Capítulo 12 - Mogno [Tielo]

Cap. 12 — Mogno.

A emoção do doguinho era visível. Tielo não conhecia muito da personalidade do pequeno a não ser que era um cantor em ascensão, mas agora dava para ver que havia um quê muito particular sobre ele: lágrimas escorriam pelo seu rosto, principalmente após o bufão falar com ele. Sem pestanejar, fora englobado pela esfera metálica, que com somente um único tic, desapareceu à vista ao se tele transportar para o storage de nosso herói. Aliás... Será que Tielo ainda é um herói? Em sua percepção talvez não seja, corrompido pelas situações que suas janelas já tiveram que presenciar ao longo de sua jornada. O cigano de um ano atrás já não é o que encarava Jake e aguardava por uma explicação; honestamente, assim como o homem de cabelos azuis, Tielo já sequer possui partes de seu antigo eu dentro do âmago.

Uma pena.

— Não há mais ninguém aqui. — Sylveon e Typhlosion então relaxavam, com o ígneo transformando-se quase de imediato em um pequeno inofensivo, que até mesmo pedia carinho a seu treinador, que relutante, o oferecia — Tsc. Assim não dá. Você não pode ser abestalhado assim enquanto está coberto de sangue. — a fada de Jake era recebida por Jynx, que começava a conversar com a mesma e Swampert em seu idioma ininteligível; a matriarca do time de Tielo possuía uma sensibilidade ímpar e acolhia todos que confiava — ... Você não muda também, não é, senhora? — o rapaz dava um meio sorriso para Jynx, que retribuía — ... — Jake puxava uma cadeira, jogando sua máscara em cima de uma das mesas de metal presentes; sentou, emitindo uma onomatopeia de dor e levando sua mão direita ao seu peito, o que era percebido pela gélida, que vinha a seu socorro — Tá tudo bem, tá tudo bem. — mentiu, respirando fundo — Como não temos como ir no hospital local, vou dar um jeito. — o rapaz retirou sua mochila das costas, jogando-a em cima da mesa — Pode continuar conversando, Jynx. Seu treinador vai me ajudar. — relutante, a matriarca saiu, mas com um olhar preocupado — Tem um kit médico aí dentro, pode pegar algodão, álcool e uma pomada pra mim, Tielo?

Mesmo com dor, Jake retirou seu casaco, revelando uma blusa azul-marinho que também não ficou muito tempo em seu corpo: o rapaz retirou a peça de roupa, revelando um corpo bem definido, fruto de muito treino. Mas o que mais chamava atenção não era seus músculos e sim um hematoma púrpuro do tamanho de uma mão em seu peito esquerdo. Parecia recente, muito provavelmente fruto de alguma embate corpo a corpo que tivera ainda no dia de hoje. Jake encostou suas costas na cadeira, deixando seu corpo deslizar um pouco, mas não ao ponto de cair.

