[Mirror's Echo] – Route 121/Mt.Pyre –

Foi com certo carinho que o olhar acompanhou, pelo menos por alguns segundos, a breve interação animada de Nosepass e Vileplume. Era uma sensação diferente, sem dúvidas, considerando que tudo que rodeava o pedregulho normalmente capturava seu coração em uma teia de aflição e pesar - questionava-se, até, se todos aqueles sentimentos enegrecidos volviam mais em torno de um "pré-conceito" seu do que por culpa, de fato, do rochoso. Quando havia oferecido-lhe um momento para se expressar, de fato? Havia arremessado em seus ombros os pesos de um pecado que talvez não fossem seus, assim como as lamúrias de uma realidade maldita; Não obstante, o arremessara por longo tempo entre os dedos do esquecimento por conta de mero temor em enfrentá-lo como ser. Estaria mentindo se arriscasse dizer que sentia-se completamente à vontade e que seu coração estava leve, mas com toda a certeza não o faria ao afirmar que toda a atmosfera pesada, no mínimo, dissipara-se com a brisa da tormenta.

Facade

De qualquer jeito, tinha um trabalho a terminar, e os pensamentos foram tragados das divagações quando o olhar tornou a encontrar o competente venenoso bípede. Percebia seu cansaço, e guardava o esforço do animal com todo o carinho - mas outra coisa também reparou: A maneira como o olhar do roedor havia se desviado, provavelmente pelo barulho insistente do sininho que dominara o ar de repente, e o jeito como em seus orbes queimavam n'alma a desconfiança, o brilho duvidoso de quem se sabe de que algo foi esquecido, ainda que tão latente fosse: Essa era a sombra que percorria os olhos de Nidoking, fitando a imagem do não-tão-mais inexpressivo narigudo. Um ar pensativo, suprimido pela exaustão que começava a correr-lhe o corpo, tentando resgatar lembranças trancadas no fundo de uma mente conturbada.

Ela percebeu, e foi por isso que apressou-se em interceder.

— Zuby! — Chamou, observando o animal piscar algumas vezes e volver o olhar em sua direção, repentinamente desfocado da dúvida que antes o consumia. Não quis dar-lhe tempo de ruminar a memória e, então, seguiu em frente com os planos que havia arquitetado - ou melhor, se esforçou ao máximo para fazê-lo. — Você está quase lá, ok? Tire um momento, respira, foco no tronco. — Indicou a árvore machucada, e os dedos se apertaram com delicadeza, por um breve instante, no tecido do cachecol que afagava-lhe o pescoço. — Mais um Focus Energy, ok? Se concentre na força, e a deixe sair. Não precisa se conter! — Instruiu, e esperou.

Esperou, que o caos da tormenta lá fora não atingisse os corredores nas entranhas da floresta.

Como bem havia imaginado, não foi preciso muito mais tempo antes que o domínio da técnica se mostrasse presente e, aliás, de maneira bem... Estrondosa, quando o impacto do corpo do venenoso se chocou contra o tronco e não somente encontrou o pico de sua força, como também foi capaz de demonstrá-la ao arrancar as raízes do chão. O fato fê-la dar um leve sobressalto mas, como já estava esperando, o barulho oco da planta tombando contra o solo felizmente não teve muito mais impacto além do sutil encolher de ombros que protagonizara.

De todo modo, não era esse o fato importante, e sim o detalhe de que o pobre venenoso também acabara tombando com a árvore. A reação foi imediata ao se aproximar do animal e, ainda que não possuísse sua força magnânima, auxiliou como pôde para que o monstrinho arroxeado fosse capaz de levantar sem mais problemas. Quando os orbes cinzentos encontraram os machucados espalhados no corpo do dinossauro, o coração apertou-se: Acabou sorrindo, entretanto, quando reparou em sua reação animada à conclusão da tarefa que lhe fora imposta.

— Você é demais, Zuby... — Murmurou, afagando com delicadeza o maxilar do pokémon. Ainda não haviam terminado, mas não se permitiu simplesmente seguir em frente: Retirando de sua bolsa uma Potion das tantas que estocava, esguichou com paciência o líquido curativo por sobre as feridas e arranhões espalhadas pelo venenoso, observando a mágica acontecer enquanto umidade evaporava junto dos machucados que lhe corroíam. — ...Só mais um pouco, tudo bem? E depois eu te deixo descansar. — Disse, guardando o frasco vazio para posterior descarte.

Earthquake

Tinha consciência, porém, que o melhor a fazer seria não forçar de imediato o esforço físico do roedor. Por um momento que fosse, o ideal seria deixá-lo descansar, respirar, se acostumar e permitir que a água curativa fizesse definitivamente seu papel para recobrar a vitalidade do parrudo pokémon. Considerando este fato, ficou em silêncio, observando sua imagem e permitindo que o pensamento fluísse em busca de alguma inspiração para dar continuidade.

— Seguinte, Zuby... — Começou, ainda meio incerta. — Precisamos só finalizar o seu Earthquake, tudo bem? Descanse um momento, respire: E, pra começar, quero que você se conecte com a energia terrestre dentro de si. Sinta a terra, deixe fluir por seu corpo, e vamos trabalhar a partir daí. Ok? — Sugeriu, dando um último afago na cabeça do pokémon. Em breve poderiam dar continuidade à jornada, no mínimo sem mais preocupações no que dizia respeito à movimentos não dominados.

