cap. 01 - Country roads

Com um singelo acenar de dedos (logo após enfiar o dinheiro no bolso), o rapaz se despediu do ruivo e de sua companheirinha brilho-maníaca. O sorriso divertido ainda brilhava nos lábios quando ele mais uma vez se encostou no murinho e, sem pressa, recuperava mais um cigarro da cartela até então escondida no bolso.

Não era lá um homem de pressa.


As estrelas apareceram mais cedo do que o esperado.

Considerando que ainda estavam próximos de Goldenrod, o céu não se abria em todo o seu esplendor: Entretanto, uma quantia razoável de pontos luminosos ainda se espalhavam no manto azul-alaranjado que já dizia adeus aos últimos raios solares. Não só isso, como também era possível enxergar pokémons voadores que carregavam seus treinadores em direção ao campo do evento que, naquele momento, também era objetivo de Taliore.

...Sabe, dizem que a noite é reservada como um momento mágico de transformação - independente do contexto, motivo ou circunstância.
Creio que posso dizer com segurança que foi o que aconteceu aqui.

Desde longe, era possível enxergar o terreno reservado por D&Dnite. Não só pelo movimento e pela fila que já se estendia pela bilheteria, mas principalmente pelas várias altíssimas tochas acesas que agora estavam espalhadas por todo o perímetro contra a parte exterior do murinho, com aproximadamente três metros de distância entre si - e, de algum jeito, nem a brisa noturna e tampouco a marinha era capaz de apagá-las (o que poderia ser ou não um indicativo de que se tratava de obra de algum pokémon).

Mais cedo, Rickson havia sido avisado de que seu perfil combinava com o ambiente e, ali, agora, era possível entender o por quê. A grande maioria das pessoas já ao lado de fora haviam se apegado à ideia do evento com direito à belas caracterizações - o que resultava em um desfile incrível de roupas de aspecto antigo ou fantástico, maquiagens elaboradas e, em alguns casos, até mesmo asas e rabos cuidadosamente curtidos, o que fazia o visual levemente anômalo do ruivo parecer facilmente uma brincadeira de criança.

O vazio matinal era compensado com a vivacidade noturna e, ainda que estivessem na primeira hora do evento, era possível enxergar um pequeno mar de formiguinhas se movimentando pelo lado de dentro, caminhando em grupos pequenos de uma tenda à outra, de lado à outro, daqui práli. Era fácil observar o fato principalmente por conta dos portões levemente abertos - onde quatro pessoas (imagino que funcionários), todas vestidas com robes grandes e sentadas atrás de pequenas mesinhas individuais de madeiras que possuíam sabe-se lá o quê, interagiam brevemente com as pessoas que entravam antes que elas se perdessem de vez no interior do ambiente.

...Acho que você não precisa de um novo ingresso, então...
Quer dar uma olhadinha?

Não se preocupe, meu caro marinheirozinho: Tal como existiam aqueles tão dedicados ao ponto de delinear escamas sobre a própria pele, também haviam os de simples vestimentas que poderiam facilmente se mesclar às suas e, além de tudo, aqueles que simplesmente vinham em roupas casuais e, de certa forma, também se destacavam sem se destacar no meio de toda aquela multidão. Digo isso para pontuar que em momento algum qualquer um deles parou para olhar uma segunda vez para você, se isso te fizer feliz.

— Boa noite! — Cumprimentou, suave, a moça responsável pela primeira mesa livre que apareceu. Digo de imediato que não há nada especial sobre ela além, é claro, das vestimentas longas que escondiam praticamente o corpo todo. — ...Primeira vez? — Foi a primeira pergunta que escapou após o questionamento do ruivo mas, principalmente, após se dar conta do ar deslocado que ele parecia emitir. — Tá sozinho? — Quis saber, um sorriso simples brincando pelos lábios enquanto analisava o bilhete oferecido e, então, o escorregava pra dentro de uma gavetinha.

— Imagino que você não conheça a marca... — Seguiu, espiando-o com suavidade e retirando alguns papéis grampeados que estendeu levemente na direção do rapaz. — Preciso que preencha esses aqui, tá bom? — Pediu, sem pressa nenhuma. Os documentos IMPORTANTÍSSIMOS que agora lhe ofereço eram, no total, três páginas grampeadas. A primeira, tratava-se de uma ficha simples que carregava alguns atributos em branco; A segunda, falava a respeito de um tomate.

