[Mirror's Echo] – Route 121/Mt.Pyre –

De extremo mau gosto e vingativa era a jogada posta em mesa com a proximidade do que logo poderia se mostrar como último turno daquele combate. Não do trio elétrico que enfrentava, oh, não; Essa veio do próprio narrador, que sequer permitiu que o sabor da vitória escorresse pelos dedos dessa que vos fala antes de abatê-la com o amargo gosto da derrota ao perder o "Jogo" - proposital ou não, eis a vil situação na qual este pobre pé se viu envolto e, sem nada que pudesse fazer a respeito, apenas aceitou o destino em que foi arremessado, traído pelo maníaco mestre da Dungeon.

Mas, oh! Não é este querido pé o protagonista desta história; Voltemos então à programação normal, do exato ponto em que o elétrico amarelado finalmente tombou ao chão, deixando o caminho novamente livre (Por pouco tempo, suspeitava, dado o histórico da situação até ali) para a ruiva que, apesar de tudo, não seguiu de imediato. Pelo contrário: Sua atenção se desviou para seus queridos companheiros que com tanto afinco batalhavam em seu nome e, verificando o estado dos ferimentos que lhe recobriam o corpo, retirou dos pertences duas Potions, utilizando uma em cada um dos combatentes. Em baixo tom, pediu-lhes desculpas por estarem adentrando tão profundamente um local perigoso, e prometeu que os compensaria em breve, assim que se vissem livres de toda aquela tormenta da tempestade.

Ali teria terminado sua estadia, e de fato os passos começaram a se encaminhar para avançar. Pararam somente quando o olhar captou uma mancha avermelhada entre os filhotes de novilho, e não precisou de muito tempo antes que reparasse se tratar de uma boneca - achou estranho a existência de um brinquedo naquele lugar e, com cuidado, recolheu-o com uma das mãos, observando atentamente a pelúcia; Decidiu então de ao menos aquilo levar como lembrança de toda a aventura, ou acabaria acreditando na perda da sanidade quando finalmente (e se, claro) retornasse à cidade.

Feito isso, seguiu seu caminho.
E apenas esperou pelo melhor.

Não foram precisos muitos passos adiante antes que uma nova interrupção ocorresse em seu caminho: Desta vez, porém, ao contrário do que já vinha acontecendo, o "obstáculo" não a impedia de avançar e era meramente sonoro - entretanto, a estranheza da situação foi mais que suficiente para que os passos da ruiva freassem no meio do caminho, enquanto silenciosamente tentava identificar que tipo de barulho seria aquele, que mais parecia uma bola de boliche gigante passeando tranquila e pesadamente pelo monte. Naquele instante, o olhar passeou rapidamente pelos seus dois companheiros e, considerando a potência que tivera de lidar durante o enfrentamento aos novilhos, hesitou; Foi por pura precaução que trouxe à tona um de seus mais fortes companheiros no momento (que não seriam tostados pelos raios, claro): Vileplume. Na falta de algo melhor, equipou-o com o único Miracle Seed que lhe restava e, respirando profundamente, se permitiu seguir em frente... ... ...

Ela se permitiu, mas os selvagens que ali estavam não o fizeram. A primeira coisa que viu não foi o planalto em si, mas a rocha gigante que rolava em sua direção: O desejo imediato foi o de virar e correr para o outro lado, e realmente o faria se não percebesse que a tal pedra parecia ter... Bracinhos? Diante dessa constatação incerta, a ruiva parou para olhar, e a esfera (imperfeita) também o fez no processo, freando vagarosamente e se desenrolando para revelar um... Dwayne?

Bem, não exatamente - mas foi de quem se lembrou de imediato quando o olhar bateu na evolução do ranzinza parceiro de Drac. Por um instante, questionou-se se o rapaz o traria para sua aventura nas entranhas da 121, como tinha dito que pretendia; Considerou que seria uma perfeita adição à equipe em meio ao caos elétrico que se espalhava pelo Pyre e, nessa linha de raciocínio, considerou quase certo que seria um companheiro à altura para aquela expedição. É de extrema valia afirmar que aquele pokémon no meio do caminho também tinha lá suas diferenças se comparado com o que deveria a forma final de Geodude, levando em consideração as rochas negras e os pelos em seu rosto mas, como dito, era uma simples lembrança que lhe viera à mente... ...

E que não pôde durar muito tempo, pois aquele projeto de armadilha não perdeu tempo em se enrolar outra ver e partir em sua direção - e a moça deveria fazer o mesmo, caso não quisesse acabar esmagada tão próximo ao seu objetivo final!

— Zuby, segura essa pedra! Não deixa ela vir, não! — Exclamou, mandando de imediato o roedor para a batalha. Os outros não ficariam de fora, então apressou-se a dar seus comandos: — Use um duplo Earthquake! Rotom, quero de você um Confuse Ray e um Leaf Storm! Vileplume, duplo Energy Ball! — Ordenou, os dedos se apertando contra a palma de uma das mãos. Acima de tudo, não poderia permitir o avanço daquele selvagem e, bem, se dependesse da própria vontade... Não o faria, né?

