Treino Difícil, Combate Fácil!

Imaginando que talvez as frutas roídas seriam úteis não apenas para descobrir os rastros de algum selvagem, mas como também poderiam ter alguma propriedade interessante como um dos itens que carregava, o monotreinador acreditou que valeria a pena guardar o resto da maçã para analisar posteriormente se, por algum acaso, seria igual ao seu Leftlovers.

Isto feito, se concentrou então nas cascas deixadas para trás. Não eram muitas - em fato, desconsiderando aquela guardada pelo rapaz, apenas mais três estavam espalhadas pelo chão, largadas de qualquer jeito entre as duas caçambas. Com uma inspeção mais cuidadosa, entretanto, era possível reparar em alguns pedaços brancos e alaranjados (possivelmente da laranja saboreada por sabe-se lá o quê) que seguiam caminho em direção à entrada oposta da passagem, ultrapassando as duas grandes lixeiras. Os rastros, infelizmente, não iam muito além, e se findavam com aquela última pista, alguns metros após a última caçamba.

Enquanto o monotreinador parecia ansioso para qualquer tipo de ação ou chances de nocautear algum pokémon desprevenido, o universo brincava com com esse sentimento ao presentear-lhe apenas com pistas e falsas (pelo menos, até o momento) esperanças. Quem sabe, aliás, se não seria a própria natureza comunhando com a cidade que, sentindo nas raízes as intenções do treinador, tentava atrasá-lo o máximo possível? Bem, claro, isso nada mais que uma hipótese que corria com o vento.

Vento esse, aliás, que foi forçado a trabalhar em prol de Gray, quando o adolescente colocou Drifblim à sua disposição outra vez. Como se seu corpo não tivesse peso algum, o balão flutuou acima do beco, das estruturas ao redor e, por um momento, sumiu de vista, ao vagar para cima dos prédios. Enquanto isso, o trio fantasmagórico era obrigado a aguardar pacientemente seu retorno - ou não tanto assim, e o rapaz já se preparava com alguns planos caso a busca do voador não fosse bem sucedida.

Levaram alguns minutos sem nenhuma notícia do balão, o que levou o jovem a colocar algumas de suas ideias em ação, montando um projeto de armadilha com seus pokémons, que apenas aguardaram, uns mais pacientes que outros. O vazio do beco, àquela altura, deveria se comparar até mesmo com o interior de Dusclops, e os ponteiros do relógio pareciam correr em câmera lenta. Até que, finalmente, uma sombra começou a descer pelas paredes da passagem! Dhelmise, em prontidão, quase de imediato se atirou na direção da suposta aparição, mas foi interrompido por um cry conhecido e estridente de susto - Mr. Drif!

O fantasma aéreo encarava a âncora com devida frustração, e pareceu até mesmo despejar algumas reclamações no leme, que era obrigado a ouvir sem muitas chances de contestação. Felizmente (talvez para Jones), não levou muito tempo até que se tranquilizasse e reparasse também na presença de Gray. Com um grunhido ainda meio chateado, o voador balançou suas fitas no ar, e deu as costas para o grupo antes de seguir flutuante em direção à passagem oposta do beco, cujo destino ainda era desconhecida pelo treinador. Parecia querer que o seguisse!

E então?

Incapaz de enxergar uma alternativa melhor, o monotreinador e sua equipe resolveram abandonar sua tocaia para seguir o companheiro voador e descobrir que tipo de resultado ele teria conquistado durante aquela curta longa busca. Caminharam então, sem pressa, ao longo do beco, se aproximando cada vez mais da claridade que escoava do outro lado para as paredes do encontro dos corredores. Quando o grupo virou a curva, puderam descobrir também que a passagem que ligava os corredores não era tão longa, considerando que não precisaram de muito mais que alguns passos para desembocar em outra área.

