WHIRL ISLANDS DUNGEON #1

Enquanto limpava a ferida exposta de Daisuke, prestava atenção no que o senhor tinha a dizer. Quer dizer... no que a memória dele tinha a oferecer. Não era como se fosse a primeira vez que via um espírito e ele não parecia querer nos fazer algum mal. E como minha mãe dizia: tenha medo dos vivos, os mortos já não podem te fazer mal.

O senhor Calgara devia ter sido um grande líder. Sabia reconhecer sabedoria e não tinha medo de dizer que cometeu erros, apear de ainda ter intacto um ego de "campeão". Ele conseguia tirar de mim alguns sorrisos, mas me deixava pensativo em outros momentos, principalmente sobre as curiosidades sobre o lendário e a magia que regia toda aquela ilha e os redemoinhos ao redor. Queria muito poder anotar todas essas informações e desenhar o que via dos cristais. Completariam demais a pesquisa de meu pai e, mesmo que nunca viesse a ser publicada em respeito a tudo e todos que vimos e vivemos, gostaria de guardar a memória de algo tão engenhoso e bonito. Talvez num outro momento.

Ao ver que Daisuke respondia bem aos estímulos de Eros e a limpeza que realizava com as gazes e água boricada, já não mais mexia no ferimento, só tirando o excesso de sangue para evitar coagulação. Tinha de fazer pressão e levantar o braço para que o sangue não continuasse escapando, caso contrário ele não teria forças para continuar de pé.

Agradecia por tudo que tinha aprendido com o senhor Calgara e observava ele ir embora na mesma hora que Daisuke recuperava a consciência.

— Desculpa, se eu não te desacordasse, seria pior... Você tava fazendo uns pedidos... sombrios. Mas não se preocupa com o que aconteceu, só precisa tomar cuidado com esse braço até conseguirmos ajuda profissional...

Dizer que ele estava clamando pela morte talvez pudesse ser um pouquinho demais. Gatilho, talvez? Então tirava um hidrotonico e dividia com ele. Era o último, mas caia bem com as castanhas ainda sequinhas que tinha trazido bem vedadas no tupperware de mamãe. Dei algumas para o Sylveon e o retornei, dizendo que talvez precisaria dele em breve.

— Quando estiver pronto me avise. Fera irá nos levar lá encima usando Waterfall. - Respirei fundo e encarei a cachoeira, com Fera ao meu lado. - Lugia nos aguarda.

Aquela coceira danada persistia em nossa pele. Seria uma praga? Em Fera não parecia surgir efeito. Estranhei, mas não tanto, então tentava só não me mover com muita violência ou coçar onde ardia.

Diante do novo ambiente, me questionava se toda essa aventura valia o esforço. Estávamos enfrentando a própria natureza ao encarar Lugia. Isto é, com o braço de Daisuke luchado e nossos ânimos exaltados, além dos nossos corpos destroçados e o psicológico abalado... Como reunir forças para mais um desafio? No entanto, me proibia de reunir pensamentos negativos como aquele. Eram por conta de dúvidas assim que eu tinha medo e despertavam as crises de identidade.

Tentei me concentrar naquele ambiente. Ao lado de Fera, e sob o bloco de pedra, mirava todo o lugar. Tomava para mim as notas mentais de como era aquele santuário que perturbávamos e, segundo Calgara, poucos chegaram até lá, incluindo curiosos da tribo.

As luzes, as formas, as dimensões! Eram tudo icônico! Talvez melhor do que ousei imaginar um dia! E quando uma voz irrompeu meus ouvidos... espera, minha... mente? Sim, a voz falava comigo por pensamento, mas pela expressão de Daisuke também falava com ele. Enfim. Quando o ouvi, não acreditei que enfim acontecei.

Quase não podia crer em meu olhos.

Eu estava diante do Pokémon Alma. O senhor dos oceanos e criador de redemoinhos!

— Lugia! - mencionei quase como uma prece, que pedia desculpas e ainda assim admirava-o por sua grandiosidade.

E ele estava certo. Não tirava sua razão. Mas também sentia amargura em seu jeito de falar. Ele ainda não tinha perdoado os humanos pelas inúmeras falhas para com os Pokémon. E eu estava segurando no braço de Fera quando ele surgiu e nos enfrentou com aqueles olhos brilhantes em uma aura poderosíssima! Fiz força no braço do pokémon num misto de empolgação e terror. Sabe-se lá o que a ira da criatura criadora era capaz de realizar por nossa falta. Não estava afim de descobrir por esse ângulo, mas no fundo ele sabia que eu desejava testar meu potencial com uma prova de valor. Um desafio. Uma batalha!

Olhei para Daisuke tentando enxergar se ele conseguiria prosseguir dali, pois eu me colocava ereto perante ao lendário em aceitação ao que viria, assentindo em resposta.

— Senhor Lugia... Eu estou pronto. - E assim como em batalhas antigas, pisquei para Daisuke e dei um sorrisinho maroto de canto, como se aquilo fizesse tudo ficar bem. - Eros, Hércules, saiam!