Chegou a ser assustadora a maneira com a qual o pesadíssimo pokémon pedregulho simplesmente atropelou a pobre planta que tão inocentemente se dispusera ao combate. O fato de que Vileplume havia sido completamente incapaz de lidar com o avanço estrondoso daquele projeto de alter-ego de Dwayne, entretanto, fê-la perceber que a atitude em lançar seus preciosos - e poderosos - companheiros havia sido uma decisão mais que certeira; Se houvesse demorado mais um segundo sequer, não tinha dúvida alguma de que provavelmente teria encontrado seu fim esmagada em meio ao caos que rodeava aquele mórbido cemitério. Sentia vontade de recuperar a vitalidade de seu gramíneo, porém, não acreditou que seria uma boa pedida tentar interferir no combate naquele momento - qualquer passo em falso ainda poderia se mostrar fatal, independente de sua determinação em passar pelo violento selvagem de Alolan.

— Zuby, mantenha os Earthquake! Rotom, continue com os Leaf Storm! Acabem isso o mais rápido possível! — Instruiu. Não tinha certeza se os monstrinhos seriam capazes de manter aquele confronto sob controle mas, bem, que mais poderia fazer além de confiar o desfecho do conflito à suas mãos?

A vitória não pôde ser comemorada. Não por ter enfrentado uma derrota - mas, na verdade, também não havia saboreado seu oposto por mérito próprio. De qualquer jeito, naquele instante, o resultado não importava pois, em verdade, a ruiva sequer o havia percebido. O violento impacto que o corpo havia recebido após o acúmulo de energia por parte do Alolan e, pior, por sua liberação instantânea - oh, céus, a sensação era como se todos seus órgãos e células se chacoalhassem dentro do corpo, em vibração pesadíssima que ameaçava partir-lhe todos os ossos em zilhões de pedaços (fato que felizmente não ocorreu, talvez até por interferência divina). Sem qualquer resistência, sua carcaça foi arremessada tal qual um saco de batatas e o impacto contra o solo arrancou-lhe uma exclamação dolorida, contida por uma simples dentada que lhe açoitou a língua.

O mundo girava e, com ele, o gosto férrico foi o que inundou-lhe as papilas gustativas. Ainda era capaz de sentir as pesadas gotas de chuva que umedeciam seu corpo e seus fios avermelhados - afinal, o capuz simplesmente tombara para trás -, fazendo-os escorrerem e grudarem pelo rosto alvo. O zumbido contínuo nos ouvidos era de irritação inigualável a qual a moça simplesmente não era capaz de fazer nada a respeito e, bem, foi justamente em meio à esta confusão mental e de sentidos que sentiu o corpo ser erguido e chacoalhado, ainda que não pudesse reagir ao incentivo exterior. Ainda que entreabertos, o olhar se mantinha fosco, nublado e perdido - todo o universo era uma mancha de tons acinzentados que pareciam não ter fim.

Era difícil dizer quanto tempo foi necessário antes que finalmente a jovem começasse a voltar à si. Quando finalmente o fez, viu-se não somente entre os braços do roedor arroxeado, mas também com os corpos de seus dóceis gramíneos ao lado - e foi a breve movimentação (que arrancou-lhe um gemido dolorido) que pareceu "acordar" aquele que mantinha guarda ao redor de seu corpo; Sentiu isso diante do focinho arroxeado que se empurrou contra seu rosto, e também pela maneira como as patas ao seu redor se apertaram por alguns segundos - outro gemido de dor, porém, foi mais que suficiente para fazê-las afrouxar e se afastar.

Sua percepção de realidade não era das melhores. Em fato, talvez fosse uma das coisas mais afetadas em sua cabeça - entretanto, em todo aquele caos mental, algumas coisas foi capaz de perceber: E tratava-se basicamente dos ferimentos pesados sobre o corpo de seus pokémons. Diante de tal imagem, o corpo agiu baseado apenas nos instintos, ainda que os pensamentos ainda fossem atrapalhados pelo constante zumbido que bailava por sua audição; Vagarosamente, os dedos remexeram dentre os pertences para recuperar algumas de suas poções restantes - já poucas, oh céus -. Os frascos foram utilizados um após o outro, até que o olhar manchado não enxergasse mais os machucados de seus mascotes: No fim das contas, as Potions entregues eram três para Rotom, uma para Nidoking, três para Vileplume - chegou até mesmo a libertar o jovem narigudo de sua esfera, e a boa vontade fê-la utilizar duas sobre o corpo machucado da estatueta.

