[Personagem Secundário] 00 - Amin

OFF: Em suma, começando a jornada em Fortree com um Sneasel...

O cheiro de fumaça me incomoda, o que é bastante irônico, eu diria. Eu vim para Fortree justamente evitar os carros e as pistas, mas ao acender meu cigarro-branco, a cortina de fumaça que sopro ao vento, retorna.

Não tusso, claro que não… mas sinto um incômodo.

O prazer de fumar é justamente jogar para fora o resto de poluição que consumo. É brincar com o desprazer. É aproveitar o balanço do pra-lá-e-pra-cá da respiração. Eu não consigo aceitar a ideia de jogar ao mundo uma bela fumaça e simplesmente tê-la de volta.
Pensando bem, é justo né?! “Toma conta do que é seu”, diz Deus para mim. Brigar com a natureza é no mínimo um insulto da minha parte. Eu vim aqui justamente para isso: para naturalizar.

Era cedo… cedo demais para beber, tarde demais para dormir. Levantei da rede de fibra-de-coco que amarrei nos caules que não faltam de Fortree. Catei-a para mim, guardei-a na bolsa e ajeitei meu Keffyieh. Abri meu pano-liso, estendi no chão, ajoelhei-me e pedi benção ao meu Deus.
Eu não conversaria muito com ele agora… era cedo demais para isso. Era só o processo de apagar o cigarro, agachar-me devagar, por-me em contato com o chão barroso e pedir por proteção.

Eu sabia que a partir de hoje as coisas poderiam mudar. Um ex-militar me mandara um pombo correio perguntando sobre meu paradeiro. Dei a ele uma belíssima resposta: “não te interessa”. É claro que ele se preocupou… quando me contatou de novo, fiquei tão envergonhado de respondê-lo bêbado que tive que reaver minha resposta.
Ao Delibird que me alcançou, dei-lhe a seguintes boas notícias: “não recebi sua primeira mensagem, talvez algum guri tenha pego e lhe enviado isso como trote” menti, tirando de mim a responsabilidade que, na verdade, era do álcool. “Estou por Johto, mas pretendo ir para Hoenn. Essa repovoação não me cai bem”.

Numa segunda semana, o Delibird me trouxera um convite. Chá-de-bebê em Fortree. Claro que eu não fui, né?! Parece banalidade de quem tem dinheiro, e não tenho nem o que comprar para uma criança. Tenho nem dinheiro para mim! Só sei que ele ficou um pouco revoltado pela minha ausência, mandara um novo pombo-correio com um recado enfurecido: “eu tento… eu tento! Mas quando a pessoa não quer ser ajudada é foda!”.

É, é foda mesmo… rapaz. Eu não lembro seu nome, para ser sincera… só sei quem é tu por causa da escrita borrada. Eu lembro que você perdeu um braço no exército e com a outra mão escrevia tudo trêmulo.

Definitivamente é só por isso que eu lembro de ti.

Ainda assim acho que já te provoquei demais, né?! Ah… não… pensando melhor, da pra brincar mais um pouco: “Me desculpe, tive um imprevisto! Não pude ir, minha sobrinha quebrou o pé e precisei levá-la no hospital”.

Não bicho… se você leu minha história você sabe, eu não tenho sobrinha. Na verdade, não tenho mais ninguém. Esse ai certamente não me conhece já que caiu nessa. Foi bem fácil vê-lo responder preocupado e marcando um encontro num bar. Só ai ele falou minha língua! Já fui imaginando que ele pagasse.

Foi num sábado de futebol. Eu bebi tanta rodada dupla na conta dele que não lembro de quase nada do dia… só de quando ele me falou que queria me dar algo. Se eu tivesse em condições normais, eu certamente recusaria o ‘presente de doido’ que ele me deu. Como eu tava ‘para-lá-de-bagdá’, eu acabei tomando nas mãos aquela esfera maluca.

E agora estou aqui, com a merda de um dispositivo bicolor em mãos - que eu ainda não abri -, pedindo para que Alá me ajude com essa aquisição (ou o descarte dela). Caminhei até o pé da rota 120, desci a escadaria de madeira em pulos, olhei para o céu, ergui um dos braços e questionei:
- Porque ainda tenta me dar oportunidades como essa, pai?! Não vê que não tem mais mundo para mim? - Óbvio que me arrependi logo em seguida do que falei - Se me destes, eu aceito… mas o que queres que eu faça? Se for para devolver ao seu mundo, devolverei.

Como todo o bom fiel, acredito no que me convém. Se Ele nada disse, temo que estou certo. Irei até lá me livrar deste pokémon…
- po-ké-mon… é até difícil pra mim pronunciar essa palavra - E era mesmo. Era tão incrédulo ter um bichano que nem sei como descobri-lo.
Mexi, remexi, chacoalhei e… puff. Finalmente apertei o botão central que revelou para mim um gatuno noturno, pelagem negra, penas vermelhas, garras afiadas e brancas e rosto bem (mas BEM) estressadinho.
Só ai eu rememorei o papo daquele pilantra de “ele é um amorzinho, é que meu filho tem alergia, ai vou ter que me virar”. Aquele salafrário vai ter que me reembolsar… ele realmente achou que ISSO ia me fazer bem?!