003 - Companhia Inesperada: Um Novo Norte!

Seguindo a minha "cartilha" de como agir em situações como essa, lancei a Pokébola de Lira para servir de distração, protegendo a sonolenta Meo-Mey de qualquer investida maior do que ela pudesse suportar. Entretanto, alguma surpresas deixaram tudo um pouco mais complicado e eu já começava a sentir que teria que "engolir" minhas palavras sobre como tudo isso terminaria rápido. Assim que a Magikarp chegou em campo, saltando mais do que se estivesse em uma frigideira ligada, Numel não pareceu esboçar qualquer sentimento sobre ter mais um inimigo, inclusive sorria de forma até mais graciosa, enquanto era arranhado numa sucessão de movimentos Fury Swipes. O tom assustador (e psicopata), não terminava por aí, porque antes de terminar sua série de golpes, a Meowth simplesmente dormiu, levando tudo a fazer sentido. Certamente o bocejo era uma tática do Pokémon de fogo para colocar seus inimigos para dormir. Uma técnica bastante interessante e perigosa — Mey! Acorde! Vamos lá! E Lira, cuida... — Eu tentava avisar Lira sobre o tal golpe de Numel, mas era tarde demais. Ao que tudo indicava, o Pokémon havia entrado no modo de ataque e agora colocava minhas companheiras em risco.

Numel então respirou bem fundo, quase sem mudar sua expressão e cuspiu uma labareda de fogo na direção de Meo-Mey, que parecia ter arrancado uma boa quantidade de energia da felina e de quebra não parecia ser capaz de acordá-la. Para piorar, as chamas ainda acertaram Lira, que ficou perdida no "tiroteio" e acabou virando um alvo fácil para o truque do bocejo do Pokémon de fogo. Quando tentei fazer algo, a Magikarp também já estava sonolenta e dormiria em breve — Ok, preciso manter a calma. Certo? Certo! Lira... Use Splash no rosto de Mey para tentar acordá-la e depois vá para cima do Numel. Salte ao redor dele para que ele deixe Meo-Mey em paz! — Comentei com Lira, combinando os próximos passos. Então vire-me para a adormecida Meowth e tentei de alguma forma lhe dar ordens para quando despertasse, talvez ela me escutaria — Assim que despertar, vamos com tudo para cima de Numel com dois Fury Swipes! Acorda Meeeeey! — E esperava que tudo terminasse bem para a equipe.

Com a batalha sendo tão complicada, eu me sentia em uma verdadeira cena de ação de um filme qualquer, onde havia uma bomba-relógio prestes a explodir e era necessário saber quais dos fios cortar. Ver meus dois Pokémon sonolentos e ao mesmo tempo imaginar estar tão próximo de uma vitória se eles acordassem colocava minha ansiedade no telhado! Pensando com maior clareza e com uma visão externa, talvez você até consiga visualizar saídas mais óbvias e diretas para a minha situação, mas acredite. Quando se está no calor (literalmente) da batalha, é difícil raciocinar com uma lógica clara, pois a emoção pesa. Nesse combate não era diferente. Eu só conseguia pedir em alto e bom som para que as duas Pokémon se mantivessem acordadas, enquanto esperava um milagre vindo de Lira e seus infinitos Splashes. Ok, eu sabia que isso não daria certo, mas o que aconteceu em seguida me deixou num misto de susto, surpresa e admiração.

— Você está indo bem Lira, continue assim! — Eu dizia em voz alta, colocando as duas mãos em forma de túnel na frente da boca para o som sair mais direcionado. Entretanto, dentro de mim, sabia que isso não terminaria bem. Quando Numel se irritou o suficiente e ergueu as duas patas dianteiras, apenas vários pontos de interrogação sobrevoaram minha mente. Eu jamais esperaria que o toque aparentemente tão sutil de suas patas sobre o solo fosse fazer um estrago desses. O chão da caverna tremeu por inteiro, era como se eu tivesse tentando me equilibrar em um skate (spoiler: Eu não sei me equilibrar em um skate). Resultado, fui direto ao chão, tentando de alguma forma parar o "mundo" de se mexer, em vão. O resultado disso foi Lira fora de combate e Mey gravemente ferida. A felina ainda tentou arranhar Numel algumas vezes, mas três foi o máximo que conseguiu antes de ser derrubada também com um simples golpe de fogo. Parecia até um "disparo" de deboche da pequena dromedário.

