Observava aqueles pequenos Pokémon com um olhar perdido, primeiramente por não saber o que fazer com eles e confiar melhor nas palavras de uma Ranger do que nas minhas próprias decisões e em segundo lugar, por estar perdendo muito sangue e sentir que além do efeito dos cristais a longo prazo, também sentia uma tontura e um mal estar terrível pelos ferimentos e tudo mais, além da dor é claro. De qualquer modo, estava preparado para mais uma batalha se fosse necessário e quando Sophia falou sobre estarem atrás de algo que "não era conversar", deixei minha mão ainda mais próxima da bolsa para um caso de emergência — Me diga o que fazer e eu farei, Sophia...  — Comentei para a garota, enquanto observava o rastro de sangue que eu havia deixado para trás, gota a gota, enquanto caminhava. A Ranger sugeriu que eu me afastasse até uma das paredes, assim poderíamos testar se eles queriam algo conosco ou simplesmente passar. Fiz exatamente o que ela pediu e praticamente colei na parede, observando com cautela a movimentação daqueles Pokémon tão minúsculos.

A própria Sophia começou a agir e eu apenas torcia para que, seja lá o que ela estivesse fazendo, desse muito certo para sairmos dali e nos reencontrássemos com os Macchiato. Ela mexia em sua bolsa atrás de algo — Quer alguma coisa? Talvez eu tenha aqui comigo... — Dizia baixinho para não assustar ninguém e também porque não conseguia falar mais alto do que isso. Antes mesmo dela responder, abri a minha bolsa para ver o que tinha lá e me surpreendi com o vapor que saiu de lá de dentro. Coloquei a mão no interior e notei que os equipamentos de metal estavam muito quentes e se continuasse assim, poderiam causar algum acidente, até mesmo uma explosão — Mas o que? Sophia... Se eles estiverem sob efeito dos cristais talvez seja melhor ajudá-los a sair... Se eles forem para lá acabarão como Mey. Ou então... Podem ser os próprios causadores disso tudo, então precisaríamos pará-los ou todos os Pokémon da caverna estarão em perigo de um "surto", assim como os treinadores... — Comentei, observando que ela colocava um pedaço de algo metálico, também bastante quente, próximo dos Pokémon, esperando alguma ação. Fiquei curioso e também esperaria o desfecho disso para agir, mesmo que fosse por conta própria.

A baixa velocidade dos Pokémon metálicos transmitia uma maior sensação de apreensão do que se fossem mais velozes e tivéssemos que correr. Era estranho explicar, mas uma ansiedade tomava conta de mim de uma forma bastante avassaladora e eu estava suando em pouco tempo, mesmo encostado naquela parede fria. Quanto mais tempo demorássemos, mais seria difícil segurar uma Pokébola e lançá-la, isso se o mecanismo não estragasse e nossos Pokémon ficassem presos ou pior! Cerrei os punhos e pensei em pegar uma cápsula mesmo assim para retirar os Pokémon, um a um, mas a atitude de Sophia me fez voltar atrás. Ela pegou uma pedra dentro da bolsa e jogou o minério na direção dos Meltan, que rapidamente voltaram-se para o objeto, deixando todo o entorno em segundo plano. Aquilo havia chamado tanta atenção que eles até "cuspiram" alguns outros itens, possivelmente para abrir espaço para mais esse. Quando dei por mim, havia um saquinho de veludo azul recheado de um pó fino e púrpura que eu acreditava já ter visto em outro lugar. A Ranger também tinha um objeto esférico e perolado perto de seu pé e por alguns segundos, fiquei observando-a, sem saber se deveríamos sair dali ou não.

Sophia então deu a deixa, pegando seu objeto e aproximando-se de mim. Abaixei com cautela para pegar o saquinho e joguei dentro da mochila, com a a ajuda da menina que me amparou para levantar novamente. Agora, apenas nos restou correr pelas nossas vidas para longe dos cristais, daquelas criaturinhas e de todo o perigo que o lugar poderia nos proporcionar — Nem acredito que escapamos! Acho que hoje definitivamente não é o meu dia...  — Comentei para a menina após um longo suspiro de decepção. Em seguida, parei de andar e recostei-me na parede, faria um pedido a ela — Acho que aqui está bom...  — Disse ao sentar numa rocha e acariciar a pelagem de Meo-Mey. Ela estava melhor, recuperada da influência maldita daqueles cristais — Ok menina, calma... calma... Está tudo bem, ok? Foi apenas um sonho ruim. Agora você precisa descansar dentro da cápsula, não se esforce...  — E com um sorriso no rosto, a coloquei de volta na esfera (se já não estivesse).

— As crianças devem estar esperando a gente... Espero que nada tenha acontecido de mal. Mas... Não queria que elas me vissem nesse estado tão horrível, será que conseguimos dar uma leve limpada no sangue e fazer um curativo simples, assim eles não se assustam, o que acha?  — Perguntei para a Ranger, afinal ela teria uma noção melhor dos perigos e do tempo que levaria para conseguir me ajudar a cuidar dos ferimentos. Se fosse mais sensato partir, teria que dar esse "susto" nos Macchiato, mas se fosse possível tratar os ferimentos, faria questão de cuidar deles ali mesmo para recebê-los da forma mais positiva possível. — Depois de encontrar eles eu só quero sair daqui, de uma vez por todas!  — Comentei com Sophia, fazendo uma cara de dor ao girar o braço para ver o estado dos ferimentos dolorosos e profundos.