— Se importa de limpar com álcool e depois aplicar a pomada? — suspirou, rangendo os dentes ao sentir os dedos de Tielo ao ajudá-lo; a dor parecia insuportável — Argh, devagar. — reclamou, jogando parte de sua franja para trás, o que revelava ainda mais a enorme cicatriz em seu rosto — Então nós dois não somos os mesmos de quando nos encontramos pela primeira vez, huh? — apontou para a cicatriz no rosto — Isso aqui foi presente de um dragão. — assim que Tielo terminava, Jake colocava sua camisa de volta, mesmo que com certa dificuldade — Tielo, você tem certeza que quer saber? — respirou fundo — Tudo bem. Você é parte dessa história, então, nada mais justo. — o rapaz ajeitou sua postura na cadeira, buscando quatro mapas diferentes e abrindo-as em cima da mesa; se tratavam de Kanto, Johto, Hoenn e Sinnoh — Aqueles caras que encontramos em Sootopolis... Eles não eram só elitistas locais. São uma sociedade corrupta que funciona como uma milícia. Depois que nos separamos, comecei a investigar e eles possuem inúmeros esconderijos espalhados por essas quatro regiões. E planejam expandir ainda mais. — apontou para os diversos círculos que possuía espalhados em seus mapas, caso contasse, Tielo veria que são mais de doze, com oito riscados em preto com xis — Os que estão com x são os que consegui destruir. — engoliu seco — São muito piores do que vimos em Sootopolis. Demos sorte de que aqueles eram recém recrutados. — levou seu indicador direito até Goldenrod — Aqui era uma das sedes deles. Foi onde consegui a cicatriz. — cerrou os olhos, rangendo os dentes — Ali foi quando decidi cruzar a linha que jurei jamais cruzar. Eles... — sua voz falhou por um segundo, com sua mão esquerda dando um único soco em cima da mesa — Eles mataram uma família inteira na minha frente. Só porque estavam em situação de rua. — respirou fundo uma vez mais, se recompondo — E descobri que não é só isso... Suas vítimas são sempre pessoas pobres e seu objetivo é "limpar o mundo" de todos eles. — Typhlosion observava seu treinador com o coração nas mãos, sentindo o peso que aquilo tinha para ele — Foi ali, Tielo, que decidi que mataria todos eles. Sem exceção. — pela primeira vez desde que começou a discursar, Jake voltou seu olhar para o bufão, fitando seus olhos — Não quero isso pra você. — o rapaz buscou o marcador preto em sua mochila, riscando em xis Mahogany — Nove. — Jake pegou todos os mapas, fechando-os e guardando-os de volta em sua mochila — Eles estão com planos de construir uma nova base, tudo que consegui até agora era que seria em Kanto. — com dificuldade o rapaz levantou, caminhando até os quadros negros — ...

Apagados às pressas, a maioria deles possuíam informações ininteligíveis, mas algo chamava atenção de Jake: no último, um apagado desenho de vulcão ainda possuía sua forma, denunciando a última informação que o rapaz precisava. Jake cerrou seu punho direito, desferindo um soco no quadro, que voava para trás e caía no chão.

— Desgraçados! São como pragas! — irritadiço, voltou seu olhar para Tielo — Você quer isso pra sua vida!? Se lembra de como eu era!? Tímido, apaixonado, abobalhado! — puxou a mochila de cima da mesa e segurou sua máscara com a mesma mão — A ignorância é melhor, porra! Pra que se envolver nisso!?

Assustados, todos monstrinhos ficavam acuados, com exceção de Jynx, que caminhava até Tielo e segurava sua mão. A psíquica fitava os olhos acinzentados se seu treinador, como se quem lesse sua alma. Ela não queria que seu mentor seguisse pelo caminho que há tempos se direcionava, mas, àquela altura, não havia mais o que fazer. Mas seu olhar não julgava Tielo: suas íris o abraçava. Jynx queria dizer que estaria ali por ele, seja qual for o caminho que decidir tomar.  A gélida caminhou até o descontrolado Jake, segurando também em sua mão e direcionando-o até o bufão. Consentiu com a cabeça e levou uma mão à outra, encostando os dígitos do rapaz de cabelos azuis contra o dorso da mão do cigano.

— Jynx... — o rapaz deixou escapar, bem baixinho — Não tem jeito. — Jake segurou a mão de Tielo, entrelaçando seus dedos — Se não posso te tirar desse furacão, pelo menos irei protegê-lo dentro dele.

Cap. 12 — Mogno.

Conversados e, com a ajuda de Jynx, acertados, ambos pombinhos (shippo demais!) terminavam de arrumar suas coisas, com o rapaz de olhos azulados decidindo levar alguns dos papéis que havia por ali junto consigo. Aproveitou, também, para retornar Typhlosion, deixando somente Sylveon do lado de fora -- apesar da ajuda da matriarca em tentar limpar o sangue, dava para ver que ainda estava manchado e ambos não queriam chamar atenção indesejada, certo?

