.001 - Arrival

Era engraçado pensar que Anthony não sabia explicar tão bem sobre as espécies de pokemons de Fiore, reiterando a hipótese das meninas; era comum que os nascidos em regiões onde a captura é cultural soubessem quase tudo sobre a fauna e a flora de onde vieram. A pergunta do protagonista deu margem para que falassem disso o dia todo, mas não o fariam. Roma podia até tentar introduzir algum muito novo, já que ninguém da mesa conhecia Alola, porém Jenny sabia que tudo que poderia dizer seria vivenciado logo mais, sendo assim, respondeu pouco:

- Bem, aqui é o sistema de capturas que você já conhece né. Tem dois pokemons, deve saber melhor que eu... - Iniciou Jenny - Depois disso é treino e mais treino, os pokemons ficam fortes por meio de lutas e assim vão se formando times e treinadores maiores. Em geral eles acabam indo para os ginásios batalhar. Conseguir mais dinheiro e mais itens para ficar cada vez mais forte. De época em época em alguns torneios abertos que são bem divertidos de ver! Todos televisionados... Ah é! Tem os torneios de beleza também, a gente chama de Contest. É para você mostrar sincronia com seu pokemon e essas coisas....
- Oh, lá em Alola não tem essa de ginásio igual as maiorias dos continentes com treinadores, lá você passa por umas missões, com orientadores. Se você passar por elas ganha um poder com "buff"... não consigo pensar em outro nome pra isso - Acrescentou Roma - E lá é legal que as quatro ilhas são bem separadas, ai acaba que cada uma tem um fauna bem diferentes. A mesma espécie de pokemon acaba crescendo de formas diferentes dependendo de onde ele é, ai tem muita diversidade - Finalizou.
- Ah, isso é interessante, porque aqui você acaba encontrando Zigzagoom e Nincada em todos os lugares, muitos treinadores iniciantes acabam frustrados - Reclamou Jenny; por querer ser coordenadora, nenhum dos dois pokemons eram muito interessante - Você capturou Pichu aqui, Anthony? É um pokemon bastante raro para um treinador iniciante... ele é vendido bem caro no mercado ilegal - Explicou.

Era evidente que nenhuma das duas imaginavam que a história de Pichu seria tão problemática de se contar; a curiosidade falou alto o suficiente para trazer a pergunta à mesa, e com ela, um bom gole e mais um copo de cerveja. Roma já enchia novamente os três copos, agora vazios, e começava uma nova rodada.

Saíra bem da proposta colocada; Pichu era um pokemon polêmico e, por mais fofo e raro que fosse, sua história era bastante carreada de stigma, isto porque Anthony nem sabe ao certo de onde ele viera. Era sem dúvidas muito novo, porém já cheio de más lembranças.
A conversa correu por outro caminho; graças ao protagonista, que resolveu trazer um tópico à tona, coisa que não fizera até então. Indagando sobre o mercado ilegal, Roma só se emudecera e escutou; Alola é pequeno demais para se criar máfias tão complexas, é fácil acessar qualquer espaço e desconfigurar os pontos de tensões. Não há muita violência ou tráfico, para não dizer nenhuma, porém Hoenn era um continente extenso, com uma infinidade de Biomas e isto não facilitava em nada a ação de políticas públicas:

- Pior que é; acho que todo o centro urbano tem um ou outro ponto, que muda de vez em sempre, pra venda de itens ou pokemons ilegais. Eles costumam vir muito machucados, com a felicidade negativada e dificilmente se dão bem com os treinadores, mas eles continuam comprando! Tem de tudo por lá; desde bebês até adultos de diferentes cores, vindos de vários lugares do mundo. O mais comum são bebês e pokemons fofos, como seu Pichu, que vários lares domésticos compram só para fazer de estimação - Explicou Jenny - É bom por um lado, pelo menos tiram eles daquele ambiente hostil, mas por outro, se ninguém comprasse, não teriam essas formas de tortura e captura tão horríveis - Finalizou.
- Eles tratam pokemon que nem qualquer pesca ou caça... - Acrescentou Roma, bastante triste com o relato - Ouvi dizer que também roubam pokemons de treinadores. Eles tentam de tudo - Comentou, sendo confirmada por Jenny, com um pequeno balançar de cabeças.
Ao fim destas falas, o garçom já chegava com uma segunda garrafa, enchendo o copo dos três e largando-a sobre a mesa.

