Rumo ao olho da tempestade.

rumo ao olho da tempestade

Tudo parecia ir bem, agora, Gray havia derrotado os dois pássaros bullies e salvo o pobre Shuckle de ser comido por eles; ainda assim, a tartaruga reagira com certo desprezo ao garoto, e isso ficara bem expresso na maneira em que se posicionava, pronta para derrota-lo. Contudo, capturar o bicho não era uma opção, e apesar da repulsa, o jovem não ajudava para ser recompensado e sim apenas pelo fato de salvar alguém; de fato uma atitude curiosa para uma pessoa sombria como ele. Pressupõe-se que treinadores de fantasmas são pessoas antissociais e até levemente psicopatas, mas não era o caso deste mono treinador aqui; ele sempre fora uma boa pessoa e ajudara o máximo que conseguia, mesmo que sua índole estivesse em cheque, acabaria arranjando uma maneira de sair por cima, e isso estava bem óbvio.

Desinteressado com a tartaruga/lagarta, o rapaz então despediu-se da mesma, o que a deixou ainda mais furiosa (sendo sua reação a de esconder-se em seu próprio casco), mas nada com que ele tivesse de se preocupar; buscando voltar a posição inicial, onde antes estava o garoto que dizia ter encontrado um lendário, nosso protagonista caminhou por certo tempo junto com seus campeões, mas nada encontrou. Aliás, estava até meio estranho, ele não encontrava mais nenhum outro treinador por ali, o que era o completo oposto da situação inicial da 121, onde diversos outros treinadores buscavam Pokémon e batalhas para treinar; a lua já não brilhava mais no céu, escondida por nuvens, e uma névoa parecia ser criada com a queda de temperatura da noite misturada a chuva incessante. Aparentemente, o clima daquele lugar parecia estar cada vez mais estranho.

Ainda andando pela região, Gray não encontrava mais nada além de névoa e árvores caídas meio a torrente de água que também não parava; imaginando o que poderia ter acontecido, algumas hipóteses poderiam ser levantadas. Talvez todos tenham ido em direção ao outro garoto, que chamar anteriormente, e ele tivesse realmente encontrado um lendário o que implicava em todos provavelmente estarem se matando para disputar uma batalha com o mítico; a outra teoria levantava o fato da maioria realmente não ter curiosidade de enfrentar o lugar a noite e o surgimento da névoa intrépida tenha afugentado a todos, ou de volta para suas casas, ou em direção ao Mt. Pyre. Ambas eram ideias interessantes e plausíveis, mas o que chamou de verdade a atenção do grupo fora uma silhueta suspeita meio a neblina, assemelhando-se a um homem e algo indeterminável que poderia muito bem se tratar de um Pokémon; talvez fosse alguém perdido, ou só algum jovenzinho corajoso que estava procurando monstrinhos por ali. O mestre fantasma poderia ir até ele, já que o mesmo não parecia notar a presença deste, mas também poderia ir caçar outros exóticos Pokémon, nada impedia.

rumo ao olho da tempestade

Interessado em descobrir o que havia acontecido por ali, o jovem treinador acabou por liberar quase todos os seus Pokémon, com exceção de seu Dhelmise que de fato não teria utilidade ali; apesar disso, Conde e Lighthalzen foram muito propícios a lidarem com tudo aquilo, visto suas habilidades de encontrar pesadelos e almas atormentadas, respectivamente; a névoa parecia realmente estranha mas comum para tipos fantasma, né? Quer dizer, fantasmas costumavam viver em regiões desse tipo, assombradas ou com grandes concentrações de almas perdidas, e névoa era algo que geralmente existia nesse tipo de local, e assim se assemelhava bastante com a condição que o mono treinador se encontrava no momento. Não que isso fosse um filme clichê de terror, mas estava bem próximo, de fato.

