Acordou com o som do despertador. A música Cristalize de Lindsay Stirling cortou o ar e chegou ao ouvido do menino que dormia com vontade naquela tarde.
Totodile também despertou. Estava em baixo da cama, onde gostava de dormir (também porque as coisas que roubava estavam ali embaixo).
Tom jogou a coberta para o lado e se sentou um pouco confuso.
Estendeu as mãos pra cima, tentando despreguiçar.
Foi até a gaveta e pegou um cordão simples, onde um pequeno cristal azulado enfeitava.
–Bom dia mamãe. – disse. Olhou o cordão uma ultima vez e o guardou novamente.
–Ótimo. Mais uma segunda-feira. – bocejou e finalmente se levantou. Saiu de seu quarto e cruzou o corredor junto ao Totodile.
Abriu a porta do banheiro e lá entrou.
Havia uma banheira de hidromassagem ali, mas não poderia usar. Não em dia de escola. Assim, foi para o chuveiro.
O banheiro era grande e possuía azulejos completamente detalhados em verde e outros bem pequenos, marrons e outros menores ainda, da cor prata.
A parede do Box era de vidro fumê. Thomas podia ver o que estava acontecendo lá fora enquanto ninguém podia vê-lo ali dentro.
Bocejou novamente e quase dormiu dentro da ducha.
Totodile quis entrar, mas a água estava quente e ele não gostava de água quente. Muito menos quando se tem um garoto de cueca Box cor de rosa nela.
Tom cuidou de seu cabelo liso com xampus e condicionadores importados. Odiava esse luxo todo, mas como todos babavam pelas coisas que ele tinha não se importava de usar, pois gostava de ser o centro das atenções.
Saiu, trocou de roupa, pegou a mochila e foi para a sala principal, onde o piso de mármore refletia uma luz doce e calma.
–Bom dia. – um homem alto entrou em cena.
O garoto se virou e o fitou.
–Oi pai.
Poseidon era alto e tinha um corpo esbelto e forte. Tinha uma pele morena e um rosto meio quadrado, o que dava mais masculinidade a ele. Tinha enormes e grossas mãos. O que mais se destacava nele eram seus olhos azuis como o mar, com cristais esverdeados. Guardavam segredos profundos e uma calma única e graciosa como as ondas. Seus olhos ficavam tempestuosos quando se irritava, e pelo o incrível que pareça, ficavam mais escuros, como uma tempestade no mar. Tinha uma pequena cicatriz em X perto da orelha, no maxilar. Sempre que perguntavam o porquê dela, Poseidon contava uma história diferente.
–Belo dia pra passear no iate, não acha?
Tom não respondeu. Caminhou até a grande porta branca e prata e a abriu.
As nuvens cinzentas e de chuva haviam sumido, deixando um céu límpido e azul.
Encontrou seu jardim de grama e árvores perenes, que drapejavam com maciota graças à brisa fresca.
Uma fonte cheia de estátuas de pequenos anjos se estendia no meio do local. Um deles, feito de pedra, jorrava água por meio de um vaso.
–Quer ir comigo, hoje à tarde? – Poseidon perguntou para o filho, que estava de costas pra ele.
–Tenho escola.
–E depois?
–Vai estar de noite.
–Podemos dormir no barco e ver as estrelas. Você gosta de ver as estrelas.
Thomas respirou fundo e se virou.
–Gosto, mas não sei. Um lado da minha mente diz que não...
Poseidon bufou e revirou os olhos. Ficou de joelho em frente ao garoto.
–Olha, não guarde rancor de mim só porque eu neguei sua passagem de treinador. Foi para seu próprio bem.
Tom encarou seus olhos profundos, e foi atingido por ondas de calmaria.
–Você sabe que malefício isso fez e continua fazendo pra mim.
–Eu já disse meu querido: O mundo é perigoso. Você não sabe o que te espera. Ninguém sabe. – disse lentamente, espalhando a calma e a paciência pelo ar. –Coisas ruins acontecem com pessoas boas. Tudo é um conflito. Você ainda não está preparado.
–Como sabe?
