Ato 06 — Flashes.

Tão rápido quanto fora o convite para um embate amistoso por parte do louro, os treinadores entreolharam-se, tornando na direção da dupla mais à frente. Sem delongas, concordaram em participar de uma luta dois contra dois, contanto que fosse rápida; a outra condição era que Nicholas e Emma dessem os primeiros comandos — ao menos o kantoniano lembrou, mesmo que ínfimo, o desafio de ginásio.

Os treinadores recolhiam os monstrinhos usados no combate anterior para as suas cápsulas, sem alguma condição de luta. Liberaram, a seguir, dois monstrinhos peculiares, com características intrínsecas às espécies não naturais de Hoenn: dois roedores que, segundo um dos garotos, foram capturados na rota dez. Por coincidência, foi por lá que Nicholas esteve ao regressar à terra natal — onde capturou Rockruff, Ponyta e seu estimado Dhelmise.

E sem muitas delongas para enfrentar Gumshoos e Raticate, materializaram Charmeleon e Kirlia, os escolhidos pela dupla para acompanharem naquela expedição à rota cento e catorze; outrora, tiveram sinergia ímpar para enfrentar o trio de guaxinins selvagens. Agora, dois monstrinhos aparentemente bem treinados e poderiam levá-los a uma melindrosa situação de combate caso não se planejassem — quiçá, tivessem azar também.

Deram, enfim os comandos para o combate.

— Charmeleon, Will-o-Wisp em Gumshoos; repita se não der certo. Depois, o mesmo golpe em Raticate — ordenou Nicholas, semicerrando suas pálpebras, os olhos anis seguiam inquietos sempre vagando entre os quatro combatentes.

— Vai pra trás do Charmeleon, Kirlia, tenta evitar o combate corpo a corpo ao máximo. Depois, dois do seu Disarming Voice! — enérgica, empolgada e otimista, a kalosiana pedia ao seu psíquico, juntando as mãos com um sutil toque de preocupação com a dupla escolhida por ela e Nicholas.

O cenho distorcia-se após os ditos debochados daquela dupla. Nicholas erguera uma de suas sobrancelhas e o lábio superior torcia-se, indicando claro desdém aos treinadores. Lentamente, o pescoço curvou-se e ângulo agudo com a horizontal, deixando que os orbes anis dançassem, olhando os dois de cima abaixo.

— Vocês dois realmente acham que eu tô levando isso aqui a sério? Se eu quisesse, poderia fazer isso aqui brincadeira de criança, seus inúteis — inferia, um sorriso arrogante lhe tingia o lábio.

E imediatamente Emma cutucava o louro com discrição, fitando-o com olhares sempre ternos. Uma gargalhada inocente quase inaudível irrompia de suas cordas vocais.

— Ei, não precisa ficar assim. Deixa esses idiotas falarem o que quiserem, só se concentra na luta, tá bom? — em tom quase inaudível, a kalosiana dirigia-se ao treinador, único e apenas para ele. Foi necessário apenas inferir aquilo, tornando sua expressão serena para o combate.

Para o azar deles, aquele turno não parecia ter favorecido aos dois. A única ofensiva que obtiveram foi a dose dupla dos ataques de Kirlia, entretanto, as queimaduras distribuídas pelo ígneo foram de utilidade demasiada. Apesar do revés, Nicholas e Emma pensavam em sincronia que era possível sair vitorioso, apesar da situação ímproba que estavam naquela ocasião.

Seus adversários deram os seus comandos, restando, agora, a Nicholas e Emma prosseguirem com o combate.

— Protect e Flamethrower no Gumshoos — exprimiu, ainda com expressão desdenhosa aos dois o kantoniano.

— Vai lá, Kirlia: Disarming Voice e Teleport! — um pouco mais enérgica, a loura pedia à sua psíquica.

Recuperar a sua postura, mesmo que infimamente, era necessário; era fato de que o louro tinha outras opções mais viáveis àquele embate, como seu Slowbro que, facilmente, conseguiu vencer um ginásio sozinho sem problemas — não esqueçamos, claro, a vantagem de tipagens —, ou mesmo seu gastrópode, dono de defesas e vitalidade propícias a um combate em que o ataque fazia a completa diferença à dupla adversária. Apenas deu de ombros para a afirmação provocativa, com os orbes sempre atentos aquela dança intrínseca aos combates entre monstrinhos.