Conde e ~X~Kull foram procurando a frente, os dois maiores do grupo seguiam como protetores, seguindo qualquer sinal ectoplasmático que pudessem encontrar, enquanto Light apenas iluminava o caminho a frente de Gray e Rag Doll se mantinha pouco atrás dos dois primeiros; a névoa não parecia densa, contudo eles não conseguiam enxergar muito, visto a falta de luz da lua e a chama produzida por seu Lampent não ser potente o suficiente para iluminar completamente o local. Ainda assim, o caminho parecia sem alguma modificação, ele seguia a frente, sempre a frente; até de forma estranha, o trajeto parecia interminável e não havia sequer um sinal de vida por ali; Conde notou uma energia estranha tomar conta de si, e percebeu então, num insight, que tudo aquilo se tratava de uma grande ilusão. Flutuou até seu mestre, mostrando em uma pequena esfera de energia fantasmagórica a realidade, onde os treinadores realmente estavam; ele poderia aumentar aquilo o suficiente para o cinzento passar, se retornasse os outros Pokémon, mas alguém deveria ter colocado ele ali dentro por algum motivo, e quem sabe o que ele poderia descobrir ali? Quem sabe o que poderia haver dentro daquela "realidade alternativa"? Entretanto, estaria Gray preparado para enfrentar algo assim? As recompensas poderiam ser grandes, mas o risco também era; ao fim, ficava a critério do garoto decidir o que fazer.

rumo ao olho da tempestade

Fugir não era uma opção, Gray sabia disso e queria aceitar tal destino, ficaria ali naquela dimensão pensando no que poderia acontecer e no que ele ainda poderia encontrar por ali; talvez algum Pokémon raro ou item especial, não dava para se ter certeza ainda mais se tratando de uma realidade alternativa. Quer dizer, era mesmo uma realidade alternativa? Aquilo poderia ter sido causado por qualquer um, e até mesmo por algum de seus próprio Pokémon querendo pregar uma peça no mono; quem realmente sabe o que era aquilo deveria estar enfiado nas entranhas daquele local, e o garoto teria de percorrer um longo caminho se quisesse chegar lá. Contudo, aquela atitude parecia algo bastante eficiente e provavelmente daria resultado, visto a capacidade de seus diversos monstrinhos e a força que todos continham; o rapaz não era um treinador qualquer, ele era forte e sabia disso, e de fato não havia nada de errado em usar todo esse poderio a seu favor.

Lançando por fim seu último fantasma, a âncora invocada logo se prendia ao chão e rangia suas correntes ao mestre, como quem dizia que estava preparada para qualquer coisa que acontecesse; como uma resposta mais demorada, Jones lançou um de seus elos de corrente ao treinador, amarrando em sua mão e logo o fazendo desaparecer; aquele seria seu passe livre. Se precisasse fugir, deveria puxar e Dave o traria de volta ali, mas esse não era o plano principal (nem mesmo o secundário). O treinador passava então a caçar em cada canto do lugar, por qualquer coisa que tivesse sinal de energia vital ou coisa parecida; mas nem ele, nem seus fantasmas tiveram sucesso. Todavia, ele logo conheceria o dono de toda aquela ilusão, e talvez se arrependesse de tê-lo procurado; ao longe, atrás de todas as árvores ele via um Pokémon amarelado com silhueta humana andando em direção a direita, e que logo desapareceu para dar origem a uma pequena casa que parecia ter saído diretamente do livro de João e Maria; tijolos e paredes de doces com árvores de pirulitos e teto de marshmellow. Aquilo não passava de algo criado pelo monstrinho ali antes presente, mas realmente parecia bem real; seria aquele o próximo destino do rapaz ou procuraria por outras pistas?

rumo ao olho da tempestade

A âncora ali não era só física, os efeitos fantasmagóricos de Dhelmise permitiam que ele fosse capaz de segurar a todos de forma espiritual e assim mantê-los seguros caso algo acontecesse; era realmente uma habilidade bastante útil, mas até onde isso levaria? Seria a corrente dele eterna ou tinha algum limite físico? Em breve, provavelmente, descobririam. Buscando analisar o máximo possível do local, Gray comandou que Mr. Driff seguisse pelo alto seus passos, e isso garantia que nada o surpreendesse, mesmo o Pokémon estranho que aparecera por agora, havia sido denunciado pelo balão antes e isso fez com que o treinador pudesse segui-lo com cautela e sem ser notado. Acompanhando o intruso, nosso protagonista viu a casa de doces se formar e um sorriso abriu em seus lábios; ele estava em casa, e sabia disso. Para alguém com seu passado e com a tipagem que dominava, tudo ali era bastante tranquilo para ele, sequer expressava algum medo ou receio da situação e só garantia que agiria com calma se necessário.

