A ruiva observava atentamente as construções da cidade que há muito pouco abandonara. Muitas saídas existiam por esta e fizera de tudo para evitar a principal. Após tais reações provindas de Gabriel no Club Battle, sinceramente, não pretendia encontrá-lo novamente. Não queria que a tensão pairasse por entre ambos. Não desejava topar com ele em plena saída de Pewter.
Seu olhar por fim encontrou o chão, observando a terra batida e a relva suave que crescia lentamente nas margens da estradinha que encontrara. Sentia o Sol da manhã roçar-lhe o corpo e também a brisa suave que brincava com seus cabelos e sua face.
Os sentimentos que corriam dentro de si como um rio selvagem no ápice de sua correnteza, resumiam-se agora em um baixo e magoado suspiro. Talvez não devesse ter pronunciado-se para o loiro. Talvez deveria ter permitido o tempo correr, para que por acaso, com um pouco de sorte, encontrassem-se na Rota Três.
Mas, como sempre, suas emoções se esvaíam nos atos que produzia antes mesmo que pudesse pensar em estancá-las. Dessa vez, além de sofrer uma pesada derrota - ou talvez não tão pesada assim -, ainda havia estragado completamente um possível reencontro.
A solidão que agora a envolvia, fazia pesar a mente de Natalie. Sim, claro que poderia libertar um de seus pequenos para acompanhá-la, mas não queria ser vista por eles tão abalada assim. Caso quisesse tal companhia, deveria ao menos relaxar e melhorar seu aspecto físico e psicológico.
Sentou-se por sob as gramíneas esverdeadas que recobriam parte do chão, erguendo o olhar ao tingido céu azulado. O brilho difuso em seu olhar era a revelação da confusão que envolvia a mente da jovem. Lentamente, as lágrimas umedeciam suas orbes e traçavam uma suave trilha úmida por sob suas bochechas, tocando seu queixo e recaindo até o tecido fino das vestes da ruiva.
Ah, como seria bom ser uma simples nuvem... Distante, e ao mesmo tempo tão próxima. Solitária e ao mesmo tempo com diversas companhias.
Sim, uma nuvem seria ótima.
Respirando fundo, ela ergueu-se, retirando os resquícios de poeira e as pequenas gramíneas grudadas no pano de suas roupas, ajeitando suavemente uma mecha de cabelos atrás da orelha. Sim, precisava urgentemente de uma companhia. E já se julgava bem o bastante para isso.
Tocando levemente a esfera bicolor de sua pequena Zorua, ela fitou o objeto calmamente. Afinal, mesmo que sua captura já estivesse concluída há certo tempo, ainda não havia sequer dado-se o trabalho de conhecer a pequena. Ela hesitou, mas por fim mirou a esfera para o chão, esperando o animal ser liberado.
...
E...
Isso ainda iria demorar?
Natalie estranhou um pouco a passividade do objeto, e tentou mais algumas vezes antes de finalmente perceber que... Bem, que estava vazio. Em pânico, olhou rapidamente ao redor, procurando a pequena raposinha. Não acreditava que ela realmente havia saído sozinha! Chamou-a por algum tempo, mas finalmente passou a correr pelo local.
Se negava a perder sua raposa!
~x~
OFF: É o seguinte: Aqui eu tive uma ideia um pouquinho diferente e resolvi deixar separados por algum tempinho para brincar com a Zorua... Em primeira pessoa. É uma ideia para juntar ambos de um jeito... Diferente. Espero que fique bom ô>
~x~
Presa. Era assim que eu me sentia. Enroscada em um espaço minúsculo, meus pulmões e sentidos imploravam para que tudo aquilo se findasse, para que fosse apenas um pesadelo que acabaria ao raiar do dia, ao fim da tormenta. Meus músculos retiniam por liberdade, para tornar a correr por entre as árvores, por sob a campina. Ali, em um lugar obscuro e artificial, não conseguia ser eu mesma. Meu corpo tremia. Esperava sair dali a qualquer momento, esperava reencontrar a bela floresta que por tanto tempo me acolhera em seus braços seguros e repletos da mais pura magia.
Mas eu sabia que não seria assim.
Aquilo não era um pesadelo, aquilo era real. O confronto forçado, a dor sentida a cada um dos ferimentos a mim infligidos. As reações máximas que procurava ter, a corrida em busca da liberdade, da calmaria.
Com o findamento da batalha, com minha caída... Achei que tudo havia se findado, que ficaria tudo bem. Que poderia contar com a ajuda da Floresta para recuperar-me, mesmo que lentamente fosse. Que logo retornaria para brincadeiras com os outros animais, para artimanhas que se findavam em gargalhadas animadas. Eu vi o mundo transformar-se no negro, e foi assim que aqui acordei.
Eu sentia as lágrimas escorrendo por meu rosto, com o único pensamento de que queria voltar para casa. Queria meus amigos, queria meus pais. Por que tudo aquilo foi tirado de mim? Fiz alguma coisa ruim na Floresta, e tive como consequência minha permanente expulsão? Ali era o Paraíso, e estraguei tudo por um erro?