Nicholas e Emma revidaram à altura a ofensiva desmedida dos adversários. O que parecia ser um combate encaminhado à vitória daqueles dois garotos, sofria uma reviravolta excêntrica, quiçá, dando uma ligeira vantagem para os enamorados. E foi com ainda mais desdém que Nico assistia aquela feição convencida esfacelar-se conforme a sequência de ataques se desenrolou; deixou um riso arrogante tingir os finos lábios, fitando-os, o pescoço levemente curvado à horizontal — se outrora era vítima de uma provocação, agora fazia o mesmo.

Mesmo que suas palavras outrora indicassem um incômodo aos insultos, Nicholas mantinha sua intrínseca calma; era arrogante, presunçoso, e não aceitava quaisquer que sejam os ditos que lhe ferissem o ego colossal que carregava em seu âmago. Ademais, manteve-se taciturno; caso seus adversários olhassem para o louro, mesmo que de relance, provavelmente sentiriam aquela expressão desdenhosa vinda do kantoniano.

O jogo não acaba até o último apito do juiz, não é mesmo?

— Flamethrower em Gumshoos; caso ele não caia, repita, ou então mude o alvo para Raticate — soprava as ordens para o seu ígneo, já envolvo das chamas de sua habilidade especial que fora evocada quando sentiu sua vitalidade estar próxima de se esvair por completo; os orbes de Charmeleon cintilavam em rubro, tão vivo quanto o sangue, e as chamas em sua cauda ganhavam proporções maiores.

— Draining Kiss duplo no Raticate, Kirlia! — a loura pedia, reduzindo, gradativamente, aquele seu tom enérgico tão intrínseco; assim como Nicholas, estava apreensiva, afinal, aquilo poderia definir o combate.

Ouvir o adversário que costumeiramente estava a inferir ofensas buscando estabilizar o louro praguejando quando seu normal caiu foi como música aos ouvidos do kantoniano. Recolheu o seu lagarto depois do embate; apesar de ter exaurido suas energias com a guarda aberta após atingir Gumshoos, era inegável o modo como fora fundamental à vitória encaminhada de Nicholas e Emma: as queimaduras no início do combate, a proteção esmeralda evocada pelo mesmo, evitando que caísse precocemente e suas duas labaredas aumentadas por sua habilidade.

Mesmo mantendo-se taciturno, o louro fitava o objeto metálico com um sorriso satisfeito com a performance de seu inicial — em seu âmago, elogiara de maneiras infindável o agora desmaiado lagarto. Guardou-a em seu bolso. Novamente, Nicholas encarava a dupla adversária com um certo desdém após as ordens derradeiras do mestre de Raticate; o pescoço tornava a se curvar levemente em relação à horizontal, as sobrancelhas erguidas e um semblante desgostoso nascera.

— O que foi que aconteceu com aquela animação de vocês? O Persian comeu a língua dos dois, huh? — exprimiu o louro, os orbes oceânicos sempre alternando entre um treinador e outro; era nítido não apenas a arrogância, como o desprezo que os fitava. — Vocês são apenas dois vermes que brincam de ser treinadores. Não dou nem um mês para desistirem. Acho que vocês realmente não sabem a realidade que tá batendo na porta de vocês, não é? Ou mudam a postura ou estão fadados ao fracasso; simples assim.

Emma encarava Nicholas com o canto dos olhos. Parecendo atônita com a postura do kantoniano, a loura dava um cutucão discreto no braço direito do mesmo. Os olhos anis sempre tão aprazíveis buscavam penetrar o mais fundo possível no âmago de Nico, como se suplicasse que abandonasse tão hostil e convencida abordagem apenas a garotos aleatórios que combatiam em um dia qualquer na rota cento e catorze.

— Ei, para. Não é assim que um príncipe se comporta, ouviu? — apesar de chamar a atenção do louro, ainda tão transparente quanto o manto celestial limpo das proximidades de Fallarbor era que Emma dizia. Deixou um riso manso, aprazível tingir o canto dos lábios, volvendo o seu braço em volta do membro arqueado de Nicholas que estava em seu bolso. Rapidamente, tornou na direção do combate. — Mais dois Draining Kiss, Kirlia!

