Ato 07 — Descanso...

Às vezes, é necessária uma mudança abrupta de ares, ainda mais depois que se é vítima de um ataque completamente inesperado de um monstrengo contendo o poder próximo à entidade guardiã do mundo distorcido. Tudo era estranho, e por mais que o vento sibilasse bonançoso em Lilycove, não iria se sentir tão à vontade ali. Sua vontade primeira era levar alguns menores e fazê-los adquirir experiência para que os utilizasse depois, e se cessara em uma situação em que tudo ao redor poderia ser destruído.

Portanto, por que não Rinshin?

Já passara poucas vezes por ali, e sua atmosfera aprazível tirava alguns pesos das costas que Nicholas carregara consigo. Como a kalosiana estava na base da sociedade desde a última vez que viajaram juntos, puderam se rever e, bem... não preciso ficar descrevendo aqui, não é? O louro até a chamou para, quem sabe, uma singela sessão de treinos; Emma optou por não ir junto, dizendo que estava muito ocupada estudando algumas civilizações antigas e, enfim, dando o tempo que era preciso por sua paixão por história.

Voltemos à rotina de um treinador que, dia a dia, digladia com seus demônios interiores em nome de seu próprio orgulho e ambição. Ainda assim, mesmo após relaxar por algum tempo, não esquecera dos acontecimentos recentes em que, novamente, viu lampejos de personalidade cujo não gostaria que emergisse. Frequentemente, Nicholas estava pendendo a um sentimento intrínseco, este claramente negativo, e por, quiçá, ter suprimido tanto tempo, sua raiva agora aflorava e praticamente tornava-se outra pessoa; dor de cabeça e tanto, huh?

Ademais, a clara evolução do seu primeiro monstrinho conforme lutavam juntos era evidente. Desempenhara um papel crucial contra uma criatura que replicava as forças de Giratina, e sempre era um coringa em sua mão; no fim das contas, utilizou-o em apenas uma ocasião, e, ainda assim, sempre era considerado uma opção excelente independente do contexto para Nicholas. Agora, o dragão jazia em sua esfera bicolor após levá-lo até à cidade de Rinshin.

Sozinho; no fim das contas, estar apenas com si mesmo era um alívio para Nicholas. Algumas batalhas poderiam fazê-lo distrair sua tão nebulosa mente, beneficiando também algum dos pequenos que levava consigo em coletar experiência e galgando seu patamar de força para se tornar ainda mais que um treinador ás.

Rinshin era próximo a Petalburg, e também não tão longe de Littleroot, onde chegou às terras tropicais de Hoenn pela primeira vez. Uma parada incerta, ainda que benéfica; poderia encontrar novatos, ou mesmo experientes naquele lugarzinho tão aprazível e remoto em Hoenn. Iniciaria as suas buscas em um centro pokémon; alguns possuem até mesmo arena de batalha para que treinadores se enfrentem, e ademais, há um mapa da cidade onde poderia se orientar melhor. Comida, estadia e um teto seguro para planejar os seus caminhos também eram pontos interessantes do edifício.

Calcorreava em passos calmos na direção do centro pokémon. Quem sabe por lá encontraria treinadores, ou mesmo fosse interceptado na rua antes mesmo de chegar ao prédio? Restava aguardar o que aconteceria a seguir.

Não tardou para enfim chegar ao centro pokémon da pequena cidade interiorana. As portas automáticas abriam-se para que os olhos oceânicos pudessem bailar livremente pelo recinto, a princípio não vendo nada fora do comum; treinadores levando suas esferas bicolores para o balcão, uma singela loja com remédios e pokébolas, refeitório — não quis saber se estava aberto ou não, afinal — e tudo o mais que caracteriza aquele edifício, fortaleza — ainda que temporária — de treinadores.

A única imagem em que pode fixar as vistas era de uma moçoila loura, trajando um jaleco e indicando que seu ofício se relacionava a pesquisas e afins. Com um sinal mostrando que em breve iria avisar sobre algo pertinente, estava de retirada de onde as duas jaziam, na direção da saída. Por mais que chamasse a atenção de qualquer um, não era do perfil do louro ser curioso daquele modo, então apenas deu de ombros.

Deu mais alguns passos adentro do edifício, onde era possível notar uma arena de treino tão movimentada como pensara ao se dirigir à cidade remota de Rinshin, um ponto que ligava duas cidades conhecidas e era um atrativo para treinadores independente de quantas experiências acumularam.

Apenas respirou fundo. Como sempre, pousou as mãos em seu bolso e seu semblante não era dos mais, digamos, simpático; passava certa seriedade, sisudo, e inexpressivo como o de costume. Os orbes cerúleos sempre inquietos, correndo para lá e para cá, analíticos, calmos, como se analisasse o terreno até mesmo de uma área segura — paranoia, huh? Fora em passos morosos que calcorreava até a arena de batalha, onde conseguiria mais facilmente alcançar seu objetivo primário: conseguir um pouco de experiência para os seus monstrinhos menores.

E o que será que encontraria por ali? Algum tipo de fila, senha ou ao mesmo seria convidado para enfrentar alguém? Ora, dirigir-se para a arena de combate, e mesmo que taciturno, uma aura de confiança o circundava, já era convidativo por si só, huh?

Vejamos o que é que aquele ambiente reservaria.

