Chegar na rota 115 ainda não poderia ser facilmente caracterizado de forma única seja de alívio como de tristeza, talvez mais voltado para o alívio por ter finalmente mais liberdade fora do túnel. Eles mal chegavam na rota e já sentiam a situação bem, e talvez completamente, diferente do que imaginava. Uma tempestade tropical.

Aquele vento terrivelmente turbulento parecia rasgar os céus com suas gloriosas nuvens carregadas com sua chuva pesada. Os trovões alcançavam o chão, seja lá onde eles se encontravam, e causavam estrondos que por alguns momentos fazia com que o trio ficasse surdo por alguns segundos, e aquela paisagem praiana com alguns detalhes da montanha de Meteor Falls virava completamente de cabeça para baixo. O céu cinzento tomava o lugar daquele dia lindo e ensolarado que era para estar e as montanhas esbranquiçadas, agora, estavam também acinzentadas por conta da forte chuva.

A rota estava, logicamente, deserta, a trilha, que agora era tomada por uma enorme poça de lama, era a única passagem para Rustboro ou Meteor Falls e os arredores daquele caminho de terra batida era um completo matagal encharcado e repleto de buracos e árvores quase desfolhadas.

Por fim, por falta de opções, a melhor escolha de proteção era a caverna, até então, mas ficar ali não seria uma boa alternativa, talvez algo os aguardasse ali naquela escuridão total sem estrelas.

A mente do garoto se dividia entre enfrentar aquela forte chuva ou aguardar na caverna até que ela passasse. Porém, ela não parecia querer parar tão cedo, o céu preto e os luminosos flashes dos trovões davam uma boa resposta quando a isso. As árvores da rota 115 também já não conseguiam criar algumas “proteções” para a chuva adequadamente, e mesmo de baixo de suas densas folhagens a água ainda conseguia penetrar e molhar tudo o que alcançava.

Naquela neblina total, enquanto a jovem Elizabeth checava seu aparelho para notar alguma informação de abrigo, ou coisa parecida, havia um pequeno ponto de luz se movimentando vagarosamente. Ele permanecia com uma velocidade constante, mas que começava a diminuir aos poucos. Era uma luz fraca e quase se acabando na cor alaranjada.

A garota, após perceber a falta de sinal, o que já poderia ser imaginado devido a tal tempestade, voltava a Shion com respostas vazias e não esperançosas.

Restava saber qual seria a atitude do trio naquela situação, eles tinham algumas opções, mas todas tinham seus devidos sacrifícios a serem feitos. Talvez enfrentar a chuva não fosse uma ideia tão ruim, mas aquilo certamente geraria problemas. Ficar na caverna parecia ser o melhor a fazer, mas a questão dos Pokémon envenenado e paralisado poderia piorar caso eles demorassem a permanecer ali. Também tinham a opção de refazer o percurso da caverna, mas depois de todo aquele imenso esforço em sair dela eles pareciam não querer nem mesmo pensar nisso.

Uma situação complicada necessitava de pensamentos complexos, e restava a Shion, talvez como líder do grupo, resolver a situação.

A intenção muito benéfica de Shion era o suficiente para atrair a atenção daquele ser que, infelizmente, tinha que lidar com a repentina tempestade que tomava conta da rota 115. A criatura, agora, se movia em linha reta na direção do trio, que parecia aguardar por algo sem ter a menor ideia do que, ou de quem, se tratava.

A criatura, em meio aquela densa névoa acinzentada que se misturava com as grossas e pesadas gotas de chuva, ainda era não identificável, mas um ponto interessante era que parecia com que aquela pessoa, sim, pessoa, estivesse carregando alguma coisa em seus braços e a luz laranja-avermelhada se originasse dali. Era alguém bem grande carregando uma enorme mochila em suas costas e algo em seus braços.

A caverna, por sinal, começava ficar molhada e algumas poças d’água que estavam tranquilamente estagnadas em pequenas cavidades negativas eram incomodadas por gotas vindas do teto daquele buraco rochoso. Filetes de água também desciam pelas paredes e o respingo da chuva, poucos centímetros dos jovens, atingiam suas pernas e roupas, com aqueles resquícios de lama e areia que carregavam.

A sua vista panorâmica era muito bem caracterizada por um panorama bem grande de um campo gramado, uma rota cortando este campo e dividindo ele com uma praia em frente ao enorme mar. Dentre essas características naturas eles viam árvores, rochas, a extensão de Meteor Falls e uma pessoa se aproximando daquele único refúgio na tempestade.

Por fim, da maneira mais perturbadora possível, aquele ser se revelava. Eles certamente não queriam ver aquilo, e muito provavelmente se arrependeriam de ter chamado sua atenção.

Aquela pessoa, se isso pudesse ser dito referente a ela, saía do meio daquela densa e pesada neblina e dava o ar da graça, ou desgraça, para o trio. Era um homem velho, com roupas gastadas e sapatos sujos. Uma barba malfeita e cabelo sujo e bem grande. Seu olhar cansado e boca faminta destacavam o que mais chamava atenção em seu rosto.

Seu sorriso sarcástico se mostrava ao ver aquelas três crianças desprotegidas e indefesas ali, jogadas ao vento.

- Obrigado por sinalizar, eu não sei o que faria nessa tempestade. – Dizia o velho que logo se aprumava dentro da caverna junto com os garotos.

Ele carregava consigo uma lamparina bem antiga, e com diversas rachaduras em seu vidro, que ainda estava, por algum milagre, acesa. Ele colocava-a no chão, próximo aos seus pés, e se livrava de toda aquela carcaça molhada que poderia ser chamada de casaco. Lançava-a sobre uma rocha qualquer e logo se sentava sobre ela enquanto não tirava os olhos de Charles.

A lamparina, um pouco a frente do senhor, iluminava bem melhor a caverna, podendo, agora, e revelando, mais claramente toda sua extensão. Era bem ampla, cerca de quatro, ou pouco menos, metros quadrados. Tinha suas estalactites características no alto e alguns filetes de água descendo sobre elas, caindo no chão enquanto ecoavam seus pingos profundamente caverna a dentro.

- E então, o que traz vocês aqui? – Dizia o senhor ante sussurros sombrios.

O velho respirava e dava leves risadas sem graça. Ele abaixava seu rosto e olhava para o chão, como se quisesse evitar o contato visual, e logo passava a mão naquele rosto poroso e nojento com uma barba malfeita e suor seco e salgado, para enfim falar algo relacionado a sua passagem pelo local, naquela tremenda tempestade, ou pouco antes dela.

- Heh... eu estava em casa quando precisei ir à cidade... eu moro aqui perto, sabe? – Olhou, erguendo seu rosto para Shion, enquanto apontava para fora da caverna. – Logo ali...

Ele abaixava novamente seu rosto e continuava falando, como se algo lhe induzisse a isso.

- Enfim, eu já estava no meio do caminho e dar meia volta e ir para casa seria desperdício de tempo, mas como vi que a chuva só piorava e também vi que havia mais alguém por aqui eu decidi continuar. – O senhor olhava, agora, para o lado de fora da caverna, com uma expressão preocupada e bem desanimada. – Espero que aquela moça esteja bem neste temporal...

As palavras poderiam ter alcançado algum lugar na mente, e talvez coração, dos garotos, mas o ponto importante que não deveria ser ignorado seriam as intenções do senhor com aqueles jovens, principalmente com Charles, a quem ele não parava de olhar.