A mente estava confusa e, ainda assim, tinha a consciência distante de que ainda tinha um trabalho a fazer; Tanta era a distração e "bambeamento" naquele instante que sequer chegou a perceber que também havia retirado o Magnet da posse de seu querido fantasminha, guardando-o sem motivo aparente. Foi de mesma maneira que recolheu também uma pedra brilhante que descansava no chão, entre uma rocha partida - não soube exatamente o por quê, mas os dedos simplesmente se sentiram confortáveis ao tê-la entre si -.

Talvez tenha sido uma força maior que a arrastara através das belíssimas e imponentes escadarias - tal como ocorrera com Nosepass ao longo do caminho, aquela era sua atração magnética pessoal. Sentia as pernas tremularem e os músculos arderem, mas não se importou com eles no momento. Sentia o gosto férrico na garganta, e também uma linha viscosa escorrendo pelo canto dos lábios e derramando-se no queixo - de peculiar tom avermelhado -, mas não se incomodou. Os barulhos externos se confundiam com as onomatopeias contínuas que rodopiavam por suas audições, mas nada poderia fazer.

Sentia tudo, sentia nada.
E apenas... Se foi.

Sentia a chuva. Era capaz de perceber cada uma das minúsculas gotículas provenientes das lamúrias infindáveis do tenebroso manto escuro que cobria a atmosfera e, sobretudo, não sentia necessidade de encarar para reparar nos caminhos que as lágrimas do céu escorregavam e marcavam por seu corpo e trajes - o temporal que residia dentro de si abria espaço pacientemente para acolher aquele que vinha do lado de fora, mesclando-se e confundindo-se em torpor mórbido ao escandaloso rancor que protestava por cada veia e artéria que perpassava entre seus músculos, aos lamentos distantes dos fantasmas e demônios que sussurravam-lhe promessas e maldições, ao agarro firme que as garras da sombra que a perseguia durante todo o seu caminho marcava em seu pescoço, sufocando-lhe e obrigando-a a se debater em seu próprio ser.

Ao tirano sentado ao trono, ofereceu um brinde; Com o corpo maculado por ferimentos e um sorriso torto que despontou dos lábios diante da imponente figura tranquilamente acolhida em seu pedestal, sua chegada ao cume servia como uma aposta de sangue - aquele que escorria de seus lábios, dos ferimentos que espalhavam-se pela pele, do que circulava em pulsar constante por seu interior. Era engraçado pensar como todo o trajeto até então havia sido banhado por temor e cuidado e, então, em seu ápice, a consciência optou por mergulhar de cabeça na mera aceitação daquilo que a aguardava, fosse ao bem ou ao mal. Sentia-se marionete bailando em resposta aos dedos de seu titereiro e, diante dos lamentos da plateia, capacitou-se a arrebentar os cordões que a manipulavam e, ali, encontrava seu castigo - ou redenção.

O berro liberto pelo imponente elétrico foi também a alavanca que transbordou mais um engasgo sanguinolento de sua pessoa - uma tosse seca e mais uma linha avermelhada se demarcou escorrendo por seu queixo. Sentiu o peso de toda a energia que emanava do pássaro por sobre seus ombros, pressionando-os para baixo e obrigando-lhe a se curvar: Era com teimosia, entretanto, que recusava a ordem não verbalizada de Vossa Majestade, pendendo a cabeça parcamente para o lado e permitindo que um sorriso sonso se desenhasse pelo rosto.

— ...Finalmente. — Foi o que escapou da garganta, o olhar cinzento ainda nublado o suficiente para praticamente desfocar-lhe os pensamentos. A escalada até o templo nem de longe fora a mais fácil, considerando que sua jornada começara desde as primeiras gramíneas que despontavam do chão e originavam a 121 - não era a primeira vez que aquelas sensações mistas lhe corriam ao peito, e particularmente duvidava que fosse a última. — Não sabe há quanto tempo estou... ... ... — Uma frase sem contexto, que jamais encontrou seu complemento. O tom se tornou repentinamente rouco, como o de alguém que há dias não vê água: Situação irônica, para dizer o mínimo.

Naquele momento, não agiu por si só, ainda que plenamente consciente dos atos que realizava. Foi apenas um braço que ergueu para apontar sem forças na direção do alado, o olhar vítreo fixado nos enegrecidos que lhe eram apresentados como centro de todo aquele caos tempestuoso. Vagarosamente, a linha curvada dos lábios esmoreceu e desapareceu, dando lugar a um semblante opaco e sem vida. A brisa gélida que corria pelos corredores de maneira lenta enlaçou-lhe o coração, e as pálpebras caíram quase ao ponto de se semicerrarem, indiferentes.

— ...Vileplume. Toxic e Venoshock; Nosepass, duplo Smack Down. — Ordenou, simplesmente, enviando a primeira dupla ao coliseu. O membro superior tombou outra vez ao lado do corpo, balançando para frente e para trás algumas vezes antes de finalmente perder a força e se manter estático.

Frente ao Rei.
Frente à um Rei, mais uma vez.
...
Talvez não soubesse lidar tanto com a realeza, afinal.