Os olhos da minha treinadora até brilharam ao ver o sanduíche que lhe havia sido oferecido, e ela alegremente aceitou. Já estávamos a caminho do centro, no entanto, os humanos resolveram fazer uma pausa para que a menina pudesse comer. Sentaram-se na calçada e lá conversaram um pouco, com o ruivo guiando a maior parte do diálogo, já que Yoshiro precisava dividir a atenção entre as palavras dele e o sanduíche.
- Eu nem pensei em trazer, achei que teria um intervalo para o almoço. Não sabia que eles não trazem comida pra cá… eu estaria mesmo encrencada se Hórus não tivesse te encontrado haha… - A garota levou a mão livre à nuca, em um gesto tão icônico que até pude imaginar uma gota sobre sua cabeça. - Vi muitas salas na base, mas nenhuma com comida, tive esse azar. É um lugar enorme, parece algo de outro mundo.
E bota enorme nisso. Gilbert provavelmente não entenderia o quão literal a garota estava sendo quando disse que viu muitas salas: conseguiu se perder em tantos andares diferentes que possivelmente nenhum outro voluntário viu tanto da Sienna Co. quanto ela. Deixei um riso escapar enquanto lembrava-me de como quase fomos enxotados de lá por um cientista antes de ele finalmente nos indicar o caminho certo até o helicóptero. Só não levamos uma bronca tão grande porque ele viu que minha humana ainda estava bêbada de sono, tanto que ela nem deve se lembrar direito dessa cena.
- Oferta de paz. - Olhei para a garota, que tinha separado uma parte do seu sanduíche e estendeu-a para mim. Ainda estava tentando se desculpar pela história do Water Gun? Com tantos problemas na cabeça, eu já tinha quase esquecido daquilo. Contudo, o sorriso meigo da humana enquanto ela dividia comigo o único alimento que teve naquele tempo todo selou minha decisão: estava mais que perdoada. Por mais que eu me estresse com ela às vezes, não é fácil ficar com raiva por muito tempo de alguém assim…
“Aceito.” Peguei o pedaço da mão da garota, e ela pareceu mais tranquila ao ver que estávamos de bem outra vez. Enquanto isso, o outro humano perguntou sobre os sucos, imaginando que Yoshiro teria esquecido também de levar água. Na verdade, isso ela não esqueceu de trazer… mas foi quem menos bebeu, e a garrafa logo se esgotou.
- Eu escolho o de Oran, obrigada. Era o mais comum onde eu morava, então virou o meu favorito. E ração, realmente não tenho… ainda não tive tempo de comprar. - Após servir-se do suco, Yoshiro liberou os demais Pokémons para que eles pudessem comer e beber também, agradecendo a Gilbert por tamanha gentileza. Enquanto todos lanchavam, o ruivo tentou adivinhar há quanto tempo Yoshiro tinha se tornado uma treinadora. É, realmente está muito perceptível o quão inexperiente ela é. - Hórus nasceu ontem, os outros eu peguei anteontem. Faz uns quatro ou cinco dias que entrei nessa vida.
Quatro ou cinco para o mundo externo, é claro. Os dias em que ficamos presos na Trick House passaram como um único para nós. Por isso, na cabeça de Yoshiro, ela começou essa jornada anteontem. Mais novata, impossível. Enfim, após os dois terminarem de conversar e nós terminarmos nosso lanche, seguimos caminho até as tais barracas que o ruivo tinha comentado. E, chegando lá, vimos que a descrição dada por ele não poderia ter sido mais precisa: vários Pokémons engaiolados, com a mesma loira de antes fazendo… fazendo o quê, exatamente? Parecia perdida em seu próprio mundo, alheia ao resto. Até me lembra alguém que conheço…
Yoshiro cumprimentou Carla e agradeceu brevemente pelas instruções, após isso pudemos finalmente iniciar a penúltima tarefa. Ver todos aqueles Pokémons engaiolados estava me dando mal-estar, eu só queria chegar logo na rota para poder soltá-los. Se nem da Pokébola, confortável como é, eu gosto, imagine se precisasse ficar preso entre todas essas grades… só pensar nisso me dá agonia.
“Vamos logo, Yoshiro. Eles já esperaram demais.” Aproximei-me da primeira gaiola de rodinhas que meus olhos encontraram e tentei empurrá-la para fora da tenda. Zubats não devem ser tão pesados assim, não é?
- Summer, Koda, podem nos ajudar? - Soltando os dois outra vez, Yoshiro orientou-os a aumentar seu poder físico com os mesmos movimentos de antes, assim poderiam empurrar com mais facilidade que eu. Felizmente, não seria uma caminhada longa até a rota 24, então os Pokémons não se estressariam muito com os tremores da gaiola, eu acho. Mesmo assim, Yoshiro passou o percurso inteiro tentando conversar com eles, em uma tentativa de deixá-los mais confortáveis em uma situação tão complicada. - Muitos de vocês já moravam aqui antes, não é? Talvez a rota esteja diferente de como se lembram… mas estamos todos trabalhando muito para que essa região se torne um bom lar para vocês de novo. Logo logo poderão sair daí, terão uma floresta inteira para explorar e construir seus ninhos. Prometo que vai ficar tudo bem, vão gostar de lá.
“Sabe, ela tem razão. Sem mais gaiolas nem paredes, vão poder ir aonde quiserem. Ficar aí dentro o dia todo deve ser horrível, mas isso vai acabar logo.” Também tentei dar algum apoio, embora nenhum de nós dois tivesse muita habilidade com as palavras. Agora só faltava chegar na dita rota, lá seria mais fácil de decidir como iríamos soltá-los.