Era apenas nisso que pensava. Eu sofria ali dentro, do mesmo jeito que sofreria caso perdesse os carinhos de meus pais para a morte.
Sentia medo.
Medo de nunca mais voltar a correr pelas estradas que Arceus me permitira desfrutar. Medo de ficar ali, e para sempre. Medo da solidão. Medo de saber que, ainda que meu sofrimento se estendesse por todo meu corpo e mente, ainda que o choro escapasse por minha garganta... Ninguém me ouviria. A cápsula firme que chegava até mesmo a machucar minha pele era um lugar cuja saída não existia.
Foi quando vi aquilo.
Uma fraca luz se esgueirava em abobada a poucos milímetros em minha frente. Foi nessa hora que um raio de esperança rasgou minha alma, acertando em cheio meu acelerado coração. Soube nessa hora que talvez fosse a única chance que ainda possuísse de ver minha tão amada floresta, meu tão conhecido mundo mágico. Tocando levemente aquele feixe brilhante com as patinhas que podia fazer uso, encostei o focinho em tal abertura, em busca de minha liberdade. Claro que este não poderia passar, mas minhas simples garras conseguiam. Perfurando a claridade, vi o mundo envolver-se em uma forte luz branca, que machucava minhas pupilas e prejudicava minha visão. Senti toda aquela angústia sumir de meu coração, e em pouco tempo sentia a grama macia abaixo de minhas patas.
Um grande sorriso se formou na boca que possuía, e de imediato me deitei, rolando por sob a relva que acalentava minha alma. Por muito pouco não emiti um riso alegre, mas notei que minha presença não era única ali.
E as tonalidades rubras me alertavam do perigo.
De um salto, ocultei-me dentre as folhagens de uma moita próxima, observando atentamente a estranha espécime que era culpada de fazer minha amada floresta sumir. Sim, havia sumido. Ainda que a sensação perfeita da natureza me envolvesse, reconhecia que aquele local não era o de minha nascença.
Em um silêncio de túmulo, me encolhia, esperando pelo pior. Mas a surpresa roubava minha expressão temerosa ao ver as lágrimas derramadas pela jovem. Por um tempo, pensei em ir até ali. Pensei em a abraçar, perguntar o motivo de seu choro infeliz, questionar se poderia fazer algo para auxiliar-lhe.
Mas, não.
Aquela poderia ser minha última chance de curtir minha real natureza, e assim o faria. A garota iria se virar uma hora ou outra. Espreguiçando-me em uma esticada longa, ouvi o estalo baixo que meus ossos provocaram após tanto tempo sem seus movimentos de direito. Empinei o focinho, dando meia volta e correndo em direção a floresta que ali havia.
O sorriso bobo emoldurava minha face, e por diversas vezes ri e corri com os animais que ali residiam. Era bem claro que minha presença era estranha e única, mas que poderia fazer? Estava feliz e recusava-me a retornar para a terrível depressão que há pouco me envolvia.
Em pequenos saltitos, notei que aquele local também possuía limites. Fiz uma careta, mas caminhei calmamente até lá, enfiando o corpo em uma moita e observando atentamente a área. Era levemente parecida com a que pouco saíra, e isso me fez entrar em pânico. Estava andando em círculos? Não, não podia, tinha certeza disso! A ruiva não teria sumido do nada, certo? Sim, sim, não estava andando em círculos.
Com curiosidade, vi um pequeno roedor elétrico em companhia de um estranho loiro que estava ali. Lembrava o outro ser, mas não poderia julgar do nada. Sorri, era um belo Pikachu que ali estava. Será que ele veria algum mal em uma brincadeira?
Meu corpo foi envolto de uma fraca luz, e aos poucos vi que minhas patas avermelhadas davam lugar a pequenas mãos alaranjadas. Olhei meu corpo, mais longo, de mesma tonalidade que aquele outro ali em frente. Claro, não queria plagiar até mesmo o gênero daquele amigo de paz, então me contentaria com sua forma feminina. Me estiquei, tendo a certeza de que estaríamos idênticos ao tocar levemente as longas orelhas que jaziam em minha cabeça.
Sorri, estaria bem melhor agora. Hesitei ao fazê-lo, mas caminhei para fora da moita, com o olhar fixo em ambos os animais. Emiti um pequeno chiado, procurando atenção, correndo para perto do roedor e novamente emitindo um sonzinho baixo. Não queria assustá-lo, afinal. Sabia o quão desastrosas tais consequências poderiam ocorrer caso o fizesse.
O esperei estancar, indo para sua frente e cutucando levemente sua bochecha, involuntariamente liberando um sorriso infantil e o abraçando com um sorriso, antes de afastar-me apenas um pouco e inclinar a cabeça para o lado.
Era a hora que poderia saber:
Amigo ou Perigo?
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O amanhã é efeito de seus atos. Se você se arrepender de tudo que fez hoje, como viverá o amanhã?