— Ok Buddy, Gaiden. Algo me diz para seguirmos em frente — Disse aos dois Pokémon que me auxiliaram na última batalha, segurando as duas Pokébolas e trazendo-os de volta — É melhor poupá-los desse calor... Por Arceus! Espero que essa saída nova me leve o mais longe do topo possível, eu preciso reencontrar as crianças e Ben. Não vou aguentar subir isso tudo de novo só para descer... — Comentei comigo mesmo, enquanto limpava o suor de minha testa usando a própria blusa. Certamente precisaria de um longo banho e incinerar as roupas antigas que talvez não tivessem mais jeito de serem limpas, tamanho o suor acumulado. Com esperanças de que acharia uma rota segura, segui a luz até o exterior.

Esperança e de certa forma, fé. Era tudo que eu tinha no momento, já que sentia minhas forças se esvaírem e não tinha perspectiva alguma de conseguir escalar novamente todo o caminho que eu havia feito. Eu estava apostando todas as minhas fichas em seguir por essa caverna. E estava errado? O brilho do Sol me servia de farol e tudo o que esperava era encontrar meu rumo para um lugar melhor, torcendo para não cair em um poço de lava surpresa. Se é que isso poderia existir por aqui... Fui me apoiando nas paredes daquele túnel, dando um passo por vez, aproximando-me cada vez mais da saída e do brilho convidativo.

Ao chegar bem próximo da "Luz", dei por mim que não se tratava apenas do Sol, mas sim dos raios solares refletidos em mais um achado espetacular. Fragmentos de um minério amarelo, mais um para minha simpática coleção, apesar de ainda não ter descoberto de fato um uso para eles além da estética. Antes de arriscar sair dali, abaixei-me e recolhi os quatro pedaços que pude encontrar, semi-enterrados. Limpei levemente cada um deles e os repousei junto de outros de outras cores, no interior da mochila. Não tendo mais nada para fazer dentro desta caverna, simplesmente a deixei para trás.

— Céus! Será que estou morto? Ou isso é... Vento? Fresco? — Assim que dei meu primeiro passo para fora do túnel, senti uma brisa encanada acertar o meu rosto. Apesar de trazer um pouco de fuligem (que infelizmente senti na marra ter um péssimo gosto ferroso e amargo), era fresco. Ao menos quando comparado aos vapores ferventes da montanha. O caminho a minha frente era recheado de pedras pontiagudas nada amistosas, mas atravessar esse calvário me levaria a um ponto plano e bem mais baixo, uma saída de emergência da trilha de fogo.

Usei minhas mãos, ainda doloridas pelas bolhas, para apoiar-me e não acabar furando meu calçado nas rochas mais pontudas. Minutos depois já estava em segurança e até perdi uns segundos arrancando a pelinha que sobra depois de uma bolha estourada. Por fim, estiquei meus braços bem alto para sentir aquele belo estalo nas costas e continuei a leva caminhada. Em pouco tempo eu encontraria Ben, Luci e Yuri, se tudo estivesse bem com eles. Certamente os Machiatto ficariam felizes ao ouvir minha história sobre a captura da Numel. Mas claro, uma coisa de cada vez... Resolvi então erguer minha voz para notarem minha presença e, quem sabe, virem ao meu encontro ou pelo menos esperassem por mim — Ei, se estiverem me ouvindo! Estou aqui! Estou chegando!

Como dizem por aí: "Todo sofrimento é pouco". Uma frase solta e bastante conhecida, mas que passa despercebida para a maioria das pessoas em suas vidas comuns. Entretanto, para treinadores Pokémon, esse ditado muitas vezes se tornava assustadoramente real! Pois bem, eu não tinha dúvidas, ele era... Depois de todo o percalço enfrentado por mim na acidentada região do pé do vulcão Mt. Chimney, a última coisa que eu esperaria e gostaria de encontrar eram três figuras desalmadas e extremamente irritantes (apesar de um tanto engraçadas), guiadas por um debochado e reclamão Pikachu falante. Era realmente a Equipe Roquete! Não podia acreditar... Felizmente eles não haviam me visto, pois se não certamente teriam vindo para cima de mim tentar "ganhar a sorte". Eu poderia abordá-los e enfrentá-los mais uma vez, porém só teria a perder. Meus Pokémon estavam cansados e desanimados, alguns até mesmo desmaiados. Mesmo que eles também estivessem na mesma situação, eles eram dois humanos e um Pokémon contra apenas eu. Por isso, fiquei na minha.

Comecei a seguir o trio disfarçadamente por três bons motivos: Primeiramente, ao segui-los eles ficariam sempre na minha frente, ou seja, não me veriam. Em segundo lugar, eu saberia se eles acabassem esbarrando com Ben, Yuri ou Luci e poderia ajudá-los da melhor forma possível em caso de enfrentamentos. E por último, se eles estivessem indo para algum lugar escondido e especial encontrar algum membro da família Tailfeller, eu descobrira e poderia fazer alguma coisa, mesmo tão debilitado. Como estávamos em um terreno um tanto monocolor, deixei eles tomarem uma distância bem maior para poder me esconder em algumas rochas quando desconfiassem de algo. De resto, não tinha muito o que fazer além de prestar o máximo de atenção na conversa deles.