— Agora mesmo que quero você no meu time, Numel! Eu aceito o seu desafio! — Disse para a Pokémon de fogo com um certo temor, mas também empolgação na voz, enquanto segurava uma das Pokébolas em mãos. Retornei Mey e Lira para suas cápsulas e lancei mais dois Pokémon em campo. Dessa vez, o fiel Buddy e também Shelmet. — Buddy, sei que está cansado, mas precisamos dessa vitória! Não precisa economizar golpes, use logo dois Mega Drain e você Shelmet, ataque com dois Absorb! — Ordenava aos novos monstrinhos que chegaram em campo. Os Pokémon não estavam preparados para o calor, mas não podia poupá-los agora ou terminaria perdendo o Pokémon de vista. Sendo assim, confiei que a experiência de batalha de Budew falaria mais alto e me levaria a vitória, mesmo diante de tantas adversidades.

Já que a Pokémon selvagem possuía alguns truques na manga capaz de causar desmoronamentos e terremotos poderosos com um simples pisar de suas patas, imaginei que ela poderia ser do tipo Terra, ao mesmo tempo em que era do tipo Fogo. Se fosse esse o caso, a decisão mais acertada seria utilizar minha única vantagem possível contra esse primeiro tipo, que era Budew. Como um bônus, também enviei Shelmet para o combate, pois ele possuía uma forte resistência e também contava com um golpe do tipo Grama. Apesar de focado na batalha, me sentia muito mal por ter deixado Mey e Lira serem nocauteadas daquela forma e não conseguia deixar de pensar no estado delas no interior de suas cápsulas. Mas não poderia deixar isso atrapalhar e colocar Buddy e Shelmet em perigo também, por isso fiz questão de me esforçar-me ainda mais para esquecer o passado e colocar todas as fichas no futuro, que ainda poderia ser alterado.

Assim que dei minhas ordens para os dois companheiros, foi Buddy que saltou primeiro na direção da Numel. Era incrível a forma como aquele broto tão fofo e aparentemente frágil conseguia crescer para cima do adversário em combate com tanta facilidade. Só podia ser produto de muita experiência de luta obtida nesse curto espaço de tempo que estamos juntos, mas sempre aliada a uma competência intrínseca do pequeno para o combate. Budew agarrou com firmeza na corcunda da Pokémon de fogo e começou a absorver suas energias, enquanto a adversária tentava escapar e atacava o desprotegido Shelmet, que felizmente aguentou bem o tranco. Buddy também se queimou com esse forte movimento, mas não largou a oponente, esperando Shelmet aproximar-se para combinarem o poder dos golpes absortivos de grama. O resultado disso foi uma poderosa Numel tombada e nocauteada.

— Isso! ISSO! Vocês foram incríveis! — Dizia para os dois Pokémon com um sorriso no rosto, enquanto abria os braços para que eles viessem. Assim que chegaram os abracei bem apertado e pude finalmente respirar aliviado, mesmo que estivesse quase sufocado pelo calor ao meu redor — Buddy, eu não tenho palavras para descrever o quanto você é incrível, eu sempre me orgulho de ser seu treinador. Ainda bem que nos encontramos! E você Shelmet, eu já não posso mais te chamar apenas de Shelmet, não é mesmo? Você é um herói também! Então... Acho que vou te chamar de um nome legal de um jogo que eu gostava muito quando era pequeno... Vou te chamar de Gaiden! Isso é "Conto" em um outro idioma, então você será nosso contador de histórias. Assim pode passar a história das nossas aventuras para os demais Pokémon quando estiverem reunidos, o que acha? — E finalmente dava um nome para o inseto de Unova, explicando o significado e perguntando o que ele achava.

Com tanta emoção e sentimentalismo, eu havia quase me esquecido da Pokémon nocauteada no chão. Afaste-me então dos dois Pokémon e peguei uma esfera vermelha, clássica, em minha bolsa para tentar capturá-la — Ok! Hora de dar as boas-vindas a mais uma companheira de equipe! — Mas assim que eu me preparei para lançar a esfera, uma luz no final do caminho chamou a minha atenção. Era muito difícil identificar a fonte daquilo... Seria uma lanterna? Um Pokémon? Uma máquina? O calor insuportável e o local inóspito fazia qualquer novidade ser um perigo a mais, portanto precisava garantir o que vim fazer antes de investigar algo novo. Com bastante cautela e sem tirar a atenção da luz misteriosa, lancei a Pokéball na direção de Numel para capturá-la. Caso não conseguisse, lançaria quantas bolas fossem necessárias, incluindo a Dusk Ball, que deixaria por último.