— Tielo, eu não vou para um hospital! — Jake batia o pé, soltando da mão do bufão, tal qual uma criança malcriada — Eles saberão onde nós estamos, não é inteligente. — suspirou, levando a mão ao peito — Preciso só de uma noite bem descansada com a pomada e pronto. — levou o indicador ao queixo, sinalizando para que começassem a caminhar para fora da sala e em direção à saída — Como teremos de ir para Cinnabar, posso descansar por lá. — o rapaz segurou a mão de Tielo uma vez mais, puxando-o para apressar o passo — Vem.

Saindo pelo local por onde o cigano entrou, a pequena criança e seu Trubbish os aguardavam, se assustando ao verem Jake com ele. Mesmo receosa, ambos se aproximaram, somente para agradecer ao bufão e dizer que voltaria para sua barraquinha. Mesmo todo coberto e desconfiado, Jake acenou para a garota, puxando Tielo uma vez mais, agora na direção de uma pousada que havia na rua principal.

— Estou com um quarto aqui. Vou tentar descansar um pouco enquanto não colocamos o pé na estrada. — o rapaz segurou em ambos os ombros do bufão, dando uma leve risada por trás da máscara — Ainda não acredito que não consegui te convencer a não vir comigo... Mas tudo bem. — abriu sua mochila, puxando uma pequena chave — Aqui a chave do meu quarto, cento e três. Se tiver algo para fazer pela cidade, faça logo, saímos de noite, tudo bem?

Cap. 12 — Mogno.

Aguardando o retorno de Tielo, Jake tomava um banho e descansava na cama, sentando de costas para a parede e espalhando alguns papéis sobre o cobertor. Sylveon ficava de guarda na porta, levantando esporadicamente sempre que alguém passava; quando Tielo retornou, a fada sequer se mexeu, sabendo que se tratava do bufão. O rapaz fitou Tielo por alguns segundos, tornando a prestar atenção em seus papéis, inclusive fazendo algumas anotações vez ou outra.

— Resolveu suas coisas? — perguntou, suspirando logo em seguida — Estava pensando aqui e acho que vai ser complicado quando chegarmos em Cinnabar. — mordeu o lábio inferior, pensativo — Depois do estrago que fizemos, com certeza vão estar nos aguardando. Além do fato que teremos que procurar e, como você viu, os esconderijos não são lá muito visíveis. — ergueu um de seus papéis, mostrando algumas anotações falando de vulcões — O grande xis da questão é como fizeram um no vulcão de lá. Sei que tá adormecido, mas, sei lá. — estalou o pescoço, começando a juntar suas coisas e colocá-las na mochila — Precisamos ir o mais rápido possível, Tielo. — voltou seu olhar para o cigano, levantando logo em seguida — Não vai ser fácil e você só vai me atrapalhar, mas... — Jake deu uma leve risada, empurrando o ombro direito do bufão — Fazer o quê se você continua voltando pra minha vida?

O rapaz de cabelos azulados uma vez mais buscava sua máscara, colocando-a antes mesmo de sair do quarto. Parecia ser algo que afetava bastante sua autoestima, mas sendo tão vidrado em sua sede por vingança, Jake só sofreria as consequências disso no futuro. Conforme caminhavam lado a lado, Jake buscava algo no bolso de seu casaco, entregando-o para Tielo. Enrolado em um pequeno saco preto, o bufão não teria ideia do que era, mas pela discrição parecia ser algo importante:

—  Toma. Encontrei isso em um cofre daquele esconderijo. — sussurrou, sinalizando para que o cigano escondesse logo o pacote — Eu não fico com nada que pertence a esses merdas, mas você pode encontrar uma utilidade pra esse dinheiro. — cutucou a costela de Tielo com seu cotovelo, dando uma leve risada abafada — Já não basta eu ser bonito, agora te banco também. Tsc. — balançou a cabeça negativamente, brincando; era bom ver que Jake abaixava um pouco de suas barreiras perto do cigano, parecia fazer tempo que o mesmo não se divertia — Tem PK$2000 aí. Vamos logo, vamos acabar perdendo a condução.

O que será que aguarda o casal em Cinnabar?

Que os deuses os protejam, não só dos malfeitores...

Mas também de si mesmos.