Fora com a frase de Anthony que Jenny parou o que tudo que estava fazendo e coçou a cabeça. Roma apenas observara essa parte do assunto, o longo gole do garoto e o coçar de cabeça de Jenny eram pequenos gestos que simbolizavam algo, algo que ela não sabia ao certo dizer o que. Via neles um incômodo, seja pessoal ou global; um incomodo genuíno com o assunto. Era este o ponto da conversa que Roma preferira não interferir, até porque mudar de assunto não garantiria que o incomodo passasse e, bem, falar sobre ele, também não. Manteve-se estática até alguém da dupla iniciar uma nova dialética e, felizmente (ou não) Jenny o fez, de maneira honesta:
- E o que a gente faz com isso? - Indagou e se emudeceu.

Esta pergunta fora um gatilho; dai a mesa se emudeceu, até o garçom passara longe da atmosfera. Acho que ninguém ali gostava muito da ideia do conformismo quanto ao tráfico de seres vivos, e a experiência positiva de Anthony parecia dizer as garotas que há o que fazer sobre, mas o que? Pouco sabiam dizer sobre. Podiam começar com pequenas e leves denúncias, ou ao menos descobrir mais sobre o assunto. Podiam só não fazer nada (o de praxe) ou ainda desafiar alguém mil vezes mais forte e perder. Podiam arriscar suas vidas e seus pokemons em um plano maluco, ou não. Ainda que escolhessem a primeira opção; nada garantiriam que fosse possível pensar em algo de tamanha magnitude sem conhecer absolutamente nada de Slateport, porque convenhamos, a única nascida de Hoenn é do interior, e não do centro urbano.

De fato, o pensamento de Anthony era como o de todos ali; não tinham o que fazer por hora. Se um dia tivessem, fariam, certo? Bem, é o que o bom senso diz. Esperemos que seja real; ali naquele bar não estavam jogando nenhum "jogo da verdade"; não precisavam saber ao certo os passos futuros para falar sobre. O futuro é incerto, as aventuras que irão vir também e não há mais porque ir afundo sobre, né? As duas concordavam um pouco com isso, decidiram então matar o assunto por ali; até criariam outro, mas não sem antes dar uma boa olhada no entorno.

Conversa ia e vinha, era já a segunda garrafa do bar e, para quem não está acostumado a beber, isso já era bastante. Jenny ficava um pouco animada e ia ao banheiro pela primeira vez, Roma resistiu mais um pouco. O estabelecimento agora já não tinham só o trio, ganhara uma grande família ao fundo e quatro ou cinco pares de amigos, que bebiam bem próximos da faixa, como nossos protagonistas. O clima fechara um pouco; o súbito sol cessou e deu lugar a leves nuvens e um vento chato, porém fraco. A orla da praia ficava deserta, porém todos os estabelecimentos em volta pareciam ter ao menos duas ou três pessoas. Sorveterias, lanchonetes, bancos. Era ai que Roma olhara no relógio:
- Oh, onze horas, já já é hora do almoço - Explicou - A gente pode pedir algo quando a Jenny voltar...

Detalhe importante; Jenny não voltara ainda do banheiro. Estava a dois ou três minutos lá. Era um tempo normal para uma ida ao banheiro, mas a barriga de Anthony já começava a conclamar por pedidos.

Era engraçado, mas Jenny não voltou logo. Nem demorou muito; ela simplesmente não voltou. Ficaram ali por algum tempo esperando, até Roma se sentir verdadeiramente incomodada com o silêncio constrangedor e com a demora da nova amiga e ir lá ver se estava tudo bem. Pediu licença sem explicar suas verdadeiras intenções e foi ao banheiro.

A sucessão de acontecimentos Anthony não tinha como saber; não só era impossibilitado de entrar no banheiro feminino como também não tinha acesso a cabeça de nenhuma das duas garotas, porém o mais importante veio em seguida. Ao contrário de Jenny, Roma não demorou mais que alguns segundos para voltar, por as duas mãos na mesa e dizer:
- A Jenny não ta no banheiro - Divulgou, um pouco alto demais.

Ouvir isto até mobilizou as pessoas em volta; agora a mesa dos dois se tornara o centro das atenções, porém ninguém havia dito nada ainda. Julgaram se tratar de mais uma menina que ia embora sem pagar sua parte da conta, mas era de fato esta a questão? Roma pensara o pior. Preocupada, não conseguia mais sentar, andou de um lado para o outro infindáveis vezes e, quando finalmente parou, deu uma ideia a Anthony:
- Vem comigo perguntar aos funcionários se eles viram ela saindo... Isso não faz sentido.