Uma dualidade excêntrica; era engraçado — quiçá irônico — como o titereiro etéreo cruzou dois caminhos tão diferentes, buscando unir aquelas duas almas muito além da carne. Se continuarem naquela sincronia tão intrínseca? Não sei dizer ao certo, é algo que apenas o futuro deverá nos revelar, não é?

Sabe-se lá o porquê de Nicholas ter me enviado sua localização com tanta pressa. A princípio imaginei que alguém tinha o sequestrado ou algo do tipo, mas ele estava perfeitamente bem no Pokézap, me xingando e me esculachando de graça... Então, não era isso. Talvez ele e Emma brigaram? Olha, toda paciência do mundo pra essa garota, porque aguentar esse meu irmãozinho que parece que chupa limão 24/7 é, para dizer o mínimo, complicado.

Com a ajuda de Ramen, que sobrevoava toda a área da rota cento e quatorze, não demorou muito para perceber uma leve comoção que acontecia um pouco mais distante da estrada principal, mais para dentro da pradaria. Balancei a cabeça negativamente, já sabendo que provavelmente se tratava de Nico; assim como eu, o loiro tem uma certa facilidade em arrumar confusões por aí.

— Que saco, não acredito que ele me perturbou pra vir aqui salvar a pele dele. — bufei, apertando o passo na direção que Braviary indicou — Se bem que ele é orgulhoso demais pra isso... Talvez seja outra coisa. — continuei falando sozinha, aproveitando para prender as longas madeixas em um alto coque — Vamos, Ramen.

Não tardou para que eu alcançasse o local de batalha, um pouco suada por ter praticamente corrido até lá; isso já me deixava com um humor um pouco alterado (eu odEIO FICAR SUADA!), mas quando percebi a loira ao lado do reclamão perturbado, precisei conter minha raiva para não ser mal educada na frente da minha cunhadinha.

— Que que você já arrumou, peste!? — exclamei, com os pés cansados caminhando em passos lentos enquanto Braviary voava ao meu lado, atento na batalha que acontecia; tá aí um bicho para gostar de lutar — Oi, Emminha! Que prazer finalmente te conhecer! — passei por Nicholas, dando um leve abraço na loira — Você é ainda mais bonita pessoalmente! Tá fazendo o quê com esse doido? — dei uma leve risada, voltando minha atenção para o loiro e abraçando-o apertado, sem soltar por alguns longos segundos; algo que ele odiava, mas eu fazia de propósito — Oi, irmãozinho! — parei, me espreguiçando no processo e finalmente observando a batalha acontecer — O que houve?

Kirlia superou Raticate com um derradeiro beijo, roubando-lhe sua vitalidade e absorvendo para si; o roedor estatelou no tapete de relva e cedeu à exaustão, declarando a vitória de Nicholas e Emma após um ímprobo combate — contra as expectativas de ambos, afinal.

Ademais, a ave psíquica materializava-se ao lado do louro, fazendo o kantoniano desviar sua atenção do embate. Em meio a grunhidos, informava ao louro de que havia visto algo enquanto sobrevoava o entorno em seus movimentos cíclicos. Rapidamente, os olhos cerúleos do treinador volviam sua atenção para o manto celeste; captaram, por fim, uma ave suntuosa, predadora por natureza, circundando a dupla. Nicholas arqueou as suas pernas, adotando posição hostil em relação à ave de rapina. Xatu preparava-se para se lançar aos ares e interceptar o monstro que, ao longe, não conseguiam identificar ao certo.

Por mais que a dupla parecera receosa, descendo de um Braviary excêntrico e majestoso — cores estas raras em todo o mundo —, a loura que Nicholas conhecera em Lavender aparecia com a ave de rapina ao seu lado. Arfava, algumas gotas de suor pendiam ao chão devido às ações da força de gravidade, observando, ao longe, o fim do combate posterior que terminou com a vitória de Emma e Nico. Ao reconhecer Karinna, uma sobrancelha ergueu-se de imediato: já estava aguardando o jeito escandaloso e espalhafatoso tão intrínseco à especialista.

