Pokémon Mythology RPG
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Ato 03 — Libertação.

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Ah, se os ares não soubessem que tudo aquilo seria passageiro... O paladino da razão, natural de Pallet se via, pouco a pouco, refém daquelas emoções que sempre suprimiu em virtude de seu desenvolvimento consciente. Ao menos, naquele momento, os sentimentos mais ternos afloravam daquele terreno tão pedregoso e ácido com um único toque — vindo de palavras de seu querubim de madeixas douradas. Um prazer inenarrável, brando, único.

Se dizem que Arceus escreve certo por linhas tortas, quiçá uma evidência estivesse amostra naqueles dois. Emma encontrara seu mundo vazio, sem vida, como dito em Gênesis, capítulo 1, versículo 1. Contudo, estamos falando de um outro livro, e a sentença proferida pela moça era diferente: “eu te amo”. Bastou uma frase composta por apenas três palavras, metafórica e coincidentemente conforme o livro sagrado do cristianismo. Aquela energia tão cálida e serena preenchia a casca alva e moribunda vista pela primeira vez sob uma árvore na rota cento e um, acompanhado de um meigo Charmander. Esse mundo agora garrido saboreava um pouco da sensação tão prazerosa de quando ainda era um garoto; flashes nostálgicos, em sinestesia aprazível e mansa, acalentando o intrínseco lancinado aos poucos.

Não é necessário dizer que aquela dupla não queria se encontrar, mas sim se perder: nos braços do outro, desfrutando de beijos, abraços, carícias e declarações como cada um bem entende. Trazendo à tona os seus romances da parte de Emma, ou algumas de suas nerdices e teorias que Nicholas tanto valorizou. Enquanto para a loura estava materializada a figura de Romeu em seu par, para o louro, estava a peça do rei de xadrez; a mais importante, que deve ser protegida a todo o custo — como o mesmo dissera, não seria esforço algum, não é?

Ainda assim, estavam em uma floresta. Mais precisamente, na rota cento e quinze, ao norte de Rustboro, auxiliando uma garotinha absorta em seus próprios demônios, que transbordaram assim que se deram conta de que sua fada, Clefable, escudeira e amiga mais fiéis, havia sumido. Até o momento, foram conduzidos à uma cerimônia fúnebre, carregada de emoções e melancolia, trazendo à tona todos aqueles pesadelos o qual Nico tanto buscou fugir e, mais uma vez, enlaçaram-no. Durante o rito de passagem do lenho aos pós vida, uma excêntrica sombra tocara o peitoral do já falecido Shiftry, que se esfacelou em corpúsculos cintilantes e se dispersaram pelos arredores daquelas pequenas sementes arredondadas. Algum odor, pouco tempo atrás, fora detectado pelo canídeo cinzento.

E não obstante, não há como se esquecer de Seedot. Aquele único curioso se juntava ao trio na cruzada em busca de Clefable, agora sobre os ombros da loura, com os orbes sempre inquietos, dançando sobre aquela silhueta esguia com a perna debilitada; curioso pensar que fora na figura do treinador que o gramíneo buscara refúgio depois de Shiftry partir. Tecendo o destino como um roteirista díspar e, quiçá, excêntrico, o Alpha do universo o fez como um porto seguro em um momento lúgubre como aquela despedida.

As incertezas do destino, não é? Ora, se nem mesmo os mais renomados teóricos com formações ínclitas e respeitadas em todo o globo terrestre ousavam prever, com exatidão, o que aconteceria a seguir, quem somos nós para o fazermos.

Resolutos e determinados, agora com um novo ar ao redor daquele trio, seguiram guiados pelo faro do quadrúpede noturno na direção dos confins da floresta. Nicholas fazia questão de marcar com sua memória por cada canto que passavam, afinal, às vezes é necessário se dar um passo atrás para se dar dois à frente — desta vez, não exatamente como aqueles checkpoints posteriores; ficava registrado claro apenas em sua memória o caminho para retornar se fosse o caso.

Em determinado ponto, Mightyena projetava sua face para cima em um local indistinto daquele emaranhado de árvores e relva, estampando confusão em sua feição. Em movimentos repetidos na horizontal, os olhos do lupino com a maior inocência indicavam o que já estava óbvio: perdera o rastro. Até o momento, o noturno sempre fora um rastreador exímio, que os guiou até um ponto chave diante de toda aquela trama, contudo, naquela ocasião, tão específica, acabara falhando.

— Você já fez muito, obrigado. Quando for necessário, te chamarei novamente — manso, exprimira Nicholas ao canídeo. A mão destra do treinador buscava a esfera bicolor do monstrinho, evocando o feixe de luz vermelho-sangue que envolvia o corpo do mamífero, recolhendo-o de volta para o apetrecho.

As pálpebras de Nico se cerravam por breves segundos. Sua mente agora exibia tudo o que gravara daquela cerimônia ao lígneo que pudesse aproveitar ainda naquela ocasião — com a razão a todo vapor, afugentava eximiamente todas aquelas memórias agourentas. A cena em que despertara com a reação súbita de Natu fez-se mais clara, enfim. Célere e misteriosa, uma sombra, disforme, tocava ao peito do lenho falecido, acarretando todo aquele acúmulo de energia alva e posterior dissipação, tal o vento faz com algumas espécies de flores para polinizá-las.

“E se aquela situação não fora a mesma ocorrida com Clefable?”, pensara. Até o momento, Nicholas só podia desconfiar daquela única manifestação sobrenatural diante de seus próprios olhos. Se a fada fora raptada por aquilo, provavelmente, teria sido arrebatada daquele mesmo modo.

— Natu, acha que consegue rastrear aquela sombra? — soprou ao pássaro em seu ombro, audível apenas a ele.

Não é necessário nem dizer que, se ele fosse capaz de fazê-lo, se guiariam a partir dos instintos paranormais do psíquico, correto? Sendo capaz de controlar energias místicas, o pássaro poderia ter um instinto muito mais aguçado que três humanos simplesmente andando a esmo na rota cento e quinze. Ainda assim, o louro se aproximaria de Seedot e inquiriria, audível apenas a ele — e Emma, já que estava em seu ombro — se o mesmo havia visto Clefable, descrevendo minuciosamente esta para que a semente tivesse algum lampejo de suas memórias.

