#01 - Em busca de um plano

Quando novamente olhei naquele olhos e no sorriso bobo eu não podia acreditar que ele fosse uma farsa. Talvez um garoto problemático, com muita raiva do mundo, mas eu também era isso. Um garoto com raiva de tudo e de todos que só queria saber de salvar o pai a todo custo.

Eu precisava colocar os pingos nos is. Eu não podia simplesmente sair dali buscando a verdade sobre meu pai sem saber a verdade de Dylan. Eu tirei a bandeja da mão dele com cautela e o olhei nos olhos.

- Você é realmente um Rocket? - eu apontei o armário onde estava o computador. - Não minta pra mim eu achei seu diário Rocket e as fotos.

Omiti a parte dos ovos, pois querendo ou não eu havia roubado ele. Esperava que ele não fosse conferir o fundo falso sendo que eu o coloquei no lugar. Eu sei que era arriscado, mas eu queria muito saber a verdade. E qualquer coisa Zyos estava ali para atacar Dylan se ele tentasse algo contra mim... ou eu poderia acertar a bandeja na cabeça dele.

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Quando Dylan olhou para Lítio, foi notável que havia alguma coisa de estranho. O jovem, que estava com um sorriso no rosto até então, foi deixando a alegria murchar e certamente pensava em perguntar ao seu hóspede o que havia, mas não achava palavras. Já Jerome, retirava a bandeja de perto do garoto e com toda a cautela que lhe cabia, começou suavemente a lhe questionar sobre tudo o que havia descoberto - ou quase tudo. O clima fechou-se. Alguém parecia definitivamente ter morrido ali, porque a expressão no rosto do Falso Rocket era de luto. A cada palavra daquele questionamento, era notável o relaxamento de músculos de Dylan, que terminou "desarmado", com os braços para baixo e a cabeça cabisbaixa.

— Você... — Começou a dizer Dylan, mas sem se mover um centímetro que fosse — Você viu tudo sobre mim? — Terminou o questionamento do rapaz, dando um sorrisinho que mais parecia desesperado do que sarcástico ou debochado — Você abriu o meu armário e observou as minhas intimidades, me traiu assim na cara dura? É ISSO? EU NÃO SOU UM ROCKET PRA VOCÊ? QUE TAL VOCÊ DESCOBRIR? — E num salto impulsivo, Dylan pulou no pescoço de Lítio, recebendo um instantâneo golpe de bandeja, como o Hacker se preparava para fazer. Além disso, o escondido Zyos surgiu aplicando um golpe paralisante sobre o anfitrião. Um grito de dor reverberou pelo quarto e provavelmente pela casa, o que em breve traria a mãe do jovem até ali.

Dylan não caiu com os golpes ou o movimento do Magnemite, mas parecia sentir muita dor e agora apertava o pescoço de Lítio com todas as forças que lhe restavam. Apesar de fraco, ele tinha um apertão forte sobre o corpo mais frágil do garoto semi-nu. Ao mesmo tempo, a mãe do Falso Rocket parecia chamá-lo do andar de baixo e começava a subir desesperada as escadas, com sons de passos pesados. Nada que pudesse tirar Dylan de seu ódio descomunal. Uma vez que Lítio não podia reagir, o assustado Zyos tomou uma decisão dura, mas necessária. Liberou toda sua energia em um Choque do Trovão por todo quarto. Lítio foi levemente acertado, mas ao menos o agressor foi golpeado em cheio. Nem mesmo a mãe do rapaz, que chegava perto da porta foi poupada e gritava de susto, caindo para trás. O que Lítio, agora momentaneamente livre, faria agora? ◄

Aquilo tudo foi tão de repente e tortuoso.

Ver a imagem inocente, e amigável de Dylan se dissolver numa máscara de ódio. O mesmo Dylan que tinha beijado não parecia ser o mesmo que voou para garrar meu pescoço. Eu me movi em resposta e acertei ele com a bandeja, mas mesmo assim ele ainda me enforcava com afinco. Nem mesmo o ataque de Zyos interrompeu sua raiva.