Earthquake

Por algum tempo, permitiu que o grande dinossauro arroxeado gozasse de seu curto momento de descanso. Enquanto o observava se pôr a "meditar", também reparou na interação breve de Nosepass e Vileplume, que começavam a correr praticamente em círculos numa brincadeira de pique. Sem dúvidas, chegava a ser irônico a maneira como a calmaria se estabelecia, ainda que de maneira sutil, em um espaço aonde todos do lado de fora anunciavam caos - naquele instante único, era a calmaria que antecedia a tormenta e, bem, considerando que o único ser vivo com o qual havia se deparado era basicamente a treinadora caçando Rattatas, começava a desconfiar se, de fato, existia tanta confusão quanto era informado pela mídia. Seria isso o sensacionalismo se agarrando de maneira podre às notícias?

— Muito bem. — Chamou a atenção do roedor, balançando a cabeça com sutileza para se livrar dos pensamentos fúteis que começavam a adornar-lhe a mente. — Eu quero que você materialize essa energia, Zuby. Deixe-a fluir por seu corpo e tente dar um pulo para começar a sentir a força que deve colocar no movimento, ok? — Pediu. Logo após, voltou-se aos pokémons que brincavam ali perto. — Ei, vocês dois! Vileplume, Nosepass! — Chamou. — A qualquer momento o chão pode começar a tremer, tudo certo? Não fiquem muito próximos e cuidado para não cair! — Alertou. Não acreditava que estariam tão próximos para sofrer danos mas, de qualquer modo, era bom deixar de sobreaviso...

Felizmente, o barulho do sino servia como alerta suficiente do caos que poderia ter acontecido caso o animal houvesse se aproximado em silêncio: Por isso, a atenção volveu de imediato na direção do pedregulho que se aproximava em seus lentos passos rápidos e, como reação, estendeu a mão para o roedor que ainda praticava os saltos e experimentava os leves tremores de terra antes que o desferissem com força total.

— Zuby, pare! Tire um tempo, volte a se concentrar e comece a acumular energia. Se prepare para o último passo, tudo bem? — Pediu, antes de se voltar na direção da estatueta ambulante. Não correu em sua direção, pois não queria assustá-lo; Mas se aproximou e abaixou na altura do pequenino, segurando de leve uma de suas mãos apontadas. — Ei... — Afagou, sutil, o local em que os dedos repousaram. — A gente tem que se afastar um pouco, tudo bem? Senão você pode se machucar, se ficar muito perto. — Foi o que falou, antes de se erguer. Apoiou de leve uma das mãos sobre a cabeça do animal, e a deslizou para o início de suas costas. — Vem comigo, vamos? Vamos juntos. — Sugeriu, incentivando o monstrinho ao dar alguns passos na frente. A pretensão era levá-lo para mais longe, com Vileplume, para que não sofressem os efeitos colaterais do poder de Nidoking.

Somente se conseguisse fazê-lo era que seguiria com o treinamento do poderoso movimento terrestre.

Earthquake

— Zuby! — Chamou, quando imaginou estar distante o suficiente. — Quero que você concentre a força em um só pé, tudo bem? Experimente erguê-lo e pisar com tudo no chão, imagino que desse jeito possa controlar melhor a força aplicada! — Instruiu. — Descarregue tudo de uma só vez. Faça esse chão tremer!

Independente do desejo de retirar o pokémon pedregulho da "linha de tiro", por assim dizer, não era como se houvesse passado despercebido por si a agitação repentina da estatueta: Tecnicamente, não seria um fator estranho há algum tempo atrás mas, considerando que agora o desenvolver do relacionamento entre ambos finalmente estava caminhando e que o animal até então estava se divertindo com o gramíneo e o sininho em sua mão, vê-lo "desconfortável" daquele jeito era, no mínimo, algo que merecia sua atenção. Esse pensamento se manteve incômodo em sua mente, mesmo após se afastar para coordenar o restante do treino de seu bípede terrestre: Um fantasma não hostil que sussurrava-lhe que alguma coisa estava fora do lugar e que certamente deveriam sair dali o mais rápido possível - uma paranoia silenciosa, que se acomodou em seus ombros e fê-los retesar.

Sim. Até então, estava tudo relativamente calmo!
...E se talvez estivesse até demais?

Após as instruções passadas para Nidoking, os orbes acinzentados correram rapidamente ao redor antes de retornar para o monstrinho rochoso e seu atualmente inseparável guiso. Analisou em silêncio os trejeitos (quase inexistentes) do espécime, tentando decifrar o motivo do retorno de sua irritação, mesmo que em níveis muito mais suaves. Infeliz era pensar que não detinha meios de compreendê-lo por completo - talvez fosse possível caso seus laços fossem mais estreitos, tal como em geral acontecia, de certa forma, com seus pokémons mais antigos. O bússola, porém, era uma situação bem diferente...

— Nosepass, aconteceu alguma coisa? Você... — Interrompeu-se. Não por conta própria: Em fato, a breve distração com os pensamentos que lhe corroeram a mente também se apresentou como estopim ao próprio desequilíbrio e, bem, para sua infelicidade não teve meios e nem tempo para evitar tal "acidente" (e assim porque, oras, já não devia estar esperando isso?). — Ah! — Foi a exclamação que escapou, primeiro quando o corpo encontrou o chão e... — ...Ow! — ...segundo, quando a cabeça também foi acertada. A reação imediata foi levar as mãos até o topo do capuz, logo após o aperto das pálpebras que inevitavelmente ocorreu. Por outra vez o olhar passeou ao redor, em busca do que diabos havia tombado daquele jeito do topo das árvores: Isso, claro, se não o encontrasse ainda logo acima da cabeça!

Mas que raios...