De alguma maneira ou de outra, precisaria, prosseguir, nem que recuassem para o local de onde partiram há pouquíssimos metros dali — entenda como a lápide figurativa de Shiftry.

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Estou certo de que já citei o quão reconfortante é ver Nicholas assim. Aquece o coração, acalenta a alma. Talvez eu esteja requirindo bastante expressão emocional por parte do treinador, mas não é exatamente como se eu pudesse evitar. Sabe, nem todos nós temos uma figura tão suntuosa para descansar os olhos; o espírito.

Então às vezes, acabamos por despejar-nos sobre algum alguém, que demonstra gentileza e simpatia. Em meio a tão intensa solidão, enganchamo-nos nos sentimentos alheios, por falta dos nossos próprios. Portanto; sim, até mesmo a alegria presente em um mundo artificial, reinventado; é capaz de causar euforia.

Uma figura alada, descendente do próprio firmamento, as encostas não visíveis das nuvens. Um ser que, com sua graça fotocinética, orienta, leva adiante. Alguém que Nicholas teve a sorte — e provavelmente, o prazer — em encontrar. Que talvez, Sofya também tivesse encontrado... Um farol na infinita noite tempestuosa de nossas vidas.

Confiança é algo relativamente fácil de se conquistar. Mas que é colocada constantemente em prova, revista, analisada repetidamente. Da mesma forma que é fácil confiar, é ainda mais fácil magoar-se. E ainda assim; ao mesmo tempo, é por meio de tal sentimento que somos capazes de notar em quem realmente queremos permanecer próximos.

Angústias são coisas difíceis de se lidar; mas com alguma ajuda, podemos contorná-las. E bem, estas não eram as únicas coisas que aquele pequeno grupo na floresta precisava contornar. Sussurrando um agradecimento, Nicholas guardou seu pokémon noturno. Bem, se iriam seguir uma sombra, talvez fosse melhor mesmo manter o grupo mais discreto, menor.

Felizmente, no entanto, o louro tinha sempre boas ideias em suas mangas. Se ele vendesse aquela camisa, provavelmente ficaria rico. E bem, ele não só pensara em uma maneira de sair daquela situação, mas encontrara duas formas que, apesar de distintas, poderiam complementar-se perfeitamente.

Natu, que estava sobre o ombro de seu treinador, ouviu as palavras deste com atenção, fechando os olhos logo em seguida. Usualmente, o pássaro poderia não ser o melhor rastreador possível, mas bem, aquela situação certamente não era usual. A tal sombra tinha algo a mais... Um quê sobrenatural. E bem, nestas horas, os poderes especiais do monstrinho poderiam ser bastante úteis.

E claro, qual ideia poderia ser melhor do que a de pedir auxílio a um morador da florestas? A semente encarou Nicholas pelo que pareceu ser uma completa eternidade; seus orbes planos e incólumes, imóveis. Então, subitamente, soltou-se das costas de Emma, caindo no chão com um baque surdo. E...

Rolou.

Sim, utilizando de fatores físicos dos quais sou incapaz de descrever, junto de seu formato razoavelmente arredondado, ele começou a deslizar pelo solo, avançando sozinho. O pássaro de Nico emitiu um piado grave, apontando uma asa para a semente, como que indicando que deveriam segui-la. Bem, se ambos os pokémon haviam concordado em um mesmo ponto, por que não ouvi-los...?





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O psíquico cerrara as suas pálpebras, quiçá concentrando as suas energias paranormais, focando os seus poderes para que conseguisse localizar aquela excêntrica e misteriosa sombra que assaltara o inerte corpo do lígneo. Sem perder tempo, o loro dirigia-se agora à noz sobre os ombros da treinadora; os orbes jazeram estáticos sobre a figura de Nicholas, fitando-o por um tempo. Ergueu sua sobrancelha começando a pensar já no pior — isto é, Seedot não saber. E, mais súbito ainda, o gramíneo jogava-se contra o chão.

O soído como se uma casca oca caísse sobre o chão impulsionou uma breve risada do treinador. Por um ínfimo segundo, sua face se contorceu, mordendo o lábio inferior para que uma gargalhada não irrompesse de suas cordas vocais. De imediato, os orbes cerúleos dirigiam à companheira, deixando aquele sorriso no canto dos lábios tão singelo e puro. Era apenas um reflexo do quão grato estava de tê-la ao seu lado.

Seedot começava a açodar para uma direção. Quiçá assimilando a indagação feita pelo treinador para localizar a fada extraterrestre, iniciara como o mais novo guia do trio, substituindo o lupino noturno. Simultaneamente, o psíquico abrira suas pálpebras conscientemente. Utilizando de seus dotes paranormais, agora elucidado, direcionava as suas asas na direção cuja semente já estava a caminhar.

Como se não bastasse ter uma certeza, agora Natu confirmava a hipótese. Nicholas confiava plenamente no psíquico, afinal, fora ele quem salvara a dupla ainda na rota cento e um, alertando-os sobre o avanço rocket. Sem dizer muitas palavras, apenas acenou com a cabeça para que seguissem o gramíneo para onde iria. Em passos morosos — decorrência de sua perna debilitada —, iria pela direção indicada pelo gramíneo.

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De fato, não havia muito mais a fazer em tal situação senão apenas observar; seguir. Em um lugar no qual poderosos monstros mágicos rondam indiscriminadamente, fazendo do caminho que traçam um mundo totalmente novo; talvez os humanos acabassem por tornarem-se uma peça à parte naquele tão complexo quebra-cabeças.

Nico não tivera apenas a confirmação de um; mas de dois pokémon. Um deles, nativo do local no qual encontravam-se perdidos; o outro, conhecido notoriamente por ser dotado de capacidades intelectuais. O jovem vinha tomando ótimas escolhas; e realmente, no momento, apenas ir de acordo com os monstrinhos parecia ser a melhor que poderia fazer.

Emma aproximou-se do rapaz, tendo um olhar terno ao observá-lo. Ela ofereceu a ele ajuda, dispondo a si mesma para servir como um apoio ao loiro. Sim, apesar de não ter sido citado tão enfaticamente, o tempo todo, Nicholas ainda estava ferido; e provavelmente, correr daquela forma não era assim tão recomendado.

Se não fosse pela morosidade letárgica com a qual avançavam, a tristeza refletida nos orbes da pequena garota que tomava a mão de Emma, e claro, a pressa em que tinham para progredir; talvez os enamorados pudessem ser vistos como uma casal feliz que levava uma jovem conhecida para uma alegre caminhada em meio à floresta.

