Acordei no Centro Pokémon com duas horas de antecedência para a batalha. Tomei uma ducha rápida, e, quando olhei para a mochila para vestir uma roupa nova, uma que Lisanna havia me comprado na semana anterior... Desisti de vesti-la. Repeti a mesma e fui para a Battle Tower. 1h30min adiantado, e, mesmo assim, a movimentação no lugar era grande. Aquela coisa não parava e dava a impressão de que sempre estaria movimentada. Passei meia hora pensando sobre como o meu dia havia progredido. Três combates, três derrotas. Estava sentado no Hall da Torre nesse momento, e, quando pensei nisso, apertei forte minha calça com meu punho serrado. Eu havia entrado numa sociedade, mas as coisas não ficaram mais fáceis desde que entrei, na verdade, é muito pelo contrário. Agora eu tinha Tyrant e Karinna na minha cola, me cobrando resultados. Respirei fundo e decidi que precisava de música, quando peguei meus headphones na mochila, me chamaram para o "camarim". Eu ficaria em espera. Ainda faltava uma hora.
Quando cheguei no camarim, me permiti um surto. Um raro, mas que aconteceu. Havia um espelho, uma cadeira na frente dele, e uma mesa com quatro cadeiras a sua volta, no fundo, um banheiro com pia e sanitário. Quando entrei, fechei a porta, joguei a mochila no chão, e, no meu primeiro impulso, gritei e virei a mesa do avesso. Jogando-a pro alto, em seguida, me olhei no espelho. Cabelos vermelhos grandes, olhos laranjas. E treinador... O exato reflexo de uma pessoa que eu não era. Que eu nunca fui. Aquele era Gary, meu irmão, e não eu. No auge do meu surto e da minha cólera, bati os pés fortemente até o espelho e o estilhacei com um soco só em seu canto inferior esquerdo.
- Mas que inferno! O que me difere dele afinal? - Foi o que gritei olhando para o reflexo, agora estilhaçado, enquanto meu punho sangrava por qualquer eventual corte devido ao soco no espelho.
Não sei bem o porque, mas me sentei na frente do espelho, na frente dele, tinha uma espécie de cabeceira onde apoiei meus cotovelos e enfiei meu rosto em minhas mãos. Não sabia o porquê e nem como, mas chorei. Chorei como se nada fizesse sentido, porque, ali, realmente não fazia. Por que arriscar meus Pokémon em competições que eu não consigo ganhar? Por que entrar numa sociedade? Por que eu havia escolhido ser treinador? Por que...? Por que...? Por que...? Por que...? Por que eu vivia na sombra do meu irmão?
Quando ainda estava chorando com as mãos em meu rosto, e me fiz essa pergunta, uma memória remota me veio. Eu criança, conversando com Gary no telefone, e gritando com ele, dizendo que não estava tentando viver na sombra dele. Eu ainda me lembrava do diálogo...
Diálogo no telefone escreveu:
- Sabe que não vai a lugar nenhum vivendo na minha sombra, né? - Dizia meu irmão depois de suspirar, em tom de repressão.
- Eu não estou virando treinador por sua causa! - Gritava com ele, hiper irritado e impaciente. Uma verdadeira criança, aliás.
- Então por que é, Daisuke? Me explica! Olha, sei que a gente é muito próximo, mas quero que viva sua vida, do jeito que você quer de fato vive-la, e não correndo atrás da sombra do seu irmão mais velho. - Falava, ainda me repreendendo.
- Não é nada disso, idiota! - Gritava mais alto ainda.
- Então por que é?
Muito constrangido, fazia uma pausa e engolia seco. Mas depois de dez segundos mais ou menos, eu conseguia tomar coragem e contei.
- Eu quero explorar o mundo ao extremo, conhecer pessoas, fazer amigos, e ir além de onde qualquer um já foi e fazer coisas que ninguém jamais fez! Não tem nada a ver com você e seu sonho de fundar um ginásio. É sobre mim! Sobre minhas convicções e sobre tudo o que eu quero fazer! - Falava, constrangido mas como se esfregasse tudo aqui na cara dele e...
... E exatamente como essa memória estava fazendo comigo agora. Quando percebi, as lágrimas imediatamente pararam de cair. Olhei no reflexo, incrédulo porque, realmente, aquele não era eu. Eu não precisava de música para esquecer do mundo a minha volta, nem pra lidar com ele. Eu, Daisuke, queria conhecer mais dele, aprender mais sobre o que estava a minha volta. O mundo, as pessoas, os Pokémon, e... E a pessoa que mais me conhecia estava me ligando. Era Lisanna. Atendi, sem demorar, e ela já começava com um esporro.
