[EVENTO] Gelatina? Não, obrigado

Ficar em coma por um tempo é estranho. Diferente de quando você dorme e sente a passagem do tempo, pra mim foi como se eu tivesse fechado os olhos e aberto logo em seguida. No hospital os médicos me contaram que eu acabei não sofrendo sequela quase nenhuma por causa do que foi utilizado para me fazer entrar no Dream World, foi como se eu tivesse ficado em animação suspensa e só. Ainda assim, é estranho mexer com o corpo depois que ele fica um tempo assim parado.

Sai do Centro Pokémon após uma longa viagem e decidi que era hora de me reconectar com meus Pokémon, precisava de um tempo com eles. Liberei Zuko da sua Pokébola, que logo me deu um abraço e uma lambida. Já havíamos nos visto, mas não interagido além do básico. Estava no centro de Goldenrod e queria um lugar para relaxar com meus amigos, então decidi procurar algum parque próximo onde pudesse liberar os outros.

- Vamos, temos muito o que conversar!

Uma coisa que não falei antes, mas depois da experiência com o Dream World os meus ciclos de sono começaram a se tornar meio... erráticos, se é que eu posso chamar assim. Meus sonhos, que até então eram tranquilos ficaram estranhíssimos. Todos eles começavam com o mesmo cenário que eu vi quando entrei no Dream Worl, a ponte do arco-íris com o castelo a frente, mas desse vez tudo era monocromático. Aquilo não tinha explicação e sempre que eu me tocava do que acontecia a ponte quebrava mais uma vez e eu caia num vazio sem fundo, até o sonho recomeçar de novo. E de novo. E de novo.

Desde aquela experiência eu relutava em dormir, conseguia tirar alguns cochilos às vezes, mas nada mais do que isso. Hoje era um dos dias em que eu preferi nem tentar e simplesmente decidi ficar acordado para dar uma volta noturna na cidade.

Caminhei junto de Zuko até o parque. Sabia que não era o melhor lugar para se visitar a noite, mas admito que eu não estava no meu melhor momento. Só queria passar um tempo com meus Pokémon longe de um Centro Pokémon ou qualquer lugar que lembrasse um hospital.

Acabei sendo pego de surpresa com uma mudança repentina no clima e uma névoa (ou como dizem lá em Mahogany, cerração) tomou conta dos arredores. Eu ainda via Zuko, que havia acendido as chamas de seu pescoço e parecia não gostar muito da situação, mas eu já havia perdido o caminho. Era difícil me localizar direito por ali e eu não conseguia enxergar muito mais do que um palmo na frente do meu nariz.

Ainda tentando me localizar acabei ouvindo um som ritmado de madeira batendo no chão. O toc toc parecia próximo e quando me dei por conta vi que a pessoa que fazia barulho esbarrara em mim. A princípio parecia simplesmente um homem usando trajes bem tradicionais de Johto, mas levando em consideração que Goldenrod era uma das  cidades mais populosas do continente, ele podia ser só um cosplayer também. Zuko rosnou, mas eu fiquei mais preocupado em me desculpar.

- Foi mal, ai! - Respondi, mas o homem não parecia muito preocupado com as minhas desculpas.

Antes que eu tentasse me achar novamente, Typhlosion encontrou algo esquisito no chão, provavelmente algo que o o carinha havia derrubado. Papéis enrolados de forma que lembravam o formato de um pergaminho, o que poderia indicar que aquilo era desde um documento importante, até um acessório qualquer de fantasia.

Me abaixei para pegar o item e assim que estava com ele em mãos me virei e chamei o homem que a pouco havia esbarrado em mim - Ei, isso é seu? - Disse. Mas assim que me virei, notei que algo não parecia certo.

Aquele cara realmente tinha estilo. Afinal, quem entrega um documento pra outra pessoa daquele jeito? O que é isso, um filme?

Bom, se aquilo era para mim mesmo, decidi olhar mais atentamente. Realmente, o papel não parecia nada novo, estando até meio desgastado, mas até ai podia ter sido feito para parecer assim. Não levei aquilo totalmente a sério, mas no fundo algo me dizia que o item era realmente verídico.

Também não pude deixar de notar que a neblina havia ficado mais fraca e comecei a reparar na cidade a nossa volta, algo havia mudado ali e os edifícios de Goldenrod davam lugar a pequenas casas meio destruídas. É Totó, tenho a impressão de que não estamos mais em Johto.

O homem ainda continuava próximo e agora se apresentava como sendo Ataraxia. No início achei meio engraçado, parecia nome de personagem de RPG, mas tudo que eu havia visto até agora indicava que talvez ele não fosse só um cosplayer.

- Eu me chamo Thomas, ele é Zuko. Onde estamos?

Perguntei, direto e reto. Em minha mão segurava o pergaminho, mas sem o abrir ainda.

Se estávamos em uma época onde coisas não deveriam acontecer, isso significava que...

- Espera, eu viajei no tempo? - Perguntei meio atônito a Ataraxia.

Se isso se confirmasse era algo pelo qual eu nunca havia passado. Eu já conhecera outros continentes, mundos virtuais, mundos dos sonhos e até outras realidades, mas nunca havia ido até o passado. O mais engraçado contudo era que o homem - que a essa altura eu já acreditava não ser cosplay porra nenhuma - parecia incólume aquilo, como se soubesse o porque eu estava ali (ou talvez, fosse ele o motivo de eu estar).

Ao menos do que ele dizia, o que eu conseguia entender era que algo de ruim acontecera e ele precisava da minha ajuda para consertar, mas porque eu?

Enquanto as explicações rolavam, coisas misteriosas continuavam a acontecer. Um vento forte abria caminho até o que parecia ser uma fortaleza antiga, um lugar provavelmente abandonado.

Ataraxia falou diretamente comigo, claramente não havia entendido meu nome direito, mas tudo bem. O samurai (acho que ele era um mesmo), enfim me explicou o que ele queria comigo ali: ajuda para salvar alguém. Aquilo me deixou muito intrigado, afinal por que eu? Será que eu fui a primeira pessoa com um Pokémon que ele achou? E o mais importante, se aquilo era mesmo o passado, o quão perigoso era a minha presença ali?

- Eu ajudo, mas preciso que você me diga, por que eu devo confiar em você?

Eu não tinha absolutamente nenhum motivo para acreditar naquele homem, porém ele parecia realmente desesperado. Pelo que me contara aquele lugar era recheado de pessoas ruins e que fariam coisas horríveis em prol de um tal "criador".

Não sabia o que deveria fazer, mas não tinha muita escolha. Estava em uma época diferente da minha e não sabia como voltar para casa, eu podia lutar ou desistir. Me virei para Zuko, ele não rosnava mais. Pelo contrário, o Pokémom de fogo assistia tudo pacífico.

- Tudo bem, eu ajudo.

Seguiria o homem e ajudaria ele a resgatar quem quer fosse, mas antes fiz algo que já deveria ter feito. Abri o pergaminho e li seu interior.