Fazer esse papel de fofoqueiro, caminhando atrás da Equipe Roquete e ouvindo seus murmúrios e lamentos era até divertido! Eles falavam bastante e às vezes soltavam uns absurdos que eu precisava me segurar para não rir e entregar minha posição de bobeira... Por uma longa distância de caminhada eu tive que me contentar em ouvir sobre a inveja que o Pikachu falante tinha de sua forma evoluída, do lamento de Jairo em não ter capturado os insetos e completado sua missão para receber a recompensa e o quanto o cabelo de Jéssica estava precisando de um reparo urgente (principalmente depois de decolar de novo). Entretanto, a parte mais recompensadora de ouvir o papo desse trio foi ao final, quando o rapaz teve um pingo de empatia para com os insetos e disse que era triste o fato do chefe querer transformar eles em bichos de palha. Bingo! Era isso algo em cima da qual poderia trabalhar... Se pelo menos Jairo tinha uma certa empatia pelos bichos eu poderia despertar isso nos outros dois, tendo assim mais aliados na resolução desse problema. Aliados que conheciam tão bem o Tailfeller como o próprio irmão Ben.

Eu matutava um plano em minha cabeça para abordá-los e conseguir suas ajudas e quando dei por mim já tinha abandonado a selvageria da rota e entrava aos poucos no ambiente urbano da cidade mais próxima, que deveria ser Lavaridge. Um turbilhão de informações então golpeou meu cérebro, informação demais para raciocinar tão rápido. Ben, Yuri e Luci já deveriam ter aparecido... O que será que havia acontecido com eles? Eu deixei as crianças sozinhas e agora o pior poderia ter acontecido? Olhei por cima do ombro para a Rota novamente e a vontade de voltar para investigar bateu forte. Entretanto, não poderia deixar os Roquete escaparem sem poder conversar um pouco com eles sobre o taxidermista.

Respirei fundo para me acalmar e deixei um pouco os pensamentos sobre os Machiattos de lado, apressando o passo e simplesmente surgindo entre os Roquetes com um sorriso teatralmente montado no rosto — Que surpresa agradável, amigos! É um prazer reencontrá-los por aqui... — Comentei despretensiosamente e aguardei um pouco pela reação deles antes de continuar falando, dessa vez com as mãos erguidas  — Calma lá! Calma má! Não vi aqui batalhar ou qualquer coisa do tipo. Eu vim sozinho, vê? Na verdade vim alertá-los... — E agora tentaria uma estratégia interessante. Acredito que todos gostem de um pouco de admiração e portanto não custava nada investir nisso — Admiro muito vocês como... Equipe... E sei que vocês não fizeram aqueles ataques por mal aos insetos... Na verdade, acho que sofrem em ter que fazer isso. Ver alguém tão importante agir de forma absurda e ter que se calar. Pior! Ter que se sujeitar a isso para sua própria sobrevivência. Eu tenho pena de vocês... —
Dizia enquanto fazia uma expressão triste, levando a mão ao peito.

— E seu Pikachu falante... — Comecei a dizer, observando o rato elétrico — Imagine o momento que o Tailfeller resolver empalhar o pobre amigo de vocês só por ele ser exótico o suficiente em falar. Não poderão fazer nada também, não é mesmo? — Dizia tentando plantar a semente da desconfiança e discórdia entre  Equipe e seu chefe, apesar de ser um tanto absurdo a ideia de empalhar um Pikachu falante e tirar sua única coisa que o torna diferente. A fala. Enfim, eu precisava arriscar e esperar para ver quais seriam as reações deles.

Podemos dizer que eu "nocauteei dois bunnelby com um bone club só", pois assim que abordei os membros da Equipe Roquete na estrada, eles fugiram apressados e me levaram diretamente para perto de Yuri, Luci e Ben. No início ficou um clima bem estranho entre nós, afinal não tinha tido tempo de explicar para os três sobre o meu plano de trazer os Roquete para nosso lado. Contudo, conforme fui colocando o plano em prática, foi ficando bem mais evidente o que eu pretendia e Ben até veio ao meu auxílio, explicando que na verdade o irmão dele tratava muito bem o trio, diferente de como agia com os demais serviçais — Hmm, verdade. Acho que tu já tinha me dito antes e eu esqueci... Deve ter sido o calor do vulcão. — Confirmei, rindo logo em seguida. Mas enfim... Isso não mudaria meu plano, que tinha como cartada final apelar para o perigo que o Pikachu falante estava passando com o Tailfeller tendo esse tipo de hobby.

Enquanto a Equipe Roquete aos poucos se convencia de que isso não era certo e que o Pikachu poderia acabar recheado de palha, passei a conversar apenas com Yuri e Luci, deixando Ben a cuidar deles. Os irmãos Machiatto logo se preocuparam com as minhas mãos, mas tratei de confortá-los e mostrar que estava bem, só cansado — Estou exausto, mas consegui o que pretendia! Eu capturei aquele Pokémon de fogo que tanto queria... Assim que chegarmos ao Centro Pokémon eu trato de tirá-la da Storage para conhecer todos vocês! — Expliquei de forma bastante animada, fazendo um certo "auto-carinho" nas minhas mãos, que repuxavam de uma leve fisgada pelas bolhas estouradas.

Depois de um tempo nessas conversas, o trio de Roquetes veio até mim com uma proposta de aliança. Pelo bem dos Pokémon, mas principalmente de Pikachu pelo visto, eles iriam trabalhar conosco para mudar a cabeça do irmão Tailfeller. Não pude conter de abrir um sorriso no rosto e parti para cima dos três, abraçando-os em conjunto — Sabia que não nos decepcionaria! Acredito e confio em vocês! Vamos fazer o mundo um lugar melhor e ajudar o próprio rapaz, que está apenas se prejudicando com um comportamento desses... Ben também certamente fica feliz e agradecido pela ajuda, não é Ben? — Comentei e depois perguntei com um sorriso. Enfim... Alianças feitas, restava agirmos. Mas antes... Yuri nos trouxe uma opção perfeita, ir até o Centro Pokémon! Eu jamais recusaria isso, pois estava precisando, principalmente de um banho gelado. — É pra já! Vamos! — E assim que terminei de falar, já apressei-me a sair na frente do grupo em direção ao nosso próximo destino.