(006) — Holy Ground

Digamos que a última coisa que esperava naquele momento era ser surpreendida. Claro, a velocidade de um peixe na água já é gigantesca e de admirar, mas sob nenhuma hipótese imaginaria que Qwilfish possuiria uma habilidade de dobrar sua natação em meio a chuva. O costume de ter Alakazam e confiar em sua monstruosa velocidade talvez venha me deixando desatenta, achando que qualquer oponente somente atacaria depois de mim. Retirei uma Pokéball vazia da bolsa e lancei no aquático para capturá-lo. Assim sendo, Sushi traria a esfera para mim com seu Psychic.

Sushi parecia tão surpreso quanto eu: o psíquico estava atônito. Manju também parecia perplexa, uma vez que sua combinação com seu irmão mais velho geralmente sequer deixa o adversário se mexer. Respirei fundo, acariciando a raposa e pegando-a no colo.

— Precisamos prestar mais atenção, filhos. — segurei Espeon no colo e aproveitei para retorná-la para sua esfera bicolor — Principalmente você, Sushi. Não somos indestrutíveis. — fitei o topo do Monte Pyre, com diversas descargas elétricas circulando em volta de seu topo — E agora vejo que não estamos prontos ainda para ir até lá.

Fitei o céu com os olhos fechados, deixando que a água da chuva escorresse pelo meu rosto e corpo como uma grande ducha natural.

Decepção.

Talvez essa fosse a palavra mais correta para definir o que sentia no momento. Frustração... É, também. Ser outsmarted por um selvagem que sequer parece tão forte assim só faz com que a culpa comece a corroer todas as veias do meu corpo. Parece bobeira, mas e se esse Qwilfish fosse um Pokémon mais forte? Com mais dano? Mais rápido ainda? Estaríamos mortos. Todos nós. Igual quase aconteceu nesta mesma rota há poucos meses. O pior de tudo é que não tenho medo do fim, mas e meus pequenos? Teríamos nossa vida ceifada por um deslize meu? Como se não pudesse ficar ainda mais péssimo, pereceríamos da mesma forma que minha família há tantos e tantos anos atrás. Como a vida é engraçada.

Abri os olhos, balançando a cabeça algumas vezes para conseguir abrir os olhos. Soltei meus cabelos molhados e fitei Elfman me olhando de volta.

— Sinto muito, mas assim que saltarmos no Pyre, pedirei para que o pescador me leve de volta para onde viemos. — busquei em minha bolsa a Pokéball de Sushi, retornando-o — Não arriscarei a vida da minha família pelo que pode existir lá em cima.  — sinalizei para o pescador, repetindo a primeira frase para o mesmo — Mas fique pela área, quem sabe um dia eu não volte para te ajudar no que precisa?

rota 121

Desistir não é nem nunca foi minha especialidade. Vinda das ruas e aprendendo a se virar com o que tinha, se naquela época tivesse jogado a toalha e renunciado a minha própria vida, talvez sequer estivesse aqui para contar essa história. Meu coração batia forte, ansiando pela aventura que me aguardava lá em cima, mas dessa vez, minha mente era responsável o suficiente para entender que minha vida não era mais somente minha. Meus pequenos são tudo que tenho e hoje não temos força suficiente para chegarmos até lá — pelo menos não sem casualidades que certamente aconteceriam. Monte Pyre já é conhecido por ser o lar de terríveis fantasmas, imagina o ser que está causando tudo isso? Não sou como os treinadores que se aventuraram para descobrir o que há no topo daquela montanha. Minha luta hoje vejo que é outra.

Cerrei os punhos e observei a tristeza no olhar de Elfman. Por mais que quisesse subir com ele, não poderia. Ajeitei a case do violino nas costas e a bolsa no ombro, abrindo um sorriso agridoce na direção do grisalho.

— Claro.  — entreguei um papel em suas mãos — Não pense que se livrará de mim tão fácil assim.

Virei as costas, andando sozinha para a parte de trás do barco novamente. Fitei o topo da enorme montanha e agora o agridoce sorriso se tornava sincero e sonhador, seguido rapidamente de um leve suspiro enquanto fechava os olhos e abraçava o bravo horizonte com meu límpido espírito.

Apoiei ambas as mãos na grade da embarcação e deixei que os grossos pingos d'água que caíam sobre meu corpo lavassem meus medos e inseguranças, como a correnteza de um rio leva uma folha de sua nascente até a foz; mas não sem antes obstáculos tentarem impedi-la, mesmo que por um instante, de alcançar seu destino. Digamos que sou a folha e ainda estou ali, bem no comecinho do leito onde a água começa a se desbravar.

A rota cento e vinte um já havia me feito crescer uma vez. Na marra. Agora vejo que esse capítulo da minha vida está finamente fechado.

Disse mais cedo que não sou como os destemidos treinadores que se aventuraram a subir o destemido Monte Pyre, mas esqueci de adicionar uma única palavra.

— Ainda. — abri os olhos — Ainda não sou como eles.

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