... O que, apesar de não ser uma mentira ao todo; estava longe de retratar toda a realidade.

A noz continuou a rolar por um bom tempo; emaranhando-se por entre os ralos arbustos e vetação gramínea, encontrando um caminho por entre as plantas de grande porte. Infelizmente, parecia um tanto quanto alheia à situação delicada que aqueles a quem guiava estavam. Contudo, tenho certeza de que não fazia por mal, era apenas incapaz de perceber, mesmo.

Após um certo tempo, pode-se notar uma determinada mudança. A mata começou a ter um espaçamento maior entre as plantas; as mesmas começaram a diminuir ligeiramente seu tamanho. Alguns raios de sol já eram capazes de atormentá-los, passando por entre as copas das árvores; e o ar não era mais sufocante, quente e úmido; um mormaço irritante.

Quer dizer, quente e úmido ainda era. Contudo, tinha um toque mais... gentil. E também um pouco mais... salgado? Exatamente. A brisa havia mudado; tanto de direção quanto de natureza; e agora carregava a doce salinidade marítima. Era um tanto quanto relaxante. Não muito tempo depois, eles puderam ver, também.

A paisagem era simplesmente deslumbrante. A imensidão azul inferior; que se misturava com os tons claros do firmamento onde a vista já não alcançava mais, era quebrada por pedaços rochosos que sobrepunham a água; alojando-se como barreiras naturais, quase como se tivessem sido posicionadas artificialmente. Talvez, fossem deslizamentos das encostas rochosas da própria rota, que desabavam sobre a superfície marinha.

Eles podiam apreciar a vista sem muitos problemas: estavam sobre uma falésia, ao fim da selva. Dali, era possível ouvir o baque das ondas chocando-se contra as paredes naturais, enquanto os Wingull grasnavam céu acima. Todo o litoral da Rota era visível; inclusive as poucas linhas de areia que cortavam o mar; como sendo pequenas ilhas.

Até mesmo a pequena e tristonha Sofya não conseguiu deixar de exibir um frágil sorriso ao observar a cena. Sim, às vezes, todos nós precisamos curvar-nos perante as forças da natureza; quando notamos o quão pequena nossa presença é, quando em comparação com as suas grandiosidades pré-formadas.

Aliás, por falar nas pequenas ilhas que cortavam o azul marinho, Natu parecia um pouco inquieto para com as tais. Seedot havia parado, como se ali fosse o mais longe que pudesse —  ou quem sabe, soubesse — chegar. De qualquer forma, o psíquico ainda não estava muito alerta. Quem sabe, o grupo poderia explorar um pouco a área, sem compromissos ou preocupações.

... Ainda que o que mais tivessem fossem coisas com que se preocupar.





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O rumo parecia definido para o trio, tendo como guia o habitante daquela floresta desconhecida, dona de eventos excêntricos capazes de mexer com a estabilidade mental do louro, revivendo os pesadelos presos nos confins de seu âmago. De início, achava cômica a movimentação de Seedot. Mesmo com seus pézinhos, tão exíguos, rolava pelo tapete verde da floresta; o movimento de se impulsionar no chão em meio a cambalhotas espalhafatosas estavam longe de ser perfeitos, pois mesmo com seu formato arredondado, não era exatamente um círculo perfeito. Descontraía-se em meio a risos inocentes o outrora cismático treinador, acalentado pela presença angelical ao seu lado.

Mesmo que avançasse com toda a sua velocidade máxima, ainda assim os passos eram vagarosos. Sem pestanejar, a treinadora prosseguia ao lado de seu companheiro, entrelaçando seu braço canhoto sobre o direito do rapaz, prestativa. Os orbes anis lembravam a calma oceânica das águas que banhavam Pallet antes de toda aquela catástrofe responsável por ruir a terra natal de Nicholas, e o firmamento livre de qualquer nuvem negra tempestuosa; sempre tão terna, afável. Quiçá, estamos falando da obra prima de Arceus.

— Você é um anjo — murmurou, brando à treinadora. Avançava seu rosto contra o da companheira, roubando um singelo e breve beijo dos lábios róseos de Emma; ah, como era inigualável banhar sua alma nas águas sempre tão mansas da Ilha dos Amores.

Não era como se necessariamente precisasse de ajuda, afinal, conseguira avançar utilizando sua própria força durante todo esse tempo. Contudo, a sua debilitada perna era uma “desculpa esfarrapada” para que eles se unissem em carne, afinal, o espírito dos dois já estavam enlaçados desde os eventos no hospital, ainda na magnânima cidade de Rustboro. Respirou, com o diafragma padronizando as expirações e inspirações em ritmo suave, tal os acordes doces da harpa de Orfeu, que, por ordens superiores, tocava sua mansa melodia àquela alma a beira do colapso. Conseguira manter em unidade aquela fragmentação dual de outrora.

E dessa maneira, prosseguiam. Receosa e preocupada, a garota de longas madeixas castanhas buscava as alvas e cálidas mãos da treinadora de Kalos, pressionando-a em nervosismo. Se por um lado Nicholas já estava em paz consigo mesmo graças ao singelo toque de Emma, quiçá tatear o ser celestial que se colocava entre aquelas duas vidas não fizesse a mesma coisa? Nem que fosse um refúgio momentâneo até ter o ente querido de volta, mas aquela fortaleza de amor e um calor tão terno ao âmago poderia fazê-la se sentir melhor; ao menos, até saberem mesmo onde Clefable estava.

A floresta não preparou armadilhas ou situações melindrosas, ímprobas de se contornar devido ao estado da perna do louro. Apesar da inospitalidade do ambiente, conseguiam progredir com êxito pelas trilhas da rota cento e quinze. Depois de uma experiência horripilante próxima à Littleroot, era natural que um calafrio percorresse a espinha do flagelado consciente, um bravo guerreiro contra os temores emocionais; contudo, este cavalheiro chamado Razão seguia forte dentro do intrínseco do garoto, afastando aqueles pesadelos e angústias de assaltarem o seu cérebro. Apesar de inquietos, os orbes cerúleos dançavam pelo ambiente mais tranquilos; a presença de seu psíquico e de seu inseto alado eram fundamentais para que permitisse baixar minimamente a guarda, todavia, ainda suspeitando dos arredores.

