O primeiro objeto encontrado, oculto por areia e poeira, havia sido extremamente útil: Senão por si só, simplesmente pela maneira que afastou os sórdidos pensamentos da moça por um único instante que fosse - pois, observando o molde amarelado onde se estampava a figura antiga de um pássaro, a mente se redirecionou para o recente encontro com Sakazaki, onde justamente um exemplar idêntico àquele lhe havia sido apresentado. Infelizmente, a experiência não lhe trazia respostas a respeito do tipo de criatura ali descansava, pois o próprio menino não tinha ciência alguma sobre ela - então, num gesto vago, Chase limitou-se a afagar com gentileza a imagem da pedra com o polegar, a respiração indo e vindo enquanto processava cada uma das palavras ditas pelo unoviano em resposta à primeira de suas três experiências.
— Parece que bastante gente acabou dando de cara com o Zapdos, na verdade. — Comentou, um encolher breve de ombros antes que deixasse um suspiro tímido escapar.
— Eu fiquei um tempo pensando se eu não tinha, sei lá, surtado, sabe? Mas acho que, considerando todas as "evidências"... Digo, eu até posso ter, mas com certeza não foi um surto de loucura alucinógena. — Brincou, com um riso sem jeito, incerta se a boba tentativa de amenizar o clima seria bem sucedida.
— ...Foi um alívio quando descobri que você estava bem, de verdade. Eu... Fiquei com medo que tivesse te acontecido alguma coisa... Uh, irreversível? — Murmurou, desviando o olhar por alguns instantes - um calafrio inquieto percorreu por sua coluna, e a ruiva se deu ao luxo de encostar a testa no braço do rapaz, silenciosa, em busca do conforto de sua mera presença.
— ...Obrigada por estar bem. — Sussurrou, os dedos tremulando em reação discreta à situação que a própria jovem os havia metido.
Respirou uma, duas vezes.
Com suavidade, então, afastou-se.
— ...Eu cheguei a ir na Roxanne pra falar sobre essa pedra, na verdade, mas foi o Nicholas quem conversou primeiro comigo. Lembra, que a gente conheceu antes do teatro e tal? — Perguntou, separando o fóssil amarelado e ajeitando brevemente uma das madeixas atrás da orelha antes de respirar fundo, o olhar passeando pela área demarcada para que tentasse decidir qual seria a próxima área a escavar.
— Eles também me falaram que é bom ir até o Sr. Stone, em Rustboro mesmo, pra descobrirmos de qual se trata. Se você quiser ir comigo, eu planejava tentar passar lá depois do parque... — Comentou, num encolher de ombros tímido e num sorriso sem jeito.
— Mas então, continuando... — E tomou ar.
— ...Depois de todo esse lance do Zapdos, eu admito que eu fiquei meio... Perdida, sabe? — Suspirou, antes de finalmente escolher um pedaço de terra e voltar a escavar, tentando se distrair com o trabalho de arqueologia que, ironicamente, também era responsável por invocar seus fantasmas.
— Era... Vazio. — Murmurou, num encolher de ombros inquieto.
— Eu não conseguia falar com você, não tinha ninguém pra falar - ninguém que fosse mais que um conhecido, ninguém que pudesse só... Sei lá. Acho que não é o tipo de coisa que se conversa com qualquer um. — Disse, em baixo tom.
— Eu tentei me ocupar de qualquer jeito, na verdade. Batalhando, viajando pra outra cidade, sei lá. Qualquer coisa. Mas só... Não sei, era uma sensação amarga que não ia embora. — Uma pausa na tarefa.
— Enfim, eventualmente achei que era só... Sei lá, deixar. Vagar por aí numa rota qualquer. Eu só queria que parasse, sabe? Só que parasse. — Discretos, os dedos apertaram o cabo do instrumento entregue pelo responsável da atração.
— ...Aí, eu fui. E foi quando eu reencontrei com a Karinna. — Outra pausa.
— Não sei se eu já cheguei a falar sobre, mas nós temos um passado um pouco complicado. Pra resumo da ópera, como você já deve saber, éramos amigas de infância e tudo o mais. — Acrescentou, antes de finalmente voltar a cavar.
— E eu sei que parece meio birutice quando eu falo, mas, sei lá... Eu acho que atraio esse lance de multiverso, sabe? — Suspirou, mordendo brevemente o lábio inferior.
— A gente só... Sei lá, a gente tava na beira de um lago, e depois a gente simplesmente apareceu dentro de duas celas, sabe? — Continuou, em baixo tom - não tinha desejo que ninguém por ali ficasse de mutuca em suas experiências, afinal.
— E tinham umas coisas bizarras lá. Pessoas, bichos, pesadelos. — Um riso nervoso - limitou-se em resumir a experiência, pois prolongá-la poderia só aumentar o sentimento drástico de que tinha simplesmente enlouquecido.
— A gente foi... Procurando como sair de lá, sabe? Levou um tempo, pra falar a verdade, mas enfim finalmente achamos que tínhamos a chave certa... — Pausa.
Uma pausa, e dessa vez maior que as outras - porque, sinceramente, ela própria não tinha certeza a respeito das palavras que estava prestes a desaguar sobre os ombros do unoviano. Naquele momento, se deu ao luxo de refletir se realmente valeria a pena dizê-las - ainda que com a consciência de que, àquela altura, não faria muito sentido simplesmente mandar um "ah, deixa pra lá" e largar por isso mesmo. Se não desejasse compartilhar aquela experiência, sinceramente, sequer teria iniciado seu relato, como com muitas coisas costumava fazer.
— ...Sabe, apareceu alguém pra tentar impedir. — Deixou, enfim, escapar.
— ...Eu acho que já mencionei, mas eu não costumo ter muita, uh... Sorte, por assim dizer? Em experiências, e tudo o mais. Principalmente sozinha, principalmente com algo ou alguém importante. — Disse, as palavras escapando da garganta num arranhado inquieto, sofrível, como se lutassem para fazê-lo.
— Eu nunca parei pra pensar muito se tudo isso seria ou não coincidência. Mas... — Prendeu a respiração, até que a pá se fincou em alguma coisa dura na terra batida da atração.
— ...Sabe, nós vimos Arceus. — Revelou.
— ...E eu acho que nunca vi olhos tão cheio de ódio. Ódio puro, sabe? Do tipo que te corrói por dentro, que reverbera por toda a sua estrutura. — Um riso seco, vazio - e balançou a cabeça, devagar.
— ...Acho que eu nunca parei pra pensar a respeito de como o Criador podia simplesmente me odiar. Você acha que isso faz sentido? — Deixou a questão no ar, quase retórica, num sorriso oco.
...Mas, enfim, não era isso que importava na hora.
Vamos à segunda descoberta, sim?
Flame Body (Fletchinder):
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O amanhã é efeito de seus atos. Se você se arrepender de tudo que fez hoje, como viverá o amanhã?