Realmente era movimentado conforme os rumores diziam. Diante de uma multidão, o louro não teve tanto espaço para se movimentar de princípio, esgueirando-se por entre os espaços até conseguir seu próprio cantinho; os orbes cerúleos vagavam para todo o perímetro, tenazes, buscando qualquer tipo, hm, sinal em que poderia desafiar alguém.

Tal como fizera outrora, uma garota de longas madeixas rubras e orbes tão intensas como seus cabelos esgueirava-se entre a multidão. Nicholas volvia as vistas até a direção da menina, de aparência jovial e feição mais aberta que a sua sisuda tão intrínseca. A abordagem era, em si, amical e quiçá com pinceladas de ingenuidade por parte da moça; sendo o primeiro contato que tivera no edifício, fitou-a.

Não tardou para que a ruiva iniciasse a falar sobre a organização de um torneio, pensado pela própria. Conforme seguia a falar, o kantoniano erguia uma de suas sobrancelhas, matutando acerca de uma competição; enfim, a parte que mais lhe interessava era quando os prêmios eram abordados. Por ínfimos segundos, cerrou as pálpebras e tornou a abri-las, deixando escapar um sucinto riso no canto dos lábios ao retesar a postura que, outrora, era um pouco mais relaxada.

Bom, era a união do útil com o agradável, não? Além de, quiçá, conseguir, conseguir quantidade razoável de experiência para os seus menores, havia um bom prêmio que o faria levar aquilo um pouco mais a sério — quem sabe, até mesmo utilizaria Balerdroch, ademais que treiná-lo estava longe de ser o foco principal.

— Muito bem, quando é que começa? — fora direto ao ponto, uma pergunta que ao mesmo tempo que inquiria algo, era uma resposta à participação daquele torneio.

Estava dentro de uma arena em um centro pokémon, e julgava um ambiente remoto à problemas maiores — acabara de sair de um de magnitude colossal —, onde depositaria toda a sua concentração em batalhas cotidianas entre viajantes, criadores e tudo mais.

Não era má ideia participar, ao menos a princípio, huh?

E, ora, quem diria ainda que começaria tão rápido assim, huh? Por coincidência, o louro era o último que faltava para completar as chaves de um suposto torneio, sendo inferido também que os embates seriam disputados em duplas, ademais que não delongariam tanto assim. Ou seja, melhor ainda: não perder muito tempo, dando a chance de até mesmo vagar por aí com os pequenos caso as lutas no centro pokémon não suprissem a sua necessidade.

A ruiva então o guiou até um espaço vago, e aguardou ínfimos segundos até que o seu oponente aparecera. Trajando roupas casuais e um boné, o adversário tinha aparência costumeira de rapazes que se encontram pelas veredas no mundo afora. Pouco depois, dita como Eris Boreas, a garota anunciava que a primeira luta estava para começar.

Não era como se o louro gostasse de tanta exposição, e ao aceitar o convite, jamais pensou em ser anunciado logo em um microfone, não é? Mas, tudo bem; não é nada demais assim, ademais que estava cumprindo o seu propósito.

Do outro lado da arena, Tom materializava os seus primeiros obstáculos: uma fada conhecida e um fantasma que que já ouvira falar, entretanto, nunca teve um encontro com um desses. Revelados enfim, era a sua vez de mostrar os seus e, enfim, dar os comandos.

Sem perder muito tempo também, Nicholas trouxe para fora de suas cápsulas os escolhidos para aquela ocasião: Nuzleaf e Rockruff. Os comandos, sem perder tempo também, eram dados assim que aquele brilho sucinto se esvaía no momento em que as criaturas tocavam seus pés na arena:

— Duplo Rock Slide, Rockruff; Nuzleaf, Energy Ball em Kirlia e Dark Pulse em Misdreavus.

— Ah, não, fazem algumas poucas semanas. Esses são alguns dos meus que precisam acompanhar o passo de outros que são mais fortes — respondeu prontamente, ainda que os orbes cerúleos não focassem na figura do garoto, observando a troca de golpes intensa entre as duplas e, apesar de vantagem aparente, acreditava que a situação não era tão aprazível assim. Em um curto lapso de tempo, arqueou o seu porta-insígnias, mostrando as quatro medalhas que conseguira naquele intervalo.

A situação era... impressionante, pra não dizer ridícula. Kirlia é um papel, e disso Nicholas sabia, afinal tivera de utilizar Balerdroch — na época, um Charmeleon — cujo foco nunca fora suas defesas para ser a fortaleza e aumentar a durabilidade de Kirlia no combate contra dois monstrinhos de ofensiva veemente; nem mesmo atacando a fada era tão poderosa assim. Mas aquela desgraça cagou um crítico super efetivo em Nuzleaf, e a paralisia mitigava a superioridade ágil de sua equipe, deixando-o à mercê dos primeiros golpes de Tom.

Não era como se não esperasse também; um dos fortes de Misdreavus é utilizar dos ataques para mitigar a velocidade ou mesmo infligir queimaduras para diminuir a capacidade de atacantes físicos. Dono de defesa especial bem chatinha de lidar, era um adversário ímprobo, no fim das contas.

Bom, provavelmente, o próximo turno é quem definiria; ou quem sabe não, huh?

— Continue com Rock Slide; Nuzleaf, Energy Ball em sequência em Kirlia — pediu então o louro, semicerrando as pálpebras e preparando-se para o turno que viria a seguir.