O avanço, entretanto, era um sucesso.

O vento agora carregava uma salinidade sem-par se comparado ao ar puro da floresta. As árvores, de menores portes e cada vez mais esparsas no terreno. Sem plantas altas, as copas já não conseguiam impedir o avanço da radiação solar e sua luz. A penumbra das florestas já começava a se clarear, incomodando a retina dos três de início, sendo necessário ínfimos segundos até que o cristalino do trio se ajustasse à iluminação proveniente do sol. O caminho seguia dessa mesma maneira, até que chegasse ao fim, em que a semente estagnasse, enfim, diante de uma vista confortante a qualquer ser vivo. Não tardou para perceberem que estavam finalmente em frente ao mar aberto da rota cento e quinze, o destino inicial do louro antes de conhecer a sorumbática Sofya — aos poucos, a mesma começava indicar melhoras. O suave movimento das ondas juntava-se ao coral de Wingulls ao céu, arrancando momentaneamente toda a melancolia no inquieto coração da criança. Uma paisagem digna de filmes, harmônica, testemunha da genialidade do Criador do Universo.

Parou por um instante. Por mais que estivesse sisudo, ainda havia alguém sentimental dentro de toda aquela casca inexpressiva. Buscou os olhos da treinadora por um instante. Era como se a mesma fosse um ímã, que sempre bramia para que Nicholas se aproximasse dela em busca até mesmo do menor, porém terno contato. Devo admitir: era de uma melosidade absurda, e eu, como narrador, tenho algumas reações adversas diante de tudo isso. Mas, como simplesmente enterrar aquele adolescente apaixonado, sobrevivente diante de toda aquela austeridade mesmo depois de eventos como os de Rustboro? E não posso me esquecer de que a humanidade, se é que podemos chamar assim, se alimentava da presença da loura; sem ela, assim como visto nas ruas da metrópole, Nicholas era apenas um espectro emaranhado de ódio, frustrações e vingança.

Por mais que ainda ache brega tudo aquilo, não posso dizer que não haja fundamento para tal. Ele também tem dezessete anos, e até então, ainda não havia experimentado um amor recíproco como aquele; ela apenas havia se sentindo acalentada pelo sentimento no mundo onírico de seus contos de fadas. Apesar de não ser necessariamente um Romeu, Emma enxergava Nicholas daquela maneira. Depois de analisar tudo isso, creio que eu seja apenas um mal-humorado ou ranzinza.

Que continuassem assim. Por dias, meses, anos... uma vida. Perto um do outro, sentiam-se vivos.

Nicholas caminhara até a companheira. Mais uma vez, as mãos do rapaz buscavam o pescoço da treinadora. Seu membro direito dirigia-se lentamente aos fios dourados da garota, afagando-a. Impulsionava seu corpo contra o dela, lento e manso. Como de praxe, um segundo beijo era retirado daquela fonte infinita de amor; era sucinto, ainda assim, um pouco mais demorado que o último ainda na floresta. Com as testas coladas, sentia a respiração branda de Emma. Aquela mão outrora acariciando as madeixas da treinadora, agora recuava um pouco, jogando uma mecha para atrás das orelhas da mesma.

— Desculpa, nem eu sabia que era tão meloso assim — murmurou em meio a risos tão cálidos e eufóricos. Agachava-se então, fixando o profundo azul de seus olhos com aqueles castanhos tão lúgubres por um breve tempo. Um sorriso faceiro lhe tingia a face gradualmente; ergueu sua mão direita na altura da testa de Sofya, deixando apenas os dedos médio e indicador tesos. Súbito, avançou-os gentilmente contra a testa da criança com pouca força, apenas impulsionando-a para trás suavemente. Com o mesmo membro, afagava a sua cabeça. — Nós estamos chegando. Não se preocupe.

Ergueu o seu tronco, volteando o seu corpo na direção do mar. Sempre atento, sabia de que, por mais que aparentasse tranquilidade, Seedot e Natu não o levaram ali por um acaso. A inquietação do psíquico fora notada por seu treinador, mas ainda não havia o porquê ficar alarmado; ao menos, por enquanto. Varreu os ambientes com seus olhos, buscando uma alternativa segura de descer e explorar a praia e, quem sabe, encontrar o monstrinho que planejara antes mesmo de entrar na mata da rota cento e quinze. Dessa vez, esse seria o objetivo secundário, afinal, comprometera-se a encontrar Clefable.

E, com certeza, faria.

Naquela ocasião, resumiria apenas a descer ao chão arenoso próximo ao emaranhado de águas salgadas abaixo daquela falésia. Pediu a Natu para que, se o mesmo sentisse qualquer inquietação, o avisasse de imediato para que seguissem seu aguçado sexto sentido atrás da fada. Enquanto isso, Ninjask seriam os seus olhos nos ares, alertando de outros perigos para que o psíquico conseguisse se concentrar por completo. Dessa maneira, seguiriam.

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Anjo. Do grego ángelos; mensageiro. Agouros de boas novas, palavras divinas. Sinônimos de luz, pureza, perfeição. Não importantes apenas para como uma inspiração artístico-literária, mas também como uma forma de policiar os comportamentos humanos, de guiar, ser âncora e farol. Então sim; Nicholas não estava errado em chamar Emma por meio de tal aposto. Afinal de contas, ela carregava muitas de tais características.

Um clima leve, um tanto quanto mais alegre. Todos pareciam aliviados; mesmo sem saber exatamente o por quê. Talvez, fosse apenas radiante, o fato de que eram agraciados por uma tão bela vista; um tão cômico jeito de andar — ou rolar; a simples alegria calorosa que invade o corpo sem motivo ou explicação. Apenas... invade.

E isso é bom.

Afinal de contas, já há muito sofrimento; trevas neste mundo. Se temos algum tempo hábil para sorrir e ser motivo de sorrisos; ao lado daqueles quem amamos; por que não? Por mais problemas que tenhamos, às vezes só é preciso... deixar ir. As lágrimas podem esperar para caírem e desfazerem-se. Talvez o essencial fosse tentar ter alguma diversão, um momento de descontração para desiludir a alma.

Tudo é uma questão de perspectivas; da tão famosa semântica. Como eu poderia chamar de emaranhado de ódio alguém tão doce e apaixonado? E ainda assim; como poderia apiedar-me de alguém que incinerou o corpo de um ser semi-morto? Não, precisa-se da análise da situação. Saber o que acontecia; como acontecia.