Mesmo que eu tivesse "forçado" essa parada, ficava feliz que Sophia tinha se compadecido de minha dor e resolvido realmente dar um tempinho para que eu respirasse. Ela também me confortou dizendo que as crianças ficariam bem e a melhor forma que encontrei para retribuir foi um sorriso, apesar de toda a dor. Quando chegou o momento de limpar o local das minhas feridas e fazer um curativo, a garota deixou bem claro que não sabia muito bem como se fazer isso, além de repetir os próprios curativos que já havia recebido. Poderia ser um problema sério, mas eu realmente confiava na Ranger e essa era sem dúvida minha melhor opção. — Se você não fizer, então eu terei que fazer e do jeito que estou... Acho que perderia pelo menos um dos baços — Disse com uma risada fraca, tentando animá-la e olhando o que ela fazia com água limpa, álcool e alguns panos. Quando ela me disse que iria doer, tentei abstrair um pouco para ouvir os sons da caverna. Haviam Pokémon pedras de vários tipos e também um som bem longínquo de Zubat. Por um instante lembrei da Golbat de Sophia e o quanto foi útil na caverna. Talvez eu devesse capturar um também quando voltasse aqui e... — Ah ahh aii... — Comentei de forma descontrolada, olhando para baixo para ver o que havia, retornando daquela viagem mental.

— Ah. não creio, perdoe por isso... Estava distraído e acabei esquecendo que sentiria dor, então quando veio... — Tentei explicar de forma desencontrada, corando um pouco, mas ainda mantendo uma carinha de dor de vez em quando. Precisava me concentrar para não dar "chilique" e foi isso que eu fiz, até que a garota finalmente terminou tudo o que tinha de fazer com o meu braço. Por fim, ela perguntou se estava apertado demais e respondi que "não", porque realmente não estava. Estava perfeito! Principalmente a parte da limpeza — Eu não sei nem como agradecê-la, Sophia... Obrigado mesmo por tudo! O que vocês Rangers fazem pelas pessoas e pelos Pokémon é realmente incrível! Eu sou uma pessoa que adora cuidar e ajudar Pokémon. Pensava em ser Criador, agora você realmente me deixou em dúvidas se serei um ou se procurarei a Sede dos Ranger quando tiver a oportunidade. Mas enfim... Isso é uma decisão mais para frente! Agora precisamos achar urgentemente os irmãos e sair daqui! Vamos, por favor.... Preciso chegar em Mountrock o quanto antes! — Disse para ela, com uma carinha de pidão e um riso no final ao me levantar, respirar fundo e partir na direção onde Luci e Yuri estariam. Torcia para que todos estivessem bem e se esse fosse o caso, já caminharia para a saída.

Com um trabalho demorado, cansativo, mas muito bem feito, Sophia finalmente terminou meus curativos de emergência, o que nos permitiu seguir adiante pela caverna de caminhada difícil... Meu corpo, quase anestesiado a essa altura, ignorava completamente o chão de pedras pontiagudas e só visava a saída daqueles túneis. Um pouco antes de sairmos entretanto, Sophia comentou sobre me informar onde seria a nova Base Ranger e isso me alegrou bastante — Fica combinado então! Eu não tenho um PokéNav ainda para te passar meu número, mas posso te enviar o contato do meu e-mail e eu lerei as mensagens quando estiver pelo Centro Pokémon... Daí se quiser, pode me passar seu número e eu mesmo ligo para mantermos contato quando achar um computador... — Comentei, seguido de uma risada, segurando as alças da mochila para não pesarem tanto em meus ombros. Continuamos conversando por mais alguns metros até acharmos finalmente as crianças em um ambiente seguro e sãos e salvos. Assim que vi os irmãos Macchiato, meus olhos focaram só neles e demorei um tempo para ver a presença de uma senhora e um Growlithe interagindo com eles. Ergui uma sobrancelha em desconfiança, principalmente quando disse meu nome e o de Sophia, mas acabei nem respondendo pois corri para ver como as crianças estavam.

— Há! Vocês estão bem! Fiquei muito preocupado! — Comentei, aproximando-me e abraçando eles com cuidado para não acabar estragando o belo curativo feito por Sophia. — LUCH! Você tá bem! — Comentou Luci, levantando-se toda atrapalhada para se jogar no abraço, junto de Yuri que parecia mais assustado com meus muitos curativos do que qualquer outra coisa. — Mey estava muito diferente, Luch? O que houve com ela? Ela está bem...? — Comentou o garoto com os olhos arregalados por trás de seus óculos de alto grau. — Sim, está ótima sim! Não se preocupem... Agora todos nós podemos finalmente sair daqui. Bulbasaur está capturada, então nossa missão de achar e salvar filhotes está praticamente concluída! — Disse mostrando a Dusk Ball com a Pokémon e depois erguendo a mão para um Hi-Five com as crianças.

Sophia conversava com a mulher desconhecida e perguntava para as crianças se estavam se sentindo melhor. Isso me chamou a atenção para a situação, dando mais foco às duas mulheres. — Assim que saímos de lá a dor de cabeça passou! Acho que era por causa do lugar... — Tentou explicar-se Luci, parecendo confusa sobre o que causou tudo aquilo. — Eu ainda tenho um pouco de dor... Mas acho que é por causa dos óculos, sempre sinto... Mamãe disse que eu teria que trocar eles algum dia... —. Complementou Yuri. Após isso, Sophia comentava sobre o quão era bom as crianças não terem ficado sozinhas e então me toquei de que deveria esquecer as desconfianças e o olhar torto para agradecer pelo que foi feito. Mas antes, respirei bem fundo de alívio pela reviravolta boa da situação — Ah sim, muito obrigado! Estava muito preocupado com as crianças... Tivemos alguns contratempos na caverna — Comentei, erguendo os braços para deixar evidente do que eu tratava. — Mas enfim, acho que já falaram bastante da gente! Prazer... — Terminei de dizer, finalmente cumprimentando a mulher e ouvindo o que ela tinha a dizer. Se é que tinha algo a nos falar.