Ruas de Mountrock - Decolando na velocidade das sombras

OFF: Era drama que você queria? Começou a fragmentação de personalidades :mds:

Logo que despertei senti minha cabeça doendo. Talvez tivesse sido pela queda, tanto que minha visão demorou a se acostumar a normalidade. Nana era o primeiro rosto que vi. Ela se mostrava enormemente preocupada comigo. Já os dois pequeninos que surgiam diante da minha visão pareciam contentes, provavelmente por saber que eu estava bem. Mas depois eu olhava para cima e era ofuscado por algumas luzes coloridas que pareciam ser os raios do sol, mas logo davam lugar à alucinação delirante que estava tendo.

Parei para perceber se as pessoas ao meu redor - que não eram muitas - também viam o que estava diante de mim. Ou quem sabe os meus Pokémon. Eu tentava controlar minha respiração para não acabar desmaiando outra vez ao ouvir aquela voz ecoar em minha mente usando palavras como "thito" e "filho". Isso com certeza não estava certo. E não era eu quem dizia. Era a outra voz dentro de mim.

THITO

"Ele não é seu pai. Não tem como ser. Se for, como ele sabe sobre mim? Sempre tomamos muito cuidado. Winnie só descobriu porque demos os dois o mesmo número para ela. Ame só soube porque decidimos contar. Daisuke só percebeu porque é seu melhor amigo e estão sempre juntos nos eventos. Ele não tereia motivos para investigar nosso segredo. A menos que ele estivesse de olho no Matthew e juntou as poucas peças que tinha, e esteve esperando o momento certo para falar com a gente."

MATTHEW

"Ele nunca teve interesse nos concursos, mas... é ele! Ao menos é mesmo da última vez que o vi... O mesmo... "

Isso me deixava com mais medo e receio ainda. A paralisia que eu sentia não era muscular, apesar de ter recebido um combo elétrico atingindo todas as células do meu corpo. Eu realmente não conseguia crer e pelo simples fato de ser o meu... pai bem diante dos meus olhos me faria reviver meus traumas e questionar tudo sobre mim... Tudo que eu sou ou um dia sonhei ser.

— V-você não pode ser... - Real. - Você...

Ele esticava a mão querendo me ajudar a levantar. Eu evitava a todo custo tocar naquele corpo. Minha última experiência fora três anos antes durante uma expedição na Bell Tower. Durante um fenômeno que me levou a um lugar de incertezas e de criaturas perdidas, ele estava lá... Ao menos foi o que pensei até que ao toque tudo se desfez. Naquela época eu já não queria mais chorar. Hoje menos ainda, mas era inevitável. As lágrimas escorriam pelo meu rosto e eu sequer tinha moral para impedir. Eu tinha medo de tocar nele e ter de crer que ele era real, mas também temia que se o fizesse, a cena do limbo se repetisse.

— Eu... eu n-não entendo.

Era tudo o que conseguia dizer.

Todavia, alguém mais tinha incertezas e conseguia me fazer pensar minimamente.

THITO

Isso só pode ser uma brincadeira! Ele "sente muito" pelo que? Por que sentiria? O que aconteceu? Por que esteve longe todos esses anos se aparentemente está bem? Ele lembrava que tinha casa? Filho? Esposa? Pokémon? Ele lembra do pobre Vaporeon? E como pode ser o mesmo se nem sua mãe era a mesma?

MATTHEW

— PARA! - me exaltei tentando calar aqueles pensamentos.

Provavelmente meu... pai... acharia que teria sido para ele por conta da aproximação, que eu ainda evitava.

Azula, Hamtaro e Nana me olhavam assustados. Ora, porque não ficariam? Era óbvio que eu estava abalado e eles nunca me viram tendo uma crise por conta dos meus traumas. Aliás, mesmo se fossem Fera ou Leeh, eu duvidava que conseguissem lidar comigo no momento... Nem eu sabia o que fazer e o que pensar, já que tinha outro fazendo isso por mim.