Talvez o importante fossem os sentimentos. Emma apenas sorriu, retribuindo gentilmente todas as investidas do rapaz — que apesar de ousadas, eram funcionais. — Não se preocupe. Meloso ou não, ainda é você. E isso basta para mim — respondeu ela, ainda com seu rosto unido ao do louro, em sinal de carinho.

Em seguida, já tomando caminho para a praia, afim de explorar a areia branca que envolvia — ou era envolvida pelo — mar. Este estava calmo, com ondas pequenas e suaves. A água azul não era cristalina; ocultando o que quer que pudesse estar por ali, mas não parecia ser de maneira alguma perigosa ou conturbada.

A descida era íngreme, mas eles conseguiriam percorrer sem muitos problemas. Haviam pequenos degraus naturais nas encostas, que podiam ser usados para um avanço lento mas seguro. Os pokémon permaneciam atentos — exceto por Ralts, que estava apenas balançando a cabeça alegremente — mas não pareciam ter muitos problemas até então.

Ao chegarem, Emma sorriu. — Como é bonito... As nuvens estão começando a tapar o sol, então não está tão quente — comentou ela, ao notar que o céu começava a ficar um pouco mais nublado, interferindo diretamente na coloração das águas, que agora ficavam levemente acinzentadas. — Aliás, com todo esse vento, está até fresquinho... Mas eu gosto!

Em seguida, a loira olhou para a criança que tomava sua mão. A pequenina parecia mais calma, de fato. Seus olhos não eram mais de um vazio incólume, e inclusive reluziam um pouco. Tinha deixado de sorrir; passado o encanto inicial; mas também já não estava naquele estado mórbido de prostração. Foi a vez de Emma sorrir — novamente.

Ei, anjinho. você já construiu um castelo de areia antes? — perguntou então, subitamente. A jovenzinha estava confusa; quase que atônita, como se não tivesse ouvido muito bem. Após piscar repetidas vezes, Emma voltou a proferir doces palavras. — O que acha de fazer um agora?

Eu... Eu não... — sussurrou a menor, ainda hesitando, sem saber como reagir. Então, olhou novamente para o rosto sorridente da loira. Colocou uma mecha de cabelo que caía sobre seus olhos atrás da orelha; apertando a mão da nativa de Kalos. E exibiu um tímido sorriso. — Você poderia me ensinar...?

Emma lançou um olhar de quem pede por paciência, e levou a garota até a beira d'água. Em seguida, começou a juntar montinhos de areia com as mãos. Ralts estava junto; utilizando sua força mental para controlar os grãozinhos. A loira ria e brincava com a menor, molhando a mão na água, convidando a pequenina para fazê-lo também.

... Por que não fazer mais uma pausa para entretenimento?





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Não era apenas um acaso toda aquela paisagem celestial diante da vista do trio. Generoso, o Engenheiro ainda deixara alguns lances de escada para que pudessem descer aquela falésia à principal atração. Com algumas pedras desgastadas — seja pelo vento ou pela ação das águas —, uma trilha fora deixada com a finalidade de explorarem a praia mais abaixo. Por mais íngreme que parecesse, conseguiram descender ao patamar abaixo. Finalmente, estavam na praia, o destino inicial traçado pelo louro para conseguirem capturar um aquático.

Já era possível sentir o chão mais fofo, afinal, a mescla pedregosa com a fertilidade do patamar pouco depois da floresta dava lugar aos grãos de sílica característico das planícies litorâneas. Apesar do mar ser fechado, os arredores das águas interiores modificaram a paisagem para que lembrasse o litoral tropical de Hoenn. E não delongava para que a loura fizesse algumas observações sobre o clima. O infinito branco começava a cobrir o círculo reluzente do astro que agraciava toda aquela praia com o seu esplendor, e era natural que o clima se esfriasse. Ainda assim, o ar era úmido e o clima era ameno; o ideal para se aproveitar o dia.

Os castanhos mórbidos agora se tornavam mais vívidos. Em outras palavras: era como se toda aquela melancolia que nublava o intrínseco de Sofya fora dissipada pela salinidade no ar que invadia suas narinas, causando um êxtase incomum naquela tão lúgubre alma. Sentiu uma pequena pressão sobre suas exíguas mãos, o que a fazia mirar acima automaticamente, fitando a face da loura em que buscara refúgio outrora. Emma se propunha a convidar a garota a fazer um castelo de areia; ora, era uma cena deveras comum nos recintos litorâneos, um adorno a um ambiente já tão harmônico de tamanha ternura que exalava. Receosa no primeiro momento, bastou encarar o angelical sorriso da treinadora, incitando que a mesma a ensinasse a fazer aquelas construções tão infantis.

E sem pestanejar, açodaram na direção da área limítrofe entre terra e mar. Agachava-se a loura, tateando os grãos de sílica abaixo de seu corpo, juntando pequenos montes de areia e emaranhando-os, hora ou outra esculpindo a figura ainda disforme — ainda estava no início. Com o auxílio de Ralts, não tardaram em conseguir ao menos algum protótipo da edificação, e convidaram para que Sofya fizesse o mesmo. Esta não pestanejou em avançar junto à personificação celestial.

De longe, Nicholas passava a observá-las, taciturno. Discreto assim como os seus monstrinhos, restringiu-se apenas a fitar aquela cena tão cândida. Um sorriso formava-se suavemente no canto de seus lábios. Alguns risos retumbavam em seu tímpano por mais longínquas que as duas estivessem, cintilando a nostalgia nos cerúleos dos olhos do louro. Enquanto a brisa marítima invadia suas narinas, erguia a sua face para o sol que iniciava a ser tapado.

Memórias. Sempre presentes na vida do louro, em sua maioria açoitando não apenas o seu consciente, como a sua sanidade. Na primeira oportunidade, viu sua humanidade se esvair em socos e ofensas proferidas ao primeiro malfeitor que vira. Mas, ah... finalmente, lembranças nostálgicas preenchiam todo o âmago do treinador, fazendo-o relaxar suavemente. Deleitava-se naquelas experiências passadas com as pálpebras cerradas, ainda com o mesmo riso faceiro lhe preenchendo o semblante.