Ao contrário do lugar onde estavam, o novo espaço era mais aberto - e com mais verde. Alguns metros à frente, um pequeno laguinho se abria no meio da cidade, com apenas duas árvores médias se erguendo na área verde. Ao seu redor, três brancos de madeira estavam espalhados, momentaneamente vazios. Atrás de um deles, porém, parecia haver uma movimentação agitada, embora não fosse possível para o rapaz definir ao certo o que seria, vendo daquele ângulo...

Deveria se aproximar, talvez?

Poucas coisas são fortes como o coração de um treinador que não se permite esquecer a emoção da caçada, busca e, mais importante, encontro de um novo pokémon. Naquele momento, Gray era o mais perfeito exemplo dessa situação, a ansiedade gradualmente correndo por suas veias enquanto se aproximava em silêncio da aparente movimentação atrás de um dos bancos. Dave Jones foi aquele enviado por seu mestre para uma investigação primária, e o fantasma se aproximou da margem do laguinho antes de afundar silenciosamente, submergindo nas águas.

Não foi necessário muito tempo antes que retornasse, dessa vez na margem oposta - mas foi suficiente para que, contornando a área, Gray pudesse acompanhar de longe a situação que se desenrolava. Atrás de um dos bancos, dois pequenos pokémons faziam um verdadeiro "cabo-de-guerra" com uma ameixa: Um pássaro agarrava a fruta entre suas patas e brigava para tentar alçar voo, enquanto um coelho de pelagem amarelada lutava para conseguir segurar ela em mãos. Parecia um conflito extremamente disputado, que foi facilmente solucionado com a aparição da âncora, que cresceu pelas costas do bípede - consequentemente, o voador foi o primeiro alertado de sua presença e, num pio alto e assustado, largou a fruta de uma vez, fazendo com que o seu adversário caísse sentado, e fugiu num rasante repentino, batendo as asas com força e sem olhar para trás.

Já o outro pokémon… Primeiro, pareceu confuso com o desfecho brusco da disputa, mas num segundo momento começou a cantar vitória, balançando o lanche para lá e para cá… Bem, pelo menos até reparar na sombra que cobriu seu corpo, vinda do nada. O coelho parou por alguns segundos, e virou o rosto para dar de cara com Dhelmise, que o observava pacientemente. Num pulo, o animal se pôs de pé outra vez, e encarou o gramíneo com uma cara desconfiada. Ao contrário do pássaro anteriormente, porém, não fugiu, e sequer foi agressivo: Sua maior reação foi abraçar a ameixa e virar um pouco o corpo pro outro lado, como que protegendo a fruta do fantasma - então, sem tirar os olhos dele, abaixou um pouco o rosto, dando uma mordida vagarosa no alimento.


Como Gray lidaria com a situação?

Pelo menos até o momento, era impossível dizer ao certo se a atitude do pokémon era frustrante ou não para o treinador - afinal, era mais que óbvio o fato de que o rapaz esperava por uma batalha, mas se o animal não parecia propenso à fugir ou à brigar, por qual motivo deveria forçar? Foi por isso que, contra todas as pretensões que tinha até então, Gray abandonou (pelo menos por hora) a ideia de iniciar um combate e tratou de tentar uma abordagem amigável, oferecendo uma fruta ao coelho bicolor.

Num primeiro momento, a reação do pokémon ao ouvir a voz foi se encolher e dar as costas para Dhelmise novamente, encarando o adolescente de cabelos cinzentos, e deu alguns passos para trás, inquieto - batendo, suave, o corpo contra parte do corpo de Dave Jones, que observou em silêncio enquanto seu leme se movia para lá e para cá. Agora mais próximo, o monotreinador possuía passe livre para obter uma visão melhor do espécime - o jeito como seus pelos estavam bagunçados, maltratados e até meio sujos, em algumas áreas. O elétrico encarou o rapaz por alguns segundos, agarrado com sua ameixa, mas não foi muito mais além do que os pequenos passos em recuo. Tinha uma expressão séria, desconfiada... Mas, ao mesmo tempo e em contrapartida, não parecia hesitante com o fato de estar escorado em Jones.

E então?