Respirei fundo antes de iniciar minhas tentativas de captura e senti o ar quente queimando minhas narinas, apesar de naquela caverna a temperatura ser bem mais amena que no exterior. Isso fazia com que o ato de respirar se tornasse uma tarefa árdua e o corpo pedisse a todo instante que deixássemos aquele ambiente. Lancei então a primeira Pokébola e para a minha surpresa, a captura não havia sido bem sucedida, inclusive tendo a cápsula sido destruída por um golpe Ember daquela dromedária tão poderosa. Apesar dessa reação destrutiva, parecia que esta havia sido a última tentativa de Numel reagir, pois finalmente havia se espatifado no chão e não parecia levantar dali tão cedo. Aproveitei então para lançar uma segunda esfera alvirrubra e para minha felicidade, desta vez a captura foi perfeita, tendo a cápsula sido teletransportada em uma luz prateada para meu Storage. Ou ao menos era o que eu esperava...

E por falar em luzes, ainda havia uma luz estranhamente convidativa no final daquele "corredor" rochoso. Não parecia ser uma luz vinda de uma lanterna, mas uma luz natural, do Sol, que conseguia atravessar alguma saída entre as rochas e me alcançava. Considerando a distância que percorri para chegar até aqui e a posição por onde eu vim, aquela saída "nova" me levaria para algum lugar bem diferente. Poderia ser uma saída fácil ou pelo contrário, poderia ser um terreno difícil e que me deixaria mais perdido que antes. Tentei fazer mentalmente o mapa daquele lugar para ver se fazia sentido seguir por ali, mas havia dado tantas voltas para escalar a montanha que certamente estaria enganado, independente de qual fosse minha decisão.

— Ok Buddy, Gaiden. Algo me diz para seguirmos em frente — Disse aos dois Pokémon que me auxiliaram na última batalha, segurando as duas Pokébolas e trazendo-os de volta — É melhor poupá-los desse calor... Por Arceus! Espero que essa saída nova me leve o mais longe do topo possível, eu preciso reencontrar as crianças e Ben. Não vou aguentar subir isso tudo de novo só para descer... — Comentei comigo mesmo, enquanto limpava o suor de minha testa usando a própria blusa. Certamente precisaria de um longo banho e incinerar as roupas antigas que talvez não tivessem mais jeito de serem limpas, tamanho o suor acumulado. Com esperanças de que acharia uma rota segura, segui a luz até o exterior.

Esperança e de certa forma, fé. Era tudo que eu tinha no momento, já que sentia minhas forças se esvaírem e não tinha perspectiva alguma de conseguir escalar novamente todo o caminho que eu havia feito. Eu estava apostando todas as minhas fichas em seguir por essa caverna. E estava errado? O brilho do Sol me servia de farol e tudo o que esperava era encontrar meu rumo para um lugar melhor, torcendo para não cair em um poço de lava surpresa. Se é que isso poderia existir por aqui... Fui me apoiando nas paredes daquele túnel, dando um passo por vez, aproximando-me cada vez mais da saída e do brilho convidativo.

Ao chegar bem próximo da "Luz", dei por mim que não se tratava apenas do Sol, mas sim dos raios solares refletidos em mais um achado espetacular. Fragmentos de um minério amarelo, mais um para minha simpática coleção, apesar de ainda não ter descoberto de fato um uso para eles além da estética. Antes de arriscar sair dali, abaixei-me e recolhi os quatro pedaços que pude encontrar, semi-enterrados. Limpei levemente cada um deles e os repousei junto de outros de outras cores, no interior da mochila. Não tendo mais nada para fazer dentro desta caverna, simplesmente a deixei para trás.

— Céus! Será que estou morto? Ou isso é... Vento? Fresco? — Assim que dei meu primeiro passo para fora do túnel, senti uma brisa encanada acertar o meu rosto. Apesar de trazer um pouco de fuligem (que infelizmente senti na marra ter um péssimo gosto ferroso e amargo), era fresco. Ao menos quando comparado aos vapores ferventes da montanha. O caminho a minha frente era recheado de pedras pontiagudas nada amistosas, mas atravessar esse calvário me levaria a um ponto plano e bem mais baixo, uma saída de emergência da trilha de fogo.

Usei minhas mãos, ainda doloridas pelas bolhas, para apoiar-me e não acabar furando meu calçado nas rochas mais pontudas. Minutos depois já estava em segurança e até perdi uns segundos arrancando a pelinha que sobra depois de uma bolha estourada. Por fim, estiquei meus braços bem alto para sentir aquele belo estalo nas costas e continuei a leva caminhada. Em pouco tempo eu encontraria Ben, Luci e Yuri, se tudo estivesse bem com eles. Certamente os Machiatto ficariam felizes ao ouvir minha história sobre a captura da Numel. Mas claro, uma coisa de cada vez... Resolvi então erguer minha voz para notarem minha presença e, quem sabe, virem ao meu encontro ou pelo menos esperassem por mim — Ei, se estiverem me ouvindo! Estou aqui! Estou chegando!