Arrumando seus equipamentos o jovem seguiu até a entrada do casebre, analisando melhor seus componentes e vendo que muitos deles começavam a se estragar e necrosar conforme ele e seus Pokémon se aproximavam dela, como se estivesse reagindo a morte que ele carregava consigo; um som de órgão foi ouvido ao fundo, e não parou mais de tocar. Aparentemente, o instrumento estava sendo tocado dentro da casa, e não demorou para que o jovem encontrasse seu dono; lá, uma garota, de cabelo louro e pele esbranquiçada como a neve tocada o grande piano. Com um detalhe logo notado pelo acinzentado: ela tinha duas cabeças; não era duas cabeças apenas, era um tronco que se dividia em dois, mas mantinha-se unido do abdômen para baixo, o que expressava a siamês de ambas. Uma delas tinha cabelo chanel, e usava um laço azulado na cabeça; esta parecia mais triste, brava com tudo que acontecia e sequer parecia estar realmente tocando ali. Quem realmente parecia feliz com aquilo era a outra cabeça, a que tinha um grande e encaracolado cabelo e que balançava conforme sua parte do tronco também o fazia, ao som da música.

Esta última sorria como quem estivesse realmente se divertindo, enquanto a outra cerrava o punho ao seu lado do corpo e era protestada pela mais feliz; num soneto ela finalizou a música, para impedir que a outra parasse de lhe interromper. Afastando-se da mesa, elas levantaram e se viraram na direção do jovem invasor, e foi então que ele notou seus belos olhos negros, sem pupila ou íris. - Você deve ser quem ela estava esperando. - Disse a cacheada. - Eu sou Ping, e essa é a Pong. - Apontou para a de chanel que mal reagiu aquilo, cruzando seu lado do braço e virando o rosto. - Ela não gosta muito de interagir, mas eu sou o completo contrário. - Riu colocando a mão a frente do rosto, de uma forma bem estranha e maníaca. - Bom, você será testado aqui, para chegar até a mestra. Se quiser, é claro. - Sorrindo, ela esticou uma mão a ele esperando a decisão do garoto. - O que me diz?  

rumo ao olho da tempestade

Os aplausos de Gray vieram em boa hora, Ping pareceu realmente ter adorado o reconhecimento que ganhara do treinador pelo seu ato, e aquilo estava muito bem estampado em sua face; contudo, Pong ainda o desprezava, mesmo que sem ao menos olhar diretamente para eles, ambos sabiam exatamente o que ela sentia, e era inegável a dor contida ali. Talvez ambas tivessem já passado por tantas coisas que era difícil imaginar, viver num corpo com outra pessoa, com gostos e desejos que diferem dos seus, provavelmente era uma tortura eterna; e de fato compreensível o porquê de P2 ser tão inconformada com sua situação. O movimento de retirar sua cartola para dar a fantasma, e depois revelando um de seus olhos coberto por cicatrizes realmente era como um cortejo para P1, ela sorria mais do que nunca, como se já estivesse apaixonada pelo cinzento.

- Oh, nobre cavalheiro. - Ela dizia, contendo as mãos juntas próximas ao corpo. - Você é, deveras, muito gentil. - A sorridente parecia imitar um sotaque britânico enquanto atuava, retribuindo o flerte do mono treinador. - A mestra ficará realmente feliz em ver que escolhemos certo, não é Pong? - Questionou a mais animada, recebendo nada além de um revirar de olhos da outra. Ping franziu o cenho e depois riu baixinho. - Escolher? Ah não, você não batalhará conosco. - Disse ela, ainda contendo o riso, mas sem sucesso. - Vai encarar o seu pior pesadelo. - Essa era a primeira vez que a irmã reclusa abria a boca; sua voz era bem mais grossa que a fofa, e isso só tornava tudo mais macabro. - Não fale assim... Você só precisará dormir, e ser protegido por seu Gengar, enquanto o faz. - Sorriu a cacheada, já pegando na mão do rapaz para conduzi-lo a um outro comodo da casa. - Venha, venha, não podemos perder tempo.

Com isso, eles seguiram por um pequeno corredor, antes de chegar a um quarto pouco menor que a sala anterior, e que continha um belo colchão de marshmallow sobre uma estrutura de chocolate. - Ali será seu primeiro teste. - Ping parou ao lado do batente, apontando com a cabeça para o móvel, e esperando que Gray se tocasse de que deveria ir logo deitar lá. - Não se preocupe, tudo será explicado uma vez que estiver no mundo dos sonhos. - Ela sorriu, dessa vez de forma bem mais macabra do que antes, e até mesmo Pong soltou um riso demoníaco, que denunciava as verdadeiras intenções da dupla. Era outra decisão a ser tomada, entraria o treinador no jogo das siamesas? Se fosse fugir, teria de rapidamente convocar Jones, para voltar ao inicio e sair daquele local sinistro.