Seus dedos eram firmes em minha jugular, tirando de minha toda a entrada de ar. Eu sucumbia no chão sem poder lutar contra aquilo. Eu sentia minha visão ficando turva e minhas lágrimas escorrendo de desespero. Foi quando um clarão de luz mudou tudo. Eu senti o queimar em minha pele, mas era pouco comparado a dor no pescoço. Porém sentir os nós dos dedos de Dylan relaxas e ele me largou. Eu respirei profundamente. Voltamos a mim notei Zyos pairando no ar. Ele olhava para alguma coisa no chão perto da porta.

Me levantei e abracei o pequeno Pokémon elétrico enquanto eu chorava profundamente. Notei que a pessoa que ele olhava era uma mulher. Supostamente a mãe de Dylan. Eu fiquei tão assustado, mas notei que ambos estava vivos. Recolhi minhas coisas, e peguei Zyos. Fugimos pela mesma janela que havíamos usado pra entrar. Corri pelos telhados até ter uma forma de descer as ruas. Sem olhar para trás eu rumei a saída da cidade. No caminho eu mandei uma mensagem anonima a polícia indicando o endereço e o que tinha no quarto de Dylan, me identificando como uma garota que havia sido atacada por ele.

Eu não queria mais pisar naquela cidade, ou ouvir falar daquele garoto. Eu só queria fugir, junto com Zyos e os ovos em minha mochila.

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Apesar do susto e da violência do ataque, Lítio constatou que tanto Dylan como sua mãe estavam vivos, apenas nocauteados. Sendo assim, era a oportunidade perfeita para escapar. Muitos sentimentos conflitantes tomavam o coração do garoto, mas a maioria deles certamente o impulsionavam para fora daquela cidade de uma vez por todas. Mauville tinha trazido e ainda parecia trazer muitas lembranças ruins... Talvez fosse o momento certo de ganhar o mundo. Mas enfim... O garoto já havia feito o que podia. Avisou sobre Dylan à polícia e andava por aí...— Vocês viram? Detonaram de novo o Cassino dos Rockets. Como se não fossem voltar, sempre voltam... — Dizia um rapaz de boné e jaqueta preta, andando de skate numa maneira barulhenta pelas ruas da cidade, junto de um grupinho de outros jovens, dentre eles uma garota com dreadlocs brancos no cabelo, que fumava um cigarro, parando para rir e responder — Beth me convidou pra ser Rocket, disse pra eu ir lá em LaRousse com ela, mas sei lá, me parece meio modinha... Todo mundo virando Grunt, acho que não me encaixo... — E ao comentar isso, todos gargalharam, passando ao lado de Lítio em direção a uma pracinha. A madrugada estava apenas começando e um frio espalhava-se pelas ruas... O que Jerome faria? ◄

Eu me sentei em um banco de uma praça nos limites da cidade. Eu gostaria agora de ter ido a um centro Pokémon, quem sabe passar a noite numa cama quente e me alimentar direito, mas minhas péssimas escolhas ainda rodavam por aí.

Eu queria correr, mas precisava primeiro me recuperar, tanto física, quanto mentalmente. Peguei um cachecol e enrolei em volta do pescoço machucado para que não visse o hematoma. Peguei algo para comer e me encolhi no banco com Zyos em meu colo. Ele não parecia muito animado. Ele mal conseguia levantar seus próprios imãs ou mesmo brincar com sua pilha favorita. Eu acariciava seu metal gelado tentando passar algum tipo de conforto.

"Não foi sua culpa", "eu provoquei aquilo", "eles estão bem", eram coisas que eu repetia a Zyos mas ele não parecia assimilar aquilo. Até pensei em o colocar na pokébola, mas poderia piorar a situação.

Enquanto eu comia eu pude notar o grupo de garotos conversando, e claro que o assunto deles chegou a Rockets. Uma estranha garota comentava sobre o convite que receberá, e o local. Parecia ser verídico, mas Dylan pareceu verídico tbm.