Apresentava meus Pokémon que enfrentariam aquele embate. Fera estava ali e continuaria me apoiando, mais que isso, emprestando seu poder para vencer. Respirava fundo e dava tapinhas em minha face, onde estava impossível de suportar os comichões devida água estranha em contato com nossa pele. Só esperava não virar um kakamura...

Após chamar os meus Pokémon, contava que Daisuke tivesse feito o mesmo. Então, com todo respeito do mundo, apontava pra frente enquanto buscava iniciar aquilo de uma vez!

— Hércules, comece usando Taunt! Não queremos surpresas. Eros, por favor, nos proteja com seu véu especial usando Light Screen! Fera, por favor, só fique por aqui e use Swords Dance.

Um primeiro turno de preparação era muito importante para que o desenrolar de uma longa batalha fosse proveitosa. Lugia, diferente dos guardas que protegiam seu templo, não seria tão fácil de deter. Seu poder era colossal! Em alguns segundos junto dele sentia como se ele pudesse explodir meus pulmões com um grito, caso desejasse. Lembrei-me de tomar para mim os dados de Lugia na pokédex. O professor Elm ficaria contente quando os visse, mas no momento eu só precisava saber de uma coisa... Sua tipagem para entender dos movimentos com efetividade!

— Certo rapazes, vamos começar o ataque! Hércules e Fera, avancem os dois juntos com Thunder Punch (Electivire) e Ice Punch (Feraligatr)! Eros eu quero que troque de habilidade com Lugia usando Skill Swap! Vejamos como outro alguém se sai com sua habilidade Pixilate.

Os comandos estavam dados. Tive que me concentrar mais do que podia para forçar o raciocínio rápido. Aquilo me deu algumas fortes dores de cabeça e gerou alguma tontura, que me fez quase bambear com as pernas, mas consegui manter-me no eixo sem cair. Não queria perder aquela batalha por nada nesse mundo!

OFF: os itens equipados serão...
- Feraligatr / lv. 48 - Expert Belt
- Electivire / lv. 45 - Magnet
- Sylveon / lv. 41 - Light Clay

Era a primeira vez que via uma energia assustadoramente forte, capaz de proteger e alterar alguns atributos de um Pokémon. Me questionava se era característico de Lugia ou se aquela energia avermelhada poderia ser compartilhada com outras espécies e qual o motivo dela. A atmosfera do lugar mudava drasticamente, inclusive pela nuvem de chuva que ele invocava ao acumular tanta energia.

Acompanhar o desafio era sensacional. Todos aqueles sentimentos de um jovem franzino que sonhava um dia ser o campeão de Johto, retornavam tão frescos quanto aquele início de jornada. A emoção era similar, apesar do amadurecimento - necessário além de forçado por questões maiores que o personagem - e nos colocava exclusivamente dependentes de terminar aquele combate épico. Eu não conseguia nem piscar direito, pois não queria perder uma cena se quer. E com isso enxergava algumas falhas em minha estratégia.

— Não funcionou... - dizia ao perceber que nem taunt nem skill swap haviam surtido efeitos contra o Pokémon Alma.

Era um momento péssimo para tomar qualquer nota. Havia uma chuva das cores dos cristais mais perversos da caverna e uma ventania que poderiam estragar com facilidade um diário antigo. Procurava tomar mais notas mentais para explorar essas intrigantes dúvidas mais tarde, quando não estiver me sentindo ameaçado pelo colossal poder de Lugia.

Mesmo sozinho, seu poder era capaz de realizar estragos na equipe que experimentávamos. Até mesmo por detrás do light screen ele assumia aquela força e já nos deixava em situação de alerta. Não precisava ser inteligente para saber que era perigoso ficar tão próximo, até porque, com os respingos de um movimento completamente inédito aos meus olhos, éramos jogados para as águas à própria sorte. Enquanto tentava me recuperar, buscando forças para voltar para a pedra que fazia de base, via por fim Fera havia levado um golpe crítico extremamente cortante de lufadas de ar!

— Hércules, ataque com THUNDER! Eros, suporte ele usando de Helping Hand. - Procurava espaço para que Fera não fosse alvo, apontando para que eles guiassem Lugia para longe enquanto eu tentava me aproximar do crocodilo como podia. - Em seguida Eros, continue com Moonblast. Hércules, avance com Ice Punch!

Ainda sentia a ardência em minha pele, mas o sangue quente me ajudava a ignorar algumas dores e aquela não era das piores que já tinha sofrido e seria frescura minha reclamar com Daisuke quase perdendo um braço. Inclusive me preocupava onde ele teria parado depois daqueles gêiseres disparados contra Rotom que nos fizeram tomar caixote, mas meu inicial precisava mais de mim. Ao chegar perto dele, tomava sua cabeça em meu colo e sacudia ele, meio destrambelhado com voz de paizão:

— Amigão, você ta bem? Consegue continuar? - O aquático me olhou como se eu não soubesse a resposta. Minha preocupação era boba? Ele só precisou de um segundo para se recompor e já estava de pé para continuar. -Certo, vamos mostrar nosso poder absoluto! Se aproprie do espaço e use um Waterfall com muito estilo e então ataque com outro Ice Punch, junto de Hércules.