- Que estava tomando uma surra, então tô ligando pra ver se seu meio neurônio ainda ta no lugar. - Falava, debochando da minha cara.
- Sim, ele está... - Respondia, rindo e secando meu rosto.
- Tem mais uma coisa... Acho que já chega desse lance de ter dezesseis anos, né? - Ria, meio sem graça.
Ela esboçou surpresa no telefone, mas depois riu.
- Sim, senhor Daisuke. Você tem 16 anos a três anos. Tô cansada já disso. - Ela falava me dando bronca e me deixando ainda mais sem graça, me chamando de senhor para enfatizar o que dizia.
- Então... Já lembrou o que precisava lembrar? - Falava, em tom de interesse.
- Tudo o que eu precisava. - Afirmei, olhos fixos no meu reflexo.
- Muito bom. Até porque gosto muito mais do Daisuke do que qualquer outra coisa que você resolva parecer. - Disse ela, com certeza no telefone, me tirando um sorriso de canto de rosto.
- Obrigado, Lis. Por tudo que tem feito e... - Nem termina essa frase. Você e eu vamos ter uma conversa séria ainda, seu otário. Vai se ferrar, tu me fez largar uma bolsa de faculdade de tão preocupada que fiquei. Eu não conseguia nem simplesmente te jogar pra escanteio porque se eu fizesse, você piorava! Olha, honestamente, ta... - Disse ela, rabugenta. Mas depois, mudou o tom de voz para algo mais... Sereno? Não sei. Não conseguia descrever todas as reações dela, por algum motivo.
- ... É bom te ter de volta. Vou assistir sua luta, então, não se esquece. Tem sempre alguém na torcida por você. Ah, e vê se corta esse cabelo, tu fica parecendo um menino, e já cansei do Daisuke de dezesseis a dois anos atrás, quando você fez dezessete.E desligou. Me peguei sorrindo quando olhei para o espelho, e, finalmente, depois de três anos, me reconheci. Como eu era, e como eu devia ser. Sempre. Liberei meus seis Pokémon de suas Pokéball, mas não disse nada, apenas os deixei por perto para assistir eu estilhaçar meu headphone pisando bem forte nele e colocando
"Remember the name" nos autofalantes e os colocava para assistir eu cortar o cabelo enquanto a música tocava.
Começando no
"You ready?" e terminando da quarta reprodução do último verso da música em
"And a hundred percent reason to remember the name" eu havia terminado o corte.
Estava melhor, troquei de roupa e no meu reflexo, finalmente, Daisuke Fernandez era refletido. Quando meus Pokémon me viram saindo do banheiro, com outras roupas da habituais e cabelos cortados, eles comemoraram. Por algum motivo, sabiam que eu não estava bem, e que agora eu estava melhor. Sorri, e agradeci.
- Obrigado, pessoal... Eu, na verdade, sou um pouco diferente do que vocês haviam conhecido antes. Mas lhes asseguro, sou uma versão melhor de mim mesmo agora. - Quando disse, todos fizeram fila para me cumprimentar, como se estivessem se apresentando oficialmente a esse tal Daisuke Fernandez, e, a cada vez que cumprimentava um, gargalhava um pouco. Depois dos cumprimentos, coloquei todos em suas Pokéball e percebi que recebi uma faixa de áudio de Lisanna no telefone. Era uma música. Phoenix de Chrissy Costanza. Eu a escutei até chegar o momento de ir para o campo de batalha. E, enquanto trilhava meu caminho até minha posição, o verso
"Go, bury your demons then tear down the ceiling / Phoenix, fly" ecoava em minha mente com perfeita ressonância.
Enquanto o treinador nos apresentava, analisei rapidamente Saphire do outro lado. Apenas uma adolescente, mas que com certeza me daria trabalho. Fechei os olhos e sorri de canto. Seria uma luta acirrada? Eu não sei, mas a cumprimentei antes de, de fato, começar.
- Ei, Saphire! Espero que façamos uma boa batalha. Mas peço desculpas de antemão, não sinto como se eu fosse perder. - Olhava para ela confiante, quando liberei minha dupla: Brave e Charjabug. Com meus Pokémon em campo, tomava a liberdade de lhes atribuir seus comandos.
- Certo, Charjabug, comece com Mud Slap no Aron e em seguida use o Bug Bite no Marshtomp. Brave, não sabemos como ela vai lutar e nem quem vai focar, então vamos pelo seguro! Comece com Mega Drain no Aron e depois Strenght Sap no Aron também! - Afirmava fazendo uma rápida análise da batalha e tentando garantir que meus Pokémon durassem mais alguns turnos.
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By: KB lindo & perfeito <3