Pallet, interior de Kanto. O sol espargia seus esplendores por toda a cidade interiorana e afastada dos grandes centros do continente. Um mar a sul da cidade também abençoava os cidadãos com sua brisa salina, balançando as madeixas de dois garotos não tão longes do grande corpo oceânico. Um deles com cabelos negros desgrenhados e penteados de maneira arrepiada, ao lado de um menino de mesma faixa etária, com suas madeixas lisas e douradas escorrendo por sua testa. O primeiro encarava o louro com um sorriso desafiador adornando o seu semblante; eufórico, os punhos cerrados estavam apontados ao firmamento em tom reptante. Já o segundo apenas lançava olhares reprovativos com um quê de desdém. Apesar desse contraste típico de rivalidades infanto-juvenis, entendiam-se bem.

Trata-se de Nicholas e James, ainda menores, durante suas infâncias no interior de Kanto.

— Aí, Digglet de Alola — disparava Hendo, mantendo os punhos cerrados apontados na direção do céu. O vocativo ríspido e metafórico se referia aos cabelos dourados de Nicholas. —, eu duvido você chegar primeiro que eu na beira do mar. Dessa vez, eu me preparei pra caramba e vou acabar com você. Não vai ser como das outras vezes!

— Pelo amor de Arceus, cabeça de Exeggutor — respirava fundo Nicholas, levando a mão destra à testa simultâneo a um movimento de negação, periódico, descrevendo um arco na horizontal. — Você sabe que nunca vai ganhar de mim, seja em esportes, videogames ou qualquer outra coisa. Acho que quem tá com Digglet na cabeça aqui é você.

— Ah, qual foi?! Vai arregar agora?! Eu tô só treinando para quando formos à escola, você vai finalmente ser batido e a Charlotte vai se apaixonar por mim!

— Você tá fazendo tudo isso pra tentar impressionar a Charlotte? Cai na real, Hendo. Ela é areia demais para os nossos dois caminhõezinhos. E outra: uma corrida depende de aptidão física, e se nós treinamos na mesma intensidade, eu ainda continuo melhor que você.

— Vai começar aquela velha história “você tem que se planejar pra fazer as coisas”. Já parou pra pensar no quanto você é um chatão, Nico?

— Não é chatice, palhaço. É a realidade, queira você ou não.

— Tudo isso é desculpa pra não querer correr contra mim. Ninguém pode vencer o grande James Henderson, não importa quem seja! Nem mesmo você, “senhor inteligentão” Halstenberg.

— Ah, então é assim?

Um sorriso convencido tingia a face do jovem garoto de madeixas douradas. O semblante de Hendo desmanchava-se diante dos olhares lançados por seu amigo; o moreno sentia-se inseguro. Uma gota de suor deslizava de sua testa, percorrendo a maçã de seu rosto até pender para ir contra o chão, esperando os últimos puxões da gravidade; estava nervoso, afinal. Nicholas colocava as suas duas mãos em sua cintura, inclinando o tronco para frente, buscando instigar ainda mais aquele nervosismo em James. James desviava os olhares levemente, engolindo em seco.

— Então eu já ganhei — bradou Nicholas a plenos pulmões, volvendo na direção na direção do mar e açodando a todo vapor.

— Trapaceiro, sem vergonha! — retrucava Hendo, disparando, tentando alcançar o seu amigo que já estava uma ampla distância à frente.

E assim seguiram. Durante todo o percurso, Nicholas garantira a liderança e próximo ao final, permitiu relaxar o ritmo, volvendo o rosto para trás, lançando um olhar galhofeiro ao seu amigo. Interrompera o ritmo frenético por explodir ao máximo até à beira-mar, que não era das menores distâncias. Esbaforido pelo esforço físico desvairado, abriu a sua boca, pensando em alguma piada pela derrota de Henderson.

Isto é, ele apenas pensava.

As pálpebras do louro se descerravam subitamente ao ver um trem desgovernado na sua direção. Próximo à chegada, James tropeçara em uma das pedras no caminho, desequilibrando todo o seu corpo e a mágica da inércia estava sendo feita. O trator moreno então esbarrava em Nicholas, completamente absorto em sua vitória, arremessando aquele emaranhado de corpos na direção do oceano. Os dois amigos caíam juntos na água salgada fronteiriça de Pallet, afundando por ínfimos segundos até que ressurgissem na superfície. O louro fitava o moreno com olhar colérico.

— Mas que merda você pensa que tá fazendo, Hendo?! Não basta perder, ainda tem que tropeçar no final e me molhar inteiro?! Cara de Ponyta! — esbravejara o louro, semicerrando as pálpebras e estreitando o seu campo de visão na figura do risonho moreno.

— Olha só pra você, Nico. Tá parecendo um Persian depois de tomar chuva — gracejava Henderson, apontando o dedo para Nicholas. O louro apenas desfazia toda aquela feição sisuda, deixando um sorriso faceiro estampar o seu semblante.

— Pelo menos o mar serviu pra tirar esse fedor de você, tava mais fedido que um Garbodor.

Subiram o pequeno patamar para voltarem à terra seca. As roupas gotejavam depois daquele mergulho espalhafatoso dos dois jovens.

— Ei, vamos até à banca de sorvete comprar aquele sorvete de petaya que dá pra dividir? Eu fico com uma metade e você com a outra — inquirira Henderson, manso, voltando ao seu olhar sereno ao louro.

— Melhor irmos pra casa, tomarmos um banho e trocarmos de roupa, antes que fiquemos resfriados e nossas mães matem a gente — respondeu prontamente o louro, tão jubiloso quanto Hendo.

— Qualé! Se a gente pegar um resfriado, não precisamos ir pra escola, né?

— E você não quer ver a Charlotte?

— Tem esse detalhe, né... De qualquer modo, o sorvete ainda tá de pé, certo? Quer dizer, depois que a gente tomar um banho e tal.

— Se a mamãe e o papai deixarem, acho que sim. Mas, eu tenho que memorizar aquela jogada de xadrez ainda.

— Ah, Nico, por Arceus! É sério que você prefere aquele jogo chato do que tomar um sorvete? Talvez se eu te pagar uma ficha no fliperama você vá comigo, não é?

— Tá, tá... Vou pensar no seu caso.

