Dois destinos, Um caminho 1.2

- Me chame de Senhoritx - Respondeu a lagarda, exprimindo um "humph" extremamente expressivo, completamente diferente do anterior; perdera o papel da mágoa e se tornara um próprio nariz em pé - Parece que seu Guia é um démodé. Já não sabe mais nada, se é que soube um dia. A vergonha da profissão.

Nesse momento Fons pode perceber: ela mudara mais uma vez. Dessa vez não tão da água para o vinho assim! Independente disso, estava diferente e talvez por isso decidiu fazer algo tão incomum; levantar e andar. Levantou-se da plataforma e desceu de seu cogumelo com uma leveza estranhamente perfeita, como quem era da mais alta classe de lagartas, até puxara a barra de sua fantasia e revelara o salto alto! Ao descer as escadas soltou uma das mãos do vestido e a estendeu, como quem pede ao cavalheiro Gus auxilio. O restante de suas patinhas estavam bem desordenadas, deixando a entender que o ator não conseguia controlá-las no mesmo tempo em que atua com completo fôlego; bom, certamente ele não seria perfeito, né?! Isso podia quebrar um pouco o clima, ainda assim, era digno de um oscar. Teatros não têm o privilégio de edições visuais que os filmes levam.

Agora pisando ao chão, a lagarta decidiu dar a volta na dupla e findar-se ao meio dos dois. Rachando-os. Ryo ficara por completo deslocado. Tão deslocado que teve que se re-alocar: com um "chega-para-lá" (que mais parecia uma bundada bem disfarçada), acabou sendo empurrado para fora de cena.
- Você não precisa desse estrupício - Fora ao pronunciar essas palavras que o bicho passara uma das mãos por trás dos ombros do nosso novo protagonista solo - Mas então me diga, Monamour. Quer sair ou quer entrar?

A intimidade se tornava algo aclamado. A dificuldade da atuação era estar tão próxima de Fonseca e ainda assim ter que falar alto para que a plateia escute; nessa altura do campeonato podemos confirmar que nosso ator ficará surdo logo mais.

O tom topa-tudo de Gus fora extremamente convidativo à lagarta que, numa espécie de ato infeliz, tratou de guiá-lo por dentro do cenário florestal. Manteve um dos braços por trás dos ombros do rapaz e lhe guiou por ali, controlando intimamente seus passos. Não falou muito: "por aqui" fora uma de suas poucas frases. Seguiram assim até o centro do palco, onde ao fundo duas grandes folhas (provavelmente colocadas só agora, já que não foram percebidas antes) serviam como portal.

O que diabos aconteceria ao entrar?! Bem, Fons não sabia ao certo mas o que o improviso preparou para o rapaz fora uma mudança abrupta. As luzes se apagaram e o cenário ficou bastante escurecido; um neon tornava o chão e o teto visíveis mas, para além disso, tudo era cinzento. Um barulho de ventilação tomou o campo e, num instante, as folhas pareciam voar. As pequenas estruturas que enfeitavam o cenário anteriormente sumiram velozmente: como quem puxava a corda e as tirava do trilho ao teto, como cortinas. Seja lá qual era a técnica, funcionou! Até mesmo o cogumelo aparentava desaparecido.

Infelizmente isso só pode ser notado pela plateia quando a luz se restabeleceu. O fatídico momento de luz mudara por completo o ambiente local; agora sem todas aquelas folhas, a fraca luz branca-e-amarela que ambientavam o ato anterior sumiu e deu lugar à luz-negra e aos lasers multi-coloridos que viajavam por todo o tablado. Uma espécie de discoteca fora montada ao centro e a lagarta puxou-o para lá. O forte barulho de ventilação continuava mas aos poucos a música-eletrônica se sobrepunha ao som; aumentava gradativamente a amplitude e frequência batida.

Não haviam muitos figurantes, salvo um rapaz ao fundo numa espécie de balcão, segurando algumas bebidas. A lagarta manteve-se com o braço bem rente ao pescoço de Gus e levou-o para lá sem falar um pio sequer. O figurante então pareceu ser importante à trama e falou um curto testo:
- Drink me ou Eat me? - Indagou

Falara e a lagarta só rio; ela sabia o que iria acontecer. Ao que parece não havia resposta certa nem errada; ambas dariam no mesmíssimo resultado.
Para a infelicidade de Fons, seu pedido não fora uma ordem. Falou em comer mas nada ganhou; ao invés disso o garçom se animou-se por completo, como quem havia mudado da água para o vinho de repente. Da mesmíssima forma que a lagarta:
- Mas para comer... Tem que batalhar comigo, meu bem. No pain no gain! - Bradou entusiasmado, pulando sobre o balcão e descendo num típico dançar rápido demais - Let's go Dance!

Agarrou o coordenador sem jeito; o ator parecia com medo de machucá-lo mas, ao mesmo tempo, queria forçar o papel. Dessa forma, bateu eu sem braço e agarrou de leve, indicando para que o seguisse. Fora correndo para a pista de dança e tentou puxar Fons consigo; jogou-se para centro da pista e chacoalhou o corpo no ritmo da luz. A batida de fundo agora se tornava alta demais; até cacofônica. O garçom ficou ali, dançando, sem responder à nada e nem iniciar a tal batalha. Entrara no seu limbo e só saíra dez segundos depois, onde deue um pulo para fora e jogou em campo um monstrinho. Um Loudred enfezado até demais.