— Eu.. preciso de um momento - pedi.

Chamaria Nana para perto afim de tentar levantar e me apoiar no dorso dela enquanto controlava minha respiração.

Segunda, 16h45min  
"Sol quente, poucas nuvens no céu. 23ºC"  

Quanto mais eu ouvia aquela voz, mais parecia certo de que era ele. Estava me cercando de certezas, querendo acreditar que era possível sim e que todos estivemos errados todos esses anos. Que a polícia de Goldenrod se precipitou e que ele tinha encontrado um refúgio em Hoenn, mas o jeito como ele falava era estranho. Mesmo assim ainda me fazia mergulhar no passado, como se estivesse me conduzindo a uma espiral dentro da minha própria mente aos tempos de menino. Isto é, se o outro não estivesse ali para me dar a mão e frear a descida.

THITO

"Você não é assim. Sempre desconfiou de tudo e de todos. Porque vai acreditar nessa imagem agora?"

MATTHEW

Em momento algum tive medo ou desconfiei daquela voz na minha cabeça. Era parte de mim e não queria o meu mau, mas estava me impedindo de me abrir e acreditar na figura que afirmava ser meu pai e isso me causava um estranhamento.

"É a voz dele. Eu reconheceria essa voz em qualquer lugar... "

THITO

"Não lembra daquele velho e o que ele fez com você e com a Leeh? O Hypno dele também conseguiu te enganar."

MATTHEW

Então me recordava que Ledian tinha pavor de Pokémon do tipo Psíquico até os dias de hoje por conta daquele episódio macabro. O Pokémon do idoso conseguiu entrar em nossa cabeça e criar situações irreais para nos assustar, mas ele teve um motivo.

"Eu invadi o território dele... Porque alguém usaria uma... me-mó-ria... pra me... ferir...?"

A palavra memória "memória" conectou algumas coisas que realmente não faziam sentido. E sim, eu tinha meus inimigos em Hoenn. Bancar o herói significava interferir muitas vezes nos planos de outras pessoas e algumas delas me faziam juras de vingança. Eu sabia que minha impulsividade em fazer o certo no que acreditava ser justo me traria consequências. Não era atoa que eu, Fera e Emboar tínhamos cicatrizes. Que eu e Ledian tínhamos nossos traumas.

— Eu sei do que eu preciso e não é de mais mentiras. Eu cuidei de mim mesmo durante todos esses anos que você esteve desaparecido. Não vou a lugar nenhum até me dizer o que aconteceu com você...

Ok. Eu não sentia, mas estava chorando enquanto falava. Toda a coragem que reuni para enfrentar minhas emoções se esvaíram ao pronunciar aquelas palavras.

Segunda, 16h55min  
"Sol quente, poucas nuvens no céu. 23ºC"  

Apoiado na Tropius, eu conseguia me manter de pé até reunir forças o suficiente para me manter sozinho diante da situação (que não estava nada favorável, convenhamos). Estava tão afoito que nem tinha me dado conta de que ainda estava com as antenas do localizador de itens na cabeça. Só fui me dar conta quando as antenas alcançaram as bananas no pescoço de Nana. Num movimento pesado, as guardava por um momento na bolsa junto do pokénav.

Minha respiração era um pouco menos violenta agora. Só que por mais que ele tivesse se afastado, como pedi, não me deu um momento para por minha cabeça no lugar. Ele insistia em querer responder minhas perguntas, mas não ali. Era como se estivesse com medo ou se escondendo... Isso só me preocupava ainda mais. Em nenhum momento por mim, mas por ele. No que tinha se metido?

THITO

"Isso está muito estranho. Porque ele não se explica logo de uma vez? E por que você está pensando em seguir ele?"

MATTHEW

Thito era o único que parecia se importar mais conosco que com meu pai. Eu compreendia, mas não me parecia o certo naquele momento. Eu queria muito dar o benefício da dúvida a ele. Sempre fui esperançoso, mesmo que desconfiado.