E com um lampejo das luzes solares da realidade agora em Hoenn, o louro retornara do onírico. É engraçado perceber que aquela cândida paisagem de Emma brincar com Sofya sem pretensão alguma trazia à tona agora as boas lembranças do então treinador. Dessa vez, sem lamúrias, agouros, ou qualquer energia negativa que se perpetuasse por aquela alma já tão aflita. Deixava aquele mesmo sorriso faceiro do pequeno Nicholas tingir o semblante enquanto observava, ao longe, as duas se divertirem e gargalharem com uma brincadeira tão singela.

Respirou fundo.

— Vocês dois — chamava a atenção de Natu e Ninjask. —, é nosso dever protegê-las, principalmente ela. Sabem, ela já me salvou da escuridão uma vez. Se não fosse por ela, não sei nem se ao menos vocês estariam comigo. Eu me conheço, e sei que tenho um lado horrível que luto a todo instante para que não venha à tona... E ela me acalma, de uma maneira que nunca vi — soprava, brando. — Mesmo se acontecer qualquer coisa comigo daqui pra frente, protejam-na, para que ela salve outras pessoas da escuridão assim como fez comigo. O caminho que talvez eu trilhe está longe de ser o mais seguro, ou o mais digno. Entenderam?

Tanto o inseto quanto o pássaro se entreolharam, túrbidos, não entendendo muito daquelas palavras soltas ao vento por seu mestre. Por mais enigmático que fosse, Nicholas sabia que, em algum momento, seus monstrinhos entenderiam aquela sua sentença. Tinham um conhecimento sucinto daquele lado escuro o qual Nico carregava e tanto temia. Pedia apenas para que protegessem aquele ser ímpar, angelical.

Nicholas se satisfazia apenas observando ao longe aquelas cenas tão inspiradoras. Agora, as bênçãos de sua musa não eram apenas exclusivas suas, afinal, Sofya também se deleitava na fonte infindável de ternura que a loura carregava consigo.

Jubiloso, fitava-as, contentando-se com tal, ao longe. A trilha sonora ambiente nada mais era que a aprazível brisa salgada do mar da rota cento e quinze.

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The undesirable one
Route 115


Ocultas nas profundezas do cérebro enquanto não necessárias, as memórias vêm à tona nos momentos em que o sistema nervoso acha apropriado. O que nem sempre acontece nos melhores momentos — e às vezes, nem mesmo acontece. Ainda assim, em alguns momentos; só é preciso uma chave, um tema específico para ligar as sinapses e tirá-las do subconsciente.

Ao observar momentos de tamanha inocência por parte de ambas as jovens, Nicholas experienciava seus viveres mais uma vez. A nostalgia é uma coisa empolgante e triste; ao mesmo tempo. Sensações há muito vividas, cujos sentimentos parecem recentes mas... não voltam mais. Conflituoso; de fato, mas não necessariamente ruim.

Ainda mais no caso do jovem treinador. Imagino que para o rapaz de louras madeixas, sentimentalismos nunca são demais. Ao menos, indicavam que ele estava vivo; como ser humano. Mesmo não participando ativamente das brincadeiras que Emma realizava ao lado da inocente criança ao seu lado, observar tornava seu coração um pouco mais mole... Só um pouco mesmo.

Nicholas era um tanto quanto vago e incompreensível, às vezes. Depois de vaguear nas profundezas do oceano novamente — desta vez, dentro de seu próprio oceano —, proferiu alguns murmúrios estranhos para seus pokémon. Eles até faziam algum pouco sentido; mas não naquelas circunstâncias, fato que definitivamente deixou os monstrinhos um tanto quanto desordenados; apenas confirmando com a cabeça.

Enquanto o rapaz perdia-se em pensamentos, no entanto, a dupla feminina parecia estar passando um bom tempo juntas. A pequena Sofya, em determinado momento, aproveitou a visível distração do treinador para aproximar-se, um esboço de sorriso no rosto, as mãos para trás, como que segurando algo que ela não quisesse que ele soubesse o que fosse.

Ei... — proferiu ela, colocando uma de suas delicadas palmas sobre o braço de Nico. — Obrigada por tudo... — continuou então, hesitando um pouco antes de continuar. Ela ergueu as duas mãos, aproximando-as da face do treinador. Estava ligeiramente corada. Atrás dela, ainda na beira d'água, Emma sorria, incentivando a garota.

Enfim... Clefable gosta muito dessas aqui — disse por fim, abrindo as mãos e revelando seu tão precioso tesouro. Uma... conchinha; que provavelmente encontrara carregada pela água marinha. Pequena, branquinha, delicada. Assim como a jovem que a segurava, em verdade. — Eu pensei que ela gostaria que eu desse isso pra você. Você disse que conversou com ela, não foi...?

E com isso; os olhinhos cinzentos a brilharem, refletindo a luz; a garota de esvoaçantes cabelos castanhos oferecia a concha para o louro. Os olhos ainda estavam um pouco avermelhados, depois de passar tanto tempo presa em lamúrias, mas ela parecia esforçar-se para manter o sorriso em seus lábios. Um símbolo de pureza e dedicação ainda maior.

... Se aquilo não era capaz de afetar Nicholas; então Emma era verdadeiramente uma feiticeira. Apesar de que feiticeiras normalmente não costumam permanecer na orla, radiantes, esperando pela reação do cavalheiro de cachos dourados. E usualmente, também não são de incentivar garotas pequenas a fazerem atos de bondade...

Mas afinal, ela é uma deusa, uma louca, uma feiticeira.





PROGRESSO — NICO :


PROGRESSO — EMMA :

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descriptionAto 03 — Libertação. - Página 4 EmptyRe: Ato 03 — Libertação.

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Ela é demais.

Mergulhava naquele mar de memórias, tão nostálgicas quanto a brisa marítima invadindo suas narinas que lhe trazia as mais ternas lembranças de Kanto. O rapaz interiorano nem ao menos percebera a aproximação da criança após seus dizeres tão enigmáticos aos seus monstrinhos. Sofya achegava-se do treinador com as duas mãos para trás, em ludismo deveras infantil. De imediato, Nicholas erguia uma de suas sobrancelhas enquanto repousava os orbes cerúleos sobre a exígua silhueta à sua frente; um sorriso emergia do seu âmago saudoso no canto de seus lábios enquanto fitava-a.