Agora foi até a margem da pista e lá chamou Gus com um dos dedos:
- Come on, baby - Gritou, num tom provocativo.
Era um rapaz jovem; de fato belo. Seu terno bem cortado lhe deixava formoso mas não combinava em nada com a ocasião; seu cabelo era inicialmente penteado e extremamente coeso e, com os balançares da dança, desprendeu os fios de trás da orelha e trouxe-os para a testa, colando ora ou outra em sua pele suada. Era caucasiano, moreno de cabelo cacheado médio. Seus traços faciais eram bem marcados e seu corpo magro detinha bela postura. Era alto e, talvez pela combinação exótica, soava até sexy chamando Gus para aquela batalha.

A plateia respondeu o monólogo de Fons com uma risada: era um indicativo positivo ao ato. Ainda que não houvesse sentido algum: neste momento ninguém brigara com o rapaz. A menos que Gus considerasse uma batalha de contest uma confusão! Ai sim, poderíamos entender melhor o que queria dizer! Fazia completo sentido: uma apresentação artística numa pista de dança.

Reparando no incomodo notório do protagonista, o coadjuvante ficara um pouco sem jeito; tentou não demonstrar seu rubor mas sentira-se realmente envergonhado. Era só uma atuação, o que mais poderia ser?! Tinha a vantagem do improviso e o trunfo de mudar-de-personalidade quando bem quisesse, já que aquilo parecia comum à peça mas... poderia?! Talvez essa fosse uma questão que Gus precisasse pensar um pouco; porque diabos todos começaram a se alterar assim? A instabilidade virara comum, o que torna estável a própria instabilidade. No mais, tinham uma batalha para fazer e esperavam ao máximo fazê-la bem:
- Oh, vamos aumentar esse som, baby. Use Swagger and Howl.

Era de fato uma chamada bem... alta?! É, era essa a palavra. Felizmente Heracross fora o primeiro a atuar; forçou seu exoesqueleto e fortaleceu sua massa muscular. Ali conseguira alguns pontos e, acima de tudo, força e defesa. Provavelmente precisaria dos dois! Ate porque, o Loudred do outro lado do campo não lhe deixava em paz; logo mais começou a gritar absurdos sobre suas poses, disse que seu fortalecimento mais parecia piada e, principalmente, que era uma baratinha e não um besouro. Isso irritou o inseto ao máximo; sabia que era um "low level" mas não aceitava ser chamado de barata. Seu ataque mais-que-dobrou, ainda assim ficou confuso. Tão confuso que não conseguiu efetuar o próximo golpe; até tentou iniciá-lo, numa posição de fortalecimento, mas não deu certo. Numa força desnecessária, o pokemon acabou por desequilibrar e cair, tomando danos de um golpe comum. O dano fora um pouco maior do que devia; graças às qualidades físicas do pokemon de Gus.

Era vez do pokemon-som continuar o espetáculo: de sua boca uivou. O som fora reverberado pelas suas caixas de som ao topo da cabeça, tomando o estabelecimento por alguns segundos.


Campo: Palco do Teatro de Forina. Nature Power: Tri Attack. Espaço escurecido com lasers como principal foco de luz. Ora ou outra holofotes tomam a pista de dança.

- Oh, continue! Howl twice! - Fora suas únicas falas, seguidas de um pequeno sapateado inaudível e cômico de se ver.



Fons
04
08
Dançarino

Mesmo com o pedido de foco, Heracross não pode obedecer muito bem: ao invés de focar na tal voz-de-Gus, focou-se no adversário errado, mais uma vez se arranhando. Estava tão forte! Aquele auto-flagelar era quase pior que um golpe! Era horrível! Ainda assim o fazia: confusão podia ser cruel. Loundred não parecia se intimidar com isso, num piado alto, refletira o som para suas caixas-sonoras da orelha e se fortaleceu. Era uma bomba de som! Sabia o quão forte podia ser e, por isso, apenas continuou a estratégia.

Nada demais acontecera: agora Heracross conseguia focar e arranhar com a noite seu inimigo. O dano fora alto demais; provável que pelo Swagger. Não ficara para trás um segundo. Devolvera todo o dano que aquela confusão causou em si, empatando a batalha. Isso era bom para um espetáculo de Contest?! Bem, Loundred parecia manter a estratégia, piando mais uma vez e aumentando seu ataque uma terceira vez, igualando ao de Heracross.


Campo: Palco do Teatro de Forina. Nature Power: Tri Attack. Espaço escurecido com lasers como principal foco de luz. Ora ou outra holofotes tomam a pista de dança.


Nessa altura do campeonato, o dançarino-garçom já não agia mais. O holofote era dos monstros: não havia o que dizer, o que atuar e nem o que tramar. Toda a plateia estava atenta naquela dança-ofensiva, que mais parecia uma batalha de verdade.

Fons
08
14
Dançarino