A terceira, e talvez a maior importante, trazia um pequeno conjunto de regras que listavam os seguintes pontos:

Regras escreveu:

"1- Seja você mesmo, ou seja quem quiser. A imaginação é o seu limite!

2- Exceto em casos de emergência, nossa equipe nunca sairá dos papéis ao qual estão assignados.

3- Dentro das atrações, você pode fazer absolutamente qualquer coisa, mesmo que imagine que não.

4- Respeito é essencial na comunidade. Se algo nesse "tudo" te deixar pessoalmente desconfortável, nossa palavra de segurança é D&Dnite.

5- Existirão Staffers ao longo da área externa que podem ser abordados caso precisem de ajuda ou clarificação.

6- Divirtam-se!"

— Você é familiarizado com interpretação? — Perguntou, apoiando a bochecha contra a mão enquanto observava o ruivo folhear os papéis. — O que nós fazemos aqui, basicamente, é um grande teatro. — Explicou, ajeitando brevemente a postura na cadeira (que tal fazer o mesmo, hein?!). — Nós preparamos alguns cenários e surpresas. Dependendo do que acontecer lá dentro, você pode receber uma e outra coisa de presente. Quem sabe? — Piscou, apontando na direção da área aberta interna. — Nós temos algumas placas mapeando as tendas. É só você dar uma passeada e deve esbarrar em alguma. — Acrescentou, espiando pra ver como andava o preenchimento da fichinha. — É mais fácil "ir na onda", digamos assim. Tem gente que gosta de ficar em um papel o tempo todo, tem quem só se importe no meio dos jogos. Tem quem não goste, também, e só venha pra ver os cenários e participar mais "de fora".

— Se você nunca tentou antes, é só ir com calma.

Ao receber a ficha pronta, a (verdadeira) recepcionista do ambiente puxou uma caneta de nanquim que repousava pacientemente sobre a madeira, a qual utilizou para fixar à ferro e fogo (bem, talvez não) as opções tecidas pelo rapaz. Se o arrependimento viesse, tenho a sensação que não haveria muito a se fazer quanto às escolhas - era bom que tivesse sorte e os atributos fossem realmente úteis ao longo do evento.

Vejamos.

— Psst. — Chamou, suave, enquanto empurrava o papel para o rapaz e o entregava de vez. Paciente, a recepcionista também retirou uma pequena pulseirinha (daquelas de eventinho VIP, sabe?) e estendeu-a ao ruivo, colocando-a em seu pulso ela própria caso a oportunidade lhe fosse oferecida. — Relaxa, ok? Ninguém vai te julgar aqui dentro. — Foram as últimas palavras oferecidas, um sorriso simpático brincando nos lábios. — Só tenta.

E então, ele se foi. Ali dentro, o espaço era mais amplo do que realmente parecia observando apenas a entrada: Alguns bancos de madeira espalhados pelos limites do murinho serviam como uma boa opção para aqueles que não desejavam sentar na grama e, bem, existia o própria chão para aqueles que não se incomodavam com o fato. A questão é que Rickson não precisou andar por muito tempo antes de dar de cara com um anúncio que, em sua superfície, trazia o desenho cuidadoso de uma simples árvore semi-pelada:



Caso tomasse um pouco de atenção, poderia perceber que a extensão do terreno em si tmava uma forma precariamente parecida com uma árvore, é verdade. Uma bem mais gorda do que a que era exposta ali, mas os "galhos" eram visíveis em passagem amplas para cada uma das atrações ali citadas. Todo o ambiente era iluminado por tochas de fogo vivo, que pulsava e dançava em seu devido limiar - além de pequenos Volbeats e Illumises que dançavam aos céus em acrobacias delicadas antes de desaparecer por mais algum tempo e, bem, repetir tudo outra vez.

Haviam muitas opções, é verdade.
... ...talvez alguma o interessasse mais?

O Torneio de Regigigas era um dos poucos lugares que não possuía uma tenda propriamente dita.