Nesse momento, uma das mãos de Sofya buscava um dos braços inertes do louro, presos dentro de seus bolsos. As pálpebras descerravam-se ainda mais, mantendo aquela mesma feição mansa de outrora, dessa fez focando-se na figura da criança. A garota então erguia suas mãos próximas ao rosto do treinador, ainda receosa quanto sua abordagem. Aprazível e gentil, murmurava agradecimentos a Nicholas; internamente, matutava acerca disso: ainda não tinha de fato resgatado Clefable, contudo, aquele apoio em alguns momentos, e principalmente Emma.

Por falar nela, ainda ao longe, um sorriso jocoso lhe estampava o semblante, adornando ainda mais os traços angelicais da garota. Com uma gentil piscadela, incentivava Sofya a continuar próxima a Nico. Seria ele tão austero a ponto de intimidá-la apenas ao fitá-la? Aparentemente, não era o motivo, e sim apenas o nervosismo diante do presente ainda oculto por suas exíguas mãos.

Por mais que pestanejasse, finalmente conseguira força o suficiente para que suas mãos se abrissem, revelando uma pequena concha, delicada, alva. Em admiração o treinador descolava subitamente os seus lábios, tornando a sorrir diante daquele adorno que, apesar de pequeno, muito significava para quem há poucos tempos atrás estava perdido em um universo lancinante e agourento pela perda de sua fada. E ora, como Clefable estava presente em todas as suas memórias. Mencionando o gosto da alienígena por aquelas conchas, exprimia que a mesma gostaria que o louro a tivesse, afinal, havia conversado com ela não faz muito tempo, não é mesmo?

Sorriu, tomando em suas mãos a pequena concha. Os olhos anis passeavam por aquela figura tão singela e exígua.

— É... — murmurava, virando a concha de um lado para o outro, frente e verso (se é que podemos chamar assim). — Obrigado — exprimia, sereno, com um sorriso jubiloso e discreto se desenhando pelos finos lábios róseos. Lentamente, erguia sua mão destra até a sua cabeça, onde repousava cuidadosamente o adorno litorâneo sobre suas madeixas. Os orbes, em vão, tentavam observar como havia ficado aquele projeto de “chapéu” de modo descontraído. — Ficou legal?

Quase como uma onomatopeia, um riso mudo emergia das cordas vocais do louro. Ainda aparentando espalhafatoso, os orbes cerúleos estavam sempre a passear: ora em fútil tentativa de ver a concha sob sua cabeça, ora para Sofya.

descriptionAto 03 — Libertação. - Página 4 EmptyRe: Ato 03 — Libertação.

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The undesirable one
Route 115


Sinceramente? Aquilo era simplesmente adorável.

Definitivamente; não havia outra palavra para adjetivar a cena. Poderia até procurar o uso de sinônimos, mas aquele único era perfeito. Não exagerado demais; mas ainda assim, relativamente forte. E mais rico que um simples fofo, também. Tenho certeza de que não sou o único a pensar de tal forma. Era fofo, sim; mas muito mais adorável que tal.

Além disso, era agradável, relaxar um pouco. A situação fez com que até o sempre-tão-sério Nicholas tivesse seu coração amolecido — mais uma vez — para brincar com a moçoila que o acompanhava. Bem, talvez a expressão não se encaixasse tão bem. Ele não estava exatamente mole; apenas aberto para os sentimentalismos. Eram coisas diferentes.

Sofya colocou ambas as mãos em sua cintura, rindo brevemente, antes de fechar a cara. Inspirou o ar com certa força, como que se preparando para dizer algo. — Não, não e não! — exclamou ela, dando uma bronca no loiro. Depois, não conseguiu aguentar, e desfez a pose, exibindo seus dentes novamente; quando ouviu Emma gargalhar ao fundo.

Você precisa encontrar uma linha e fazer um buraco nela — a pequenina começou a explicar, dando alguns pequenos pulos; tentando alcançar a concha que se encontrava sobre a cabeça do rapaz. — Aí você passa a linha por dentro e usa como um colar! Quer dizer... Pelo menos eu acho que é assim...

Era deveras engraçado, também; ver a garota começar a proclamar seus ditos com tamanha certeza, apenas para depois perder-se na dúvida. — Droga, eu não lembro direito... Era Clefable quem sabia fazer isso melhor... — comentou então, voltando a divagar um pouco sobre seu passado com a feérica rósea.

Antes que ela pudesse perder-se em pensamentos novamente; a figura enviada pelos céus agiu novamente. Ainda cegando os meros mortais com o cintilar de sua arcada dental, aproximou-se; colocando as mãos sobre os ombros da menor. — É assim mesmo. Só precisamos de uma linha, agora. Você é muito inteligente, Sofya!

A morena corou com o elogio, não devolvendo nenhuma resposta; nem mesmo um murmúrio. Então, ela esboçou um olhar confuso para Nico. Ou ao menos, na direção do louro. — O que... o que ele está fazendo? — questionou então, em dúvida. Emma ergueu o olhar, e caiu em gargalhadas logo em seguida.

O motivo?

Ah, isso é simples. Por causa de uma pequena e estranha noz que havia prendido-se às costas de Ninjask; e agora encarava intensamente o treinador, lá de cima. Aparentemente, o gramíneo gostava de esgueirar-se e apoiar-se sobre os outros. Com a súbita quantidade anormal de atenção, no entanto; ele pareceu perder a concentração.

Seedot olhou para as jovenzinhas risonhas, confuso, e perdeu o pouco equilíbrio que tinha nas costas de seu até então colega inseto. E então caiu. Utilizando da força potencial gravitacional que mantinha todos em seu devido lugar, a noz começou a ser puxada em direção do centro terrestre; tomando o caminho mais curto até este. Isto é, o topo da cabeça de Nicholas.

Oops.

E isso, é claro, causou apenas mais uma grande explosão de risadas por parte do grupo. Rir. Do latim ridere. De acordo com o dicionário; "contrair, em geral de modo súbito, os músculos faciais, em consequência de uma impressão alegre ou cômica; achar graça em". É, isso caracterizava muito bem, de forma concisa e precisa.

Se eu fosse fantasiar o riso, utilizando de minhas próprias palavras; provavelmente diria algo como "a manifestação da alma em sons de êxtase e alegria. Sinônimo de viver". Então bem, pensando assim; talvez fosse melhor que eles vivessem enquanto pudessem, não? Ainda tinham algum tempo para aproveitar. Isto é, antes da indesejada das gentes chegar.





PROGRESSO — NICO :


PROGRESSO — EMMA :

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