Acho que a melhor solução seria seguir um disfarce. Olhei o mapa do continente em meu aparelho. Todos os jovens da cidade seguiam seus rumos a Rustboro, onde havia um ginásio. E se eu seguisse tbm? Eu não queria ouvir a palavra Rocket tão cedo em minha vida. Eu só queria sumir por um tempo.

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Mesmo tendo bastante interesse nos Rocket, era óbvio que o jovem Lítio tinha passado momentos complicados o bastante envolvendo esta Organização, mesmo que na forma de um fake, para evitá-la por algum tempo. Mauville era o seu lar, mas no momento tornava-se um barril de pólvora considerando tudo o que ele havia vivido em apenas uma noite. Era natural que o jovem simplesmente quisesse escapar dali o quanto antes, mas se pensasse friamente, logo após uma "batida" policial, era esperado que as fronteiras estivessem com segurança reforçada. Além disso, Jerome havia tido um enfrentamento com um Policial e ainda por cima se envolveu violentamente com um garoto provavelmente sob custódia das autoridades, que conhecia mais dele do que o jovem gostaria. Será que realmente valeria a pena deixar a cidade agora? Ao menos sem um plano nas mangas?

— Me vê um trocado, garoto? Só uma moedinha, já ajuda! — Dizia um homem bastante maltrapilha e fétido, enrolado num cobertor sujo e rasgado, tanto que ficava até difícil identificar seu rosto. Ele mantinha a mão erguida a espera de trocados, enquanto seguia Lítio com o olhar. Definitivamente Jerome não estava na parte mais "glamourosa" da cidade. Conforme havia caminhado, as luzes de LED dos postes modernos foram dando lugar a iluminação precária incandescente, grande parte dela queimada ou ausente. Lírio ignoraria o mendigo? Se sim, para onde iria? Estava bem perto de uma saída da Cidade ao Norte, para a Rota 111. Ao Sul, havia a 110, apesar de bastante distante e da necessidade de atravessar o Centro para tal. Tão perto quanto o Norte estava o Leste e a Rota 117. Já o último caminho, na rota que o levava também ao Centro Pokémon, estava a saída para a Rota 118. Diante dessas opções, o que o rapaz faria? ◄

A verdade é que eu não tinha plano nenhum. Eu não sabia o que fazer. Cogitei até voltar para casa, mas eu não poderia encarar o olhar julgador da minha tia.

Quando eu estava quase chorando abraçado a Zyos um senhor me chamou a atenção. Era um mendigo fedido. Limpei minhas lágrimas e ofereci a ele o resto de meu lanche e algumas moedas que tinha.

Me levantei do banco e decidi sair dali antes que chamasse mais atenção de moradores de rua. Liguei o mapa. Precisava seguir para a rota 117, mas não sabia que ruas passar para chegar na saída oeste.

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Ao passar pelo fétido mendigo, Lítio fez questão de lhe dar alguma coisa, afinal haviam pessoas em uma situação ainda mais preocupante do que a dele... Era incrível como metade de um lanche poderia suscitar tanta alegria no rosto abatido de um homem... Mas enfim, o jovem ainda tinha que tomar um rumo na vida, pois ficar parado por ali não lhe renderia quaisquer frutos. Sendo assim, investigou o mapa da Cidade em busca de um destino, observando e interessando-se pela Rota 117 no momento. Entretanto, a região em que se encontrava não era a mais conhecida, dificultando um pouco o processo...

— Está perdido garoto? — Questionou o Mendigo, com sua voz rouca e comprometida, provavelmente pela falta de dentes em sua boca. Ele ainda encontrava-se escondido por uma grande manta, mas a barba peluda não conseguia ser completamente coberta e deixava uma parcela de seu rosto do lado de fora — Eu posso lhe ajudar, conheço essa cidade com a palma da minha mão, até mesmo essa região suja e violenta que estamos. Se me der mais uns trocadinhos... Ou... Nem precisa de trocados. Você é um treinador, não é? Se me der a chance de mais uma batalha, como nos velhos tempos, eu te darei tudo o que precisa. O que me diz? — Questionou o homem, suspirando profundamente e esperando uma resposta. ◄