–Você não sabe se virar sem seu celular. – ele sorriu. –Agenda, despertador, internet, até um diário. Lembra quando eu o tirei de você? Que você ficou louco e esqueceu-se até da hora de comer? – Poseidon sorriu, mostrando grandes dentes bem cuidados e brancos.
Thomas também sorriu coisa que não quis fazer.
–Mas estou preparado. E é só levar o celular e está ótimo.
–Você vai ter que passar por terra, ar, água e lama. Acha que seu celular vai ficar bem? – ele colocou as mãos grossas em seus ombros e olhou fixamente nele. –Você sabe por que os pais mandam os filhos para essa jornada?
–Não. – respondeu cabisbaixo.
–Para que os filhos ganhem responsabilidade, confiança, auto-estima, sabedoria e saber se virar.
–Então porque você não me manda fazer isso? Se for algo bom que vai ajudar minha mente, alma, corpo e espírito...?
Poseidon se levantou.
Deveria contar a ele ou não? Deveria contar o que escondia, do que fugia?
–Quem sabe um dia, Tom. Só vá para a escola. Smith vai levá-lo.
–Porque você não me leva? – sorriu. –Tem um tempo que não ficamos juntos. – “graças a Lorena!” queria continuar, mas não ousou.
–Ok, eu te levo.
Eles cruzaram o jardim juntos, enquanto Totodile tentava pular dentro da fonte, mas seu dono impediu.
Entraram na BMW e cruzaram Littleroot até chegar num enorme prédio branco com vidros azuis, que refletiam toda luz que recebia.
Conversaram coisas comuns no caminho, apesar de Tom querer continuar o assunto da sua passagem de treinador.
Lia-se “Colégio Lorien” em letras de placas de metal que se destacavam na frente do edifício.
Tom se despediu rapidamente e pulou do carro, entrando no clima da cidade.
Littleroot não era um local muito agitado, então, não se ouvia barulhos de veículos ou buzinas. Uma camada de frio se estendia logo acima, deixando o lugar gélido. A poluição ali também era quase nula, devido a pouca quantidade de fábricas e a grande quantidade de árvores e plantas.
–Ah é! – Tom se lembrou ao ver seu Totodile correndo ao seu lado. –Você não pode entrar.
–Totodile!
Tom olhou para os lados para ver se tinha alguém, e como a resposta era “não”, logo disse:
–Entre na bolsa!
Ele abriu a mochila e o Pokémon entrou dentro dela. Já era costume.
Tom sempre esquecia a Pokébola dele. E mesmo que se lembrasse, não saberia como usar.
Logo entrou no prédio, onde foi recebido por alguns professores e secretários.
Viu o diretor, Pittacus Lore, que o cumprimentou com um aceno. Notou a mochila cheia do garoto e emitiu um sorriso travesso.
Sabia que o Totodile dele estava ali, mas sempre o deixou com ele. Fingiu não saber de nada.
O menino usou o elevador e saiu dele no oitavo andar. Chegou a um corredor cheio de armários e apinhado de gente.
–Hei Thomas. – um garoto de cabelos pretos o cumprimentou. –Veio de Lamborghini?
–Não... Hoje vim de BMW, e você?
–No Maserati Spyder do meu velho.
Tom suspirou e foi até seu armário.
–Tem aula de quê hoje? – perguntou, revirando os livros.
–Agora é biologia.
Ele pegou um livro verde e foi até a sala 05.
–Melhor ir entrando. Você vem?
–Vou, mas tenho de pegar o meu ainda. Espere. – o garoto se retirou e mergulhou no mar de pessoas.
Tom se virou para a porta da sala e viu pelo vidro, uma menina de cabelo loiro puxado para o castanho. Possuía um sorriso radiante e olhos cintilantes.
Ela ria com algumas meninas, e assim que notou que Thomas a encarava, perdeu lentamente um pouco do seu sorriso.
Tom pareceu sair de um transe e entrou na sala, olhando fixamente para o chão.
Ele se sentou na cadeira mais distante e abriu a carteira. Abriu a mochila lentamente, deixando o Totodile sair dela pra ficar dentro da carteira.