"Eu não sei... Mas eu preciso saber da verdade e se preciso for eu volto no limbo para descobrir."

Eu realmente precisava saber o que estava acontecendo. Só assim vou conseguir acreditar que não era delírio ou alucinação. Só assim poderia fazer as pazes com meu passado e reorganizar meus pensamentos embaralhados e largar de mão os mais sombrios.

Thito se calava, pois eu já tinha tomado minha decisão.

Retornava Nana para a pokébola e fazia o mesmo com Hamtaro. Quando tentei chamar Azula de volta, ela negou querendo ficar do lado de fora. Eu não estava com ânimo para lidar com os dramas dela então apenas permiti, indo de encontro a figura que se movia. O caminhar era lento e pesado. Eu engolia em seco e me sentia fraco, mesmo reunindo a coragem que ainda persistia comigo para um beco na virada da rua pouco movimentada.

Particularmente becos escuros não eram minha definição de lugar privados para uma conversa sensível. Meu senso de perigo alertava, mas eu tentava ignorar. Azula ao menos se mostrava atenta a eventuais sinais de perigo, já que os pequenos roedores tinham esse sentido apurado, precisando estar sempre alerta contra grandes predadores. Talvez alguém estava atrás do meu pai. Será que aquela organização estava por de trás disso?

Segunda, 16h55min  
"Sol quente, poucas nuvens no céu. 23ºC"  

Minha respiração voltou a ficar estranha, como se eu estivesse perdendo o fôlego a cada passo que dava. Meu estômago se revirava e eu tinha de me esforçar para segurar o nervosismo como podia. Eu já tinha deixado de sonhar com o retorno dele há anos e do nada ele retorna? Sem mandar um bilhete? Nenhuma informação escondida? Nenhum sinal de vida que só eu pudesse identificar? Eu realmente estava tentando manter minha fé nele acesa, mas a medida que passava um tempo com ele, mais minhas dúvidas questionavam tudo naquela presença.

Ao entrar no beco, as mesmas luzes cegantes de antes. E não podia ser ação solar, pois elas tinham um padrão. Aquilo foi estranho... Talvez Thito tivesse razão. Eu estava querendo tanto acreditar nele que não estava totalmente atento aos sinais a minha volta. Eu não era assim, mas talvez eu estivesse cansado de me blindar a todo instante, como se nunca pudesse me permitir ser fraco. Ser vulnerável. Meu pai com certeza seria a chave perfeita para baixar todas as minhas defesas, mas era irreal demais querer insistir naquela história.

Enquanto ele falava parecia o certo. O que eu gostaria de ouvir. É claro que ele poderia ter me visto. participei de inúmeras copas entre Hoenn e Tohjo. Levei o nome dele a pódios e fiz o meu próprio nos palcos de concursos e teatros como Thito. Eu levei minhas mãos nos bolsos, ainda ouvindo as palavras dele, enquanto chorava em silêncio, permitindo que aquelas palavras se entranhassem na minha mente. Quantas vezes eu tinha sonhado em ter meu pai ao meu lado nos meus melhores momentos? Poder compartilhas das minhas vitórias toda vez que retornasse a Goldenrod e me sentir completo de novo. Mas aquilo... Aquilo não suava certo. Era de alguma forma vazio... E confuso.

Minha cabeça doía com aquelas novas informações. Não sabia ao certo o que sentir. Ele estava "envolvido" com quem? E como assim devendo dinheiro? Para que ele precisava disso? Nunca faltou nada em casa, pelo contrário. A agonia que eu sentia de toda aquela situação me fazia querer gritar e sair correndo. Se não fosse pelo respinho de fé e curiosidade que restara...

— Porque você ta falando assim? E porque veio falar comigo só agora? Tem alguém te perseguindo? Você precisa de alguma ajuda?