Não era difícil de perceber: Elevando-se à dois metros do chão, um ringue montado já de longe cumprimentava qualquer um que se aproximasse, com grossas cordas elásticas que serviam como contenção mínima de sabe-se lá o que entrasse lá dentro. Duas plataformas exteriores também existiam, onde eu imagino que provavelmente seria o espaço para que os treinadores dos gladiadores pudessem se posicionar. Além disso, não haviam muitas pessoas - o pouco fluxo que corria por ali eram basicamente pessoas que vinham observar a decoração e, válido observar, paravam em uma das três mesas (bem parecidas com as da entrada) para conversar com os funcionários que ali estavam.

Graças à ausência de multidão, era fácil de enxergar uma campânula artesanal que se abria a alguns metros de distância do ringue, lugar onde um belíssimo Mienshao se posicionava em guarda, o focinho volvendo de um lado para o outro e avançando brevemente para interromper a aproximação de qualquer desavisado que tentasse chegar perto da flor.

Uma placa de madeira fincada ao chão anunciava o ambiente, além de trazer consigo algumas pequenas informações:

TORNEIO DE REGIGIGAS
- O COLOSSO DORMENTE -
PERÍODO DE INSCRIÇÕES: ATÉ 10 MINUTOS ANTES DO INÍCIO

INICIANTE: 18:30
INTERMEDIÁRIO: 19:30
PROFISSIONAL: 20:30

Essa era a denúncia que o rapaz tinha a respeito de que levaria algum tempo para que aquela atração fosse iniciada - entretanto, considerando as mesas e o pequeno vai-e-vem, era seguro dizer que já seria possível fazer sua inscrição caso quisesse realmente participar. Além disso, o ringue denunciava (ou, pelo menos, era uma conclusão óbvia) que aquele era um espaço dedicado à batalhas Pokémon, então era outro ponto a se levar em conta ao ir em frente.

Durante todas as experiências que já tive ao longo dos anos, já experienciei coisas demais. Dimensões alternativas, linhas temporais atormentadas por vastas anomalias, maravilhas e, principalmente, pesadelos. Testemunhei esperanças, suavidades, gentilezas e meras criaturas vis que domavam as rédeas de um destino incerto.

Jamais, e repito, jamais presenciei um treinador recusar uma batalha em qualquer que fosse a circunstância ou contexto, principalmente se tratando de uma situação tão segura quanto a apresentada em um evento.
Creio eu que jamais irei.

Dito isso, seria com absoluta segurança que apostaria na cena que se seguiu, com os passos do rapaz flutuando em direção aos funcionários responsáveis daquele pequeno momento pré-torneio. Infelizmente, não houve ninguém que aparecesse pra me oferecer um dinheirinho em troca dessa possibilidade de aposta invisível, o que me leva à aceitar meu pobre (literalmente) destino. Fazer o quê?

Não conte pra ninguém, mas o rapaz abordado para tirar as dúvidas estava ocupado o suficiente desenhando um lindo solzinho no cantinho do papel de inscrições - rabisco esse instantaneamente com a mão quando ouviu a proximidade e, com isso, eu quero dizer a torrente de questões extremamente válidas de Taliore.

— ...quê?! AH! — Exclamou, balançando a cabeça e imediatamente ergueu o queixo na direção do ruivo. — ....aaaaah..... — Um sorriso amarelado, a coluna se endireitou na cadeira e olhou melhor para o rapaz. — Sãaaao.... Iniciantes! Ah, hmm... Quer dizer... — Ponderou um breve momento ao se dar conta que, bem, isso não respondia absolutamente nada. — ...O torneio em geral só é permitido um pokémon! Dois, às vezes, mas depende bastante da situação. — Um sorriso sem graça. — O primeiro horário é mais pro pessoal que acabou de começar, então você não deve ter problema com. — De levinho, apertou a bunda da caneta. — Quer se inscrever? Mesmo que não tenha experiência, não custa nada, então se você quiser minha opinião, não tem nada a perder! — Incentivou, um sorriso leve no processo. — Só preciso do seu nome e o Pokémon, e a gente te chama na hora. Também temos nossa enfermeira entre as batalhas, então é algo que não precisa se preocupar de ir correndo pra lá e pra cá. — Acrescentou, apoiando a caneta no papel - e aguardando uma resposta, também.

...
Talvez quisesse voltar a desenhar seu solzinho, mas isso não posso te garantir.