–Em silêncio! – sussurrou pra ele antes de fechar a tampa.
O sinal bateu, e inúmeros alunos entraram na sala. Mas a atenção na garota se focalizava mais e mais.
O tempo se passou, mas ele continuava encarando ela.
–Então você está de olho na novata, Bodeller? – perguntou seu amigo, cujo nome era Liam.
–Bodeller? Que raio de nome é esse?
–É o sobrenome. Violet Bodeller, filha de Evan Bodeller, dono da maior empresa de cosméticos de Hoenn e Johto.
–Legal.
–Só legal? Quer que eu a apresente pra você? – Perguntou Liam baixinho, enquanto a professora explicava sobre Lamarck e suas teorias.
–Não. Não vou ter tempo pra garotas quando entrar na jornada.
–Ultra Gay.
–Quê? Qual o problema?
–Fala sério! Não ter tempo pra garotas, gay. E ainda quer entrar pra uma jornada? Criança. Sonho de criança com falta de hormônio.
–Pelo amor de Arceus, Liam! Eu não quero apenas trabalhar e receber o negócio de meu pai.
–Você vai ficar rico, zilionário!
–Eu quero me divertir.
–Ora! Vá à festa, uma boate streap tease, vá beber! Viaje o mundo, mas nada de jornada.
–Acho jornadas mais interessantes... Fazer amigos e lutar, isso é legal.
–Luta com Pokémons... Você nunca viu UFC?
–Já, mas os lutadores não têm poderzinhos.
–Essa é a graça.
–Não acho graça nenhuma.
Violet encarou Tom, que a fitou. Em uma fração de segundos ela voltou à atenção pra frente.
Tom sentia algo forte por ela, sem nem ao menos dizer uma palavra pra ela.
Mas mesmo assim, tirou-a da cabeça e focalizou nos desenhos no quadro.
Depois de horas, o sinal do recreio bateu.
Liam reuniu alguns meninos frescos e frangotes, que amavam mostrar a carteira do pai.
Tom não gostava muito de andar com eles. Sua mente se tornava mais e mais egoísta quando ficava perto deles.
–Olhe quem eu trousse! – disse Liam, que mostrara Violet Bodeller ao seu lado.
O coração de Tom bateu mais forte e ele começou a corar. Os raios de sol batendo nela e iluminando seu rosto lindo o fez gamar.
–Olá garotos! – disse ela acenando com seus dedos finos e inocentes.
–Ah... Oi. – Tom respondeu por último. –Gosta de treinadores? – disse rapidamente, como se as palavras fossem cuspidas. “Merda!” pensou.
Os garotos riram e ela também.
–Prazer em conhecê-lo também. E sim, estou bem. – usou um pouco de uma ironia inocente. –Nunca vi um treinador.
–Você tem Pokémons?
–Infelizmente não.
–Se interessa?
Ela levou a mão ao queixo.
–Hmn... – pensou. –Um pouco. Não tenho muita coragem de sair por aí sozinha... Mas confesso que já quis, mas também quero trabalhar seriamente.
–Você é filha de Evan Bodeller, certo? Dono da Avon.
–Sim. Notícias se espalham rápido, por aqui... – disse levantando as sobrancelhas finas.
Liam engoliu seco.
–Numa escola de gente mesquinha, tudo espalha rápido. – comentou Thomas
Ela riu e os outros garotos se incomodaram com o comentário.
–Porque não vem à minha casa na sexta-feira? Podemos ver alguns filmes e nos conhecer.
Tom corou.
–Hei gente! – disse Liam. –Estou aqui ainda. E adoraria ir à sua casa. – emitiu um sorriso travesso.
–Claro. Mas vou ver com meu pai. Posso levar meu Pokémon?
Violet mostrou outro sorriso.
–Adoraria. Qual é?
–Um Totodile.
–Gosto de Pokémons aquáticos. – ela se virou e saiu de cena.
Thomas Allen sorriu de orelha a orelha. Ele acatou o celular rapidamente e anotou na agenda.
–Sexta-feira na casa da Violet... Anotado.