Por mais que minhas incertezas ainda permanecessem, tinham dúvidas mais urgentes que precisariam ser respondidas antes de qualquer coisa.

Segunda, 16h55min  
"Sol quente, poucas nuvens no céu. 23ºC"  

"eu me envolvi com alguns rocket"

Aquelas palavras foram mais fortes que um Giga Impact e agora eu quem necessitava de um turno de descanso. Suspirei pesadamente, tentando não surtar uma outra vez. Thito parecia estar em silêncio, agora em acordo comigo. Aquele padrão se repetia e não havia nenhuma troca de ambientes. Respirei fundo, ainda tentando prestar atenção nas palavras dele, mas já era muito difícil de acreditar. Depois de mais de 6 anos sem acharmos o corpo do meu pai, ele estava de frente ao filho único e pedia dinheiro? Aquela história cada vez mais cheirava mal, porém, alguma coisa dentro de mim insistia em dizer que fazia sentido, por mais louca que fosse a explicação. Pensei de novo naquelas luzes e minhas experiências passadas com Psíquicos...

Tudo que veio depois foi tão falso que me senti idiota por ter caído naquele truque. Mas passou. Agora no lugar, uma raiva intensa crescia. Minhas expressões? As mesmas de antes. Incrédulo com lágrimas escorrendo nos olhos. Só que agora era minha vez de jogar.

— Entendi. Eu tenho bastante grana guardada num cofre da minha residência aqui na região, eu posso te ajudar com isso de boas. Seria incrível te apresentar o lugar, tem vista pro mar! Você, como especialista em Aquático, iria adora pai!

Tentei não vomitar. O Thito era um ator com muita experiência e não me deixaria fazer um papel menos que excelente de filho pródigo. Eu realmente não me importaria de pagar a dívida de um pai. Assim como minha mãe, que era criadora e tinha imensos fundos e propriedades em Goldenrod. Talvez o significado de família não fosse o mesmo para todo mundo. Uns criticam, outros usam, alguns abandonam, mas na minha a gente se apoia. Era assim que eu trabalhava com meus Pokémon. Como fui ensinado.

— Sabe, eu não to em jornada há meses, na verdade tem mais de três anos e eu acumulei bastante coisa durante esse tempo. Fiz muitos amigos. Evoluí muito. Aprendi muito... Ah! Aliás foi engraçado você comentar da Nana. É claro que ela é rara, mas deve ter um monte em Hoenn. Agora o meu Trubbish? Ele sim é um Pokémon único, quer ver?

Sem esperar por uma resposta, eu sacava a esfera de cor ciano e branca, sussurrando algumas palavras na capsula antes de revelar o Holy Trubbish. Pedi para que usasse Acid Spray nos olhos daquele homem e em seguida Toxic Spykes para cercá-lo. Enquanto isso, estalava os dedos para Azula subir em meu braço, pois a lançaria depois de dizer o que eu queria que ela fizesse — Não estou achando a Pokébola do Hamtaro nem da Nana. Mete o cacete usando Nuzzle e verifica se fomos roubados.

Eu estava em meu eixo novamente. Ainda emocionalmente abalado, mas não mais instável. As lágrimas que saíam dos meus olhos agora ardiam em amargura ao pensar que alguém violou minha mente e as lembranças que tinha com meu pai. Estava farto de ser o bom moço. Minha integração na Avengers não foi para estudar administração e contabilidade. Foi para fazer justiça com minhas próprias mãos.

Aquela experiência reviveu algo latente em mim. Aquele espírito frio e vingativo movido pelo ódio que poucas vezes mostrou a face. Nunca me orgulhei dessa parte mim, mas também nunca a reprimi. Só permitia que co-habitasse porque foi a força que me incentivou a treinar nos dias mais duros e nas noites mais traumáticas. E agora ele surgia novamente, entrando no jogo mental de quem quer que fosse aquele homem.

Segunda, 16h55min  
"Sol quente, poucas nuvens no céu. 23ºC"