Claro que a recepção não poderia ser muito diferente do que desenhara em sua mente, não é?

Era indistinguível se era de fato um xingamento ou apenas alguma brincadeira, desvencilhava-se das cordas vocais da especialista uma pergunta pouco receptiva — Nicholas já contava com isso, portanto, não fizera qualquer tipo de reação súbita ou mesmo ofensiva ao ser abordado por Bley. A especialista passava por entre Nicholas e a kalosiana, dando-lhe um abraço sucinto e recebendo-a calidamente. Emma derretia-se diante de Karinna, já que interagira brevemente com a mesma pelo pokézap, onde sabe-se lá como os dois foram adicionados.

Com a atenção desviada, nem ao menos ouviram as palavras ofensivas disparadas pelos outros treinadores.

— Ai, Kah, eu quem o diga. Você é uma deusa grega, olha só! O prazer é todo meu — inferia a loura, encarando a especialista por breves segundos, perdendo-se no oceano aprisionado na íris de Karinna. Riu, inocente, com os gracejos feitos pela garota ao indagar o porquê de estar ao lado de Nicholas. — A gente saiu pra dar uma voltinha e procurar alguns pokémons. Quem sabe ele também não ignore o meu pedido pra gente fazer um piquenique, não é? — pigarreou, olhando de relance para o kantoniano. — Quer ficar com a gente? Eu vou amar se puder.

E é claro que Karinna não poderia deixar de irritar o kantoniano na primeira oportunidade, afinal, era intrínseca aquela dinâmica entre ambos, em que a especialista buscava explorar os confins da paciência — pouca — que Nico carregara consigo. Recebia o abraço com seu cenho inexpressivo corriqueiro, ainda com as mãos no bolso; era intrínseco que era apenas uma provocação por parte de Bley, então nem respondera. Ao se desvencilhar do corpo do treinador, inquiria o que estava acontecendo, quiçá curiosa.

— Só estávamos colocando alguns imbecis no seu devido lugar. Se eles tiverem algum cérebro, vão me ouvir e desistirem, já que não tem talento algum; doa a quem doer, é a realidade, nua e crua — retrucara o kantoniano. Emma, ao lado, encarava Nicholas com o cenho franzido e sobrancelha erguida, balançando a cabeça em sinal negativo com a atitude arrogante do louro. Nico fitou a especialista, indicando, com um simples movimento de angular o pescoço para um lugar um pouco mais afastado que gostaria de conversar um pouco mais em particular com a mesma. — Eu preciso conversar um negócio em particular com a Karinna, Emma. Espera aqui.

— Ei! Não é justo! Por que ela pode saber e eu não? Tá escondendo alguma coisa de mim, Nicholas? E eu quero conversar com ela também!

— É rápido. Vocês duas vão ter todo o tempo do mundo pra conversar depois.

O louro prosseguiu para não muito longe de onde a kalosiana jazia. Estava de costas para Emma, que bramia em volume audível para o treinador.

— Para de ignorar as minhas perguntas! — batia o pé, com os braços cruzados e as bochechas levemente infladas. Viu seu Kirlia achegar-se de si com um sereno riso depois de um combate tão melindroso como o de outrora. — Argh, como ele é chato — disse para si mesmo após revirar os olhos. Agachou-se então, dando alguns afagos para o seu psíquico.

Um pouco mais afastado, Nicholas volveu-se na direção da especialista. Olhou de relance para Emma, agora distraída com o seu monstrinho; era o sinal que queria de que a kalosiana não ouviria qualquer que fosse o assunto.

— Aconteceu alguma coisa depois... daquilo? Te descobriram ou tentaram de atacar nesse tempo que esteve fora? — Nicholas fora direto ao ponto. As mãos jaziam em seu bolso e a feição, como sempre, não expressando qualquer sentimento, penetrante; não desviava as vistas dos orbes cerúleos de Bley. — E sobre essa tal sociedade... o que é que eu ganho se me juntar a vocês?

O tom de voz era ameno, quase inaudível, apenas para que a especialista ouvisse; ora, se era uma conversa em particular, buscava se blindar de fofoqueiros, mesmo que monstrinhos selvagens — apesar que não estava no entorno.